segunda-feira, 27 de junho de 2016

ARMAS DA CIA VENDIDAS NO MERCADO NEGRO DA JORDÂNIA


 
jdubfudge / Flickr
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Armas enviadas pela CIA e pela Arábia Saudita para os rebeldes sírios tiveram como destino final o mercado negro, depois de terem sido roubadas por agentes jordanos.
Um sem número de armas enviadas pela CIA e pela Arábia Saudita para a Jordânia, destinadas aos rebeldes sírios que combatem Bashar al-Assad, foram roubadas e vendidas no mercado negro por agentes jordanos.
A informação foi avançada por funcionários norte-americanos e jordanos a uma investigação conjunta do The New York Times e da Al Jazeera.
Em declarações aos dois órgãos de comunicação, os funcionários admitem que as armas, tal como Kalashnikov, morteiros e granadas, tiveram como destino o mercado negro.
Algumas das armas roubadas terão sido até utilizadas no tiroteio que, em novembro passado, matou cinco pessoas, incluindo dois norte-americanos, num centro de formação da polícia de Amã, capital da Jordânia.
Segundo a investigação, não é certo o que terá sido feito à maioria das armas, que acabaram nas mãos de diversos grupos, incluindo redes criminosas e tribos rurais jordanas que utilizam bazares de armas para montarem os seus arsenais.
Os traficantes de armas também as compram nos bazares para as enviar depois para fora da Jordânia, segundo divulga a mesma investigação.
Fontes governamentais jordanas afirmaram ser “absolutamente incorreta” a informação de que existem agentes implicados nos roubos de armas.
Por seu lado, a CIA não quis tecer comentários relativamente à investigação, de acordo com o jornal norte-americano.
As armas eram inicialmente destinadas aos rebeldes que pretendem derrubar o presidente sírio, um tipo de programa que a CIA e o Pentágono levam a cabo há várias décadas.
ZAP / Lusa

MULHER DE VALE E AZEVEDO ACUSADA EM BURLA DE 25 MILHÕES AO BCP


 
Tiago Petinga / Lusa
Vale e Azevedo à saída da prisão da Carregueira, a 7 de Junho de 2016.
Vale e Azevedo à saída da prisão da Carregueira, a 7 de Junho de 2016.
Depois de Vale e Azevedo, agora é a vez da mulher do ex-presidente do Benfica se sentar no banco dos réus para responder por crimes económicos. Em causa está uma alegada burla de 25 milhões de euros ao BCP.
Filipa Vale e Azevedo e dois franceses estão acusados de 15 crimes no total, nomeadamente de burla qualificada e falsificação de documentos, avança o Correio da Manhã que teve acesso ao processo.
Desta vez, Vale e Azevedo não está acusado no caso que envolve um pedido de financiamento aoBanco Comercial Português (BCP) da empresa Vale e Azevedo Capital.
O processo do ex-dirigente do Benfica foi autonomizado e está agora dependente das autoridades britânicas, segundo o CM.
Em causa está a alegada tentativa de obter dinheiro do BCP através de garantias de uma sociedade que não existia.
A Vale e Azevedo Capital terá solicitado um empréstimo de 25 milhões de euros ao BCP para comprar a Companhia Portuguesa de Amidos.
Como garantia de pagamento, apresentou um documento emitido pela PM RE Seguros, uma suposta representante da Swiss Re Group em Paris.
Mas o BCP constatou que não havia nenhuma filial desse grupo em França e que os dois franceses ligados ao caso, Eric Guyon e Richard Botella, alegadamente representantes da tal sucursal, não estavam ligados à empresa suíça.
Um esquema semelhante terá sido utilizado por Vale e Azevedo para, alegadamente, burlar alguns clientes, nomeadamente PêMais, a Vencimos, a Eurolondons e a Futurbelas, constata o mesmo jornal.
ZAP
Comentário: que estilo de vida vem a ser deste casal? Vida dupla? Por norma a duplicidade não se conjuga, dai a situação de apuros.
J. Carlos

PERITOS CONCLUEM QUE DILMA ASSINOU DECRETOS ILEGALMENTE (MAS NÃO HOUVE “PEDALADAS”)


 
Dilma Rousseff, Presidente do Brasil
Dilma Rousseff, Presidente do Brasil
Uma perícia feita por técnicos do Senado (câmara alta parlamentar brasileira) a pedido da defesa da Presidente afastada Dilma Rousseff indicou que esta não foi responsável pelos atrasos nos pagamentos, as chamadas “pedaladas fiscais”, um dos crimes que sustenta o processo de destituição.
Segundo os peritos, não existe prova de que a chefe de Estado tenha agido diretamente nas chamadas “pedaladas fiscais” consideradas crimes na denúncia, referindo-se às manobras que consistem no atraso de repasses de dinheiro devido pelo Governo aos bancos para melhorar as contas públicas.
“Pela análise dos dados, dos documentos e das informações relativos ao Plano Safra, não foi identificado ato comissivo da Exma. Sra. Presidente da República que tenha contribuído direta ou imediatamente para que ocorressem os atrasos nos pagamentos”, lê-se no relatório.
Por outro lado, os peritos indicaram que não há controvérsia na segunda acusação contra Dilma Rousseff, considerando que cometeu crime de responsabilidade ao libertar créditos suplementares sem o aval do Congresso em três decretos editados no ano passado, quando a meta fiscal de gastos já tinha sido ultrapassada.
Dilma Rousseff foi afastada no dia 12 de maio pelo Senado para responder às acusações de que teria cometido crime de responsabilidade.
Uma comissão especial formada por parlamentares da câmara alta está a analisar o processo de destituição e, atualmente, ouve testemunhas de defesa e de acusação arroladas no processo.
Pelo cronograma oficial, que ainda pode ser alterado, o plenário do Senado deve fazer a votação de um parecer prévio sobre as acusações contra Dilma Rousseff no dia 9 de agosto, depois do qual a defesa e a acusação terão dois dias cada para se pronunciar.
Passado este prazo, o julgamento final sobre o impeachment de Dilma será marcado no prazo de dez dias.
Se o calendário for mantido, a Presidente brasileira deve ser julgada antes do fim de agosto.
São necessários pelo menos 54 votos desfavoráveis de um total de 81 senadores para Dilma Rousseff ser destituída. Em caso de condenação ela também perderá o direito de se eleger a cargos públicos por oito anos.
/Lusa

O COMBATE Á VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES EM ÁFRICA: O EXEMPLO DO EGIPTO

Rui Peralta, Luanda 

O ACTDC (Appropriate Communication Techiniques for Development Center), no Cairo, lançou um projecto – iniciado em Maio deste ano – de envolvimento dos homens no combate á violência contra as mulheres. Este projecto enfatiza o papel dos homens no suporte á causa contra a violência sobre as mulheres, na tentativa de dar mais visibilidade ao problema e gerar activistas masculinos que possam desenvolver acções de mobilização e de esclarecimento entre a população masculina egípcia.
De acordo com um estudo efectuado em 2013 pela Fundação Thomson Reuters, o Egipto é um dos países africanos onde os direitos das mulheres são mais ignorados.

 Baseado neste estudo o ACTDC lançou uma iniciativa com jovens universitários, líderes comunitários, sindicatos, ONG´s, associações culturais e socioprofissionais, escolas e comunicação social, desenvolvendo acções e campanhas que abrangem os diversos tipos de violência contra as mulheres, começando pela perseguição nas ruas e nos locais de trabalho, violência doméstica, estupro, casamento forçado e mutilação genital (frequente nas áreas ruais do Alto Egipto.

Em paralelo decorre uma campanha contra a perseguição às mulheres, organizada pelo NCW (Conselho Nacional para a Mulher) sob o lema: “Juntos contra a perseguição”. Esta campanha é levada a cabo por homens e mulheres e conta com a cooperação dos ministérios da Justiça, do Interior e dos Assuntos Religiosos. A campanha tem como objectivo a criação de mecanismos que permitam um maior controlo da violência nas ruas e reduzir os elevados números de casos de perseguição a mulheres. O NCW criou uma linha directa para denúncia de casos de perseguição e de violência doméstica, assim como levou a cabo uma petição sobre medidas de prevenção que recolheu milhões de assinaturas de mulheres e que foi apresentada ao parlamento egípcio.

Um outro estudo sobre violência domestica efectuado pela Agência Central para a Mobilização Publica e Estatísticas, publicado em Novembro do ano passado, revela que uma em cada quatro egípcias casadas é abusada fisicamente pelos maridos. Mais de 30% são sujeitas, pelos maridos, a violência psicológica e física. 25% das egípcias licenciadas ou que frequentam o ensino superior, casadas, são vitimas de agressões físicas, sexuais e/ou psicológicas. Esta percentagem é de quase 40% nas mulheres que não completaram o ensino básico. Ainda de acordo com este estudo a violência contra a mulher é muito mais acentuada no Alto Egipto onde 32% das mulheres casadas são vítimas de maus tratos, enquanto no Baixo Egipto cerca de 29% das mulheres casadas são vítimas de abusos.

No Egipto existem nove abrigos, sob tutela do Ministério da Solidariedade Social, para mulheres vítimas de violência. No entanto um relatório publicado pela NWF (New Woman Foundation) considera que o acesso a estes abrigos é muito dificultado por razões burocráticas e, também, devido á inexistência de um gabinete especializado que efectue e analise os dados estatísticos sobre a situação das mulheres egípcias e as formas de violência por elas sofridas. 

MERCOSUL: O QUE VEM AGORA?

O Mercosul corre um sério risco de tornar-se apenas uma via livre para a estratégia das multinacionais e seu futuro depende do percurso político no Brasil.

Maria Silvia Portela de Castro; Jacy Afonso de Melo/Carta Maior

A tentativa de golpe no Brasil desencadeou um processo que ameaça gravemente a democracia no Mercosul. Este teve inicio no Paraguay, em junho de 2012, quando meteoricamente (24 horas) o Senado paraguaio regulou e aplicou a lei de impeachment contra o Presidente Lugo. A reação dos demais sócios foi imediata e dura: a suspensão da participação institucional do Paraguay até que houvesse a normalização democrática. Posteriormente a situação do Paraguay foi normalizada. Na Venezuela, que havia sido admitida no bloco, aumentaram as ações de desestabilização agitação política da oposição para o governo chavista, contando com apoio da mídia e figuras políticas dos Estados Unidos e da Europa. Depois da morte de Chaves o quadro piorou significativamente.

Em 2014 cresce a campanha contra a corrupção no Brasil, desencadeada pela enorme divulgação da operação lava jato capitaneada pela Justiça Federal no Paraná. Um processo que vai de encontro com os anseios da sociedade contra a corrupção, mas que se desenvolve através do uso freqüente da prisão como forma de forçar a delação e do vazamento seletivo de informações, tendo sempre como principal alvo o PT. Fica cada vez mais claro a judicialização da política e que a bancada dos juízes e procuradores se alinhou a mídia conservadora para culpar o PT por anos de corrupção e não permitir que esse partido siga governando o país.  

Na Argentina o kichnerismo/esquerda perdeu as eleições, depois de uma enorme campanha de mídia contra a presidente Cristina Kirchner, também acusada de pratica de corrupção e um conflito também com instancias do judiciário (a morte do promotor Alberto Nisman em 2015).

Não são coincidências. Se na vida nada é por acaso, em política muito menos. 

Na primeira década do novo século, partidos desenvolvimentistas e de centro-esquerda venceram eleições com o apoio de movimentos sociais e de alguns setores empresariais, ocupavam simultaneamente os governos (sempre alternamos nossos governos entre ditaduras e democracias). Vários pontos poderiam, explicar porque dessa conjunção, mas não é esse o objetivo do artigo. Mas provavelmente a esquerda ganhou os governos nos países mencionados devido a falência das medidas neoliberais aplicadas a países que não vivam sob um estado de bem estar social. A destruição do patrimônio publico e dos serviços sociais aprofundou as desigualdades sociais.

Nesse cenário, partidos como o PT e Frente Ampla do Uruguay, que há tempos vinham crescendo na política ocuparam o espaço. Na Argentina a crise provocada pelo período Menem desembocou numa grave crise política em 2001, que terminou com a queda de De la Rua. A saída foi um governo transitório a cargo do velho peronismo e a ameaça de vitoria de acabou precipitando uma virada a esquerda, fortalecendo a candidatura Kirchner.   

Até 2008, quando explodiu a crise financeira de Wall Street, os países do Mercosul, comemoravam a redução da miséria e da desigualdade e ensaiavam através da UNASUL e da CELAC a formação de um bloco político. Faltavam, no entanto bases econômicas e interesses comerciais comuns para consolidar essa idéia.

Entre as principais conquistas da UNASUL podemos citar a criação dos Conselhos de Defesa Sul-Americano, Energético e de Infraestrutura e Planejamento. Mas a UNASUL dificilmente avançará como bloco econômico, porque em seu interior convivem dois blocos com modelos opostos de articulação comercial: o grupo do Pacifico (parte da antiga CAN e mais o Chile) e o grupo do Mercosul. Os compromissos assumidos pelo Chile, Colômbia e Peru, através dos TLCs com os EUA e UE, impedem que seja compartilhado um acordo de comercio com uma união aduaneira como o Mercosul.

Com a descoberta do Pré-sal no Brasil o Mercosul passou a ser a terceira maior reserva de petróleo no mundo. Se juntarmos esses fatos aos interesses do governo estadunidense depois de setembro de 2001- de controle de fontes energéticas e expansão de mercados - não estranharemos o crescimento do valor estratégico do Mercosul para o hemisfério norte.

Esses fatos se amplificam quando inseridos em um cenário de acirramento da crise econômica e política, a partir de 2010. O governo Dilma Roussef demonstrou pouco interesse em alavancar a integração comercial e política na região. Suas parcas ações em matéria de política externa foram no plano multilateral (BRICS principalmente). A Argentina por outro lado, entrou em uma estratégia defensiva, adotando medidas protecionistas e provocando conflitos com os demais sócios, inclusive o Brasil. Desde 2011 o processo de integração econômica e comercial do Mercosul está estagnado. Um cenário que facilita o retrocesso que está sendo anunciado, tanto pelo governo Macri, como principalmente pelo Ministro de Relações Exteriores interino brasileiro, José Serra.

A política de combate ao "terrorismo" efetivada pelo governo estadunidense nos últimos 15 anos, resultou na eliminação de uma serie de direitos individuais e justificou as invasões e ataques ao Iraque, Afeganistão e Líbia. Assim como o desastre que vem ocorrendo na Síria. A União Europeia, enfrenta uma crise sem proporções e a falência da social democracia dos anos 90 dá lugar a governos conservadores, que alimentam o autoritarismo e a xenofobia. O tratamento a onde de imigrantes não faz jus a um continente que lutou bravamente contra o nazismo.

Para a America Latina a tríade lançou como prioridade o combate a corrupção, como se esse problema (que é realmente muito prejudicial) acusando os novos partidos que ocuparam os governos como os mesmos corruptos de sempre. Não há dúvida que houve erros graves nessas administrações, mas não são essas as causas da crise atual. Assim como o combate ao terrorismo islâmico nos Estados Unidos e Europa, a campanha de mídia e de incentivo a ações de massa contra a corrupção passou a justificar quaisquer medidas, mesmo que autoritárias e ilegítimas, como o que vem ocorrendo no Brasil, chegando ao absurdo de apoiar a ação golpista de um grupo parlamentar corrupto e sem perfil político. O objetivo é preparar o terreno para uma virada na política econômica e social e expandir a oferta de mercado a vários grupos multinacionais. Para isso é preciso terminar com os governos do PT e inviabilizar uma nova candidatura de Lula. 

Concordando com a análise do professor André Singer (debate "Caminhos da Esquerda frente ao golpe" no dia 30/05/16 - USP), a Presidente Dilma, em seu segundo mandato, tentou uma saída buscando aliar-se a burguesia industrial (redução das taxas de juros dos bancos estatais, subsídios fiscais, apoio a investimentos e exportações, etc), mas este segmento se mostrou desinteressado de um projeto de soberania nacional que implicasse em um confronto mais sério com outras facções do capital (externo e financeiro). Mais que isso, seus representantes políticos cederam a pressão da mídia e aliaram-se ao judiciário e ao setor mais corrupto do Legislativo para tirar o PT do governo. Com isso a grave crise econômica que o Brasil atravessa resulta dos impactos da crise global, mas principalmente pela paralisia imposta a economia do país por essas forças políticas. O caminho esta aberto para o aprofundamento da internacionalização da economia brasileira.

Os setores industriais dinâmicos no Brasil estão em conglomerados liderados pelas multinacionais (automóveis, alimentação, laboratório, etc); depois temos os segmentos de infraestrutura em empresas estatais (como a Petrobras) e de grandes Construtoras que cresceram a sombra das obras publicas. Um segmento que se expandiu durante o regime militar (a quem o Professor Chico de Oliveira chamou de "burguesia burocrática"). Essas empresas são parte importante das chamadas "multilatinas e tem hegemonia na região e no governo Lula foram definidos várias política de apoio para o investimento e comercio externo. No processo da lava jato boa parte dessas empresas estão acusadas de corrupção e paradas. Terão dificuldade para retomar seus investimentos.  

Assim muito provavelmente - por conseqüência dessa crise econômica e política que vive o Brasil e das medidas privatistas e de diminuição do Estado que podem ser adotadas - corre-se o serio risco de que esse setor deixe de existir e passe a ser ocupado por empresas estadunidenses, chinesas, etc.

O Mercosul vai sobreviver?

Quando o Tratado de Assunção foi negociado, Argentina e Brasil eram administrados por governos liberais. Porque não se optou pelo modelo Nafta e sim pela criação de um bloco comercial?

Provavelmente o empresariado brasileiro só aceitou apoiar um Mercosul que tivesse uma tarifa externa comum - TEC. O medo era que nossos vizinhos fizessem triangulação comercial e as empresas brasileiras não suportassem a concorrência com terceiros mercados. Principalmente a China. Apesar do empresariado industrial pender pela aprovação da ALCA, o receio da competição com a indústria estadunidense falou mais alto e o levou a aceitar silenciosamente o fim das  negociações em 2005.

Nos últimos 10 anos, com a insistente desvalorização cambial, houve um forte  crescimento das importações. Além disso, em segmentos antes protecionistas como calçados e aviões, grandes empresas foram para fora do país (América do Sul, África e China), visando a venda para o mercado brasileiro. E principalmente no setor automobilístico houve mudanças na estrutura da produção mundial e passou a ser interessante uma maior abertura comercial.

Essas mudanças não foram acompanhadas pelo aprofundamento da integração e nem pela adoção de alguma estratégia comum. Os dois países menores nunca viram com satisfação a limitação que lhes foi imposta pela TEC (comprar principalmente do Brasil) e a Argentina, apesar das tentativas do período Kirchner não conseguiu retomar sua industria, apoiando-se cada vez mais nas exportações do agro. Caminho que que esta sendo trilhado pelo Brasil cada vez mais.

Desta forma a permanência da Tarifa Externa Comum - TEC passou a ser incômoda para alguns segmentos da industria brasileira. Nacão por acaso a FIESP é a maior defensora da flexibilização do Mercosul e Serra seu principal portavoz.

Se perdurar essa política dos governos da Argentina, Brasil e Paraguay, o Mercosul  retrocederá  ao modelo de um zona de livre comercio, sem articulações ou políticas produtivas, trabalhistas e sociais comuns. Muito provavelmente negociará acordos com a UE e talvez os EUA, ou o bloco do Pacifico. No Brasil haverá pressão pela adoção de Acordos de Proteção Internacional e ficaremos vulneráveis a intervenção de multinacionais nas definições de nossa política interna.

A integração dos processos de produção será cada vez mais gerenciada pelas multinacionais, crescendo mais o comercio intra-empresas. Quando não existem políticas de integração num plano desenvolvimentista, as grandes empresas é que determinam a construção e funcionamento das cadeias de produção e comercio, onde, quando e como colocar ou deslocar a produção. O darwinismocomercial será mais violento.

Desta forma toda a agenda social, política e trabalhista tende a naufragar ou no mínimo tornar-se retórica pouco crível.  

No Mercosul, graças a forte presença do movimento sindical no processo (no período de 1992 a 2005) a agenda trabalhista teve importante papel. Mesmo depois do período neoliberal dos anos 90 se conseguiu aprovar a Declaração dos Direitos Fundamentais do Mercosul em 1998. Em 2004 foi realizada a primeira Conferencia de Emprego do Mercosul e aprovado um ambicioso plano de trabalho, que em quase nada ultrapassou a retórica. Como os governos nacionais aplicava, políticas de geração de emprego e renda e valorização dos direitos fundamentais, o ator sindical Mercosul foi deixando de lado seus espaços e depois do fim das negociações da ALCA as centrais sindicais foram dando cada vez menos importância a participação nas atividades regionais.

Seria um erro não retomar o protagonismo no processo de integração quando entra em débâcle um projeto tão importante como esse e, principalmente, não desenvolver uma estratégia que priorize a articulação de trabalhadores e trabalhadoras de mesmos grupos empresariais e segmentos produtivos, para impedir exatamente a pratica do dumping social e a perda de direitos na região.

No Mercosul existem instrumentos aprovados - como o caso da Declaração Sociolaboral - mas pouco efetivos, pois nunca foi materizalizada a via para implementá-los. O sindicalismo, tão ativou nas primeiras etapas de negociação do bloco não pressionou por sua implementação e nem lançou mão desses recursos. É hora de fazê-lo.

Para finalizar podemos dizer que o Mercosul corre um sério risco de tornar-se apenas uma via livre para a estratégia das multinacionais e seu futuro depende fundamentalmente do percurso político no Brasil.

Mas, o fortalecimento e da articulação sindical e a definição de estratégias comuns de ação contra a política anti-sindical e anti social do grande capital depende bastante da decisão e da iniciativas do movimento sindical e social.

Maria Silvia Portela de Castro- socióloga, assessora sindical
Jacy Afonso de Melo - bancário, ex-dirigente nacional da CUT e Secretario de Formação da Federação dos Bancários do Centro Norte

Em Pravda ru - Créditos da foto: Roberto Stuckert Filho/PR

TUDO COMEÇA POR UM NÃO

Nuno Ramos de Almeida* – jornal i, opinião

Estamos numa encruzilhada. O Brexit pode significar o regresso à soberania democrática de uma pessoa, um voto, ou a criação de Estados racistas

Duas histórias retiradas de uma mesma realidade complexa: num comboio no Reino Unido, uma mulher vestida com nicabe, um véu que cobre o rosto e apenas revela os olhos, canta uma canção de embalar para a sua criança numa língua aparentemente estranha. Um homem irrita-se e diz-lhe: “Você está no Reino Unido, devia ser obrigada a falar inglês.” Uma senhora de idade reage de pronto: “Estamos no País de Gales e ela está a cantar em galês.” No dia em que foi anunciado o Brexit, Bruxelas e Berlim comunicaram que ia haver uma reunião para a União Europeia meditar sobre o sucedido e convocaram todos os 27 países, deixando de fora o Reino Unido? Nada disso, marcaram uma reunião dos seis “fundadores”. Foi apenas por vergonha que foram buscar os fundadores da CEE quando, no fundo, achavam que isso se fazia somente com Berlim.

O racismo e a falta de democracia na União Europeia são duas faces da mesma moeda e alimentam-se mutuamente. Há muito que a União Europeia é profundamente racista em relação aos imigrantes e refugiados, como provam os acordos feitos com a Turquia e as combinações que fizeram com o governo de Cameron antes do referendo, para limitarem os direitos sociais do emigrantes no Reino Unido. Os governos da Europa legitimaram com a sua ação os argumentos racistas que pretendem ligar a crise à imigração e aos trabalhadores do Terceiro Mundo. Quando, no fundo, o que se verifica é que o processo de globalização económica que a UE persegue contribui em muito para a destruição progressiva do Estado social europeu e o esvaziamento total da democracia. A democracia que os governantes de Berlim e Bruxelas querem é um regime em que todos possamos falar, mas estejamos impedidos de decidir caminhos alternativos àquele que foi contratualizado com as grandes empresas.

Depois do processo de liberalização neoliberal iniciado nos anos 80 criou-se uma situação de agravamento exponencial das desigualdades económicas e de poder. A destruição do Estado social e a privatização galopante das suas funções, para entregar maiores fatias de rendimento a grandes grupos económicos e financeiros, criaram uma situação de precarização generalizada de camadas cada vez maiores das populações; a crise económica e financeira de 2008 apenas veio radicalizar ainda mais esse processo, obrigando os contribuintes a pagarem os custos da economia de casino. Temos uma espécie de socialismo para banqueiros: quando há lucros, os senhores recebem sozinhos os dividendos; quando há prejuízos, pagamos nós.

Apesar das repetições das crises, do agravamento dos problemas sociais, há um discurso dominante que nos garante que não há alternativa a esta realidade, como se essa realidade fosse uma espécie de real inultrapassável. Numa conhecida passagem, citada por Zizek, de Fredric Jameson afirma-se: “Ninguém mais considera seriamente as possíveis alternativas ao capitalismo enquanto a imaginação popular é assombrada pelas visões do futuro ‘colapso da natureza’, da eliminação de toda a vida sobre a Terra. Parece mais fácil imaginar o ‘fim do mundo’ que uma mudança muito mais modesta no modo de produção, como se o capitalismo liberal fosse o ‘real’ que de algum modo sobreviverá, mesmo na eventualidade de uma catástrofe ecológica global... Assim, pode afirmar-se categoricamente a existência da ideologia qual matriz geradora que regula a relação entre o visível e o invisível, o imaginável e o inimaginável, bem como as mudanças nessa relação.”

O que veio provar o Brexit é que esse discurso de um real eterno e inultrapassável está a rebentar. O cenário está a desfazer--se. Mas tal como no passado, isso não garante que surjam alternativas melhores; elas têm de ser produzidas e estão muito longe de o ser. Nos anos 30, o rescaldo da i Guerra Mundial e a grande crise de 1929 levaram ao crescimento de uma extrema--direita racista que dava voz a camadas da burguesia empobrecida que estavam atemorizadas pela crise e pelo crescimento do movimento operário e dos comunistas. A crise dos anos 30 e a falta de capacidade de gerar alternativas populares com capacidade de se oporem ao ascenso do fascismo levaram-nos diretamente à guerra e ao Holocausto.

Por todo o lado, a crise na Europa está a fazer subir partidos xenófobos. E eles têm de ser combatidos. Agora, qualquer combate não pode ser feito pela manutenção do estado atual, nem pela afirmação das políticas e instituições que nos trouxeram até aqui. A União Europeia tornou-se o espaço da imposição do neoliberalismo e do esvaziamento da democracia. Pregar a sua manutenção significa tentar tapar o sol com a peneira. Esta União Europeia não vai a nenhum lado mas, infelizmente, o caminho que pode sair daqui pode ser ainda pior se não for criada nenhuma alternativa verdadeiramente popular.

As alternativas políticas não estão talhadas na pedra, têm de ser construídas pelos homens e pelas mulheres. Uma mesma situação social pode ser parteira de uma melhor sociedade ou de uma muito pior. Há uma luta para criar sentido político de uma determinada situação. O maior erro da liderança de esquerda dos trabalhistas, protagonizada por Corbyn, foi ter deixado o espaço do combate ao neoliberalismo e da austeridade made in eixo de Berlim e Bruxelas aos racistas. A política tem horror ao vazio e estes aproveitaram a situação.

Três meses antes de ser eleito para a liderança dos trabalhistas, Jeremy Corbyn era clarinho como água: “Uma Europa usurária que transforma as pequenas nações em colónias escravizadas sob o fardo da dívida não tem nenhum futuro.” Esta posição de Corbyn era absolutamente coerente com o seu percurso político; em 1975, ele tinha defendido a saída da então CEE; em 1993 rejeitou o tratado de Maastricht, prevendo que a aprovação desse tratado e o rumo seguido pela integração europeia iriam levar a que fosse retirada aos parlamentos nacionais a capacidade de “definir as políticas económicas dos seus países em favor dos interesses de uma série de banqueiros não eleitos”.

No seu discurso de 14 de abril de 2016, Corbyn anuncia o seu apoio à permanência do Reino Unido na UE, inserindo-o na estratégia da “construção do socialismo”. Estranhamente, o mesmo voto é defendido por 80% dos membros das confederações patronais e pelos bancos JP Morgan Chase, Goldman Sachs e HSBC, embora estes afirmem que o voto no sim garante os interesses do grande capital financeiro. Como observa Hannah Sell, do Partido Socialista britânico, “se Corbyn chegar ao poder, o seu programa será ilegalizado por Bruxelas”. Preso por ter cão, preso por não ter. A primeira possibilidade de mudança passa pelo fim das imposições de Bruxelas, mas essa mudança só será progressista se houver alternativas deste teor a disputar o sentido e as narrativas desta rutura. 

*Jornalista

PORTUGAL DEVE PREPARAR-SE PARA SE “LIBERTAR DO EURO”, MAS SEM REFERENDO

O secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, disse hoje que Portugal deve estar preparado para se libertar do euro, mas mostrou-se reticente quanto à realização de um referendo, remetendo as decisões em matérias europeias para "as instituições nacionais".

Jerónimo de Sousa, que falava após uma reunião do comité central do PCP para analisar a situação política e económica nacional e internacional, destacou "a urgência e a necessidade de Portugal se preparar e estar preparado para se libertar da submissão ao euro", salientando que este deve ser "um processo" e não "um ato súbito".

Quanto a um eventual referendo, lembrou que tal como a adesão à CEE não foi objeto de consulta popular, o mesmo se deve aplicar noutros casos, já que as instituições nacionais "têm legitimidade" para reconsiderar as decisões no que diz respeito à Europa.

O líder comunista elogiou a decisão britânica de abandonar a União Europeia, que classificou como "uma vitória sobre o medo" e uma forma de mostrar "rejeição" pelas políticas europeias, recusando que seja analisada usando apenas os argumentos de xenofobia.

Lusa, em Notícias ao Minuto

COMISSÃO EUROPEIA CONTINUA COM AMEAÇA DE SANCIONAR PORTUGAL E ESPANHA

Segundo o “Le Monde”, a Comissão Europeia irá recomendar ao Conselho Europeu que sancione Portugal e Espanha, impondo uma multa e a suspensão temporária dos fundos estruturais. O Bloco de Esquerda defende que Portugal deve recusar as sanções e anunciar “um referendo para tomar posição contra as sanções”.

“Le Monde” anuncia que a Comissão Europeia (CE) se prepara para propor ao Conselho Europeu que sancione Portugal e Espanha por “défice excessivo” em 2015, impondo-lhes uma multa, que poderá ir até 0,2% do seu Produto Interno Bruto (PIB) e uma suspensão temporária dos fundos estruturais europeus. A CE não terá tomado posição até agora devido às eleições em Espanha.

Em maio passado, o presidente da CE, Jean-Claude Juncker, defendeu que a Espanha não devia ser punida, por estar sem governo estável e à beira de eleições, e Portugal também não devia ser punido, para que a CE não fosse acusada de “punir” um governo de esquerda. No passado, Juncker já, por diversas vezes, fez declarações num sentido e, passado algum tempo, defendeu o contrário do que havia dito antes.

A chantagem das instituições europeias não têm, no entanto, deixado de aumentar. A decisão de adiamento da discussão sobre a aplicação de sanções foi fortemente criticada pelo governo alemão e o seu ministro das Finanças, Wolfgang Schäuble. O presidente do eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem, defendeu publicamente a aplicação de sanções aos dois países ibéricos, afirmando que a CE deve "respeitar o pacto de estabilidade".

O artigo questiona como reagirão Portugal e Espanha e as suas populações e cita uma afirmação do ministro da Economia de Espanha, Luis de Guindos do PP, que falou de sanções de “zero euro”.

O artigo “esquece” que o parlamento português aprovou, a 9 de junho, dois votos de condenação das sanções.

Sanções a Portugal serão “declaração de guerra” e podem provocar referendo

No encerramento da X Convenção do Bloco de Esquerda, Catarina Martins voltou a abordar o tema, considerou que a decisão de aplicar sanções a Portugal por causa do governo que seguiu as polícias da troika significa que “a Comissão Europeia declara guerra a Portugal”.
“E nesse caso Portugal só pode responder recusando as sanções, recusando o arbítrio e anunciando que está disposto a por na ordem do dia um referendo para tomar posição contra as sanções”, propôs a coordenadora do Bloco.

Esquerda.net

Portugal. PCP JÁ VÊ “LIMITAÇÕES” NO GOVERNO PS

O Comité Central comunista não tem dúvivas: houve avanços com o Governo socialista, mas António Costa peca por se “submeter às imposições da UE” e por não “afrontar o grande capital”. O OE 2016, aprovado pelo PCP, “não deu a resposta necessária“ e é preciso ir mais longe. O aviso fica dado

O apoio do PCP a um Governo do PS não está em causa e até os comunistas querem sublinhar "os resultados positivos alcançados no quadro da nova fase da vida política nacional". Mas, na verdade, nem tudo são rosas na coligação das esquerdas. Há "limitações e opções do Governo PS que condicionam as possibilidades de crescimento" do País, dizem os comunistas, para quem se podia (e devia) ter ido mais longe no último Orçamento de Estado. Motivo? O PS não consegue deixar de se sujeitar ao euro e "às imposições da União Europeia", tal como não consegue fazer face e afrontar "os interesses do grande capital".

Estas são algumas das conclusões da reunião, este fim de semana, do Comité Central do PCP. O orgão máximo dos comunistas entre Congressos elencou, mais uma vez, as vantagens da coligação parlamentar com o Governo socialista, mas não deixa de lançar avisos e separar as águas com algumas das medidas assumidas pelo Executivo de António Costa. Na verdade, "o Plano Nacional de Reformas e o Programa de Estabilidade enviados à Comissão Europeia são da responsabilidade do Governo. O PCP não os aprovou e não está de acordo com os seus objetivos, funções e natureza política", diz o comunicado de 14 páginas, divulgado esta segunda-feira pelo Partido Comunista.

Mas os motivos de discordância não terminam aqui. Mesmo o Orçamento de Estado deste ano, aprovado graças aos votos comunistas, não deixa de ser motivo de crítica. O documento "não deu a resposta necessária" a muitas das questões que o PCP considera prioritárias porque, segundo os comunistas, o PS não consegue "enfrentar os interesses do grande capital e do diretório de potências da União Europeia".

IR MAIS LONGE, AQUI E NA UE

Os comunistas gostariam de ver o Governo ir mais longe no aumento real do valor das pensões de reforma, queriam ver eliminadas as restrições às progressões das carreiras no Estado e no sector público empresarial. Não desistem de aumentar os impostos sobre o capital e os grandes grupos económicos ou de aumentar os estímulos às pequenas e médias empresas. "A verdade é que a drenagem de recursos para os encargos com uma dívida insustentável e com os apoios e benefícios fiscais ao grande capital está a traduzir-se em níveis muito baixos de investimento público", diz o Comité Central.

E é com este conjunto de diferenças (e esta espécie de caderno de encargos) que o PCP parte para a discussão do próximo Orçamento do Estado com os socialistas. A que se junta uma visão francamente distanciada do PS em tudo o que se refere às questões europeias. Desde logo, no atual quadro político e no pós referendo para a saída do Reino Unido da UE.

O PCP não tem dúvidas de que se tratou de uma boa notícia e até "saúda" a decisão britânica. Os comunistas acham mesmo que "o referendo britânico constitui uma oportunidade para se enfrentarem e resolverem os reais problemas dos povos" e isso passa pela preparação da saída de Portugal do euro, mas também pela reversão dos tratados que regem a UE.

Os comunistas até têm um calendário: amanhã e depois, por ocasião do Conselho Europeu, deve Portugal "lançar as bases" para a realização de uma cimeira intergovernamental onde se consagrasse a "reversibilidade dos tratados", de declarasse a "suspensão imediata e revogação do Tratado Orçamental" que impõe limites aos défices dos Estados membro e, finalmente, aprovasse a revogação do Tratado de Lisboa.

Rosa Pedroso Lima - Expresso - Foto: Miguel A. Lopes / Lusa

DESINTEGRAÇÃO DA UE É QUASE IRREVERSÍVEL - artigo de opinião de George Soros

O Expresso disponibiliza na íntegra um artigo de opinião de George Soros publicado pelo Project Syndicate. “As consequências para a economia real só serão comparáveis às da crise financeira de 2007-2008 (...) Além disso, o próprio Reino Unido poderá não sobreviver (...) O tempo não está do lado da Europa, já que as pressões externas de países como a Turquia e a Rússia (que estão ambos explorar a discórdia para seu benefício) aumentam o conflito político interno (...) Mas não devemos desistir”


O BREXIT E O FUTURO DA EUROPA

A Grã-Bretanha, na minha opinião, tinha o melhor dos acordos possíveis com a União Europeia, fazendo parte do mercado comum sem pertencer ao euro, e tendo assegurado uma série de outras exclusões às regras da UE. E, mesmo assim, isso não foi suficiente para impedir a decisão do eleitorado do Reino Unido de sair da união. Porquê?

Podemos encontrar a resposta nas sondagens de opinião dos meses que levaram ao referendo do “Brexit”. A crise migratória Europeia e o debate do Brexit alimentaram-se mutuamente. A campanha do “Sair” explorou a deterioração da situação dos refugiados (simbolizada por imagens assustadoras de milhares de requerentes de asilo concentrados em Calais, desesperados por entrar na Grã-Bretanha por todos os meios necessários) para instigar o medo de imigração “descontrolada” proveniente de outros Estados-membros da UE. E as autoridades europeias atrasaram decisões importantes sobre a política a aplicar aos refugiados, para evitar um efeito negativo sobre o voto no referendo Britânico, perpetuando assim cenas de caos como a de Calais.

A decisão da chanceler Alemã Angela Merkel de abrir as portas do seu país aos refugiados foi um gesto inspirador, mas não foi devidamente pensado, porque ignorou o fator de atração. Um influxo súbito de requerentes de asilo perturbou as vidas quotidianas de pessoas em toda a UE.

Além disso, a falta de controlos adequados criou pânico, afetando todas as pessoas: a população local, as autoridades encarregues da segurança do público e os próprios refugiados. Também abriu caminho ao rápido crescimento de partidos xenófobos e antieuropeus (como o Partido da Independência do Reino Unido, que liderou a campanha pelo Sair), já que os governos nacionais e as instituições Europeias parecem incapazes de gerir a crise.

Agora, materializou-se o cenário catastrófico que muitos temiam, tornando praticamente irreversível a desintegração da UE. A Grã-Bretanha poderá ou não ficar numa melhor situação relativamente a outros países por ter saído da UE, mas a sua economia e o seu povo irão sofrer significativamente no curto e médio prazo. A libra mergulhou para o seu nível mais baixo em mais de três décadas imediatamente a seguir à votação e a instabilidade nos mercados financeiros em todo o mundo deverá permanecer durante as negociações com a UE relativas ao longo e complicado processo de divórcio político e económico. As consequências para a economia real só serão comparáveis às da crise financeira de 2007-2008.

Esse processo será seguramente repleto de incerteza e de riscos políticos adicionais, porque o que está em jogo nunca foi somente uma vantagem real ou imaginária para a Grã-Bretanha, mas a própria sobrevivência do projecto Europeu. O Brexit abrirá as comportas para outras forças antieuropeias na União. Na verdade, assim que o resultado do referendo foi anunciado, a Frente Nacional de França lançou um apelo ao “Frexit”, enquanto o populista Holandês Geert Wilders promoveu o “Nexit”.

Além disso, o próprio Reino Unido poderá não sobreviver. A Escócia, que votou esmagadoramente para permanecer na UE, deverá tentar novamente conseguir a sua independência, e alguns responsáveis da Irlanda do Norte, onde os eleitores também apoiaram o Permanecer, já apelaram à unificação com a República da Irlanda.

A resposta da UE ao Brexit também poderá constituir outra armadilha. Os líderes Europeus, ansiosos por impedirem que outros Estados-membros sigam o exemplo, podem não estar dispostos a oferecer as condições ao Reino Unido (especialmente as relativas ao acesso ao mercado único Europeu) que minimizariam a dor da saída. Com a UE responsável por metade do rendimento comercial da Grã-Bretanha, o impacto sobre os exportadores poderá ser devastador (apesar de uma taxa de câmbio mais competitiva). E, com as instituições financeiras a deslocalizar nos próximos anos as suas operações e pessoal para centros na zona euro, a City de Londres (e o mercado imobiliário de Londres) não serão poupados.

Mas as implicações para a Europa poderão ser muito piores. As tensões entre os Estados-membros atingiram um ponto de ruptura, não só sobre os refugiados, mas também devido às pressões excepcionais entre países credores e devedores na zona euro. Ao mesmo tempo, os enfraquecidos líderes da França e da Alemanha estão agora concentrados nos seus problemas internos. Em Itália, uma queda de 10% no mercado bolsista logo a seguir à votação do Brexit assinala claramente a vulnerabilidade do país a uma crise bancária generalizada, que poderia mesmo conduzir ao poder, ainda este ano, o populista Movimento Cinco Estrelas, que acabou de ser eleito para o município de Roma.

Nada disto é um bom augúrio para um programa sério de reforma da zona euro, que deveria incluir uma verdadeira união bancária, uma união fiscal limitada, e mecanismos de responsabilização democrática muito mais fortes. E o tempo não está do lado da Europa, já que as pressões externas de países como a Turquia e a Rússia (que estão ambos explorar a discórdia para seu benefício) aumentam o conflito político interno.

É aqui que nos encontramos hoje. Toda a Europa, incluindo a Grã-Bretanha, sofreria com a perda do mercado comum e a perda dos valores comuns que a UE foi concebida para proteger. Porém, a UE deixou de cumprir a sua função e de satisfazer as necessidades e aspirações dos seus cidadãos. Caminha para uma desintegração desordenada que deixará a Europa em pior situação do que se a UE nunca tivesse conhecido a existência.

Mas não devemos desistir. Reconhecidamente, a UE é uma construção com falhas. Depois do Brexit, todos aqueles que acreditam nos valores e princípios que a UE foi concebida para defender devem unir-se para salvá-la, reconstruindo-a laboriosamente. Estou convicto de que, à medida que as consequências do Brexit se desenrolarem nas semanas e meses que se seguem, mais e mais pessoas se juntarão a nós.

Expresso - Traduzido do inglês por António Chagas

George Soros é presidente do Soros Fund Management e das Open Society Foundations

Direitos de Autor: Project Syndicate, 2016 - www.project-syndicate.org

POR QUE NÃO VALE CHORAR PELA UNIÃO EUROPEIA

As consequências geopolíticas do “Brexit” podem ser dramáticas. Para encará-las, esquerda deve lembrar que a UE nunca foi a “Europa dos Povos”

Pepe Escobar* - Outras Palavras

Então, o que começou como chantagem feita por David Cameron e válvula de escape para o descontentamento dos britânicos, a ser usado como alavanca para barganhar com Bruxelas e arrancar mais alguns poucos favores, entrou em metástase e se converteu em espantoso terremoto político que tem tudo a ver com a desintegração da União Europeia.

O irrepreensivelmente medíocre Donald Tusk, presidente do Conselho Europeu, fazendo pose de “historiador”, alertou que o Brexit “pode ser o começo da destruição não só da União Europeia, mas da civilização política ocidental na totalidade.”

Bobagem. Está claro que a causa do Brexit é a imigração, estúpido. E mais uma vez é a economia, estúpido (embora o establishmentbritânico neoliberal jamais tenha dado atenção a isso). Mas pode-se apostar dinheiro sério em que o sistema da União Europeia em Bruxelas nada aprenderá dessa terapia de choque – e não se autorreformará. Haverá racionalizações de que afinal de contas o Reino Unido classicamente sempre reclamou demais, sempre se opunha a tudo e vivia a exigir privilégios extras nas negociações com a UE. Quanto à “civilização política ocidental”, o que acabará – e, sim, é grande evento – é o relacionamento transatlântico especial entre EUA e UE com a Grã-Bretanha lá enfiada como Cavalo de Troia dos norte-americanos. (…)

Como seria de prever, a Escócia votou “Fica” e pode fazer outro referendo – e separar-se do Reino Unido – antes de deixar-se expulsar pelos votos dos trabalhadores ingleses brancos. Na Irlanda, o Sinn Fein [herdeiro do Exército Republicano Irlandês-IRA] já quer plebiscito pela unidade do país [o que implicaria em separar a Irlanda do Norte do Reino Unido]. Dinamarca, Holanda e até Polônia e Hungria quererão status especial dentro da União Europeia, porque senão… Por toda a Europa, a direita movimenta-se como estouro da boiada. Marine Le Pen quer um referendo francês. Geert Wilders quer um referendo holandês. Quanto à vasta maioria dos britânicos com menos de 25 anos, que votaram “Fica”, talvez considerem viagem só de ida, não para o continente, mas ainda mais adiante.

Mostre-me o povo

O historiador anglo-francês Robert Tombs observou que, quando europeus falam sobre história, referem-se ao Império Romano, à Renascença e ao Século das Luzes. Passam pela Grã-Bretanha como se nem existisse, de certo modo. Em troca, há britânicos que ainda veem a Europa como entidade da qual se deve guardar distância segura.

Acrescente-se ao problema que não se trata de uma “Europa de povos”. Bruxelas absolutamente detesta a opinião pública europeia, e o sistema mostra resistência férrea a qualquer reforma. Nesse projeto atual de União Europeia, que visa afinal a ser uma federação modelada segundo os EUA, a Grã-Bretanha não se encaixa. Pode-se dizer que aí está uma das razões chaves por trás do Brexit – que por sua vez já desuniu o reino e pode eventualmente reduzi-lo a pequeno entreposto comercial na beirada da Europa.

Sem “povo europeu”, o sistema de Bruxelas só conseguiu articular-se como uma burocracia kafkiana, não eleita. Além do mais, os representantes dessa Europa sem povo em Bruxelas realmente defendem o que consideram que seja o interesse nacional deles, não o interesse ‘europeu’.

Mas Brexit não significa que a Grã-Bretanha ficará livre do que dite a Comissão Europeia (CE). A CE sim, propõe a política, mas nada pode seguir adiante sem decisões do Parlamento Europeu e do Conselho de Ministros, que reúnem representantes de todos os governos eleitos dos estados membros.

Pode-se argumentar que um “Fica”, no melhor dos casos, teria levado a algum exame de consciência em Bruxelas, e a um sinal de alerta, que talvez se traduzisse em política monetária mais flexível; em impulso para conter os imigrantes atrás das fronteiras africanas; e mais abertura em direção à Rússia. O Reino Unido permaneceria numa Europa que daria mais peso a países fora da eurozona, e a Alemanha concentrar-se-ia nas 19 nações membros da eurozona.

O “Fica” teria levado a Grã-Bretanha a aumentar o próprio peso político econômico em Bruxelas, e a Alemanha se abriria mais para algum crescimento moderado (em vez da ‘austeridade’). Mesmo que sempre se pudesse argumentar que a Grã-Bretanha rejeitaria a noção de um futuro ministro do Tesouro da eurozona, de um FBI europeu e de um ministro europeu do Interior – de fato, toda a noção de uma completa união monetária e econômica.

Já são águas passadas. Além do mais, não se pode esquecer o poderoso drama do mercado único.

A Grã-Bretanha não perderá apenas o livre acesso ao mercado único europeu de 500 milhões de pessoas; terá de renegociar todos e cada um dos tratados comerciais com o resto do mundo, uma vez que todos eles foram negociados pela/na União Europeia. O ministro da Economia da França e aspirante à presidência Emmanuel Macron já alertou que “se a Grã-Bretanha quer um tratado de acesso comercial ao mercado europeu, os britânicos têm de contribuir para o orçamento europeu, como fazem noruegueses e suíços. Se London não concorda com isso, nesse caso tem de ser saída total.” A Grã-Bretanha ficará excluída do mercado único – para o qual vão mais de 50% de suas exportações –, a menos que pague quase tudo que paga atualmente. Além disso e sobretudo, Londres terá ainda assim de aceitar a liberdade de movimentos, tipo imigração europeia.

A City ganhou um olho roxo

Brexit derrotou conjunto espantoso do que Zygmunt Bauman definiu como as elites globais da modernidade líquida: a City de Londres, o FMI, Wall Street, o Fed, o Banco Central Europeu [ing. European Central Bank (ECB)], grandes fundos de hedge/investimentos, todo o sistema interconectado do banking global.

Mais de 75% da City de Londres, como era de prever, votou “Fica”. Espantosos US$2,7 trilhões são negociados todos os dias na “milha quadrada”, que emprega quase 400 mil pessoas. E não é só a milha quadrada, porque a City agora inclui também Canary Wharf (quartel-general de vários grandes bancos) e Mayfair (local privilegiado de convivência dos fundos hedge).

A City de Londres – indiscutível capital financeira da Europa – também administra espantoso $1,65 trilhão de fundos de clientes, riqueza, literalmente, de todos os cantos do planeta. Em Treasure Islands, Nicholas Shaxson diz que “empresas de serviços financeiros voaram em bandos para Londres, porque Londres as deixa fazer o que não podem fazer em casa.”

Desregulação sem limites combinada a influência sem igual sobre o sistema econômico global é mistura tóxica. Nessa direção, Brexit pode também ser interpretada como um voto contra a corrupção que invadiu a mais lucrativa indústria da Inglaterra.

As coisas mudarão. Dramaticamente. Não mais haverá “passporting” [“Passporting significa que um banco britânico pode prover serviços em toda a UE, a partir de sua sede na Grã-Bretanha. Importante, também significa que um banco suíço ou norte-americano pode fazer a mesma coisa de uma filial ou subsidiária estabelecida na Grã-Bretanha, pela qual os bancos podem vender produtos a todos os 28 membros da UE, com acesso, assim, a uma economia integrada de $19 trilhões” (de Dlapiper, NTs)]. Basta ter quartel-general em Londres e alguns miniescritórios satélites. Passporting entrará em fase de negociação feroz, assim como o que acontece nos pregões denominados em euro, de Londres.

Acompanhei o Brexit aqui de Hong Kong – a qual, há 19 anos, teve seu próprio Brexit, quando realmente deu bye bye ao Império Britânico para ligar-se à China. Pequim está preocupada, temendo que Brexit venha a se traduzir em fuga de capitais, “pressões de depreciação” sobre o yuan, e perturbações sobre a gestão da política monetária do Banco da China.

Brexit pode até afetar seriamente as relações China-UE, porque Pequim, em tese, pode vir a perder influência em Bruxelas, sem o apoio britânico. É crucial não esquecer que a Grã-Bretanha apoiou um pacto de investimento entre China e UE e um estudo conjunto da viabilidade de um acordo de livre comércio China-UE.

He Weiwen, codiretor do Centro de Estudos China-EUAUE, sob a Associação Chinesa de Comércio Internacional, parte do Ministério do Comércio, disse claramente: “A União Europeia provavelmente adotará abordagem mais protecionista nos negócios com a China. Quanto a empresas chinesas que instalaram quartéis-generais ou filiais na Grã-Bretanha, é possível que já não gozem de acesso sem tarifas ao marcado europeu em geral, depois que a Grã-Bretanha deixar a União Europeia.”

Isso se aplica, por exemplo, às grandes chinesas de alta tecnologia, como Huawei e Tencent. Entre 2000 e 2015, a Grã-Bretanha era principal destino de investimento chinês direto, e o segundo maior parceiro comercial da China dentro da UE.

Mas também pode acabar por reverter em ganha-ganha para a China. Alemanha, França e Luxemburgo – todos competindo com Londres pelos sumarentos negócios offshore em yuan – aumentarão seu papel. Chen Long, economista do Banco de Dongguan, está confiante de que “o continente europeu, especialmente países da Europa Central e Oriental, se envolverão mais ativamente nos programas chineses de “Um Cinturão, Uma Estrada” [também chamados “Novas Rotas da Seda” (NTs)].

A Grã-Bretanha, assim, viraria a nova Noruega? É possível. A Noruega deu-se muito bem depois de rejeitar a inclusão na União Europeia, em referendo de 1995. Será estrada longa e sinuosa, antes de o Artigo 50 ser invocado e lançar-se uma negociação de dois anos entre Reino Unido e União Europeia sobre território ainda não mapeado. Alistair Darling, ex-chanceler britânico do Exchequer, resumiu tudo: “Ninguém tem ideia do que signifique ‘Fora’.

*Pepe Escobar - Jornalista brasileiro, correspondente internacional desde 1985, morou em Paris, Los Angeles, Milão, Singapura, Bangkok e Hong Kong. Escreve sobre Asia central e Oriente Médio para as revistas Asia Times Online, Al Jazeera, The Nation e The Huffington Post.