sábado, 16 de julho de 2016

OS 20 ANOS DE TOTAL (IN)EXISTÊNCIA DA CPLP

No mundo lusófono existe uma “coisa” que agora festeja 20 anos de completa inoperacionalidade, 20 anos de (in)existência. Chama-se CPLP – Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e nada mais é, hoje, do que um elefante branco.

Orlando Castro*  – Folha 8

A Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), sobretudo devido ao incremento (ou será excremento?) dado pela Guiné… Equatorial, tem estado na ribalta. Faz agora 20 anos mas não passou, apesar da idade, de um nado-morto.
Segundo o saudoso Vasco Graça Moura, na altura presidente do Conselho de Administração da Fundação Centro Cultural de Belém, “a CPLP é uma espécie de fantasma que não serve para rigorosamente nada, que só serve para empatar e ocupar gente desocupada”.

Seja como for, a CPLP tem uma esplendorosa sede no Palácio Conde Penafiel, na zona do Largo do Caldas, na baixa de Lisboa, que inclui auditório, biblioteca e centro de documentação, além de salas de reuniões, gabinetes de trabalho e um salão nobre. A embalagem é excelente. O conteúdo, contudo, continua a ser uma farsa. Farsa, ainda por cima, de muito fraca qualidade.

“Fica facilitada a nossa intenção de promover um contacto mais directo com a comunidade”, disse na altura da inauguração da sede, em Fevereiro de 2012, o então secretário-executivo da organização, Domingos Simões Pereira, adiantando que a ideia era atrair a comunidade académica e promover encontros com as várias comunidades lusófonas que vivem em Portugal.

“Este conjunto de movimentos deverá permitir que a CPLP seja mais conhecida e esteja mais presente no dia-a-dia dos cidadãos”, considerou, lembrando que as anteriores instalações, na Lapa, não ofereciam condições para estas iniciativas.

Ao longo dos anos, a CPLP, criada a 17 de Julho de 1996, pretendeu (embora sem êxito) afirmar-se como organização de concertação politico-diplomática e de cooperação, sendo frequentemente criticada por não conseguir chegar às sociedades dos oito países. Aliás, raramente consegue ir mais além do umbigo dos seus idílicos, líricos e eventualmente etílicos mentores.

“Gostávamos de ter ido bastante mais rápido, mas (…) era preciso estruturar a organização, era preciso que fosse reconhecida nos espaços oficiais para que hoje possamos sentir que temos oportunidade de nos aproximarmos da comunidade”, disse na altura Domingos Simões Pereira.

E sendo a CPLP uma Comunidade dos Países de diversas Línguas, entre as quais a Portuguesa, não admira que enquanto Timor-Leste quer abandonar o português, outros queiram entrar, mesmo que o que pensem da nossa Pátria comum (a língua) seja igual a zero.

Nada como a CPLP estar preocupada, por exemplo, em ajudar os cidadãos ucranianos e esquecer – como tem feito até agora – os guineenses. É, aliás, simpático dar sapatos aos filhos do vizinho enquanto os nossos andam descalços…

“Mas quando nós começamos a receber esta atenção e este nível de interesse por parte de países que ‘à priori’ não pareceria terem afinidades, interesses tão óbvios, isso deve alertar-nos para aquilo que a CPLP pode significar, para aquilo que pode representar”, acrescentou na altura Domingos Simões Pereira.

E pelo que a CPLP quer de facto representar, seria mais aconselhável mudar o nome para Comunidade dos Países de Língua Petrolífera. Esquecia-se a língua portuguesa, que é coisa de somenos importância, e apostava-se forte naquilo que faz mover os areópagos da política internacional: o petróleo.

Aliás, mesmo sem perguntar a Xanana Gusmão, todos sabem que a Indonésia é um daqueles países a quem a lusofonia tudo deve, mormente Timor-Leste.

Por alguma razão Jacarta proibiu, enquanto foi dona de Timor-Leste, aquilo que foi, ou é, desejo de Xanana Gusmão, ou seja, o uso da língua portuguesa.

Prioridade das prioridades é para a CPLP o Acordo Ortográfico. Tão ou mais prioritário quando se sabe que a Guiné-Bissau regista a terceira taxa mais elevada de mortalidade infantil no mundo e Angola a primeira.

Será que algum dia a CPLP se preocupará como facto de a esperança de vida à nascença dos guineense ser apenas de45 anos?

Será que algum dia a CPLP se preocupará como facto de os líderes angolanos continuarem a saborear várias refeições por dia, esquecendo que na mesma rua há gente a morrer à fome?

Será que algum dia a CPLP se preocupará como facto de a comunidade internacional continuar a mandar (em sentido figurado) toneladas de peixe para Moçambique, esquecendo que o que os moçambicanos precisam é tão só de quem os ensine a pescar?

Será que algum dia a CPLP se preocupará como facto de se mandar montes de antibióticos para a Guiné-Bissau, esquecendo, sobretudo porque tem a barriga cheia, que esses medicamentos só devem ser tomados depois de uma coisa essencial que os guineenses não têm: refeições?

A CPLP diz que Angola desenvolveu nos últimos anos um grande esforço para “acentuar a coesão” entre os membros do bloco lusófono nas áreas da democracia, direitos humanos e reforço do estado de direito. O paradigma de tudo isso será com certeza a Guiné Equatorial.

Democracia? Direitos humanos? Estado de direito? Será que a CPLP sabe mesmo quais são os estados que fazem parte da Comunidade de Países (também) de Língua Portuguesa?

Ou, sabendo-o, considera que Angola é um exemplo de democracia, quando 70% dos angolanos vive na miséria e vota com a barriga?

Saberá a CPLP que, há muitos anos, a Human Rights Watch revela que Angola enfrenta problemas de desrespeito pelos direitos humanos, incluindo a falta de liberdade de expressão, a tortura e a violência?

O caso da Guiné Equatorial

Embora seja uma ditadura, a Guiné Equatorial é membro da CPLP. Tudo normal. Nesta matéria Angola já não se sente isolada.

Domingos Simões Pereira explicava na altura da adesão que, “por um lado, a Guiné Equatorial já está cumprindo com a aprovação da língua portuguesa, como língua oficial. Mas também há princípios que têm a ver com o exercício democrático no país, com uma maior abertura, com os direitos humanos. Há todo um conjunto de princípios no país que nós achamos que têm que ser respeitados”.

Por aqui se vê como a língua portuguesa é complicada. Para a CPLP democracia e direitos humanos têm um significado diferente, ou até antagónico, daquela que nos é ensinado pelos dicionários.

Assim, com a bênção do democrata (apesar de não eleito nominalmente e no poder desde 1979) presidente de Angola, e com o agachamento dos restantes países, a Guiné Equatorial comprou o seu lugar na CPLP.

É evidente que a entrada da Guiné Equatorial na CPLP “não vai mudar nada o regime de Teodoro Obiang” (onde está a novidade?), afirmava já em Julho de 2010 um dos líderes da oposição em Malabo.

“Obiang está no poder desde 1979 e vai continuar a violar os direitos humanos, a torturar e a prender”, declarou Celestino Bacalle, vice-secretário geral da Convergência para a Democracia Social (CPDS).

“Nada mudou na ditadura nestes anos todos nem vai mudar com a entrada na CPLP. Quem muda são os que antes criticavam a situação na Guiné Equatorial e agora são convencidos pelo dinheiro, pelo petróleo e pelos negócios”, acusou então o número dois da maior plataforma da oposição equato-guineense.

“Hoje, os que tinham uma posição crítica sobre a ditadura de Obiang mudam de posição depois de visitarem Malabo”, ironizou o dirigente da oposição, responsável pelas relações políticas internacionais da CPDS.

“A adesão à CPLP não nos surpreende. Está na linha do que Obiang tem feito com outras organizações internacionais. Ele quer mostrar ao povo guineense que o dinheiro pode comprar tudo o que ele quiser. O pior é que tem razão”, denunciou o dirigente da CPDS.

A Guiné Equatorial faz parte do pior de África, mas isso não interessa a quem fica convencido pelas promessas de negócios.

Reconheça-se, contudo, que tomando como exemplo Angola, a Guiné Equatorial preencheu todas as regras para integrar a CPLP. Não sabe o que é democracia mas, por outro lado, tem fartura de petróleo e outras riquezas, o que é condição “sine qua non” para comprar o que bem entender.

Obiang, que a revista norte-americana “Forbes” já apresentou como o oitavo governante mais rico do mundo, e que depositou centenas de milhões de dólares no Riggs Bank, dos EUA, tem sido acusado (tal como o seu homólogo angolano, por exemplo) de manipular as eleições e de ser altamente corrupto, tal como o que se passa em Angola.

Obiang, que chegou ao poder em 1979, derrubando o tio, Francisco Macias, foi reeleito (isso é que é democracia) com 95 por cento dos votos oficialmente expressos (também contou, como em Angola, com os votos dos mortos), mantendo-se no poder graças a um forte aparelho repressivo, do qual fazem parte os seus guarda-costas marroquinos.

Os vastos proventos que a Guiné Equatorial recebe da exploração do petróleo e do gás natural poderiam dar uma vida melhor aos 600 mil habitantes dessa antiga colónia espanhola, mas a verdade é que a maior parte deles vive abaixo da linha de pobreza. Em Angola são 70% os pobres…

A Amnistia Internacional (AI) diz que no país do Presidente Teodoro Obiang se registam “vários casos de detenções e reclusões arbitrárias por motivos políticos”, que normalmente ocorrem “sem que a culpa dos detidos seja formada e formalizada”, e sem que haja “um julgamento justo”.

Estas alusões a Teodoro Obiang e ao seu país encaixam que nem uma luva ao caso de Angola, até mesmo quanto aos anos que os dois presidentes estão no poder.

“Tais práticas não constituem apenas violação dos padrões internacionais de Direitos Humanos aplicáveis às regras processuais policiais, penais e jurisdicionais, mas constituem também forma grave de restrição à liberdade de expressão”, afirma a AI.

As “fortes restrições à liberdade de expressão, associação e manifestação”, os “desaparecimentos forçados de opositores ao Governo”, os “desalojamentos forçados” e a existência de “tortura e outros maus-tratos perpetrados pelas forças policiais” são outras das preocupações expressas pela AI referentes a Angola… perdão, referentes à Guiné Equatorial.

Não se tivesse a certeza que a AI estava a falar da Guiné Equatorial (formalmente é uma democracia constitucional) e, com extrema facilidade, todos pensariam que estaria a fazer o retrato do reino de sua majestade o rei de Angola, José Eduardo dos Santos.

Por outro lado, a AI destaca que “60 por cento” da população da Guiné Equatorial vive “abaixo do limiar da pobreza”, ou seja, com “menos de um dólar americano por dia”, apesar dos “elevados níveis de crescimento económico do país, da elevada produção de petróleo e de ser um dos países com o rendimento per capita mais elevado do mundo”.

Tal como o seu homólogo angolano, Teodoro Obiang quando fala de princípios democráticos bate aos pontos, entre muitos outros, Jean-Bédel Bokassa, Idi Amin Dada, Mobutu Sese Seko, Robert Mugabe, Muammar Kadafi ou Kim Jong-un.

Atente-se, contudo, no que afirmava o moçambicano Tomaz Salomão, na altura secretário executivo da SADC (Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral): “São ditadores, mas pronto, paciência… são as pessoas que estão lá. E os critérios da liderança da organização não obrigam à realização de eleições democráticas”.

A melhor prenda que poderiam dar à Lusofonia era a notícia de que, na altura em comemora 20 anos de (in)existência, esta CPLP seria extinta. Não vai acontecer, é claro. Continua a haver muita gente que precisa de ganhar bem e nada fazer. E nisso esta CPLP é exímia.

*Orlando Castro é diretor-adjunto do jornal Folha 8

Guiné-Bissau. PAIGC acusa justiça de "traição". PR elogia "importante" decisão do Supremo

Partido maioritário no Parlamento da Guiné-Bissau acusa Supremo Tribunal de traição à democracia

Domingos Simões Pereira, líder do PAIGC, partido vencedor das últimas eleições legislativas na Guiné-Bissau, acusou hoje o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) do país de ter traído a democracia ao tomar decisões contraditórias sobre a nomeação do primeiro-ministro.

Em conferência de imprensa, Simões Pereira reagiu ao acórdão do STJ que considerou constitucional o decreto do Presidente da República, José Mário Vaz, que em maio nomeou Baciro Djá como primeiro-ministro - seguindo-se em junho a nomeação do Governo.

"Como pode o mesmo tribunal, que há cerca de um ano foi tão contundente e pedagógico na sua deliberação, voltar atrás e desta feita seguir outro caminho, ignorar e até ridicularizar uma sua deliberação anterior", questionou o líder do PAIGC.

Domingos Simões Pereira considerou ainda que todos os políticos e cidadãos devem respeitar as decisões judiciais, quaisquer que sejam, pelo que o seu partido também irá aceitar o veredicto do STJ, mas alerta para a contradição assumida pelos juízes na apreciação do mesmo assunto, com os mesmos personagens.

O dirigente do PAIGC referia-se ao acórdão assumido pelo Supremo Tribunal guineense em agosto de 2015 que dizia ser inconstitucional na forma e na matéria a nomeação de Baciro Djá para primeiro-ministro.

"Se um acórdão não anula outro, eu penso que era de justiça que a própria câmara tomasse a providência de esclarecer como é que espera que as entidades respeitem essas duas postulações", observou Simões Pereira.

O líder do PAIGC afirmou que toda a interpretação feita pelos juízes para fundamentar o acórdão tornado público na sexta-feira "trai a democracia por se ancorar em tudo menos direito e justiça".

"Cada parágrafo deste acórdão dá para suspirar e bradar aos céus com a qualidade de montagens e distorções da realidade", que encerra, defendeu Domingos Simões Pereira, anunciando que o partido tomará ao nível do Parlamento.

MB // SMA - Lusa

Presidente da Guiné-Bissau considera "importante" decisão do Supremo Tribunal de Justiça

O Presidente da Guiné-Bissau, José Mário Vaz, considerou hoje "importante" a decisão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) do país ao definir como constitucional a nomeação do novo primeiro-ministro e o seu Governo.

Fazendo uso das competências de Tribunal Constitucional, que a Guiné-Bissau não tem, os juízes do STJ defenderam ser constitucional o procedimento adotado por José Mário Vaz, em maio, ao nomear Baciro Djá como primeiro-ministro.

Djá lidera um Governo a ser sustentado no Parlamento pelo segundo partido mais votado nas últimas eleições legislativas.

O PAIGC, partido vencedor das eleições realizadas em 2014, tinha solicitado ao Supremo que declarasse a inconstitucionalidade da decisão do chefe de Estado, alegando ter o direito legal de formar Governo.

Em curtas declarações no aeroporto de Bissau, antes de viajar para o Ruanda, onde vai tomar parte hoje e no domingo na cimeira de líderes da União Africana (UA), José Mário Vaz considerou importante o pronunciamento do STJ, mas também defendeu ser decisivo unir os guineenses.

"É importante, de facto, a decisão do Supremo Tribunal de Justiça, como um órgão de soberania (...), mas o mais importante hoje na Guiné-Bissau é unir o país, unir os guineenses, para que haja solidariedade entre nós", referiu.

O chefe de Estado falou numa necessidade de "entendimento entre diferentes órgãos de soberania" para que o país "ganhe realmente uma nova dinâmica rumo ao desenvolvimento".

Para o Presidente guineense, o importante para o país é o trabalho.

"Todos somos poucos para o desafio que temos pela frente: temos que nos unir para retirar o nosso país da situação difícil em que se encontra", acrescentou Vaz que disse preferir o trabalho a falar.

"Quem fala muito não tem tempo para trabalhar e quem trabalha não fala muito", defendeu o líder guineense, que vai aproveitar a cimeira em Kigali para explicar aos seus homólogos africanos o que se passa no país.

A situação política na Guiné-Bissau será um dos temas a debater na cimeira da UA, adiantou José Mário Vaz.

O ministro dos Negócios Estrangeiros guineense, Soares Sambu, já se encontra no Ruanda, tendo tomado parte das reuniões preparatórias da cimeira que, entre outros assuntos, vai debruçar-se sobre as estratégias para o combate ao HIV/SIDA no continente africano.

MB // SMA - Lusa

NAS ELEIÇÕES DE SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE “DÃO O BANHO” E CONSPURCAM A DEMOCRACIA

Sempre que se realizam eleições em São Tomé e Príncipe a notícia vai bater na mesma tecla ou no… “banho”. 
O banho é a forma airosa de os candidatos comprarem os votos dos eleitores. Tradição. A cumplicidade entre candidatos e eleitores é vergonhosa. Podemos dizer com toda a propriedade que aquela espécie de "banho" desvirtua e conspurca fraudulentamente o processo eleitoral e a democracia. Democracia? Que democracia?

Sempre que há eleições em São Tomé e Príncipe ficamos a saber que o candidato vencedor conseguiu comprar mais votos que os seus antagonistas porque destinou maior verba monetária para ser eleito. “Democraticamente” eleito.

As eleições presidenciais realizam-se amanhã, domingo. Que candidato presidencial despenderá de mais dinheiro vivo para comprar mais votos?  Uma corrente de sãotomenses no exterior dizem que já sabem quem é o vencedor, afirmando que vai “ser eleito PR o preferido do atual primeiro-ministro Trovoada". Os Trovoada “têm sido uns mãos largas a darem o banho.” Ficamos a saber e registamos que são uns quantos batoteiros a “darem banho” de mãos sujas. Quem dá mais?  Democracia? Que democracia? (PG)

Multibancos da capital sem dinheiro em véspera de eleições

Paulo Jorge Agostinho, enviado da agência Lusa

São Tomé, 16 jul (Lusa) - As caixas multibanco estão hoje fechadas na capital são-tomense por falta de dinheiro, na véspera das eleições presidenciais, momento tradicional de compra de votos no país.

"Ontem [sexta-feira] havia gente a sair com sacos de notas", disse à Lusa João Santana, um elemento associado a uma das mesas eleitorais do país.

Ao final do dia, muitas caixas multibanco (Dobra 24) já estavam fechadas e hoje nenhuma das que se localizam nas artérias principais da capital estavam a funcionar, constatou a Lusa no local.

O 'banho' é uma tradição da democracia são-tomense. Os eleitores estão habituados a serem pagos pelas candidaturas, explicou Filinto Costa Alegre, jurista são-tomense.

Todos os candidatos disseram à Lusa discordar do 'banho', mas a compra de votos é esperada por todas as partes.

"Sabe como é, isto é São Tomé. Toda a gente fala mal do 'banho', mas toda a gente toma banho", disse João Santana.

Candidatam-se às presidenciais são-tomenses de domingo o atual Presidente, Manuel Pinto da Costa, como independente, Evaristo Carvalho, apoiado pela Ação Democrática Independente (ADI, no poder), Maria das Neves, apoiada pelo Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe -- Partido Social-Democrata (MLSTP-PSD), o professor Manuel do Rosário e o economista Hélder Barros.

PJA (VM) // NS

Angola. VOO POR CIMA DE UM NINHO DE REVÚS – entrevista a Nuno Dala

O Folha 8 inicia hoje uma série de entrevistas sobre o que pensam os Revús. E, para começar, eis a opinião de Nuno Dala, por muitos considerado “a arma secreta do grupo”.

António Setas – Folha 8

À semelhança do que se passou com a selecção de Portugal no decorrer do Euro 2016 de Futebol, em que o herói dos vencedores lusos foi um negro da Guiné-Bissau, o Eder, por assim dizer desconhecido do público em geral e apelidado “patinho feio” entre os seus camarada da selecção, o Folha 8 escolheu o seu herói e começa nesta edição toda uma série de entrevistas com enfoque na personalidade dos membros do grupo, começando por levar à estampa nesta edição uma entrevista de um elemento pouco mediático, mas muito importante dos Revús, Nuno Dala.

De Nuno Dala, 31 anos, professor universitário, há quem diga que ele é “a arma secreta do grupo”. Iniciou uma greve de fome a 10 de Março de 2015 que durou cerca de um mês, em protesto por as autoridades lhe terem confiscado os seus bens no decorrer da sua detenção, entre ao quais Bilhete de Identidade, cartão bancário, computador, impressora, telefone, documentos e livros. Terminado o julgamento e ditada a sentença, as autoridades continuam, ainda hoje, na posse de objectos pessoais dos activistas, inclusive os seus.

(Nota: o Tribunal Supremo de Angola notificou já o juiz da causa do julgamento dos 17 Revús (a 14.07.16) para a restituição imediata dos bens arrolados ao processo. Falta obedecer, o que não é evidente em Angola)

De salientar que a obra da sua lavra, “O Pensamento Político dos Jovens Revús – Discurso e Acção”, é a primeira deste docente universitário. Foi apresentada em Lisboa no dia 27.05.2016, no Café Hollywood, na Mouraria, em interacção com a mulher em Luanda, no dia de aniversário da sua filha, Joaquina. Que tinha três semanas de vida quando ele foi encarcerado.

Folha 8 – Depois da decisão tomada para vos libertar condicionalmente, apareceram na baila mediática e mesmo em órgãos oficiais, analistas a dizer que essa decisão era uma prova cabal de que em Angola existe separação de poderes políticos. Está ou não está de acordo?

Nuno Dala – Não estou de acordo com o discurso dos analistas do regime. José Eduardo dos Santos viu-se deveras encurralado. Os grandes poderes subterrâneos colocaram-no entre a espada e a parede. A espada era demasiado afiada para ser ignorada e a parede extremamente densa e alta para o bloquear internacionalmente. Quanto à situação interna, ele viu-se pressionado perante os apelos incessantes da sociedade angolana, incluindo no seu círculo interno, para que pusesse fim à aventura iniciada em Junho de 2015. Na verdade o regime viu-se em terreno lúgubre. Deve também ficar claro que as próprias condições socioeconómicas, sociopolíticas e psicopolíticas em si não deram ao regime banditesco e ao seu chefe qualquer espaço de manobra.

F8 – Esteve encarcerado em vária prisões, que opinião tem sobre a qualidade de vida que elas proporcionaram? É assim tão mau como se divulga na imprensa privada? A comida, a água, os maus-tratos e a convivência…

ND – Tanto no Estabelecimento Prisional de Kakila, Comarca de Viana como no Hospital Prisão São Paulo, onde estive, a comida nem sequer devia ser servida a animais. A água de Kakila é a pior. É acastanhada. É péssima. Não há bibliotecas, centros culturais e desportivos para usufruto dos reclusos. O ambiente não é o de reeducação/reabilitação. É infernal. Mas, no quadro geral, sempre fomos tratados como presos especiais, o que, porém, não me impediu de enxergar a realidade.

F8 – Alguma vez sentiu que estava em perigo de morte?

ND – Sim. Isto foi durante os primeiros dias, em que as transferências da 29ª Esquadra (onde está alojada a sede do Serviço de Investigação Criminal) para outra esquadra (junto da Centralidade do Sequele) foram feitas na calada da noite e num clima de silêncio total dos agentes do SIC e do SINSE. Eu nem sequer sabia para onde ia, logo, e porque eles estavam armados até aos dentes, pensei que estava a ser levado a uma mata qualquer para ser executado.

F8 – De que maneira ficou a saber que ia ser solto?

ND – Pela TV Zimbo. Fui o primeiro dos meus 11 companheiros da Ala C a saber, através de uma “sinopse” do noticiário, o qual seria apresentado às 13.00.

F8 – Qual foi então a primeira ideia que lhe passou pela cabeça? Persiste em pensar hoje da mesma maneira?

ND – Fiquei céptico. Aliás, até achei que fosse piada de mau gosto. De qualquer modo, ficou demonstrado que era verdade. Seríamos soltos.

F8 – Vocês vão continuar a contestar, pensamos. Tem alguma coisa a dizer sobre como vai ser organizada e executada essa contestação?

ND – O activismo será mais sofisticado e desenvolvido tanto no discurso político-social como nas formas e métodos de luta.

F8 – Pensa que a sua (vossa) contestação pode levar a uma ruptura interna no seio do MPLA?

ND – Creio que já provocamos uma fissura.

F8 – E depois, se isso acontecer, a seu ver, haverá mudanças em que sentido, vira o disco e toca o mesmo, ou nova política?

ND – Caso a fissura se transforme em ruptura, prevejo uma agenda de concertação política e social.

F8 – Se a nova política vingar, vai ser como, para uma viragem para aumento da repressão ou para uma tentativa de liberalizar? E essa tentativa tem alguma chance de êxito?

ND – Certamente, desde que as diversas partes coloquem os interesses dos Angolanos em primeiro lugar.

F8 – A seu ver, se houver uma mudança de partido no poder, que destino será dado aos actuais dirigentes do governo de Angola?

ND – Defendo a reconciliação vertical e horizontal. As caças às bruxas não se compadecem com a tese do Pacto de Nação, que eu defendo há algum tempo.

Leia mais em Folha 8

Angola. “HÁ FOME INTENSA NO CUANDO CUBANGO” – Sapinala (com áudio)

O secretário provincial da UNITA no Cuando Cubango, Adriano Sapinala, afirmou que as autoridades tradicionais no país já não são independentes e que trabalham para o partido no poder.

“Lamentavelmente, as autoridades tradicionais transformaram-se em militantes do MPLA”, disse Sapinala, acrescentando que “são manipuladas pelo poder executivo”.

O secretário provincial da UNITA falava no programa “Angola Fala Só”, onde revelou que há fome intensa entre a população do Cuando Cubango.

Sapinala disse que o Cuando Cubango é a província que menos beneficiou do crescimento económico registado no país antes da crise e também aquela que menos recursos recebeu do Orçamento do Estado.

Como resultado, a província vive situações muito difíceis, por exemplo, com uma rede rodoviária de apenas 400 quilómetros que deixa muitas zonas isoladas.

Sapinala afirmou que no aspecto político há discriminação contra os cidadãos que não pertencem ao MPLA.

“O cartão de militante (do MPLA) é melhor que o Bilhete de Identidade”, disse.

Como exemplo da intolerância política, o secretário provincial da UNITA referiu-se ao ataque em Abril no Mocusso.

A UNITA, disse, "identificou os atacantes, apresentou uma queixa criminal e aguarda agora pela resposta das autoridades".

Sapinala fez notar outros ataques através do país contra militantes da UNITA e afirmou que o MPLA parece estar interessado em regressar à guerra.

O secretário provincial da UNITA disse que o seu partido nunca seguiria uma política de nepotismo e de favoritismo dos seus quadros se for Governo.

O partido do ´galo negro´, garantiu, “pode representar mudança para todos, no poder “não há quadros da UNITA, há quadros do país”.

Voz da América


Escravos modernos angolanos, morte de músicos, Rafael Marques e Rádio Despertar

Fernando Vumby, opinião

ELES MANIPULARAM O POVO DE TAL MANEIRA QUE CONSEGUIRAM TORNÁ-LO SEU ESCRAVO MODERNO CONTENTE COM A SITUAÇÃO

E isto vamos ver para crer em 2017 depois de mais um processo eleitoral esquisito, carregado de manipulações como tudo indica, onde os escravos (modernos) como sempre vão continuar aplaudindo, enquanto os iludidos de sempre pela pseudo democracia vão se curvar em nome de uma paz inexistente.

Todos os dados explorados até agora, todas as conversas de bastidores com conhecidos fardados e civis, ex-camaradas do outro tempo, assim apontam - mesmo que os problemas sociais com que os angolanos se debatem hoje venham a ser muito piores.

E tudo isto porque nem os analfabetos acomodados, os pobres de espírito e nem os ilustrados iludidos pela (democracia) musculada conseguem perceber que enquanto não se aceitar enfrentar de peito aberto este regime a mudança não deixará de ser um pesadelo.

Que venha o 2017 para vermos os rostos dos candidatos (maravilhosos). Cada um vendendo as suas promessas no jogo da compra e venda de votos dos vivos e dos mortos para dar tudo certo e iludir cada vez mais os escravos modernos (contentes) beneficiando os vigaristas e corruptos habituais...

Manos! Só mesmo quando todos nós pensarmos em nós mesmos e nos outros, verdadeiramente preocupados com o bem estar de todos os angolanos, então nesse dia a ilusão e os pesadelos acabarão e sairemos desta condição de escravos modernos.

QUEM NÃO DESCONFIA PELA FORMA COMO MORREM OS MÚSICOS ANGOLANOS QUE PONHA O DEDO NO AR

Estou curioso em saber como funciona a censura musical em Angola e quantos músicos não conotados com o regime terão pago com suas próprias vidas por não aceitarem convites para atuarem em maratonas carregadas de cerveja de borla e atos comemorativos de significado partidário?

Vou acabar por saber e não vai ser difícil como às vezes pensam e acreditam. Existem sempre fontes escritas, orais e materiais fora e dentro país. Com algum jeito e experiências acumuladas vou mesmo perseguir todas as pistas e vestígios até descobrir o muito que ainda se esconde por detrás de algumas versões postas no ar raramente não pelos próprios carrascos sobre as verdadeiras causas das mortes de alguns músicos.

Vou dar toda prioridade aquelas fontes habituais como sempre, que me garantem melhor qualidade de informações, fiéis em seus dados e pesquisando junto de coleções documentais em armários mal fechados. Acabarei mesmo por vislumbrar não apenas o impacto da ditadura eduardista em Angola, assim como as ações dos seus esquadrões da morte mascarados de movimentos espontâneos, comités de ação ou Sinfo - entre outros tantos nomes e siglas.

É o saber da existência de perseguição a músicos que não se identificam com o regime, o controle cerrado e proibição de certo tipo de música na televisão e rádios públicos que me inspira a perseguir até ao fim alguns rastos, nem por isso escondidos com sucesso como alguns acreditam estupidamente.

Nem já no tempo colonial se controlava desta maneira a circulação das músicas e dos músicos, nem havia tantos roubos encomendados de CD, exatamente na hora em que os músicos preparam a promoção dos seus álbuns como acontece hoje.

Até a participação em grandes concertos é impedida, fora e dentro do país, assim como shows em centros recreativos se o músico não tiver cartão de militante do MPLA conforme Yuri Da Cunha, D. Caetano, Matias Damásio ou Maya Coll, por exemplo. “Sem cartão nem pensar nisso”, dizia um músico anti JES/MPLA.

RAFAEL MARQUES (MAKA ANGOLA) & RÁDIO DESPERTAR: UM PROJETO DE SOLIDARIEDADE AOS REVÚS QUE MEXEU MUITO E TIROU SONOS

Ficou provado que mesmo onde o uso da violência política e policial já permitiu a construção de um Estado sem limites repressivos, nem sempre é preciso ter garras de leão para se enfrentar esse regime.

Com a libertação dos jovens (REVÙS) não podemos negar que somamos mais uma vitória, apesar de se continuar a sofrer e a morrer. A estare desaparecida muita gente. Recordo-me neste momento dos cento e tantos Lundas em defesa da liberdade, da justiça social e desta nossa luta por uma Angola melhor para todos os angolanos.

Resgatar essa história da detenção, julgamento e condenações encomendadas pela presidência da República, dos jovens (REVÙS) julgo ser necessário não só para que não se percam as conquistas fruto das lutas das suas mães, dos advogados, da sociedade portuguesa solidária e deste que foi para mim o maior sinal alguma vez dado ao regime de que a sociedade está sensibilizada, mobilizada e vai continuar a lutar de forma pacifica como ficou provado no projeto de solidariedade aos REVÚS sob organização de Rafael Marques e Rádio Despertar.

Pela informação que tenho este foi um dos projetos que mais tirou o sono e aconselhou o opressor angolano JES/MPLA a refletir muito seriamente em relação à situação e libertação dos REVÙS o mais rápido possível.

Um projeto que parecia condenado e sem pernas para andar e que de forma assustadora ganhou velocidade estrondosa e mobilizou todas as sensibilidades políticas e religiosas nacionais - como provou o número de aderências e presenças.

O regime deu conta da força e capacidade mobilizadora da Rádio Despertar e um aspeto devo considerar aqui: a pujança de Rafael Marques e o respeito misturado com medo que o regime passou a ter da consolidação cada vez mais sólida das suas iniciativas, para além da já famosa luta contra a corrupção e defesa dos Direitos dos angolanos.

O opressor angolano JES percebeu que caso não libertasse os jovens a onda de aderência e simpatia á volta de outras iniciativas de solidariedade para com os REVÚS pudesse aumentar de forma assustadora. Que talvez perdessem o controle da situação.

Prender todos os aderentes e fabricar motivos como habitualmente para os julgar e condenar coletivamente já não está a ser tarefa fácil para um JES/MPLA cada vez mais fragilizados, podres de divisões e descontentamentos internos. Ao ponto que já se desconfiar que o general fulano de tal ainda se pode se revoltar e entornar o caldo todo...

Fórum Livre Opinião & Justiça - Fernando Vumby

A TEORIA ECONÓMICA DOS 1%: COMO DESCONSTRUIR A TEORIA CONVENCIONAL

John Weeks [*]
Durante muitos anos perguntei-me porque tantas pessoas bem informadas manifestam ignorância de aspectos simples da nossa economia. Demorou décadas para perceber que a resposta a esta pergunta repousa em grande parte na resposta a uma segunda: por que estudantes da teoria económica convencional (mainstream)não sabem quase nada acerca da economia real, mas consideram-se peritos embrionários neste campo?

As respostas a estas perguntas são semelhantes e simples. Elas motivaram o meu livro. Os economistas convencionais têm tido um êxito extraordinário em doutrinar pessoas levando-as a acreditar que os trabalhos da economia são demasiado complexos para qualquer pessoa entender, excepto peritos (isto é, os próprios economistas). A economia que eles afirmam revelar-nos não existe. Eles criaram-na, a alternativa reaccionária ao mundo no qual as pessoas vivem e trabalham. Ensinar estudantes acerca desta economia imaginária impede-os, assim como o público, de entender a economia real.

A teoria económica mainstream doutrina tanto os estudantes como o público pois representa mal os mercados, propalando falsidades sistematicamente. Como parte desta doutrinação, os [economistas] convencionais capturaram a profissão, a seguir expurgaram-na de keynesianos, ricardianos, marxistas, institucionalistas e todos os outros dissidentes. A disciplina que se chama a si própria ciência económica (economics) é uma doutrina religiosa dedicada ao culto dos mercados e os seus membros são sacerdotes desta doutrina.

Economistas convencionais tipicamente descartam dissidentes como incompetentes, insuficientemente matemáticos e técnicos. Mas os incompetentes são os seguidores da doutrina convencional, sobrecarregando a profissão e o discurso público com um peso morto de inconsistências absurdas que eles apresentam como teoria. Em séculos passados astrólogos e alquimistas representaram uma barreira para o entendimento do mundo natural. Em grande parte do mesmo modo, as constantes adulterações neoclássicas da realidade impedem o entendimento das circunstâncias económicas nas quais as pessoas vivem, trabalham e sustentam-se.

Em consequência desta adulteração não há consequência política ou económica tão reaccionária ou ultrajantemente anti-social que alguns economistas convencionais não defendam e a maior parte dar-lhe-ia seu apoio tácito. Dentre os absurdos reaccionários inclui-se que discriminação de género e de raça é uma ilusão, que o desemprego é voluntário e que o sector público é ineficiente.

Os [economistas] convencionais propõem e praticam uma falsificação da teoria económica. Eles são econo-falsificadores, presos a uma fraudulenta teoria económica pseudo-científica, tal como astrólogos deturpavam o cosmos e alquimistas apregoavam o contra-senso da transubstanciação química. A ideia de que economias de mercado estão sempre e continuamente em pleno emprego subjaz à estrutura teórica destes convencionais. Todas as conclusões teóricas e políticas derivam desta premissa falaciosa. É a inexorável e indesculpável presunção do pleno emprego, contrária à realidade, que mais do que qualquer outra coisa qualifica os economistas mainstreamcomo "falsificadores". Tal como os astrólogos, alquimistas e criacionistas dizem asneiras acerca do mundo natural, os neoclássicos propõem e defendem zelosamente uma versão falsa da sociedade de mercado.

Se, depois de se apropriarem da profissão, a escola neoclássica tivesse sido conduzida ao descrédito – como aconteceria se criacionistas assumissem o comando da genética, se astrólogos fossem guindados à astronomia e alquimistas capturassem laboratórios de química – a sua ofensa classificar-se-ia como um crime intelectual menor. Contudo, eles tiveram êxito em vender o seu dogma como sabedoria incontestável para a orientação de governos. Não é sabedoria. É um vírus do intelecto que corrompe o cérebro, tornando-o incapaz de pensamento são.

Alguns críticos reclamam que economistas arrogantemente pretendem entender muito mais do que realmente entendem. Esta crítica é demasiada fraca. O mainstream afirma ter conhecimento profundo da economia, mas não entende quase nada da mesma e obscurece quase tudo. A suposição do pleno emprego serve como véu de ocultação, representando mal "o problema económico" como aquele de distribuir recursos escassos. A realidade é a oposta. O problema económico central em sociedades de mercado é gerar trabalho útil e produtivo para aqueles que o desejam. Em sociedades de mercado o trabalho é abundante, não escasso.

Grande parte da imerecida credibilidade de economistas mainstream resulta da sistemática promoção da ignorância ao longo dos últimos trinta anos por parte dos economistas neoclássicos e dos media. Entender a economia não é simples, mas não mais difícil do que entender suficientemente o sistema político para votar. As pessoas vão regularmente às cabines eleitorais e escolhem candidatos ou rejeitam-nos todos. As mesmas pessoas manifestam uma ignorância da teoria económica que as deixa incapazes de avaliar teses competidoras acerca da política pública.

Meu primeiro livro explica que relações e processos económicos podem ser entendidos pelo público geral e que a perícia apregoada pelos [economistas] convencionais é um espectáculo de enganos e encobrimentos (smoke-and-mirrors). Em linguagem não técnica reformulei então a teoria económica como deveria ser: o estudo de sociedades com recursos ociosos e como induzir o que permanece ocioso à utilização produtiva. Este foi o contexto teórico para todos os grandes economistas, desde Smith e Ricardo até Marx e Hobson e continuando até Keynes, Galbraith e Kalecki. Rejeitar o absurdo dos recursos escassos leva a uma refutação das parábolas reaccionárias dosmainstream, das quais as mais importantes são:

O desemprego resulta de altos salários e/ou de apoio demasiado generoso àqueles sem trabalho (trabalhadores causam seu próprio desemprego); 

Demasiada moeda em circulação causa inflação e é invariavelmente o resultado de despesas pública excessivas (governos causam inflação); 

A competição faz mercados eficientes e traz benefícios para todos, tanto internamente como no comércio internacional (a competição beneficia toda a gente, a regulação prejudica todos); e 

As regulações do sector públicos interferem com a livre escolha das pessoas e solapam a eficiência dos mercados (o governo é um fardo).

No meu livro mostro que estas parábolas reaccionárias derivam do mundo de fantasia do pleno emprego, não de teoria sã. Os economistas de pacotilha dão-lhes credibilidade superficial ao apresentarem pessoas como produtores e consumidores que procuram obter ganho individual. Na teoria económica do mundo real, as pessoas não são primariamente produtoras e consumidoras. As economias de mercado são sociedades de classe na qual a vasta maioria procura através de meios sociais regular, reformar e limitar o dano colateral criado pela competição de mercado. E ao assim fazer, alcançar, se possível, uma sociedade produtiva de pleno emprego apta para a vida humana. 


O original encontra-se em http://iippe.org/wp/?p=2342

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ 

CORBYN E SANDERS E A DEMOCRACIA BLOQUEADA

A ascensão de outsiders potentes, nos EUA e Grã-Bretanha, revela: desejo de superar crise da política chegou também ao centro do sistema

Paul Rosenberg – Outras Palavras - Tradução: Inês Castilho

As comparações entre Bernie Sanders e Jeremy Corbyn não são novas. Ambos são idiossincráticos, social-democratas estranhos – “velhos socialistas rabugentos”, dizem alguns – que alcançaram relevância representando pontos de vista populares abandonados pelas elites, particularmente as elites dos partidos institucionais de centro-esquerda em seus países. Ambos foram vistos como candidatos marginais quando surgiram pela primeira vez, ano passado, e as elites mal podem esperar para marginalizá-los novamente – mas isso pode não ser tão fácil, tanto por quem são quanto pelo que representam.

As similaridades começaram a funcionar primeiro quando Corbyn venceu a eleição para líder do Partido Trabalhista, naturalmente recebendo os cumprimentos de Sanders. Mais tarde, quando Sanders venceu as primárias de New Hampshire, as comparações aumentaram. Seus apoiadores, para começar, eram incrivelmente semelhantes. Havia vozes discordantes, mas as amplas correspondências eram tão espantosas que até Tony Blair foi obrigado a notá-las, mostrando sua frustração, o que levou Deborah Orr, principal comentarista do The Guardian, a responder:

Tony Blair admite estar “frustrado” pela ascensão de Jeremy Corbyn e Bernie Sanders por causa da “questão da elegibilidade”. Para ele, essas escolhas simplesmente não são pragmáticas. Não importa quão boas sejam as ideias abraçadas pelos candidatos, para Blair a questão-chave é se eles podem ou não chegar ao poder. Não que ele pense, exatamente, que Corbyn e Sanders estão cheios de excelentes ideias: “Taxas de matrícula grátis: bem, é ótimo”, diz ele. “Mas alguém vai ter de pagar por isso.”

Mas a resposta é óbvia, claro. O próprio pragmatismo parece não ser mais eficientemente pragmático. E as políticas praticadas por Blair acabaram em desastre, a despeito da suposta esperteza da conciliação promovida por ele.

O mesmo poderia ser dito do pragmatismo de Hillary Clinton. Porém, ela foi pragmática o suficiente para mover-se à esquerda em resposta a Sanders – um processo que continuou mesmo depois que foi declarada provável candidata; e que Sanders havia perdido as chances de exercer influência.

Também Corbyn estava supostamente liquidado depois do voto do Brexit. Ele sofreu um voto de desconfiança entre os membros trabalhistas do parlamento por 172 a 40. Para os parlamentares, as únicas questões colocadas eram como ele sairia, e quem o substituiria. Contudo, ao mesmo tempo a principal candidata para substituí-lo, Angela Eagle, ficou constrangida quando sua seção local do Partido Trabalhista opôs-se ao voto de desconfiança. Vale lembrar que Corbyn recebeu apoio maciço dos membros do Partido Trabalhista quando publicou uma mensagem desafiante, reafirmando seu compromisso com os princípios tradicionais do Partido Trabalhista e com seus apoiadores. Os conspiradores admitiram a derrota:

Um parlamentar veterano disse ao The Telegraph: “Acabou. Ele vai vencer facilmente num segundo turno, se estiver concorrendo — e isso é tudo o que desejamos evitar.”

Democracia! Mas que amolação!

Nos Estados Unidos, os comentaristas da elite estavam intrigados, se nãodesdenhosos, quando Sanders focou na luta por uma plataforma que refletisse seus objetivos. Mas quem presta atenção a plataformas, de qualquer maneira? Sanders viu o desprezo da elite pelo seu programa como algo que podia tornar-se uma vantagem para si. As plataformas são irrelevantes somente quando não há ninguém para levar os líderes partidários a se responsabilizar por elas. Para ter certeza de que haverá alguém, é preciso travar uma luta a seu favor – precisamente o que Sanders fez, ao sustentar seu apelo por uma revolução política. Os resultados foram impressionantes, como notou Steve Bennen:

O documento, que está disponível na íntegra, é surpreendente porsua audácia em tudo, da faculdade comunitária gratuita à expansão da Seguridade Social, à derrubada do financiamento dos partidos pelas empresas, à proibição de armas semi-automáticas eà reforma de justiça penal para revogar a Emenda Hyde, que impede o financiamento público ao aborto.

Espera-se que a campanha de Clinton volte para o centro. Mas a equipe de Sanders alterou a dinâmica – talvez permanentemente. Eles estabeleceram limites – aceitos pelo partido – que podem levar a giros à esquerda no futuro, mas não à direita. Se isso é o que já está na plataforma, as pessoas serão encorajadas a continuar pensando cada vez mais além da lógica “pragmática”.

A questão não se limita à plataforma. A própria Hillary anunciou recentemente uma mudança significativa em sua política para a educação superior, inclusive “eliminando a mensalidade em universidades públicas estaduais para famílias com renda inferior a 125 mil dólares anuais em 2021”. Embora ainda insuficiente, isso representa um avanço significativo:

Ele poderia ajudar a mudar o entendimento sobre onde está o poder. Poderia ajudar mais gente a enxergar o que o ativista e o organizador inteligente já veem: que se a sociedade fosse capaz de se organizar, talvez pudesse identificar o poder fora de onde ele é visto normalmente. Não um poder abstrato, mas o poder para mudar os termos e as condições concretas da vida cotidiana.

Isso é precisamente o que Bernie Sanders quer dizer com uma revolução política. E com todas as deficiências que se pode ainda ver no programa de Hillary, essa significativa mudança torna ainda mais poderoso o reconhecimento de Sanders.

Sim, Sanders e Corbyn são líderes improváveis, precisamente porque todas as estruturas de liderança da elite perderam o rumo, deixando um vazio que só poderia mesmo ser preenchido por estranhos improváveis. A descoordenação das elites, que proporcionou a de ambos, não desaparecerá, ainda que seja possível livrar-se de Sanders e Corbyn da uma hora para a outra. Mas o desejo das multidões por uma democracia que funcione – uma democracia que responda de fato às necessidades das pessoas – também não está desaparecendo. Esse é o significado real de Sanders e Corbyn – eles ajudaram a reacender esse desejo.