A Universidade de Coimbra já registou 23 intercâmbios cancelados e 81 desistências do curso de língua portuguesa, e admitiu que os estrangeiros a regressar temporariamente aos países de origem pode crescer face à pandemia da covid-19.
“Até à data, foram cancelados 23 contratos de intercâmbio que se encontravam em vigor e no Curso Anual de Língua Portuguesa houve 81 desistências”, afirmou à agência Lusa fonte oficial da Universidade de Coimbra (UC), referindo que também regista 30 estudantes da instituição em mobilidade que decidiram regressar a Portugal.
Neste momento, estariam 941 estudantes em regime de mobilidade na Universidade de Coimbra e 171 desta instituição em universidades estrangeiras.
Questionada pela Lusa sobre se tem conhecimento de alunos que, mesmo não desistindo do intercâmbio ou do curso, possam estar a regressar aos seus países de origem, a Universidade de Coimbra afirmou que, face ao recurso crescente do ensino à distância, é provável que tal aconteça cada vez mais.
“Dezenas já decidiram regressar ao Brasil”, contou à Lusa o presidente da Associação de Pesquisadores e Estudantes Brasileiros (APEB) em Coimbra, Rafael Firpo, notando que todas as semanas há mais relatos de alunos a optar por sair e aponta para o exemplo da sua casa, onde moram quatro pessoas, e três irão embora este fim de semana.
Rafael Firpo explica essa decisão seja para estarem junto das suas famílias neste momento, seja pela própria situação económica cada vez mais “preocupante”, a que se junta a desvalorização do real.
Lídia Sousa, estudante de doutoramento em Direito na Universidade de Coimbra, decidiu regressar temporariamente ao Brasil e tem viagem marcada para domingo.
“Há uma dupla preocupação: financeira e emocional. Por um lado, pensamos nos nossos familiares que estão lá e por outro há a questão económica em que o euro valia quatro reais e agora está quase a seis”, notou.
Isabella Calvacanti teve alguns colegas que regressaram ao Brasil, mas a estudante de Jornalismo decidiu ficar.
“Aqui, sinto-me segura, mas é frustrante acompanhar tudo o que está a acontecer lá, com o nosso presidente [Jair Bolsonaro] a ir contra todas as medidas que vão sendo tomadas”, disse, temendo também pela crise económica que se possa instalar.
Também Edgar Almeida, de Cabo Verde, decidiu ficar, ao contrário de alguns colegas seus.
“Preferi ficar. Fico mais focado nos estudos e também evito qualquer tipo de situação de estar infetado e estar a colocar a minha família e o meu povo em risco”, afirmou, considerando este momento como “mais um período de adaptação”, depois de ter chegado a Coimbra há quatro meses para estudar Biologia.
Em declarações à agência Lusa, a presidente da Associação de Estudantes Moçambicanos em Coimbra, Jacqueline Matlaba, referiu que tem conhecimento de vários estudantes que voltaram para Moçambique, “que entraram em pânico ao ver a situação em Itália”, mas salienta que “os que foram irão voltar”.
O maior problema são as ‘fake news'”, notou.
Na Erasmus Student Network (ESN) Coimbra, uma das primeiras preocupações foi conseguir assegurar informação credível em inglês para os estudantes estrangeiros, quando começaram a ver informação falsa a circular em grupos de WhatsApp.
“No início, havia um grupo de estudantes que não queria saber e os estudantes de Erasmus italianos cá começaram a pedir para respeitar as regras face aos relatos que recebiam de Itália”, contou o presidente da ESN Coimbra, Pedro Valente.
Segunda a sua perceção, há “imensos casos de pessoas que ficaram e imensos casos de pessoas que partiram”, esperando agora também alguma sensibilidade por parte das instituições face aos contratos de intercâmbio, que pressupõem que o aluno não pode sair do país durante a fase de mobilidade.
Lorenzo Gallo, de Turim, no norte de Itália, está a fazer Erasmus na Escola Superior Agrária de Coimbra e nunca pensou em regressar, face à situação no seu país.
Também a estudante italiana Chiara Viani, que está em Coimbra através do programa Erasmus desde setembro, não pensou sequer em regressar ao seu país ou a Granada, em Espanha, onde frequenta a licenciatura.
O intercâmbio agora “está a ser mais intenso”, vinca.
“A vivência, em si, já é intensa. Neste momento, com todos fechados na mesma casa, é tentar viver na casa o que tínhamos lá fora”, relata.
Míriam Rodriguez, a frequentar um doutoramento, também nunca pensou em regressar a Málaga, Espanha.
“Sinto-me mais segura cá em Coimbra, porque a situação ainda não chegou ao ponto a que chegou em Espanha”, sublinha.
Apesar de estar longe da sua rede de suporte familiar, vão-se construindo outras redes, com amigos a ajudar no que é preciso, como por exemplo a entrega da insulina que precisa, que no seu prédio não tem caixa de correio e que antes ia para a Universidade de Coimbra, referiu.
Lusa