Todos os anos cerca de 300 mil jovens moçambicanos atingem a idade economicamente activa e procuram o seu primeiro emprego. Durante 39 anos de independência o sector público e privado criou somente 1.366.738 postos de trabalho mas o Presidente Filipe Jacinto Nyusi propôs-se, através do seu plano quinquenal, a criar em apenas cinco anos 1.483.562 novos empregos. “Criámos 302 188 empregos em 2015” disse em Fevereiro passado a ministra do Trabalho, Emprego e Segurança Social, Vitória Diogo. Todavia, em igual período, o Instituto Nacional de Segurança Social apenas registou 86.452 novos beneficiários. A explicação para a disparidade é que 215.736 empregos não foram criados e uma das evidências é o grande número de jovens envolvidos na criminalidade nos centros urbanos.
O @Verdade questionou à ministra Vitória Diogo porque razão o número do novos empregos criados em 2015 não é igual ao número de novos beneficiários registados pelo Instituto Nacional de Segurança Social? Passado cerca de um mês a resposta não veio.
Em entrevista ao @Verdade o director-geral do Instituto Nacional de Emprego e Formação Profissional (INEFP), Anastácio Chembeze, explicou que existem “pessoas que são empregadas no sector agrícola, sem protecção social e são empregos sazonais. Ele entra sai, entra sai, só tem aquele salário”.
Chembeze clarificou que na verdade registou-se uma duplicação dos postos de emprego criados, entre 2014 e 2015, pois a recolha de dados sobre postos de trabalho foi alargada até aos distritos. “O que nós fizemos em 2015 foi colocar pontos focais nos distritos, nós (o INEFP) não temos delegação distritais mas fomos ter com as secretarias distritais para nos alocar um técnico para fazer parte da recolha de dados. A questão de emprego em Moçambique ainda vai levar algum tempo para a gente perceber as nuances, parecem muitos empregos que estão a ser criados mas se olharmos para a população não é necessariamente isso que se vê”, afirmou o director-geral do Instituto Nacional de Emprego e Formação Profissional acrescentando que os trabalhadores das pescas e da construção civil também enfrentam situação precária idêntica a que se verifica na agricultura.
Portanto embora o Governo de Nyusi tenha-se comprometido, no seu Plano Quinquenal 2014 a 2019 , em “Reforçar o controlo da legalidade laboral e promover o trabalho digno” contabilizou como novos empregos postos onde os moçambicanos trabalham sem contratos e nem mesmo segurança social.
Empregos na agricultura e florestas não são seguros nem dignos
Efectivamente analisando os sectores que mais aumentos de empregos registaram em 2015 destaca-se o sector de “outras actividades e serviços”, os chamados auto empregados, com mais de 90 mil novos empregos, a “agricultura, produção animal, floresta e pesca” com mais de 51 mil novos empregos, e também a “construção” com mais de 42 mil novos postos de trabalho.
A agricultura é o sector que de longe emprega a maioria dos moçambicanos, 67,9% dos mais de 10 milhões de cidadãos em idade economicamente activa, de acordo o Instituto Nacional de Estatística, todavia a “sazonalidade, a baixa remuneração e a precariedade do emprego são aspectos comuns e dominantes nas agro-indústrias” apurou um estudo académico dos economistas Rosimina Ali e Carlos Muianga, do Instituto de Estudos Sociais e Económicos(IESE).
“Nas plantações de cana-de-açúcar e florestais, a estrutura do emprego é polarizada, com poucos trabalhadores qualificados e relativamente bem pagos e um grande número de trabalhadores sazonais não qualificados com baixos salários. Igualmente, nas plantações chazeiras, o padrão de emprego é similar. Contudo, a baixa remuneração abrange, também, os trabalhadores qualificados das fábricas de processamento. Nos três casos em análise, o recrutamento de mão-de-obra ao longo da época agrícola é instável”, acrescenta o estudo do IESE que estamos a citar.
Os académicos concluíram que “As práticas laborais nas plantações agro-industriais são inconsistentes com legalidade e segurança social. Relativamente à legalidade laboral (Lei n.º 23/2007, de 1 de Agosto), há uma desconformidade com as práticas laborais nas plantações explicada por pelo menos três condições. Primeiro, as condições de contratação são instáveis e, em alguns casos, não estão sujeitas à forma escrita”.
Ademais “os salários mensais pagos aos trabalhadores das plantações não chegam ao salário mínimo em vigor na agricultura. Isto resulta da variabilidade na estimativa dos salários mensais dado o sistema de empreitada onde a experiência de vários trabalhadores revela um incumprimento das metas com implicações no valor do salário efectivamente auferido”.
Por outro lado os académicos do IESE apuraram que “há falta de cobertura da segurança social mesmo com contribuição dos trabalhadores inscritos (contribuição sem direito/benefício). Existe um mínimo de 20 dias de trabalho por mês que os trabalhadores precisam atingir para poder beneficiar do sistema de segurança social. Entretanto, os trabalhadores casuais têm geralmente contratos de curta duração não contínuos e não registados regularmente durante a vigência do contrato de trabalho”.
O economistas concluíram ainda que “no quadro das estruturas produtivas extractivas prevalecentes, criar mais emprego não significa, necessariamente, melhorar as condições sociais da força de trabalho. O tipo de estrutura produtiva dominante gera um padrão de emprego e condições sociais de trabalho irregulares, instáveis e precárias e não consistentes com a legalidade laboral e segurança social. Isto tem implicações para o tipo de força de trabalho e de economia que estão a ser criadas e se criam para o futuro. Assim, gera-se um emprego menos produtivo, não especializado, e uma força de trabalho diferenciada com limitadas oportunidades de emprego e opções sociais, reflectindo uma economia pouco produtiva. Este cenário pode colocar em causa a reprodução da força de trabalho e a sustentabilidade das actuais estruturas produtivas”.
“Nota-se um maior envolvimento na actividade criminosa de jovens”
Este estudo revela que taxa de desemprego, oficialmente situada nos 20,7%, não é real pois os mais de 7 milhões de trabalhadores do sector agrícola na verdade não têm um emprego fixo.
É ainda evidente, embora o Governo repita muitas vezes que está a criar postos de emprego, que esses postos ou não existam ou não são de trabalho digno e que resultem em rendimentos suficientes para os moçambicanos sobreviverem. Uma das evidências é a criminalidade que está claramente a aumentar nas cidades e municípios.
“Nota-se um maior envolvimento na actividade criminosa de jovens com idades compreendidas entre 22 e 35 anos, residentes, sobretudo, nas zonas urbanas, porquanto, do total de 10.815 arguidos nos processos tramitados durante o ano de 2015, 7.572, correspondentes a 70 %, são jovens, cujas idades estão compreendidas naquela faixa etária”, afirmou a Procuradora-Geral da República, Beatriz Buchili, no seu informe apresentado este ano à Assembleia da República.
De acordo com a PGR, dos “15.203 internos, dos diversos estabelecimentos penitenciários distribuídos pelo país, 12.135, correspondentes a cerca de 80%, são jovens com idade inferior a 35 anos. Esta realidade remete-nos para uma reflexão profunda, com o envolvimento de todos os sectores da sociedade, sobre o futuro dos nossos jovens e, em última análise, o futuro do nosso país”.
"Os jovens não são apenas o nosso futuro – eles são o nosso presente"
O repto da Procuradora-Geral da República está patente num outro estudo do IESE, elaborado pelos investigadores Carlos Arnaldo e Rogers Hansine, que analisando o ritmo de crescimento acelerado da população moçambicana no último meio século avaliam as oportunidades e desafios que o aumento do peso da população em idade de trabalhar (15-64 anos) pode constituir para o nosso País.
Os académicos considerem que pode ser “uma janela de oportunidade para o crescimento económico, se grande parte da população, particularmente a economicamente activa, gozar de boa saúde, tiver acesso a formação e a um emprego decente, seguro e produtivo”.
Contudo, a “ausência de um quadro político-institucional que assegure o acesso da população a cuidados de saúde e educação adequada e a sua absorção no mercado de trabalho (…) pode ter um impacto significativamente fraco, ou mesmo negativo, nos crescimento económico e no desenvolvimento humano e social”.
Numa mensagem por ocasião do Dia Internacional de Juventude que se comemora nesta sexta-feira 12 a directora-geral da UNESCO, Irina Bokova, afirmou que “Os jovens não são apenas o nosso futuro – eles são o nosso presente”.
“Hoje, muitos jovens vivem em países menos desenvolvidos, e carregam os pesados fardos dos conflitos e da pobreza. Não pode haver desenvolvimento sustentável se os jovens permaneceram à margem, e eu chamo todos os Estados-membros e parceiros da UNESCO a apoiar suas iniciativas, a dar-lhes voz e a deixá-los crescer para, juntos, darmos forma à dignidade futura que estamos construindo hoje”, acrescenta a directora da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura.
Dos 25,7 milhões de moçambicanos 45,9% são jovens.