Piruka, You Can’t Win, Charlie Brown, Blind Zero e Capitão Fausto estiveram presentes no segundo dia do Douro Rock, em Peso da Régua. Os Blind Zero pisaram o palco em terceiro lugar, numa atuação onde não faltou energia, boa disposição e muito rock!
Prestes a lançar o seu próximo álbum, Often Trees, a banda composta por Miguel Guedes, Nuxo Espinheira, Pedro Guedes, Vasco Espinheira e Bruno Macedo levou ao público ao rubro. “Blind Zero sempre no seu melhor” ou “Os anos passam e estão cada vez melhores” foram os comentários mais utilizados para descrever o desempenho da banda portuense.
Horas antes do concerto, o Miguel e o Vasco estiveram à conversa conosco acerca deste novo álbum e das expectativas para o festival de Peso da Régua.
Os Blind Zero estão aqui porque vão atuar no Douro Rock. Quais as expectativas para logo à noite?
Miguel: São grandes, porque nós estamos quase a editar um disco novo que se chama Often Trees e estamos a testar algumas canções ao vivo deste novo disco. O que até agora tem acontecido é uma reação muito boa das pessoas e nós também ainda estamos muito emocionais em relação àquilo que fizemos agora de novo. É um disco que está completamente pronto, com dez canções e se calhar é o disco que nos dá mais gozo ouvir de todos os que já fizemos.
Vocês disseram algures que gostam sempre de terminar os concertos com a música com que tudo começou. Portanto, nós já sabemos como é que vai terminar o concerto logo à noite... (risos)
Miguel: (risos) Pode haver surpresas, atenção! Isso é verdade em 99,9% das vezes, mas há aquele 0,1% (risos). Não sei, nós temos um alinhamento delineado mas não é certo que terminemos da mesma maneira, porque nós vamos mudando algumas coisas de concerto para concerto e, preferencialmente, no próprio dia. Vamos ver o que acontece logo à noite!
Falando agora do vosso novo álbum. O Miguel referiu há pouco que vocês estão prestes a lançar o vosso próximo disco. You Have Won é o primeiro single. Como é que tem sido a reação do público?
Vasco: Acho que têm reagido muito bem porque, por mensagens que vamos recebendo nas redes sociais e do “boca-a-boca” das pessoas, elas (as pessoas) têm gostado e achado piada a uma nova cara dos Blind Zero e isso acho que, para nós, é o mais positivo. Ao fim de vários anos conseguirmos fazer coisas diferentes daquilo que é o expectável, acho que é o mais interessante que pode haver numa banda nesta altura.
E o que é que vão trazer de inovador? Porque dizem que querem mostrar uma banda numa nova dimensão neste disco...
Miguel: É um disco que nós nunca fizemos ao longo de vinte e tal anos de percurso. Não só por ser um disco, naturalmente, com canções novas, mas também por ter uma estética que nós nunca abordamos desta forma. Parece-me que, de alguma maneira, acaba por recuar um pouco ao que foi o início dos Blind Zero, ou seja, a uma carga sonora mais forte e mais densa. Um disco mais rock, mas que não é um disco rock’n’roll. É um disco com uma atitude rock, mas que passa por outros ramos. É um disco mais pesado nesse sentido e aproxima-se um bocadinho daquilo que nós fizemos naquele primeiro terço do nosso percurso entre 1995 e 2001. Para além disso, naturalmente não é um disco dessa altura. É um disco dos tempos de agora e com um som e uma abordagem que me parecem muito nossos. Há ali uma negritude que nós já não tínhamos há uns bons anos. Acho que, agora, as coisas passam mais pelo coração.
Os Blind Zero existem há mais de vinte anos. Existe, por isso, essa necessidade de reinventar?
Vasco: Sim, claro que sim. Acho que aquilo que mantém as bandas saudáveis é a reinvenção. Se pensarmos no percurso da história rock, poucas foram as bandas que ficaram muito tempo e que se conseguiram reinventar. Pode ser uma reinvenção mínima, mas é extremamente importante de fazer porque, dessa forma, sentes que estás a ser produtivo, sentes que estás a caminhar no desconhecido. E isso é aquilo que dá adrenalina... Tu conseguires entrar num sítio que não reconheces, que não estás confortável, onde em cada curva, atrás de cada pedra, tens algo que pode ser uma supresa. E, traduzindo isto para música, as músicas têm todas um bolão de experimentação dentro delas que faz com que não seja aquela fórmula típica da música. Tentámos quebrar um bocadinho com esses paradigmas todos e isso mantém a banda ativa, interessante e motivada, acima de tudo.
E sendo uma banda com mais anos de existência, como é que vêem as bandas que têm surgido mais recentemente? Hoje, por exemplo, vão atuar com bandas mais recentes no palco do Douro Rock...
Miguel: Hoje é uma noite em que nós queremos ver os concertos do início ao fim. Para nós que somos músicos e que, acima de tudo, somos amantes de música, ver bandas como os You Can’t Win Charlie Brown ou os Capitão Fausto é uma coisa muito boa. É muito reconfortante porque ouvimos música que gostamos, temos a oportunidade de partilhar também o palco com eles... E acho que são projetos maravilhosos e este cartaz do Douro Rock é uma prova muito clara de que é possível fazer cartazes só com bandas portuguesas. É muito engraçado ver aqui um festival só com bandas portuguesas e perceber que no primeiro dia estiveram cerca de 5.000 pessoas. É sinal de que isto faz todo o sentido, porque o cartaz é muito interessante.
Há um ano, eu perguntei ao Miguel qual era o seu álbum preferido dos Blind Zero e disse-me A Way To Bleed Your Lover. Agora pergunto-lhe se não vai passar a ser o Often Trees?
Miguel: (risos) Eu acho que corro sérios riscos de este ganhar alguma proeminência, sabes? Porque o A Way To Bleed Your Lover, como eu te disse há um ano atrás, é um disco que, para mim, traça um bocado a bicetriz do que são os Blind Zero. A densidade, algum peso mas também algum apelo rítmico, alguma carga melódica, introspeção e também alguma luz que começou a aparecer nesse disco e que, depois, no The Night Before and a New Day, foi mais clara. Este disco é um disco que acho que nos reconcilia um bocadinho com a nossa génese, com as nossas perturbações absolutamente patéticas (risos), mas ainda assim existentes e que sempre nos guiaram ao longo deste percurso. É um disco mais negro, mais denso, mais perturbado e mais policial, às vezes. Policial do coração, como se tivesses um polícia a correr nas artérias (risos). E isso é muito bom. Para nós, que temos uma banda há muitos anos, sentir que ainda conseguimos dizer coisas com alguma vitalidade e sentirmo-nos válidos e depois termos pessoas que nos ouvem é uma coisa maravilhosa. E isso não é possível fazendo coisas iguais e se calhar não é possível fazendo coisas parecidas. Portanto, acho que é um disco arriscado e mais difícil porque as pessoas podem gostar mais ou gostar menos. É mais complexo mas é um disco excitante.
Vasco: E sentimo-nos uma banda nova. Isso é que é o objetivo. É a cada disco sentirmo-nos como uma banda nova. É sentires-te como se este fosse o teu primeiro disco. Acho que é esse o sentimento que temos de passar para a máquina, digamos assim, conseguir progredir. Este é o primeiro disco, depois vai haver outro primeiro disco, e assim sucessivamente.
É o inovar sem nunca perder a identidade...
Miguel: Sim, eu acho que é bom manter a identidade porque, se houver uma razão para mudar, a identidade está lá. E nós sempre tivemos razões, muitas vezes emocionais, claras para mudar as coisas. E esse sentido de que fizemos um disco e termos a clara ideia de que este disco nos vai permitir ficar para fazer outro, isso é muito importante.
“You Have Won” é o single de avanço de Often Trees, próximo álbum dos Blind Zero a ser lançado em outubro.
Cátia Barbosa. Licenciada em Jornalismo e Comunicação, pela FLUC