A idade média dos produtores de leite de Vila do Conde e Póvoa de Varzim, na bacia leiteira de Entre Douro e Minho, a maior do país, está aumentar a um ritmo que responsáveis pelo setor classificam de "alarmante".
Segundo
dados divulgados pela Agros, a união de cooperativas que domina na
região, apesar do aumento da capacidade produtiva nas explorações,
restam hoje 1.500 dos 16 mil produtores que a instituição
englobava na década de 90, sendo que a maior parte tem já mais de
50 anos.
No
seu âmbito, a Agros calcula que os produtores com menos de 40 anos
não chegam, atualmente, aos 13%, havendo mais de mil entre os 40 e
os 65 anos, sendo que a idade média já ultrapassa os 53 anos.
Numa
recente intervenção pública, Fernando Capela, presidente desta
união de cooperativas, considerou que "o envelhecimento
progressivo é alarmante e urge ser combatido com o estímulo à
entrada de novos produtores e incentivos à transmissão familiar das
explorações existentes".
As
medidas apontadas pelo presidente da Agros são também defendidas
por Carlos Neves, líder da Associação de Produtores de Leite de
Portugal (Aprolep), que fez à Lusa um retrato inquietante da falta
de rejuvenescimento dos operadores do setor.
"O
envelhecimento é preocupante, não só porque perdemos massa crítica
nas empresas, nas associações e nas cooperativas, mas sobretudo
porque teremos, a longo prazo, um decréscimo na produção de leite
e mais campos abandonados", anteviu o presidente Aprolep.
Carlos
Neves reconhece que, atualmente, "o setor não é atrativo para
a entrada de jovens", apontando uma série de fatores.
"Com
o final das quotas leiteiras, devido a uma decisão errada da Europa,
o setor sofreu uma crise, agravada com várias medidas da indústria
e distribuição que fizeram descer o preço pago ao produtor",
afirmou.
Carlos
Neves acrescentou que as "burocracias para se iniciar um projeto
e obter com licenças de construção e legalização das vacarias
são complicadas", levando quem quer entrar no setor ao
desânimo.
"Se
a atividade não é rentável, não há motivação para investir,
até porque para se iniciar um projeto é preciso um grande esforço
financeiro", apontou o dirigente da Aprolep.
Assim,
o parco rejuvenescimento que tem havido no setor, nomeadamente nos
concelhos de Vila do Conde e Póvoa de Varzim, tem acontecido com a
transmissão familiar de explorações, mas, mesmo neste caso, as
dificuldades são grandes.
Isso
mesmo confirmou Miguel Silva, de 35 anos, produtor da freguesia de
Mindelo, Vila do Conde, que tenta dar continuidade ao negócio de
família, mas ainda sem uma autonomia total.
O
jovem produtor partilhou que atualmente está a receber 28 cêntimos
pelo litro de leite vendido, quando os custos de produção rondam os
34 cêntimos.
"Neste
momento estamos com preços tão baixos que não chegam para cobrir
os custos que temos para produzir. Isto origina a que jovens como eu
não consigam entrar ou vingar na atividade", desabafou.
Miguel
Silva vai mais longe, e garante que atualmente "avançar com um
investimento para novo projeto seria um suicídio", garantindo
que "pagar as despesas já tem sido muito difícil".
"Quem
herdar alguma coisa ainda poderá pensar em continuar, mas para quem
pretende começar do zero, certamente vai perceber que será melhor
seguir por outro caminho", completou.
O
jovem produtor lembrou, também, que o empenho necessário para
atividade. "Com 12 horas de trabalho por dia e sem fins de
semana é pouco atrativo para os jovens", disse.
"Só
se tiveram a sorte de ganhar o euromilhões e não tiverem mais nada
para fazer. Caso contrário, é perder dinheiro todos os dias. É
impossível um jovem instalar-se neste setor com os preços que estão
a ser pagos", desabafou.
Apesar
do desânimo de Miguel, o seu pai, António Silva, de 68 anos, e que
há mais de 40 se dedica à produção de leite, acredita que o
cenário poderá inverter.
"Estou
convencido que as coisas vão, pelo menos, normalizar. Tal como está,
não dá para aguentar. Em 2016 foi um grande aperto. Se se alterar,
creio que vai animar os jovens para continuarem", perspetivou o
experiente agricultor.
António
Silva confessou que já "houve tempos em que se trabalhou muito,
mas era-se recompensado", apontando uma das principais
diferenças em relação há algumas décadas.
"O
que tem vindo a complicar é que além dos preços pagos aos
produtores terem descido, os custos dos fatores de produção, como
as rações, o gasóleo ou a eletricidade, não param de aumentar",
analisou.
Pai
e filho concordaram que "a globalização do setor, com o fim
das quotas facilitou a entrada de leite vindo de fora, complicando a
vida aos produtores nacionais".
Ora
para combater isso, a Aprolep tem vindo a sensibilizar o Governo e os
consumidores. Estão a ser promovidas ações de promoção do leite
e dos produtos derivados portugueses, havendo, para já, segundo
refere o dirigente associativo Carlos Neves, uma reação positiva.
"Tem
de haver um esforço da indústria e da distribuição para passar o
máximo de valor para o produtor, e identificar a origem do leite
para que o consumidor que nos quer ajudar possa saber que está
consumir leite, queijo ou iogurte realmente português", vincou.
Lusa