Convida-me o Bombeiros para Sempre (BPS) a que reflita sobre se será possível aos bombeiros portugueses ter uma política e estratégia de comunicação que os valorizem junto da sociedade. Sendo a Comunicação uma matéria que desde sempre tem preocupado o BPS e uma das áreas em que tenho desenvolvido a minha carreira profissional, aceitei com gosto este desafio.
Em primeiro lugar, importa saber para que quer, uma determinada Instituição (seja ela privada ou social, com objetivos comerciais ou altruístas, etc.) explorar a Comunicação? De forma simples e resumida, uma estratégia de comunicação que conduza a uma boa-imagem é tão importante como uma adequada política de recursos humanos, de compras, de administração e finanças.
Uma Instituição que se pretenda moderna e capaz de enfrentar os desafios dos tempos atuais faz da função Comunicação um dos seus principais pilares de gestão e atuação. Não só não subalterniza a Comunicação face a demais áreas, como a coloca no mesmo patamar que as restantes, recorrendo a especialistas na matéria.
Com uma estratégia adequada de Comunicação uma determinada Instituição pode captar a compreensão do público (ou públicos), conseguindo por exemplo que este compreenda a sua missão e coopere para que a mesma seja atingida. No caso dos bombeiros este é um aspeto fulcral, pois uma população melhor informada sobre o seu papel contribui para que os seus operacionais tenham objetivamente melhores condições para executar as suas missões.
Depois, uma estratégia adequada de Comunicação é determinante para o desenvolvimento de parcerias positivas com outras Instituições, ou por exemplo, para a obtenção de determinados financiamentos fundamentais para a concretização de variados projetos. Uma vez mais, algo que assenta como uma luva às necessidades dos bombeiros portugueses.
Uma estratégia adequada de Comunicação contribui ainda para elevar de forma significativa o moral dos profissionais dessa Instituição. Quem de nós não prefere colaborar numa “casa” que é valorizada e compreendidas pelas pessoas, em que o facto de aí desempenharmos uma determinada função é positivamente avaliado pelos nossos conhecidos, familiares e amigos?
Por fim, nos dias que correm a comunicação com o público é ainda fortemente mediatizada, ou seja, realizada através dos órgãos de comunicação social. Apesar de fenómenos relativamente recentes como as redes sociais online terem possibilitado a criação de canais de comunicação diretos com a comunicação, as televisões, as rádios e os jornais continuam a ser fundamentais para fazer chegar as mensagens ao grande público.
E também aqui, uma estratégia de comunicação é absolutamente decisiva: se apenas deixado à iniciativa dos media, apenas se irão lembrar da nossa instituição quando algo (e isso vai inevitavelmente acontecer!) correr mal. É portanto necessário contrabalançar esse “negativismo” natural dos órgãos de comunicação social com a divulgação (sem propagandismo, mas com profissionalismo) do muito de bom que todos os dias é feito.
Ora bem, num cenário em que existem quatrocentas e muitas corporações de bombeiros em todo o país, cada uma fala por si, muitas vezes mal, tornando difícil um dos elementos básicos para comunicar: a existência de uma mensagem bem definida. No fundo, o que é que queremos transmitir ao público?
Neste aspecto, seguindo de forma algo atenta a área, temos o caos instalado. Havendo felizmente algumas exceções, as corporações de bombeiros são a maior parte das vezes notícia por motivos menos positivos.
Ou porque há falta de voluntários na corporação X, ou porque o comandante e a direção da corporação Y estão em guerra, ou porque na corporação Z a ambulância teve um acidente a caminho da ocorrência. Isto para já não falar no período crítico para os bombeiros, a altura dos fogos florestais, em que a mensagem é na grande parte das vezes a dificuldade em combater os incêndios, a falta de efetivos no terreno, etc., ou seja, mensagens negativas.
Há que fazer alguma justiça: da parte da Autoridade Nacional de Proteção Civil nota-se algum cuidado na mensagem passada pelos Comandantes Operacionais Distritais e dos seus dirigentes nacionais. Fruto da experiência e também, seguramente, de alguma formação.
Da parte dos comandantes e outros operacionais das diversas associações de bombeiros, uma vez mais com algumas honrosas exceções, o cenário não é tão famoso. Mensagens desconexas, cenários completamente desadequados e impreparados, falta de formação para lidar com os jornalistas…
Sejamos honestos: cimentar uma determinada estratégia comunicacional é obra para vários anos, é um projeto a ser implementado a médio/longo-prazo. Se alguém vos disser que basta um estalar de dedos para o conseguir, das duas uma: ou trabalha numa agência de comunicação e quer “sacar-vos” uma avença ou então não é honesto.
Se começassem – ANPC, Liga dos Bombeiros Portugueses, Associações de Bombeiros, em conjunto – já hoje a trabalhar afincadamente nesse domínio, acredito que dentro de quatro ou cinco anos os primeiros sinais positivos dessa estratégia começariam a ser visíveis. E com sinais positivos quero dizer uma mensagem articulada e com o objetivo de atingir determinado(s) objetivo(s), conducentes sobretudo à valorização social da competência e da missão dos bombeiros portugueses.
Como não tenho ilusões, demorará tempo até que todos os atores neste importante sector estejam alinhados do ponto-de-vista comunicacional. Até porque isso significaria abdicar um pouco do poder que tenho sobre a minha “quintinha”, algo que encontra sempre uma grande resistência.
Como começar então: apostar na formação específica em comunicação. Seja ao nível da ANPC, seja ao nível da Escola Nacional de Bombeiros, seja ao nível de outros tipos de atores do sector.
Os comandantes, adjuntos de comando, operacionais, membros da direção, etc., precisam começar a dominar conceitos teóricos e práticos da comunicação. Para que encarem cada oportunidade de contacto com os media como uma oportunidade única para valorizar a sua missão e com isso obterem uma cada vez melhor imagem junto do público.
Será a chamada marcha dos pequenos passos. Começando a trabalhar especificamente neste domínio os bombeiros portugueses terão muito a ganhar.
Continuar, também aqui, com base no “desenrascanço” (tão tipicamente português, mas que em comunicação nunca dá bons resultados) é continuar a desaproveitar um património que os bombeiros portugueses têm ao seu alcance e que não têm sabido explorar. Até quando?
A todos os nossos bombeiros portugueses, um abraço amigo. Obrigado pelo vosso empenho e continuação de bom serviço!
Pedro Coelho dos Santos
Especialista em Comunicação e Mestre em Competitive Intelligence
Ex-Diretor de Comunicação do INEM
Site www.adasca.pt