Não podia ser pior esta notícia! A Luna, lutadora já mora no Céu, Paz à sua alma. |
O
tempo de que emergimos eufóricos e inconscientes, agarrando nele e esbanjando-o
como se fosse um tesouro inesgotável. – a admitir que haja tesouros
inesgotáveis.
Um
dia, de repente, uma criança descobre em si a Vida. Pega nesse dom maravilhoso
que nem sequer imagina como lhe veio e desata a utilizá-lo sem a mínima ideia
de que os relógios lho gastam implacáveis, certos, ritmados. Descobre mil
encantos e mil razões de se dispersar por todos eles, entregando-se-lhes
desenfreadamente, desbaratando-se, sem poupar um único instante para se deter a
ouvir aquele tique-taque-tique monotonamente rigoroso e igual a si próprio que
devia – que por vezes até desejar! – anunciar-lhe o desgaste inevitável, o
desgaste de que ela, a criança já adolescente, o adolescente já adulto, não se
percebe sequer.
Na
ultrapassagem incessante dos minutos, a criatura dissipa todas as
possibilidades. Dissipa-as enchendo o seu tempo com o que raramente merece sair
de um nada tranquilizador.
A
criatura, ansiosa, anelante, descobre em cada novo dia novos motivos de
dispersão e arranja constantemente novos passatempos. E passa o tempo. E o
tempo passa sem ser aproveitado da forma mais convenientemente. Atrás da
criatura, passatempo depois passatempo, não surge nada, não fica nada, não há
nada de concreto. E de repente, sem que o momento seja pressentido a tempo, a
criatura descobre em si um terrível cansaço. Terrível! Mas… cansaço de quê, se
na verdade não fez nada? Cansaço de quê, se se limitou a gastar o tempo? Sim, a
gastar o tempo da vida. Sem ter feito nada. As criaturas que desperdiçam o seu
tempo, abrem um dia os olhos sobre a própria velhice e nesse instante acordam
para a noção de serem destroços de possibilidades atraiçoadas. E a vida não se
repete!...
Por
Odette de Saint-Maurice
Biografia:
Escritora portuguesa, natural de Lisboa, nascida em 1918 e falecida em 1993.
Dedicou-se particularmente à literatura juvenil, tendo traduzido, entre outros
autores, Emílio Salgari. Foi produtora de rádio, trabalhou na Emissora Nacional
e colaborou em diversos jornais. Da sua obra destacam-se O Canto da Mocidade
(1938), Teatro Infantil (1951) e Romance de Cecília (1979).