Os líderes mundiais reafirmam comprometimento de pôr fim às doenças tropicais negligenciadas, citando avanços notáveis desde 2012. Para tal, governos e doadores privados prometem 812 milhões de dólares na cimeira de cinco dias que decorre em Genebra (Suíça).
Esta semana, líderes de governos, empresas farmacêuticas e organizações filantrópicas reuniram-se em Genebra numa cimeira de cinco dias para assumir novos compromissos aos esforços colectivos para controlar e eliminar as doenças tropicais negligenciadas (DTN).
O encontro coincidiu com o lançamento do Quarto Relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre as DTNs, mostrando progressos visíveis contra estas doenças debilitantes e um compromisso do Reino Unido para duplicar o seu financiamento para as DTNs.
A reunião ocorre cinco anos após o lançamento da Declaração de Londres sobre DTN, um compromisso dos sectores público e privado para atingir os objectivos da OMS para controle, eliminação e erradicação de 10 DTN. Naquela época, bilhões de tratamentos foram doados por empresas farmacêuticas e entregues a comunidades empobrecidas em quase 150 países, alcançando quase um bilhão de pessoas em 2015.
As DTN são algumas das doenças mais antigas e mais dolorosas que afligem as comunidades mais pobres do mundo. Uma em cada seis pessoas no mundo sofre de DTN, incluindo mais de meio bilhão de crianças. As DTN incapacitam, debilitam e perpetuam ciclos de pobreza, mantendo crianças fora da escola, pais fora do trabalho, e diminuem a perspectiva de seu desenvolvimento económico.
Um novo relatório da OMS, intitulado Integração das Doenças Tropicais Negligenciadas na Saúde e Desenvolvimento Globais, revelou que, mais do que nunca, pessoas estão a ser atendidas com as intervenções necessárias para as DTN. Em 2015, cerca de um bilhão de pessoas recebeu tratamentos doados por empresas farmacêuticas para pelo menos uma DTN, representando um aumento de 36% desde 2011, um ano antes do lançamento da Declaração de Londres. À medida que mais países e regiões eliminam as DTN, diminui também o número de pessoas que necessitam de tratamento, de 2 bilhões em 2010 chegou-se a 1,6 bilhão em 2015.
“A OMS tem observado um progresso sem precedentes na história, que colocou de joelhos pragas antigas como a doença do sono e a elefantíase”, disse Margaret Chan, Directora-Geral da OMS: “Nos últimos dez anos, milhões de pessoas foram resgatadas da invalidez e pobreza graças a uma das parcerias globais mais efectivas da saúde pública moderna”.
O relatório detalha o progresso ante cada doença, citando países e regiões que estão a alcançar metas de controle e eliminação para DTNs específicas.
Filariose linfática (LF, em Inglês, ou Elefantíase), atingindo a meta: No último ano, oito países (Camboja, Ilhas Cook, Maldivas, Ilhas Marshall, Niue, Sri Lanka, Togo e Vanuatu) eliminaram a LF, e outros dez países aguardam os resultados da fiscalização para verificar a eliminação. Graças aos fortes programas, o número de pessoas que requerem tratamento preventivo a nível mundial diminuiu de 1,4 bilhão em 2011 para menos de 950 milhões em 2015.
Mínimo histórico de casos de Tripanossomíase Africana (HAT, em Inglês, ou doença do sono): Em 2015, houve menos casos registados da doença do sono que em qualquer outro ano da história, com menos de 3000 casos em todo o mundo – uma redução de 89% desde o ano 2000. As tecnologias inovadoras de controle e diagnóstico de vectores, apoiadas por um número crescente de parcerias para o desenvolvimento de produtos, estão revolucionando o diagnóstico, a prevenção e o tratamento da doença do sono.
Diminuição de 82% em casos de Leishmaniose visceral (VL, em Inglês) na Índia, Nepal e Bangladesh: Desde 2008, os casos de VL nestes países diminuíram 82% devido às melhorias no controle de vectores, mobilização social de voluntários das aldeias, colaboração com outros programas de DTN e doação de medicamentos dos parceiros da indústria.
Doença do verme-da-Guiné aproxima-se da erradicação: Os casos de doença do verme-da-Guiné diminuíram de aproximadamente 3,5 milhões em 1986 a somente 25 casos humanos em apenas em três países (Chade, Etiópia e Sudão do Sul) em 2016.
Os governos e outros doadores anunciaram novos compromissos durante a cimeira para ampliar o alcance e o impacto dos programas de DTN em todo o mundo. A Fundação Bill & Melinda Gates garantiu 335 milhões de dólares de doações nos próximos quatro anos para apoiar um grupo diverso de programas de DTN focados no desenvolvimento e entrega de medicamentos, vigilância de doenças e controle de vectores. O compromisso inclui 42 milhões de dólares para apoiar a iniciativa de erradicação do verme-da-Guiné do Centro Carter, além de fundos dedicados a acelerar a eliminação da Doença do Sono Africana.
“As DTN são algumas das doenças mais dolorosas, debilitantes e estigmatizadas que afectam as comunidades mais pobres do mundo. É por isso que ajudamos a lançar a Declaração de Londres, um marco histórico que levou a um progresso significativo no tratamento e redução da disseminação das DTN e demonstrou o impacto que o sector público, o sector privado, as comunidades e as ONG podem ter quando trabalhando juntos”, disse Bill Gates, co-Presidente da Fundação Bill & Melinda Gates.
“Graças a esta parceria, estas doenças negligenciadas estão a receber agora a atenção que merecem, e menos pessoas têm que sofrer com estas condições tratáveis. Houve muito êxito nos últimos cinco anos, mas o trabalho ainda não está terminado. Nós estabelecemos metas ambiciosas para 2020 que exigem o compromisso continuado de empresas farmacêuticas, governos doadores e receptores e dos trabalhadores de saúde de linha de frente para garantir que os medicamentos estejam disponíveis e sejam entregues às pessoas de mais difícil acesso”.
O Governo da Bélgica também prometeu 27 milhões de dólares adicionais, divididos igualmente nos próximos nove anos, para a eliminação da doença do sono no República Democrática do Congo. Este montante será igualado nos próximos três anos pela Fundação Bill & Melinda Gates, estabelecendo uma plataforma para uma maior colaboração entre Bélgica, República Democrática do Congo e a ampla parceria de DTN.
Como parte de seu compromisso em eliminar a Tripanossomíase Africana, a Vestergaard comprometeu-se a doar 20% de seus insecticidas para pequenos alvos usados no controle da mosca tsé-tsé que transmite a doença, aumentando essa quantidade para até 100% nos próximos três anos à medida que a eliminação da doença é alcançada.
Estes compromissos baseiam-se no anúncio do Governo do Reino Unido no início da semana, no qual prometeu quase 450 milhões de dólares ao longo de cinco anos para apoiar os esforços mundiais de controle e eliminação das DTN.
O progresso na luta contra as DTN tem sido possível graças à doação em grande escala de medicamentos por parte de 10 empresas farmacêuticas. Nos cinco anos transcorridos desde a Declaração de Londres, as empresas doaram mais de 7 bilhões de tratamentos que, com o apoio dos parceiros, alcançam actualmente quase um bilhão de pessoas em cada ano. Estas doações, com um valor estimado de 19 bilhões de dólares entre 2012 e 2020, multiplicam muito o impacto dos investimentos dos doadores; a USAID estima que cada dólar investido na entrega das doações corresponde a 26 dólares em medicamentos.
Declaração de Londres
“A Declaração de Londres é um exemplo poderoso do impacto de parcerias de sucesso”, disse Haruo Naito, CEO da Eisai e um signatário original da Declaração de Londres: “Ao aproveitar os nossos recursos e focar um objectivo comum, já estamos a fazer progressos sem precedentes na direcção da eliminação destas doenças terríveis. O trabalho que estamos a fazer hoje é um investimento a longo prazo em um futuro mais saudável e próspero”.
Além das doações, as empresas farmacêuticas estão a trabalhar em parceria e com institutos de pesquisa para descobrir e desenvolver novas ferramentas para prevenir, diagnosticar e tratar DTN. Um relatório publicado hoje pela Federação Internacional de Fabricantes e Associações Farmacêuticas colectou todo o escopo dos investimentos da indústria em P&D de DTN, incluindo:
Sanofi e a Iniciativa Medicamentos para Doenças Negligenciadas estão a desenvolver um candidato a novo fármaco oral para a HAT, fexinidazol, que substituirá o actual regime misto oral-intravenoso de fármacos. O fexinidazol poderia representar um avanço terapêutico que apoiará os esforços de eliminação sustentável, segundo o objectivo para 2020 da OMS. Espera-se que este fármaco seja submetido a aprovação regulatória até o fim de 2017.
Várias empresas estão a trabalhar no desenvolvimento de formulações pediátricas de medicamentos contra as DTN, incluindo Bayer (nifurtimox, para a doença de Chagas), Merck KGaA (praziquantel, para a esquistossomose) e Elea/Mundo Sano (que estão a trabalhar com DNDi para desenvolver uma segunda fonte pediátrica de beznidazol, para a doença de Chagas), enquanto a Johson & Johnson (mebendazol, para vermes transmitidos pelo solo) desenvolveu uma nova forma mastigável de mebendazol, recentemente aprovada pelo FDA, para crianças muito jovens.
AbbVie, Bayer, Eisai, Johnson & Johnson e Merck KGaA fazem parte do Programa de Aceleração de Fármacos Macrofilacida, uma iniciativa focada em identificar e criar novos compostos fármacos que podem matar os vermes adultos que causam Oncocercose e Filariose linfática.
A Bayer está a trabalhar com a DNDi para desenvolver o emodepside, um novo tratamento oral para filariose linfática e cegueira dos rios.
A Eisai está a trabalhar para desenvolver o ravuconazol, um novo fármaco oral actualmente em fase de testes para a doença de Chagas, e está também em parceria com a DNDi para desenvolver o ravuconazol para combater o Micetoma.
A GlaxoSmithKline e a DNDi entraram em acordo para juntos buscarem o desenvolvimento pré-clínico de dois novos candidatos para o tratamento da leishmaniose visceral; os candidatos foram desenvolvidos pela colaboração entre a GSK e a Unidade de Desenvolvimento de Fármacos da Universidade de Dundee, este trabalho foi financiado pela Wellcome. O acordo para o desenvolvimento pré-clínico estará condicionado à assinatura de um acordo adicional.
Em 2015, Eisai, Shionogi, Takeda, AstraZeneca e DNDi lançaram o Acelerador de Descoberta de Fármacos DTN, um esforço de várias empresas para acelerar a descoberta de novos fármacos para leishmaniose e doença de Chagas. Em 2016, a Celgene Global Health também juntou-se ao projecto e a Merck KGaA anunciou que também se unirá ao consórcio.
Muitas empresas – incluindo AbbVie, AstraZeneca, Bayer, Bristol-Myers Squibb, Celgene, Chemo, Daiichi Sankyo, Eisai, Elea, Eli Lilly, GlaxoSmithKline, Johnson & Johnson, Merck KGaA, MSD, Novartis, Pfizer, Sanofi, Shionogi, e Takeda – deram à DNDi e outras organizações sem fins lucrativos o acesso às suas bibliotecas de compostos e/ou contribuem com seus conhecimentos científicos e técnicos para a DNDi e conduzem estudos clínicos e pré-clínicos para facilitar o desenvolvimento de novos medicamentos para combater várias DTNs.
A Gilead está a colaborar com o Departamento de Defesa dos EUA, Centros de Controle e Prevenção, e Institutos Nacionais de Saúde, assim como, com muitas instituições académicas para descobrir e desenvolver novos antivirais para patogenias muito infecciosas e doenças virais negligenciadas/emergentes, incluindo a dengue. O GS-5734, o agente de pesquisa mais avançado da Gilead, está a ser actualmente estudado em sobreviventes de Ébola.
As empresas também estão a trabalhar com seus parceiros para resolver os problemas na cadeia de suprimentos, desenvolvendo estratégias de programas e construindo capacidade local nos países para assegurar que os medicamentos, ferramentas e outras intervenções cheguem aqueles que mais necessitam.
Ainda que se tenha alcançado um tremendo progresso na redução da incidência das DTN, os objectivos globais de controle e eliminação não poderão ser alcançados sem um maior apoio financeiro, um maior compromisso político e melhores ferramentas para prevenir, diagnosticar e tratar as doenças. Esta semana, os parceiros da filantropia privada, os governos de países afectados e as associações intersectoriais comprometeram-se novamente a aproveitar seus respectivos recursos e experiência para preencher as lacunas críticas.
Apesar de cerca de um bilhão de pessoas terem sido tradas às DTN em 2015, é necessário mais financiamento para garantir que os programas de DTN cheguem a todas as pessoas e comunidades afectadas pelas doenças. A OMS estima que 340 milhões de pessoas na África subsaariana poderiam ser acolhidas com novos investimentos de 150 milhões de dólares anuais até 2020.
Folha 8