Plinio Maria Solimeo
Por anos, gerações e gerações de crianças e adolescentes — e por que não dizer, também de pais? — se encantaram com a leitura dos contos de fadas para crianças. Lembro-me ainda com saudades de ler com muito deleite, quando pequeno, por exemplo, a história do “Patinho Feio”, do “Soldadinho de Chumbo”, da “Gata Borralheira” ou “Cinderela”, do “Pinóquio”… e outras tantas histórias que alegravam minha vida de criança.
Num artigo anterior, comentei que, de acordo com cientistas, a criança nasce com o senso do bem e do mal, da verdade e do erro. E que o bebê se alegra e ri diante de algo bom ou belo, e faz careta e afasta o rosto diante do contrário. Trata-se, como nos ensina a doutrina católica, da lei natural, comunicada pela Providência Divina, a cada alma dos que nascem.
Por isso é muito benfazejo e formativo alimentar essa boa tendência na alma das crianças, ajudando-as a preservar essa visão primeira.
Porque, em geral, os contos de fadas procuram mostrar o lado bom, belo e deleitável da vida, e por isso ajudam a formar as mentalidades das crianças, incentivando esse lado bom, e servindo de alimento para suas almas.
O eminente líder genuinamente católico, Plinio Corrêa de Oliveira, dizia que as crianças têm
seus primeiros contatos com a vida através das histórias e, por meio delas, a inteligência infantil transpõe os limites do ambiente doméstico. Assim, aprende as noções iniciais sobre a sociedade humana. Segundo esse grande pensador, essas primeiras noções sobre esta luta que é a vida, e as impressões mais profundas que recebem em seus primeiros anos de existência, ajudam a criança a tomar posição diante delas. Donde a importância capital, para uma civilização católica, de proporcionar às crianças uma literatura profunda e saudavelmente formativa, que as ajude a manter-se fiéis à inocência, e a empreender o caminho da admiração pelo maravilhoso. Isso poderá constituir o verdadeiro timão de suas vidas
[i]. Como estamos longe disso nos nossos tristes dias!
Hans Christian Andersen, o mais célebre escritor infantil
Antônio Giuliano, jornalista de “Il Timone”, da Itália, ao comentar a biografia do maior escritor de narrações infantis de todos os tempos, Hans Christian Andersen (1805-1875) [foto ao lado], comenta: “A miúdo se escrevem mais os contos para os adultos, que para as crianças. E eles [os contos] têm um estranho poder: ajudam-nos a reler nossa existência, projetando-a para horizontes mais amplos e inimagináveis”.
Diz o jornalista que “o grande escritor dinamarquês revela, em sua autobiografia, alguns traços ainda pouco notados e paradoxais de sua personalidade. Ele a começa assim: ‘A minha vida tem sido um formoso conto, rica e feliz’, quando, na realidade, sua existência foi tudo, menos um conto”. De família pobre, seu pai, sapateiro, enviuvou quando ele tinha 11 anos, deixando-o “abandonado a seus sonhos e à sua fantasia, alimentados pela leitura de livros infantis, feita com o pai”.
Aos 14 anos Andersen resolveu partir para Copenhague, “abandonado a mim mesmo, sem ninguém mais que o Deus do Céu”.
Depois de várias tentativas frustras, começou a escrever peças e contos. Alguns doadores generosos lhe permitiram satisfazer uma de suas maiores paixões: “viajar”. Fez 30 viagens fora da Dinamarca, sete só na Itália, que muito amava. Nunca teve casa própria nem família, vivia quase sempre em casa de amigos. Só no fim da vida foi-lhe reconhecido o mérito, e começou a gozar a merecida fama.
Quando se dedicou exclusivamente ao conto infantil, “Desaconselharam-me absolutamente, e todos me disseram que me faltava o talento necessário, e que isso não era coisa para nossa época”. Esses pessimistas não mostraram ser profetas…
Giuliano comenta:
“Mas, em seus contos, o bem é superior ao mal, e o fazia sobretudo passar a mensagem de que, na vida, nunca se pode dar por vencido. Basta crer, sustentados por essa certeza posta no início de sua autobiografia: ‘A história de minha vida dirá ao mundo o que ela me diz: existe um Deus amoroso, que conduz tudo a melhor fim’”[ii].
“Escola de Princesas”
Qual a menina de antanho que não pensou em ser uma princesa de contos de fada, pelo menos por um dia? Ou qual o menino que não sonhava com um uniforme de soldadinho, com espadinha e tudo?
Foi, pois, com prazer que li a reportagem do “Estado de São Paulo”, sobre uma “Escola de Princesas”, fundada em Uberlândia, na qual as meninas de quatro a 15 anos são ensinadas “desde os valores de uma princesa — como humildade, solidariedade e bondade — e como arrumar o cabelo e se maquiar, até regras de etiqueta, de culinária, e como organizar a casa”, tudo isso num ambiente elevado e tradicional. As aulas são ministradas por profissionais, entre os quais cozinheiras, nutricionistas e psicólogos.
É claro que, em nosso mundo tão igualitário, uma escola dessas tinha que ser alvo de críticas. Diz a jornalista Hyndaira Freitas em sua reportagem:
“‘O sonho de toda menina é tornar-se uma princesa’: esse é o mote da escola, que recebe críticas por ser, supostamente, um retrocesso, ao ensinar tarefas domésticas apenas para meninas, como se ensinasse que lugar de mulher é na cozinha”[iii]. Isso horripila as feministas e os esquerdistas de todos os matizes de nosso tempo
.
Por isso, como não poderia deixar de ser, logo surgiu a reação da esquerda. O mesmo “Estado de São Paulo” traz, no dia 17 de novembro, o artigo: “Meninas fazem oficina antiprincesa”.
É preciso dizer que esse título é forçado, e não condiz com a matéria. Pois não se trata de meninas que fazem esse curso, mas de adultos “engajados”, que idearam e tocam avante essa oficina.
A reportagem refere-se — aliás com indisfarçada simpatia —, a uma “Oficina de Desprincesamento”, que uns chilenos estão introduzindo em São Caetano do Sul (SP). Pelo que diz a mãe de uma menina, candidata ao curso, pode-se avaliar o grau de engajamento ideológico que seus idealizadores têm em vista.
Com efeito, explica a mãe da mencionada menina que
“no encontro, as garotas terão workshop de autodefesa, e serão apresentadas a personalidades como Clarice Lispector [escritora, conhecida como a
“grande bruxa da literatura brasileira”[iv]], Patrícia Galvão (a “Pagu”), [“membro do Partido Comunista Brasileiro, trotkista”
[v], e Violeta Parra [chilena, folclorista,
“mãe da canção comprometida com a luta dos oprimidos e explorados, suicida”[vi]].
“Estão planejados ainda um debate sobre auto-imagem, o que é ser princesa [segundo o conceito marxista], e o que pode ser feito para manter um cotidiano mais igualitário entre meninos e meninas”.
Ainda, segundo ela, “entre os assuntos debatidos no treinamento dado pelos chilenos, foram abordados o amor romântico [que soa como o amor entre pessoas do mesmo sexo] e questões de gênero [não podia faltar!]. Explica ela que “o curso é uma forma de ‘plantar uma semente’ nas novas gerações, para minimizar a desigualdade de gênero nas próximas décadas”(grifos do jornal). Não podia ser mais ideologizado!
É trágico verificar como esses radicais não perdem ocasião de pregar e pôr em prática suas mais perversas teorias. E vão matando assim na alma das crianças aquela visão primeira e dourada da vida, apresentadas a elas pelos contos de fadas.
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[i] Cfr. “O maravilhoso, o real e o horrendo na literatura infantil”, Ambientes, Costumes e Civilizações, Catolicismo Nº 40 – Abril de 1954.
[vi] https://pt.wikipedia.org/wiki/Violeta_Parra
Fonte:ABIM