Ensaio nuclear ou disparo de míssil por Pyongyang eram antecipadas para hoje. Japão prepara saída de nacionais na Coreia do Sul.
Kim Jong-un durante uma visita realizada ontem a uma unidade das forças especiais norte-coreanas
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Uma chuva miudinha caía ontem em Pyongyang, enquanto os residentes se dedicavam às suas obrigações ou se concentravam em grupos para colocarem flores junto de estátuas e retratos do fundador do regime, Kim Il-sung, cujo 105.º aniversário do nascimento se assinala hoje. A atmosfera tranquila na capital da Coreia do Norte, num dia onde a temperatura diurna rondou os 20º graus centígrados, não era contudo suficiente para dissimular o clima de tensão que se vive na península e que pode subir ainda mais neste sábado com um possível ensaio nuclear do regime hoje liderado por Kim Jong-un, neto do fundador.
Perante esta eventualidade, o ministro dos Negócios Estrangeiros sul-coreanos, Yun Byung-se, declarou que se Pyongyang "realizar uma provocação estratégica", leia-se um ensaio nuclear ou disparos de mísseis balístico, irá "pagar um preço insustentável". Yun, que falava no Parlamento, afirmou ainda que qualquer possível ação militar dos Estados Unidos contra o regime norte-coreano seria tomada "após consulta" com Seul.
A demonstrar a gravidade da situação, o ministro dos Negócios Estrangeiros chinês, Wang Yi, afirmou ontem que "nuvens de uma tempestade pesam agora sobre a península coreana" e que um "conflito pode começar a qualquer momento". Wang insistiu na ideia de que "todos os lados devem cessar as provocações mútuas e as ameaças, por palavras e atos, conduzindo a situação a um ponto de não retorno e fora de qualquer possibilidade de controlo". Se o alvo das palavras do MNE chinês são os EUA não deixam de ser, igualmente, Kim Jong-un, que ascendeu ao poder no final de 2011. "Quem quer que comece uma guerra na península, deve suportar com essa responsabilidade histórica e pagar o respetivo preço", disse Wang que falou no final de uma visita do seu homólogo francês, Jean-Marc Ayrault.
Citado pela AFP, um conselheiro de política externa da Casa Branca, declarava sob anonimato estarem "em estudo várias opções militares". O presidente Trump e o vice-presidente Mike Pence, que chega amanhã a Seul, "estão a ser continuamente informados pelos serviços de informações", revelou ainda a mesma fonte, porque a "questão não é a de saber se vão ou não realizar um teste, a questão é quando" o vão fazer, indicou à Reuters uma outra fonte da Casa Branca. "E estaremos preparados para isso", sublinhou esta segunda fonte.
Da China, principal aliado da Coreia do Norte, têm partido nas últimas semanas declarações de advertência a Pyongyang. Na passada quarta-feira, um jornal oficioso de Pequim, Global Times, avisava "que medidas restritivas sem precedentes" serão aplicadas em caso de novas "provocações" norte-coreanas.
E ainda ontem, foi anunciado que a principal transportadora aérea de Pequim, Air China, suspendeu algumas das ligações com Pyongyang, alegadamente por falta de procura. Mais significativo, a 26 de fevereiro a China suspendeu a importação de carvão da Coreia do Norte, a sua mais importante exportação. Pequim terá também suspendido parte das vendas de petróleo a Pyongyang como forma de pressão. "Se a China cortasse totalmente os fornecimentos, a Coreia do Norte não sobreviveria por mais de três meses e tudo ficaria paralisado", explicava à Reuters Cho Bong-hyun, analista do banco IBK, de Seul. Aquele combustível é relevante para os setores militar, agrícola e de transporte, sendo o carvão empregue para as restantes necessidades
Da Rússia, um outro aliado relevante de Pyongyang, vieram também palavras de advertência. O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, declarava ontem que o presidente Vladimir Putin segue "com inquietação" os acontecimentos e espera que "todas as partes" saibam evitar atos suscetíveis de serem interpretados como "provocações".
Facto a revelar o nível de tensão na península, soube-se ontem que o Japão tem preparado um plano para evacuar da Coreia do Sul os mais de 60 mil nacionais a residir neste país.
Do lado de Pyongyang não parece haver espaço para compromissos. O vice-ministro dos Negócios Estrangeiros norte-coreano, Han Song-ryol, declarava à AP que haverá novo ensaio nuclear, "onde e quando a liderança o decidir".
Para aquele que é a principal figura da diplomacia de Pyongyang, "se compararmos a política de Trump para com a República Popular Democrática da Coreia do Norte [RPDCN, designação oficial do país] com a da anterior administração [de Barack Obama] nota-se que é muito mais agressiva e maldosa".
"O Dia do Sol"
A multiplicação de advertências e comentários sobre o agravamento de tensões coincidem não só com a multiplicação de atos provocatórios de Pyongyang, como o lançamento de mísseis - só este ano já realizou dois disparos -como da aproximação da data que hoje o regime comemora com particular pompa. Só a sua designação diz tudo: "O Dia do Sol", data do nascimento de Kim Il-sung. A anteceder a data, as autoridades deixaram antever para hoje um "acontecimento importante", expressão que tem sido empregue, em ocasiões semelhantes, para o anúncio de ensaios nucleares, o lançamento de foguetões ou o disparo de mísseis. Algo a que o presidente dos EUA deu a entender seria inaceitável.
A Coreia do Norte recorreu ontem à habitual retórica apocalíptica, ameaçando os EUA "e os seus vassalos" com um "ataque impiedoso" que "não deixará sobreviventes entre os agressores".
Especialistas consideram que Pyongyang tem capacidade de causar importantes estragos militares na Coreia do Sul e também no Japão. No entanto, dificilmente poderia enfrentar com sucesso uma operação militar conjunta destes dois países com envolvimento dos EUA. Uma realidade que passa despercebida aos próprios norte-coreanos. Na reportagem da Reuters citada no início do texto, Jon Myon-sop, que trabalha numa central de camionagem em Pyongyang garantia que "se os inimigos querem declarar guerra aos nossos líderes, não temos de ter medo porque vamos ganhar". Uma ideia repetida por um soldado na reserva, Ho Song-chol, que diz acreditar que "enquanto tivermos connosco o nosso Líder Supremo [Kim Jong-un] acreditamos na vitória".
A RPDCN foi fundada como regime comunista em 1948 por Kim Il-sung, a que sucedeu seu filho Kim Jong-il em 1944. Após a morte deste em 2011, foi sucedido por Kim Jong-un, seu filho.
Fonte:DN
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