Ingratidão
Por
Joaquim M. C. Carlos *
É
muito difícil compreender certas contradições e paradoxos da vida. O exame
metódico e sereno das coisas, feito por processos rigorosamente científicos,
baseados numa segura e firme argumentação, não se aplica quando se pretende
explicar determinados mistérios da alma humana, que escapam duma maneira geral
à observação mais aguçada e minuciosa. Por isso, na necessidade de analisar
esses sentimentos e de os explicar melhor ou pior, tem de se recorrer ao estudo
de tantos outros factores que com eles estão relacionados, e depois, por
deduções, bastantes ocasiões muitas vezes à «contrário sensu», concluir aquilo
que parece estar mais conforme com as circunstâncias especiais no fenómeno.
Há
sentimentos que desnorteiam e desorientam as mais sólidas teorias e entre eles
figura, talvez, em lugar bem distinto, precisamente porque é dos mais
vulgarizados, a ingratidão, nas suas múltiplas fórmulas e revelações externas.
Não custa nada, por muito orgulhoso que seja, mostrar reconhecimento a quem nos
fez um favor, e que, portanto, se soubermos ser delicados, nos pode vir a fazer
muitos mais.
Agradecer
é um sinal de superioridade de carácter, um pretexto para merecermos a
confiança de amigos bons e sinceros, dos quais, naturalmente, podemos precisar,
mais depressa do que se julga. E, apesar disto, os homens, ainda mal acabaram
de receber uma gentileza, já estão esquecidos da mão que os amparou com o
benefício, quando não pagam com qualquer grosseria a benevolência tida. Quando
eu encontro alguém que sabe ser reconhecido, fico admirado, admirando a
superioridade desse alguém o que é tão raro nos dias que correm.
Os
homens obcecados na alucinada demência duma maldade feroz e egoísta, esquecem o
que convém às suas conveniências, agradecer para receber, pois não é com
«espinhos que se colhem rosas»...
Ocultos
atrás dum sorriso alvar, escondidos na mesquinha insolência duma inteligência
que a maldade desvaria à multidão é difícil sentir prazer espiritual da
gratidão.
Reconhecer
uma fineza, é admitir em alguém uma virtude, prestar-lhe homenagem, elevá-la, e
essas criaturas não sabem mais do que rebaixar os outros, difamar todas as
intenções honestas e todos os esforços generosos.
Ser
reconhecido e agradecer, é prestar um alto acto de Justiça e, devemos
confessá-lo, se o verdadeiro sentido da Justiça não existe na maioria dos
homens, também não pode existir neles o sentido abençoado da gratidão.
Tenho
sentido na pele a feroz ingratidão desde a fundação desta associação, que por
sua vez se torna difícil explanar. Por vezes surge do lado que menos esperava,
mas, o ser humano na sua maioria é assim, é ingrato, é mau e tem memória curta.
Apesar
de tudo a obra está ai, os resultados alcançados falam por si deitando por
terra a incredibilidade que muitos revelaram e profetizaram contra este
projecto desde o seu início. São necessárias pessoas que estejam motivadas para
elevar ainda mais a ADASCA, e não as motivadas pelo fingimento, inveja, intriga
e ingratidão, com o intuito de a destruir, existe algumas destas ervas daninhas
no seu interior, que em muito me têm infernizado a vida.
Para
poucos a ADASCA é filha, para alguns é sobrinha e para muitos é enteada. É
nesta última condição que desde sempre tem sido tratada. Haja respeito pelo
trabalho que tem sido desenvolvido em prol da comunidade necessitada.
“Existem
três classes de ingratos: os que silenciam diante do favor; os que o cobram e
os que se vingam.” (Ramón y Cajal). Mais: “ “O
indivíduo infiel é tão perigoso como o mentiroso. Ambos são fracos, ingratos e
constroem castelos sem fundações”. Textos Judaicos.
*Presidente
da Direcção da ADASCA.
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