segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Macroscópio – Outros temas, outras preocupações, e aquilo que andamos a ler

Macroscópio

Por José Manuel Fernandes, Publisher
Boa noite!
 
100 milhões de americanos deverão assistir hoje ao primeiro debate entre Hillary Clinton e Donald Trump, o que a confirmar-se será um record. A expectativa é grande, pelo que admito que alguns leitores do Macroscópio se juntem a esta multidão de telespectadores e passe a noite em claro (o debate decorrerá entre as 2h e as 3h30 desta noite, nós já antecipamos o Enfim, a sós, haverá liveblog aqui no Observador e, manhã cedo, crónica e balanço do que aconteceu). Entretanto, e porque teremos de voltar à campanha americana, fazemos hoje aqui um intervalo para outras divagações, sobretudo para sugerir uma mão cheia de leituras ora interessantes, ora provocatórias, ora surpreendentes. Vamos a elas, sem esquecer que hoje a Nasa revelou que descobriu  um oceano de água líquida debaixo da camada de gelo que compõe a superfície de Europa, uma das luas de Júpiter (na foto).
 
Os especiais do Observador
Como sabem os que nos seguem, jornalismo online não é sinónimo de jornalismo com menos profundidade. Os nossos Especiais são disso exemplo pelo que, dos publicados nos últimos dias, há alguns que gostaria de destacar (mas há mais, há mais, pode encontra-los todos aqui):
  • E então, Hollywood, o amor é isto e nada mais?, um apanhado realizado por Alexandre Borges de um conjunto de casamentos entre estrelas que acabaram em divórcios, tudo a propósito do mais recente de todos, o de Angelina Jolie e Brad Pitt. Recordam-se outros pares famosos como Gloria McLean & James Stewart (1949-1994), Joanne Woodward & Paul Newman (1958-2008), Elizabeth Taylor & Richard Burton (1964-74; 1975-76), Mia Farrow & Woody Allen (1980-1992) ou Nicole Kidman & Tom Cruise (1990-2001).
  • “Tintin”: a revista dos 7 aos 77 faz 70 anos, onde Carlos Maria Bobone recorda a história de uma revista de banda desenhada por onde passaram clássicos como Blake e Mortimer, Alix ou Clorofila e que também teve a sua edição portuguesa, se bem que com vida relativamente efémera.
  • Em Espanha, os mortos não esquecem. E falam, de Helena Matos, que nos dá conta de alguns estranhos hábitos denuestros hermanos, pois que há quem deixe vinte milhões de euros para obituários e quem aproveite a necrologia para mandar mensagens enigmáticas e políticas, revelar problemas com heranças. Ou vingar-se.
  • O velhinho do Restelo, onde Bruno Vieira Amaral recorda que o estádio do Restelo, em Lisboa, cumpre a bonita idade de 60 anos, aquela idade em que até os edifícios feios se tornam respeitáveis. Com uma diferença pois, como sublinha, o Restelo sempre foi “formosíssimo”.
  • Como se preparam os medicamentos contra o cancro, um trabalho de Vera Novais que nos conta o trabalho inovador do Instituto de Biologia Experimental e Tecnológica para testar as novas moléculas. Isto porque, antes de serem testados em humanos, isto é, bem antes de chegarem às farmácias, os novos fármacos têm de mostrar-se seguros e eficazes.
  • Germano Silva: “Às vezes sinto-me um homem rico”, uma entrevista de vida de Sara Otto Coelho a um portuense, prestes a completer 85 anos, que ia descalço para a escola, com 11 anos puseram-no a trabalhar, lutou e foi jornalista durante 40 anos, sendo que ninguém sabe tanto sobre o Porto quanto ele. Razão porque, agora, vai ser Honoris Causa.
 
À descoberta da história do Homem e em defesa dos legados da históricos
O El Pais deste domingo trazia um trabalho que gostaria de destacar pois trata-se de uma excelente síntese do que hoje sabemos sobre a evolução da nossa espécie. Em Enredos en la familia escreve-se que “La evolución humana ya no se explica como una simple cadena lineal de eslabones perdidos. La ciencia nos revela un entramado más complejo de elementos, con una mayor diversidad entre especies”. Em concreto, “Su forma es más bien la de un arbusto, con una variedad de ramas aquí y allá, con diversificaciones locales, salidas en falso, callejones sin salida y extinciones frecuentes. Tan frecuentes que, de hecho, ahora solo quedamos nosotros”. Uma bela infografia acompanha este trabalho - El rompezabezas de la evolución humana.
 
(Já agora, e porque se trata de uma curta animação muito fácil de apreender, aproveite também para ver The Origin of Dogs, da The Atlantic, onde se faz uma boa síntese daquilo que sabemos sobre a forma como foi domesticado e, depois, evoluiu aquele que tratamos como “o melhor amigo do homem” e que é, isso sabemos de ciência certa, o mais antigo, pois foi o primeiro animal a ser domesticado. A animação acompanha o artigo do editor de ciência da revista, A New Origin Story for Dogs, onde se explica que “The first domesticated animals may have been tamed twice.”)
 
Mas a leitura daquele trabalho do El Pais é encorajadora, pois mostra os avanços do conhecimento e de como sabemos cada vez mais sobre as nossas origens, já passer os olhos por Ancient Syrian Sites: A Different Story of Destruction, na New York Review of Books é algo deprimente. O que aí se conta é que a destruição das ruínas Palmira pelo Daesh está longe de ser a única calamidade que caiu sobre o riquíssimo património cultural da Síria. O relato do que aconteceu à antiga cidade que ficava a meio caminho entre o mundo romano e a antiga Mesopotâmia é comovente, mas há mais e porventura pior: “The US and its allies have seemed helpless to make a difference where it matters most: before the damage or destruction occurs. As long ago as December 2014, well before ISIS captured Palmyra, the United Nations released a report showing that nearly three hundred historic sites in Syria had been damaged since the beginning of the war, most of them by groups other than ISIS. Of these, twenty-four had been “totally destroyed” by different militias or by the Assad regime itself, including twenty-two in Aleppo alone. As of this year, all of the six sites in Syria that were supposedly protected by UNESCO World Heritage status have been damaged, including, along with Palmyra, the Krak des Chevaliers, Syria’s most important crusader castle, the remains of the Hellenistic city of Dura-Europos, on the Euphrates, and the Roman city of Bosra. A number of the destroyed monuments, like the Temple of Bel frieze at Palmyra or the majestic, eleventh-century minaret in Aleppo, toppled amid fierce fighting in early 2013, were unique works with no known parallels.”
 

Três pontos de vista controversos
Para completar o Macroscópio de hoje sugiro ainda mais três textos, todos textos de opinião controversos mas com argumentos que fazem pensar:
  • Poland’s Crime Against History. Shlomo Avineri, professor de ciência política na Universidade Hebraica de Jerusálem, contesta neste texto do Project Syndicate uma decisão recente do governo polaco – “The government’s proposed legislation goes even further: it makes any reference to ethnic Poles’ role in the Holocaust a criminal offense” – e lamenta o negacionismo histórico: “It also refers to what it calls “historical truth” regarding the wartime massacre of Jews in the town of Jedwabne by their Polish neighbors. When the historian Jan Gross published his study establishing that Poles, not Germans, burned alive hundreds of Jedwabne’s Jews [livro editado em português, Vizinhos], Poland naturally suffered a major crisis of conscience. Two Polish presidents, Aleksander Kwaśniewski and Bronisław Komorowski, accepted the findings and publicly asked for the victims’ forgiveness. As Komorowski put it, “even in a nation of victims, there appear to be murderers.” Now, however, the authorities claim that the issue must be re-examined, even calling for the mass graves to be exhumed.” O autor vai porém mais longe, discutindo alguns aspectos do comportamento do governo polaco nos meses que antecederam a II Guerra, assim como do governo polaco no exílio, numa perspectiva já mais discutível do que esta crítica ao actual governo de Varsóvia. Vale a pena ler.
  • Did Henry VIII's Tudor 'Brexit' lead to England's trading glory, or a century of depression?, mais um texto do nosso conhecido Ambrose Evans-Pritchard, sempre imprevisto nas suas opiniões no Telegraph, e que nesta crónica discute uma análise divulgada pelo banco japonês Nomura em que se compara o Brexit à ruptura de Henrique VIII com Roma, uma ruptura que muitas vezes se interpreta como tendo permitido a posterior expansão da Inglaterra isabelina mas que o banco considera que também deu origem a uma recessão económica que durou cem anos. É curioso seguir a argumentação histórica, mesmo que o autor evite qualquer conclusão: “Whether Brexit is a success or failure will not be clear for decades, and perhaps centuries. When Chinese premier Zhou En-Lai was asked about the impact of the French Revolution on western civilisation he famously said it was "too early to tell".”
  • Intervening in Libya in 2011 was the right thing to do, um texto do filósofo e activista francês Bernard-Henri Lévy, publicado no Guardian, onde este mostra o seu desacordo com as conclusões de uma comissão do Parlamento inglês sobre a intervenção na Líbia. O seu argumento é que o facto de a intervenção não ter corrido bem não era possível deixar de ir em socorro dos que combatiam Muammar Kaddafi: “That the coalition allies failed, after the fact, is sadly true: they failed in their duty to help liberated Libya build a state and a society. (…) But the intervention in Libya itself; the response to the call of a people who had decided no longer to allow a mad dictator to act as he had for the past 42 years; the alliance forged with the African Union and the Arab League (…); the subsequent implementation of a UN resolution adopted for the first time in history under the principle of the responsibility to protect and legitimised by the security council”, tudo isso foram importantes passos em frente no que se refere à defesa de uma ordem internacional mais justa.
 
E pronto, por hoje é tudo. Tenham bom descanso e, se possível, aproveitem algumas destas sugestões de leitura. 

 
Mais pessoas vão gostar da Macroscópio. Partilhe:
no Facebook no Twitter por e-mail
Leia as últimas
em observador.pt
Observador
©2016 Observador On Time, S.A.
Rua Luz Soriano, n. 67, Lisboa

Nenhum comentário:

Postar um comentário