domingo, 3 de setembro de 2017

Portugal | A mais recente viatura militar da Força Aérea é um jipe... de 1972

O comandante do Aeródromo de Trânsito, Rui Campos, junto ao jipe Willis recuperado

Responsável pela recuperação do jipe retirado da sucata é um militar que representa a última geração de uma família de sargentos.

Eduardo Bexiga é sargento-mor da GNR, donde saiu em 2006 para andar sempre à civil. Onde anos depois, contudo, voltou a vestir a farda para assinalar a sua última obra: recuperar e oferecer à Força Aérea um jipe Willis retirado literalmente debaixo de muito ferro velho.

A cerimónia realizou-se a 8 de junho, no Aeródromo de Trânsito nº1 (AT1). Eduardo Bexiga, militar de infantaria e mecânico nas horas livres, fardou-se a rigor também "para simbolizar a colaboração da GNR com a Força Aérea e homenagear a sua última unidade": o Grupo de Intervenção de Proteção e Socorro (GIPS) da Guarda, que ajudou a criar e da qual foi o primeiro sargento-mor.

O projeto de recuperar o inutilizado jipe CJ6 de seis cilindros a gasolina - popularmente conhecido como Willis e que agora tem um motor de quatro cilindros a gasóleo - surgiu em 2015, ano em que o coronel Rui Campos assumiu o comando do AT1, a unidade militar adjacente ao aeroporto de Lisboa. Decidido a renovar aquelas instalações, o oficial descobrira a enferrujada viatura debaixo de muita sucata numa área oficinal.

"O jipe nem sequer estava à carga e podia ter sido levado" por quem quer que fosse que ninguém notaria, diz Rui Campos. Motivados os militares e civis a limparem o local, colocava-se o problema de como financiar o projeto. "Não havia dinheiro" mas o desafio de o concretizar era suficientemente forte para procurar soluções, lembra Rui Campos ao DN. A solução acabou por surgir no início de 2016, ao ser apresentado a Eduardo Bexiga, ex-militar da Força Aérea e especialista em jipes Willis.

Eduardo Bexiga - com o irmão, sargento-mor paraquedista - representa a última geração de uma família de sargentos. O avô foi sargento do Exército e integrou o Corpo Expedicionário Português enviado para França na I Grande Guerra. O pai estava em Macau durante a II Guerra Mundial como sargento do Exército, donde transitou para a Força Aérea no início dos anos 1950, quando nasceu o ramo aeronáutico em Portugal.

Com o bichinho e a aprendizagem da mecânica automóvel herdados do pai, sargento-ajudante mecânico de material de terrestre, Eduardo Bexiga iniciou a vida militar em 1972 no mesmo ramo, mas na Polícia Aérea. Em 1980 entrou para a GNR, onde prosseguiu a carreira no Regimento de Infantaria - atual Unidade de Intervenção da Guarda - até a concluir no GIPS.

Já com vários Willis recuperados no currículo, Eduardo Bexiga aceitou o desafio apesar da "falta de peças mecânicas e da impossibilidade de [as] comprar por terem um custo incomportável". Com a ajuda de dois sargentos, um da Força Aérea e outro da GNR, mais uns militares e civis do AT1, o sargento-mor deitou mãos à obra em fevereiro de 2016.

"Optei por incorporar um motor e uma caixa de velocidades de um Nissan Patrol" da Força Aérea, que estava para ser abatido, "e por adaptar a carroçaria do jipe [transformando-o numa viatura para cerimónias de parada] mas mantendo o seu visual estético inalterado", conta o militar já na reforma. Isso significou alargar a abertura lateral direita do Willis, que os puristas classificam como um CJ6 mas que passou assim a ser igual à versão M170.

Foi-lhe também adicionada uma haste para colocar a flâmula da alta entidade - o Presidente da República ou o comandante da Força Aérea, por exemplo - que presida à cerimónia militar, bem como um pirilampo azul para o jipe servir como viatura Follow Me nas receções a chefes de Estado ou de governo que visitem Portugal. Foi aliás nesta função que este Willis já foi usado, aquando da chegada ao aeroporto do presidente do parlamento chinês e do primeiro-ministro da Índia, refere o comandante do AT1.

E quanto custou? Rui Campos sorri de satisfação, também por saber que vai surpreender: "Menos de 600 euros." Eduardo Bexiga, que também sorri mas de orgulho, acrescenta que a única coisa nova do jipe é o vidro - e umas borrachas, acrescenta o coronel.

O resto foi tudo material recuperado, desde o radiador aos pneus (também do Patrol), passando pela direção assistida aos travões de disco à frente e atrás - para garantir a sua "utilização consentânea com as normas de segurança", explica Eduardo Bexiga - ou aos farolins.

Agora em fase de registo e obtenção de documentos como viatura militar especial, o jipe foi oferecido a 8 de junho ao chefe do Estado-Maior da Força Aérea, general Manuel Rolo. Por concretizar, devido ao atraso dos trabalhos, ficou o desejo de Rui Campos em o ver desfilar nas cerimónias do 10 de junho, no Porto e com Marcelo Rebelo de Sousa a passar revista às tropas.

Nas laterais do capô já está inscrita a sua classificação militar e segundo as regras NATO: 13 números, correspondendo os últimos seis ao dia 1 do mês e ano em que renasceu. Mas ainda falta pintar a águia da Força Aérea no capô....

Fonte: DN

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