As notas da semana de Marques Mendes nos seus comentários na SIC. O comentador fala sobre o Sporting, a prisão de Lula da Silva, a polémica na Cultura, os aumentos da função pública e o futuro de Centeno, entre outros temas.
Luís Marques Mendes08 de abril de 2018 às 21:24 |
SPORTING
- Primeiro apontamento – Como dizia ontem um comentador do Sporting, Paulo Andrade, não se fazem críticas públicas ou nas redes sociais aos atletas do clube ou a qualquer trabalhador de uma empresa. Isso é humilhar pessoas. É maltratá-las. O que há a dizer diz-se em privado. É uma questão de bom senso. Bom senso precisa-se.
- Segundo apontamento – Não se fazem críticas como as que foram feitas (e anúncios de decisões de suspensão de actividade) em vésperas de jogos importantes. Fazem-se, sim, dentro de casa, terminadas que estejam as competições. Assim se evitam precipitações e recuos. É uma questão de bom senso.
- Terceiro apontamento – No Sporting, como em qualquer outro clube, o Presidente tem de se lembrar sempre que é o Presidente do clube. Não é o Dono do clube. E quando o Presidente se esquecer disso – no Sporting ou em qualquer outro clube – é necessário haver alguém, com estatuto, capaz de não ser um yes man, com coragem para dizer as verdades e até ser banido de funções, que recorde aos presidentes esta coisa elementar: que houve clube antes deles e continuará a haver depois deles. Neste caso, que houve Sporting antes de Bruno de Carvalho e continuará a haver depois dele.
A PRISÃO DE LULA
- A encenação política – O que assistimos ontem foi a uma encenação ridícula. Lula da Silva a fazer-se de mártir ("Já não sou um ser humano. Sou uma ideia"). Isto é ridículo porque:
- Lula da Silva não é um preso político. É um preso por corrupção.
- Lula da Silva pode ter feito como Presidente uma grande obra social. Mas isso não o isenta de responsabilidades nem o coloca acima da lei.
- Lula da Silva não é um mártir. É apenas mais um de muitos políticos e empresários brasileiros – de todos os quadrantes políticos – condenado na operação Lava Jato que é a maior vergonha de corrupção alguma vez ocorrida no Brasil.
- A prisão de Lula é um golpe político ou a Justiça a funcionar? Claro que é a Justiça a funcionar.
- Ele foi condenado em primeira instância;
- Ele foi condenado em 2ª instância e viu até a sua pena agravada;
- Ele perdeu agora no Supremo Tribunal um habeas corpus, sendo que a maioria dos juízes até tinha nomeada no seu tempo de Presidente;
- Ele foi condenado e preso segundo as regras que há anos se aplicam no Brasil e que já foram aplicadas a vários outros cidadãos, de vários partidos.
- A justiça brasileira funciona bem? Tem um sistema que não existe em Portugal e que a meu ver tem defeitos sérios. Mas é igual para todos.
- Delação premiada – Condenar pessoas com base na delação premiada é um convite ao abuso. Mas tem sido sempre assim e aplica-se a Lula ou a qualquer outro.
- O Juiz de Instrução é o mesmo que julga em 1ª instância – Esta solução não é recomendável. Mas tem sido sempre assim e vale para Lula ou para qualquer outro.
- Os Juízes do Supremo são nomeados pelo poder político – Isto conduz a uma certa politização da Justiça. Mas foi sempre assim, com Lula ou sem Lula.
- Desde o Mensalão que os Juízes querem "limpar" a vida política (judicialização da política) – não é o melhor caminho, mas é assim há anos, para Lula e para os outros. Os Juízes aproveitam-se da fragilidade da política.
- Em conclusão: o sistema judicial brasileiro tem soluções indesejáveis. Mas é igual para todos; é assim há muitos anos; e no Lava Jato já condenou pessoas da esquerda e da direita.
- E agora? Uma tragédia.
- O país está dividido ao meio e a sociedade está radicalizada;
- As Forças Armadas fazem ameaças;
- A classe política é corrupta;
- A classe empresarial está decapitada.
- Não se vê uma figura capaz de liderar a regeneração da democracia brasileira.
- Nota final – Nós queixamo-nos muito do que temos. E com razão. Mas, com todos os defeitos que tem, prefiro o sistema político português e o sistema judicial nacional.
A POLÉMICA NA CULTURA
Esta polémica com o sector das Artes evidencia quatro realidades:
- Primeira: António Costa está a ser vítima das expectativas que criou. Prometeu mundos e fundos. Acabou a ter a maior contestação que se conhece nos últimos anos no domínio das artes. E há a sensação de que nada de relevante mudou na cultura em Portugal. Por exemplo: a UE gasta em cultura, em média, 1% do PIB. Portugal continua abaixo da média (0,8% do PIB).
- Segunda: o Governo não tem Ministro da Cultura. Eu já o tinha dito, por mais do que uma vez. O país sentiu-o agora. Este ministro é uma inexistência política. Um erro de casting. João Soares deve sentir-se vingado.
- Terceiro: o Governo está mesmo em campanha eleitoral. Isto viu-se:
- Na rapidez com que o PM reagiu às pressões dos agentes culturais;
- Na facilidade com que o PM arranjou mais milhões de euros;
- No facto de o PM ter sido desmentido em público pelo secretário de Estado da Cultura e "ter enfiado a viola no saco". O que prova que António Costa não quer "ondas".
- Quarto: toda esta contestação é fortemente penalizadora para o PS. E quem beneficia com isso?
- A oposição não é, muito menos o PSD de Rui Rio, com a imagem que lhe ficou associada na Câmara do Porto;
- O grande beneficiário é o Bloco de Esquerda. António Costa perde para Catarina Martins.
- Não é dramático para o PS, porque o sector da cultura não gera mais votos. Mas é um sector que desgasta e influencia muito uma certa opinião pública.
FUNÇÃO PÚBLICA SEM AUMENTOS EM 2019?
Começou o debate do Programa de Estabilidade. Pelo que se conhece, as previsões não trazem nada de muito surpreendente. A grande polémica que este PE gera é a questão de eventualmente não haver aumentos salariais na função pública em 2019. Uma polémica que pode atingir sérias proporções:
a) Primeiro: não faz sentido introduzir esta questão agora, em Abril, quando o Orçamento só será apresentado em Outubro. É um debate extemporâneo.
b) Segundo: para a geringonça é difícil explicar que não há aumento salarial (ainda que pequeno) na função pública em 2019. Porquê?
- A função pública não tem aumentos desde 2009 (logo, em 2019, passam 10 anos).
- O próximo ano será o quinto não consecutivo de crescimento económico.
- O próximo ano será o terceiro não consecutivo com crescimento acima de 2% (segundo as previsões).
c) Terceiro: esta questão pode ser um problema sério dentro da coligação.
- PCP e BE vão fazer certamente desta questão uma causa nuclear de negociação do próximo orçamento. Se o Governo recua, é mau (está a recuar). Se não recua, é mau (gera mau ambiente).
- E se algum deles, PCP ou BE, ou os dois, resolvem "chumbar" o OE por causa desta questão? Abrir uma crise política com base no não aumento da função pública não é o que mais favorece o Governo. Se isso sucedesse, o Governo não tinha nada a ganhar e poderia ter bastante a perder.
- Tudo isto por causa da estratégia pessoal de Mário Centeno.
O FUTURO DE CENTENO
- Mário Centeno é, ao mesmo tempo, um "abono de família" do Governo e um problema para o Governo.
a) É um abono de família – Foi o MF que conseguiu que, pela primeira vez em Portugal, o PS fosse, ao mesmo tempo, o partido da cigarra e da formiga.
- Habitualmente, o PS era o partido da cigarra. Tratava de gastar. Distribuía riqueza. O PSD, por sua vez, era o partido da formiga (trabalhava para produzir e ter contas em ordem).
- Agora, pela primeira vez, o PS é o partido que poe a economia a crescer, que tem contas em ordem e que distribui riqueza. Logo, é o partido da cigarra e da formiga. Uma vantagem política.
b) Só que Mário Centeno também é um problema para o Governo.
- Primeiro: pelo seu feito. Mário Centeno "não é flor que se cheire".Debaixo daquela bonomia de um sorriso aberto está um homem que não tem propriamente "bons fígados". É teimoso. Não gosta de ser criticado. E não perdoa a quem o critica. Como diz, e bem, Pedro Adão e Silva, a Centeno aplica-se aquela máxima: "quem se mete com Centeno perde". Foi por isso, e só por isso, que o Ministro da Saúde disse "Somos todos Centeno". Uma forma de evitar um conflito.
- Depois, Mário Centeno é um problema porque está a trabalhar acima de tudo para o seu curriculum europeu, para a sua imagem na Europa. E quer estar na Europa com a imagem do ortodoxo financeiro.
- Porquê? Porque Centeno está a pensar no seu futuro europeu.
- Primeiro, Mário Centeno não quer voltar a ser Ministro das Finanças (isso ficará certamente para Mourinho Félix);
- Segundo, Governador do Banco de Portugal já é de menos para as suas ambições e estatuto;
- Terceiro, cabeça de lista ao PE dava jeito ao PS, mas é coisa pouca para o Ministro das Finanças;
- Então, o que ele quer é ser Comissário Europeu e, de preferência, Vice-Presidente da Comissão Europeia.
- E todo o seu comportamento cá dentro na gestão do Orçamento, na gestão do défice, na questão dos funcionários públicos, no Programa de estabilidade tem muito a ver com isto: Mário Centeno quer impressionar bem a Europa. Mesmo que isso gere alguns problemas no Governo em Portugal.
A SAÍDA DE MONTENEGRO
- Luís Montenegro deixou de ser deputado. Isto já não é notícia. Notícia são duas outras questões:
a) A primeira é que Montenegro saiu com estrondo. Com grande impacto. Na AR e fora dela. No Partido e fora dele. A grande razão é que Luís Montenegro adquiriu nos últimos anos um estatuto de grande prestígio, sobretudo depois de ter sido líder parlamentar e depois do discurso no último Congresso;
b) A segunda questão é que todos têm a sensação que esta é uma saída temporária. Sai para voltar.
- Como diz Bernardo Ferrão, no Expresso, Montenegro e Pedro Nuno Santos são os senhores que se seguem, respectivamente no PSD e no PS. É uma nova geração em marcha. Diferente uma da outra. Mas uma geração com talento e coragem.
- Só que Luís Montenegro está muito mais adiantado. Porque a situação n PSD é bastante mais crítica e precária que no PS.
- Mesmo assim, julgo que Luís Montenegro tem vantagem em não ter pressa nem cair em precipitações: o tempo agora é de eleições externas (as Europeias e as legislativas de 2019) e não de eleições internas no PSD, o que seria um disparate que ele seguramente nunca cometerá.
O CASO DA CATALUNHA
Três apontamentos:
- Independentistas ganharam um novo alento com a decisão das autoridades judiciais alemãs de libertar Puigdemont. Não muda nada, mas reforça o moral das tropas.
- Governo de Madrid ficou desolado. Perdeu uma batalha. É por estas e por outras acções que o PP está em queda nas sondagens, os Ciudadanos estão em primeiro lugar e até já se fala em Rajoy ser substituído na liderança do PP pelo Presidente do Governo Regional da Galiza.
- Questão de fundo. O problema da Catalunha é um problema político. Só pode ter solução por via política.
- Colocar as "fichas" todas numa solução jurídica (como fez o Governo de Madrid) é um erro colossal;
- A solução passa: por maior autonomia á Catalunha ou pela reedificação de Espanha como um Estado Federal; e por uma amnistia aos dirigentes catalães que estão presos.
- Mas provavelmente só com um novo governo em Madrid é que este caminho é viável.
Fonte: jornaldenegocios
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