Aspectos
éticos da dádiva de sangue
Por muitos motivos a cadeia
transfusional da dádiva até à transfusão, coloca vários aspectos éticos. O
sangue é de origem humana é um recurso precioso com uma vida limitada depois de
colhido. A gestão de dadores tem dupla responsabilidade moral, responsabilidade
relativamente ao dador e aos receptores de produtos sanguíneos. Tal obriga,
muitas vezes, a decidir conciliando interesses diferentes e ética.
As decisões políticas e de gestão de
dadores são fundamentadas em quatro princípios éticos:
- Respeito pelos indivíduos e sua
autonomia;
- Protecção dos direitos e bem estar
individuais;
- Evitar exploração como parte do
princípio mais geral do princípio de justiça distributiva;
- O PRINCÍPIO Hippocrático de primum
non nocere ou ´primeiro, não fazer mal`.
Na gestão dos dadores, há a considerar
alguns aspectos éticos que podem ser divididos em dois grupos:
CONSIDERAÇÕES comerciais: Há um longo e
extenso debate relativamente à permissão de negócio com o sangue de alguém. Uma
vez que os produtos sanguíneos provêm de dádivas não remuneradas, como evitar a
exploração e garantir uma justiça distributiva se estes produtos entrarem numa
cadeia comercial?
TRATAMENTO incorrecto e perspectivas dos dadores: O sangue é uma
matéria sensível, e um tratamento incorrecto, real ou mal entendido, pode ter
um forte impacto no público e dar origem a discussões públicas.
Esta secção aborda alguns aspectos
éticos. São mencionadas algumas referências para informação e discussão
adicional.
REMUNERAÇÃO OU NÃO?
Por todo o mundo, dar sangue, tecidos e
mesmo órgãos representa, para muitos, uma dádiva sem preço, um “presente especial de vida”.
Preferencialmente, esta dádiva é efectuada por puro altruísmo, apenas
significando a ajuda a outros que necessitam de produtos sanguíneos, sem os
quais poderiam morrer ou perder qualidade de vida.
PERIGO DA EXPLORAÇÃO: Tradicionalmente
não “é feita” a venda de partes do corpo, como o sangue. Apesar dos riscos
relacionados com a dádiva, a exploração pode facilmente emergir se parte do
corpo entrar nos sistemas de mercado. É fundamental que os componentes doados
sejam “propriedade comum”, significando que qualquer um pode recebe-los, se
necessário, para melhorar a sua saúde. Deste ponto de vista, este acto humano
único contra-indica qualquer negócio ou comercialização.
SANGUE COMO UMA
COMODIDADE? Em
contraste, há quem argumente que o sangue é uma comodidade tal como muitos
outros produtos de cuidados de saúde, apesar de ter propriedades especiais e
únicas.
Todos os indivíduos produzem sangue da
mesma maneira; apenas as “condições de produção” variam e provocam algumas
especificações, como o grupo sanguíneo. Deste ponto de vista, a comercialização
surge como sendo lógica.
VENDER SANGUE? ALGUNS
ARGUMENTAM: “As
pessoas vendem o seu talento, experiência, serviços, criações, etc. etc., e o
seu valor é determinado pelas leis do mercado. Assim, porque não vender o
próprio sangue? Há algum risco envolvido na dádiva de sangue?
ECONOMIA. Curiosamente,
entre todos os actores envolvidos na cadeia transfusional, os receptores,
voluntários e dadores são os únicos que não fazem dinheiro com a dádiva.
RECEPTORES: Pode esperar-se
que receptores de produtos sanguíneos (doentes ou “clientes”), possam eles
próprios, de facto, pagar pelos produtos, o seu seguro ou de qualquer forma,
dependendo do sistema de financiamento da saúde do país. O ganho do doente por
este pagamento é uma esperança de vida extra ou uma melhor qualidade de vida.
VOLUNTÁRIOS: Por definição,
os voluntários não aceitam pagamento. Todos aceitamos a sua escolha e
aproveitamo-nos disso.
DADORES: isto deixa o
dador como o único que quebra as regras económicas, em toda a cadeia
transfusional. Isto funciona bem, desde que não haja falta de sangue. Todos os
outros na cadeia transfusional, fazem dinheiro, e não raramente, para viver.
Nestes incluem-se os seguintes grupos de pessoas:
- GESTÃO E PROFISSIONAIS
DE UM SERVIÇO DE SANGUE;
- FORNECEDORES
de equipamento, material descartável,
e todo o outro material necessário para um serviço de sangue funcionar;
- PROFISSIONAIS
DE SAÚDE, nomeadamente, médicos prescritores e os profissionais que
estão envolvidos na administração dos produtos e nas actividades de suporte,
como os laboratórios e na distribuição.
Provavelmente não há nada de errado com
isto, desde que os princípios de mercado sejam socialmente aceites de acordo
com o princípio da justiça distributiva. Subsequentemente, estes “actores
pagos” da cadeia transfusional devem garantir os direitos individuais e o bem
estar. Os profissionais pagos devem ter respeito por um conjunto de opiniões
diferentes. Devem, por exemplo, não recusar a transfusão a alguém que não é (ou
não foi) dador.
SANGUE é um bem de consumo
comercializável? Tudo
isto pode implicar que o sangue seja considerado como um bem de consumo
comercializável. Contudo, do ponto de vista legal, esta questão foca o facto de
o sangue poder ser ou não considerado como um bem de consumo, na realidade.
NA UNIÃO EUROPEIA, um bem
de consumo é definido como: “produtos que podem ser avaliados em dinheiro, e que
como tal, podem ser objecto de transacções comerciais. De acordo com algumas
opiniões, a Comissão Europeia não exclui a possibilidade do sangue ser
considerado um “bem de consumo”, pelas seguintes razões:
1.Embora os tratados internacionais
proíbam os ganhos financeiros com o sangue, estes tratados não são
vinculativos;
2.Na Comunidade Europeia, o sangue é
sujeito a uma taxa normal.
A questão se o sangue é ou não um bem de
consumo ainda não está decidida e poderá ser matéria para o Tribunal Europeu de
Justiça. A porta da comercialização ainda não está fechada.
SEGURANÇA do receptor: Uma outra
razão importante para não se pretender a comercialização do sangue é a
segurança do receptor. É um facto provado que os dadores pagos com dinheiro têm
um risco muito mais elevado de ter uma doença infecciosa transmissível por
transfusão. Mas também outros tipos de pagamentos, incluindo vouchers ou
bilhetes grátis e dispensa do trabalho pode implicar um risco acrescido. Uma
razão plausível para este aumento do risco é o facto de o potencial dador poder
inclinar-se a “esquecer” comportamentos de risco recentes ou problemas de saúde
que podem interferir com a possibilidade de serem seleccionados como dadores.
DÁDIVA VOLUNTÁRIA.
Possível coacção? Tal
como estabelecido, por exemplo, no Código de Ética do ISBT, “a dádiva incluindo
a dádiva de células hematopoiéticos para transplantação, deve, em todas as
circunstâncias, ser voluntária e não remunerada, não devendo ser efectuada
qualquer coacção sobre o dador”. Embora muitas pessoas e organizações,
incluindo a OMS, concordem com os princípios acima enunciados, em muitos locais
há coacção, como caso das chamadas coacções para reposição.
MOTIVAÇÃO do dador: Quando se
pergunta aos dadores porque dão sangue, são referidas cinco motivos primários:
- ALTRUÍSMO:
preocupação com os outros, ou, para benefício de alguém, com sacrifício
do próprio;
- SOLIDARIEDADE:
para a unidade como resultado de interesses, sentimentos ou simpatia
comuns;
- CAPITAL
SOCIAL: algumas pessoas dão sangue, outras dão dinheiro ou bens de
consumo, e assim todos cumprem os seus deveres;
- RECIPROCIDADE:
troca de dádivas de sangue com outros para benefício mútuo. “Eu dou
sangue agora, porque quero ter se vier a necessitar”;
- INCENTIVOS:
(´quid pro quo): Melhor auto-estima, pequenas lembranças de valor
limitado, pagamento, compensação, rastreio de saúde ou outros que representam
para o dador, um benefício.
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