segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Quanto aos crimes contra a Administração Pública: Corruptíveis ou corruptores?


João António Pagliosa
Antes de delimitarmos a respeito de questões sobre a corrupção faz-se necessário o seguinte questionamento: tenho contribuído para a cultura de corrupção que se instaurou, lamentavelmente, de maneira tão intrínseca no país?

Qualquer posicionamento arguido no presente texto será inútil se a pergunta supracitada não for objeto de reflexão ainda que por apenas alguns instantes. É nítido que, ainda que seja justificável nos rebelarmos contra a corrupção e considerarmos comum o repúdio a essa prática, muito tem se falado dos pequenos atos corruptivos que nós, participantes e integrantes na vida civil somos surpreendidos ao cometer.

Seria mesmo poder que corrompe os agentes públicos? Ou será que o poder tem sido vítima de pessoas corrompidas que só se diferem da maioria de nós por uma posição hierárquica mais ou menos elevada?

De fato, ao delinearmos o tema de crimes contra a Administração Pública, o primeiro pensamento de muitos é imediatamente interligado aos escândalos políticos recentes e os rombos causados por criminosos infiltrados no funcionalismo público. Podemos notar a ocorrência de práticas de favorecimento, desvirtuamento, desvio e quebra de valores no que se refere à intenção inicial da prestação do serviço público em prol da sociedade, e embora seja compreensível que essa premissa predomine, há muitos pequenos atos cotidianos que auxiliam a recuperação da integridade do patrimônio público estar cada vez mais utópica. Esses pequenos atos não são do Estado, são nossos! 

Uma cultura é formada pelas ações continuadas de uma geração após a outra, trata-se de uma mentalidade sólida. Uma cultura não se estabelece com atos isolados e individuais, mas sim com uma infinidade deles produzida dia após dia. O que vivemos hoje nada mais é do que o resultado lamentável de uma cultura distorcida que, pouco a pouco, ditou que o incorreto, se vantajoso pra você, é correto.

Na legislação pátria, encontramos os crimes contra a Administração a partir do artigo 312 do Código Penal. E um forte exemplo de crime que coloca o Estado no polo passivo é o de Corrupção Ativa, descrito no artigo 333 do código. Vejamos.

“Art. 333 - Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.

Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional. ”

Nesse caso, o sujeito ativo do delito pode ser qualquer pessoa, independentemente de sua condição ou qualidade pessoal, o que só intensifica a nossa responsabilidade de contribuir com o Estado em não o corromper. Além disso, importante salientar que a corrupção ativa se dá pelo oferecimento de alguma forma de compensação (dinheiro ou bens) para que o agente público faça algo que, dentro de suas funções, não deveria fazer ou deixe de fazer algo que deveria fazer. Trata-se de um crime formal, isto é, não precisa do resultado. A simples oferta já é o suficiente para tipificá-lo.

Ainda que as ações de improbidade administrativa ocorram na esfera civil, os crimes contra a administração pública são de âmbito criminal, e embora para o direito administrativo os funcionários públicos sejam os concursados com funções determinadas em lei, para o Direito penal são todas as pessoas investidas em cargo público, emprego público e função pública, transitoriamente ou sem remuneração alguma, de acordo com o artigo 327 do código penal. Assim, o sistema penal visa proteger não o Estado em si, mas o funcionamento coerente dos três poderes.

Por fim, é evidente que a responsabilização dos crimes contra a administração pública praticados por funcionário público é necessária, e, aliás, devemos continuar lutando incansavelmente por ela. Porém, nos cabe lembrar que ao vivermos em sociedade, a cada um de nós é imposto um dever de colaboração, de modo que apenas culpar quem está no poder e praticar atos igualmente corruptos já nos provou, mais de uma vez, ser insuficiente.

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