domingo, 1 de maio de 2016

PORTUGAL É O “OFFSHORE” PRIVATIVO DO REI DE ANGOLA

Folha 8 digital

O regime de sua majesta­de o rei de Angola ainda não declarou “guerra” a Portugal para defender a honra da sua mais em­blemática filha, Isabel dos Santos, mas não tardará a fazê-lo. E tem legitimidade para o fazer. Como aqui se escreveu, em Luanda o regi­me continua com uma espi­nha, enorme por sinal, enta­lada na garganta. Não aceita que o Banco de Portugal se tenha negado a dar o regis­to de idoneidade a Isabel dos Santos para exercer funções na administração do BIC Portugal, onde é a maior accionista. E, conve­nhamos, desta vez o regime até tem razão. Ou há mora­lidade ou comem todos. Se Isabel dos Santos não tem idoneidade para exerce fun­ções na administração de um banco, tem essa mesma idoneidade quando o negó­cio é descarregar em Lisboa contentores e contentores de dinheiro?

Sabe-se, e nem isso irá tirar o sono ao clã Eduardo dos Santos, que Portugal reci­cla capitais do regime an­golano, sem qualquer tipo de preocupações éticas ou morais. Se para esse efei­to Isabel dos Santos tinha e tem idoneidade, porque carga de chuva vem agora o Banco de Portugal armar­-se em moralista? Angola, ou melhor, o regime, tem investido “especificamente em bens estratégicos” por­tugueses e, em troca, os go­vernos de Lisboa têm servi­do a “estratégia de poder e reciclagem de capitais” dos dirigentes de Luanda, consi­dera Francisco Louçã.

“Não há nenhuma potência colonial que se tenha trans­formado numa espécie de offshore [paraíso fiscal] da família real do país que foi a sua antiga colónia, e Por­tugal, hoje, é um offshore de Angola”, afirmou o ex-líder do Bloco de Esquerda, co­-autor do livro “Os donos angolanos de Portugal”.

Se para esse efeito Isabel dos Santos tinha idoneida­de, porque carga de chu­va vem agora o Banco de Portugal armar-se em mo­ralista? Como em tempos recordava Francisco Louçã, continua a existir uma “ân­sia dos sectores do capital português” para terem par­cerias com Angola “ou até para a venda pura e simples” os activos estratégicos. or­tugal, de facto, tem uma de­pendência estratégica em relação ao regime angolano que se mostra irracional. Os “empresários” do regime fi­zeram da banca portuguesa uma peça basilar dos seus negócios, situação que se revela contraproducente por dependência de caudais financeiros que são, no mí­nimo, de origem duvidosa.

Mas se essa foi e é a opção portuguesa, se para esse efeito Isabel dos Santos tinha idoneidade, porque carga de chuva vem agora o Banco de Portugal armar-se em moralista?

“O que é vantajoso para Portugal e para Angola é que haja relações económi­cas, políticas e diplomáticas normais”, contrapõe Fran­cisco Louçã, frisando que “o grande problema” é que “a imensa fortuna que Angola produz é, em grande parte, acumulada por uma família e essa família confunde-se com o Estado”, o que faz de Portugal “um local de la­vagem de dinheiro de uma operação de extracção da riqueza angolana”.

“Quase todos os partidos” portugueses estão ligados ao regime angolano, o que explica o “silêncio político em Portugal” sobre as re­lações bilaterais, entende Francisco Louçã.

Assim é. Recorde-se que o PSD, CDS-PP e PCP rejeita­ram no dia 8 de Janeiro um voto de condenação apre­sentado pelo Bloco de Es­querda sobre a “repressão em Angola” e com um apelo à libertação dos “activistas detidos”, iniciativa que teve a abstenção do PS.

Este voto do Bloco de Es­querda, porém, contou ainda com o apoio de seis deputados socialistas (Ale­xandre Quintanilha, Isabel Moreira, Inês de Medei­ros, Isabel Santos, Pedro Delgado Alves e Wanda Guimarães), além do repre­sentante do PAN (Pessoas Animais e Natureza).

“É preciso travar e dar por finalizado este arrastado processo que visa intimi­dar, deter e punir aqueles que criticam a governação de José Eduardo dos Santos, que tem tido interferência directa ao longo de todo o processo, dando ordens no sentido de prolongar inde­finidamente as audiências”, referia o voto da bancada bloquista.

Com este cenário, se para esse efeito de bajulação Isabel dos Santos tinha idoneidade, porque car­ga de chuva vem agora o Banco de Portugal armar­-se em moralista?

Folha 8 digital – 30 abril 2016

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