quinta-feira, 11 de agosto de 2016

O “bunker” da indiferença

Leo Daniele (*)
Quem não ouviu falar da famosíssima experiência de Pavlov?

Coloca-se açúcar diante de um cão imobilizado. Ele salivará. A seguir, associa-se a apresentação do açúcar ao som de uma buzina, e repete-se a operação várias vezes. O cachorro continua a salivar normalmente. 

Em uma terceira fase, toca-se a buzina, mas não se apresenta o açúcar. O cão saliva, porque se estabeleceu uma associação entre o som da buzina e a apresentação do açúcar.

É o que o cientista russo, os meios científicos e culturais chamam, de reflexo condicionado.

Se se continuar tocando a buzina, de vez em quando, mas sem apresentar o açúcar, o que acontecerá? A salivação irá diminuindo, e começará a se manifestar uma inibição das funções reflexas, que irá se estender a todo o organismo e engendrar um estado de sonolência.

A mesma inibição das funções reflexas, que assim se obteve pela repetição, pode-se conseguir quando o excitante for particularmente intenso. Por exemplo, a aparição súbita de uma serpente pode inibir as reações de fuga de um pássaro.

Algo de semelhante acontece com o homem pós-moderno? acocorado dentro de seu “bunker”(1) de indiferença, já não capta com grande clareza a realidade externa. Culposamente, diante de uma situação em que ele normalmente reagiria, pode acontecer que se limite a bocejar ou a lançar um vago lamento.

Por exemplo, o Brasil está sendo penetrado por um batalhão de 4 mil médicos cubanos e apesar das dimensões do lance, quase ninguém protesta! Ou o faz por causa de um pequeno aspecto secundário!

O homem de hoje, pela TV, pela internet, e outros meios de comunicação, está sendo submetido a uma espécie de experiência de Pavlov. Uma verdadeira sarabanda. Em várias ocasiões, Plinio Corrêa de Oliveira mostrou os efeitos deletérios de certa mídia, do próprio acontecer moderno e pós-moderno sobre os nervos dos indivíduos:

“O que faz esta sarabanda informativa? Interessa? Atrai? Orienta? A meu ver, o mais das vezes causa acabrunhamento, superexcitação, e por fim tédio. Sim, o tédio dentro da superexcitação; eis o estado de espírito que a pletora informativa cria em muitos e muitos de nossos contemporâneos [...] Em suma, todos sabem de tudo, não entendem nada, alguns ficam com os nervos a tinir, e quase todos, à falta de melhor, bocejam”.(2)

“Acontecimentos que em outras épocas teriam ferido profundamente a sensibilidade do público, despertando reações clamorosas, hoje não inquietam a quase ninguém e não geram nenhum conflito sério. Mesmo quando transgridem princípios e convicções, e até quando contrariam — supremo mal em nossos dias — consideráveis interesses individuais ou de grupo”.(3)

O ilustre autor constata:

“A opinião pública está desnorteada e cambaleante, com toda a zoeira do caos contemporâneo. E isto a leva a alternativas de sobreexcitação e de letargia”.(4)

Vem-se falando — e com justíssimo motivo — dos efeitos nocivos da televisão sobre a psique dos meninos. Pouco ou nada se escreveu sobre as deformações que a própria vida moderna pode provocar sobre um adulto que viva num grande centro e se entregue ao frenesi próprio de nossa época. Muitos dos elementos que prejudicam a vida mental e emotiva das crianças teledependentes podem ser encontrados nesse frenesi, ao qual ainda se somam as ansiedades, as preocupações e as torções muitas vezes presentes no quotidiano de quem precisa ganhar a vida.

Tudo isto pode conduzir à indiferença. E como o indiferente se defende, para não deixar a indiferença! Nisto ele não tem nenhum relaxamento, e defende o estado de torpor valentemente. Como se estivesse dentro de um bunker! E a principal arma de defesa é a frase: “O que tenho a ver com isso?”

Observa Plinio Corrêa de Oliveira: “Durante o dia, em cada minuto, pensa em si e em seus problemas, uma vez ou outra lê um jornal e comenta um acontecimento, pensando que com ele próprio não é assim, graças a Deus. Dobra o jornal e acabou-se. Esta indiferença associa a pessoa à categoria dos indiferentes”.

Se precisar ensinar a alguém como escapar desse bunker, para ser breve eu diria: adote como lema três palavras: Ver – julgar – agir. Ver com inteira objectividade, sem optimismo nem pessimismo. Julgar sem paixão e com justiça. Agir sem omissão, mas também sem um ardor descalibrado e impaciente: são esses os três tempos da Sabedoria, e da anti-indiferença.
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Notas:
1. Termo utilizado em sentido figurado. Em sentido próprio, bunker é uma instalação fortificada fechada, com teto arredondado, à prova dos projéteis inimigos.
2. “Folha de S. Paulo”, 23 de maio de 1971.
3. TFP-Covadonga, España Anestesiada sin Percibirlo, Amordazada sin Quererlo, Extraviada sin Saberlo - La Obra del PSOE. Ed. Fernando III El Santo, 1988, p. 21.
4. “Folha de S. Paulo”, 25 de abril de 1971.
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(*) Leo Daniele é colaborador da Agência Boa Imprensa (ABIM)
Postado por Paulo Roberto Camp

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