domingo, 2 de outubro de 2016

Aos leitores do PÚBLICO — e a todos os outros


Acredito com firmeza que o PÚBLICO vai viver por muitos e bons anos.
Lembro-me muitas vezes da frase que a Cristina Ferreira, minha colega no PÚBLICO há 27 anos, diz quando tem um artigo pronto a publicar. “Foi o melhor que consegui. Tem de certeza erros… mas ainda não os encontrei.”
Sempre gostei desta definição de jornalismo. O que fazemos é tornado públicoapesar de tudo. E dentro das circunstâncias. Sempre imperfeito, partilhamos o nosso trabalho com os leitores todos os dias, a todas as horas.
Hoje é o meu último dia como directora do PÚBLICO. Calcei estes sapatos transitórios durante sete anos. Secretamente, nunca quis que fossem tantos. Como nas Nações Unidas, nas empresas ou nas câmaras municipais, é fundamental renovar as chefias e encontrar, na frescura de um novo olhar, formas diferentes e melhores de fazer as coisas. Idealmente, com mandatos pré-definidos e conhecidos por todos.
No Verão de 2009 dei um salto da cadeira — literalmente — quando a Cláudia Azevedo me disse de rompante, sem introdução nem aquecimento, que queria que eu sucedesse ao José Manuel Fernandes. Pensei num pára-quedas, mas esse é um objecto que os escritórios da Sonaecom não costumam ter à mão. A alternativa foi começar a fazer coisas. Nos últimos anos, muitas coisas mudaram no jornalismo. Outras estão inalteradas desde o século V a.C., quando Heródoto foi viajar pelo mundo à procura de respostas para a pergunta “Quem é que começou a guerra?”.
Nestes sete anos, fizemos 2500 edições em papel, ao mesmo tempo que crescemos como marca digital; criámos o fundo “Público Mais” com o apoio de empresas com perfil filantrópico; aumentámos de 16 mil seguidores no Facebook para um milhão; expandimos para o Brasil, onde temos 1,5 milhões de leitores; ganhámos seis prémios Gazeta em seis anos seguidos, numa linha contínua que não acontecia desde a fundação do jornal: a Sofia Lorena, com a série de reportagens no Iraque, em 2010; o Paulo Moura, com a cobertura da Primavera Árabe, em 2011; o José António Cerejo, com a investigação sobre a Tecnoforma, em 2012; a equipa liderada pela Catarina Gomes, com o projecto “Filhos do Vento”, que incluiu o Ricardo Rezende, o Manuel Roberto, o Dinis Correia e a Andreia Espadinha, em 2013; o Manuel Carvalho e, de novo, o Manuel Roberto, com o trabalho sobre os 100 anos da I Guerra Mundial, em 2014, e este ano a Sibila Lind — a jornalista mais nova do jornal — com o vídeo Anatomia de uma ópera. Destes seis Gazeta, quatro foram financiados pelo fundo do “Público Mais”. Todos envolveram equipas multidisciplinares e muita investigação. Talento e tempo. E por isso é imperioso dizer duas palavras aos mecenas deste fundo inovador: muito obrigada. E acrescentar isto: continuem a acreditar e a apoiar o “Público Mais” de forma desinteressada. Neste tempo de corrida de cavalos, é fundamental lutar pela profundidade e pela investigação no jornalismo.
Pelo caminho, iniciámos a prática das Provas dos Factos e vamos a caminho das 100; deixámos de ser um jornal que “faz textos, fotografias e desenhos” e passámos a fazer reportagens multimédia tão acutilantes que as televisões as incluem nos seus noticiários em prime-time. Ganhámos dezenas de prémios de grafismo, webdesign e infografia. Fomos o jornal mais bem desenhado da Europa. Criámos um sistema de paywall nas plataformas digitais, um passo que, se empurrou alguns leitores para os sites “sem muro”, contribuiu para aumentar as receitas e fidelizar leitores digitais dentro e fora de Portugal. Num gesto inexorável que o mercado acabará por acompanhar, fomos pioneiros e temos hoje uma base de assinantes digitais que, embora não garanta a necessária solidez financeira, é uma peça importante no complexopuzzle da sustentabilidade de um jornal que não cede ao populismo nem à tentação do clique fácil.
E, last but not least, acabámos de ganhar um financiamento de meio milhão de euros do Fundo de Inovação da Google com uma ideia do João Pedro Pereira, o mais geek de todos nós: dar ao leitor um pacote de informação personalizada, seleccionada com base no tempo que o leitor esteve sem consultar o PÚBLICO online, na hora a que regressa, nos seus interesses e hábitos de leitura, se usa um telemóvel, um tablet ou um desktop.
Fonte:publico.pt/opiniao

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