terça-feira, 27 de junho de 2017

RIQUEZA | Quanto vale a floresta? Mais de 1,3 mil milhões e ainda está subaproveitada

Fileira dá muito a ganhar ao país, mas intervenientes pedem políticas mais adequadas e apoios mais ajustados. Potencial de crescimento é enorme

País precisa de repor, pelo menos, os 150 mil hectares de floresta perdida nos últimos 10 anos. Fotografia: Rodrigo Cabrita
País precisa de repor, pelo menos, os 150 mil hectares de floresta perdida nos últimos 10 anos. Fotografia: Rodrigo Cabrita
A floresta vale, pelo menos, 1,3 mil milhões de euros. Essa foi a avaliação feita em 2001 e é a que consta no despacho do Conselho de Ministros da Estratégia Nacional para a Floresta aprovado no ano passado. Américo Mendes, professor de Economia na Universidade Católica do Porto, autor daquela avaliação, repartiu-a em três grandes fatias: 41% resulta da produção de madeira, 47% vem de outros produtos e serviços e 12% provem de serviços ambientais. Dezasseis anos depois, Américo Mendes considera que, agora, é necessário ter em conta que o impacto dos danos causados pelos incêndios é maior; por consequência, os produtos para comercializar baixaram, mas a componente positiva associada à floresta teria de ser revista caso a caso. 

Certo é que só a silvicultura representou, em 2015, um volume de negócios de 793 milhões de euros (+15% face a 2013), com 7646 empresas (+1603 unidades) e 12716 trabalhadores (-3147 pessoas), para um Valor Acrescentado Bruto (VAB) de 208 milhões de euros (+55%). As importações subiram 3%, de 2013 a 2016, para 271 milhões de euros, mantendo este ano, até abril, a tendência de subida. Já as exportações tiveram uma profunda queda, de 59%, naquele período, para 50 milhões de euros, prolongando este ano igual evolução, de acordo com o Instituto Nacional de Estatística (INE).

Floresta: fileira ao sabor da imprevisibilidade

“A floresta é a base de um setor cheio de oportunidades que poderiam ser melhor aproveitadas”, garante a diretora executiva da Forestis – Associação Florestal de Portugal. Rosário Alves acredita que as exportações da fileira (designa tudo o que está implicado na exploração florestal, incluindo a indústria), que representam 15% do total das exportações nacionais, poderiam facilmente duplicar no espaço de 20 anos. Mas para isso são precisas “políticas públicas adequadas” e “previsíveis” e o “empenho dos agentes económicos”. 

Rosário Alves garante que a produção florestal está a 50% da sua capacidade, fruto de uma gestão florestal desadequada: “Falta mão de obra qualificada e não há uma aposta clara na formação, na capacitação e na transferência tecnológica para os produtores florestais”, diz. Por outro lado, o país precisa de recuperar os 150 mil hectares de floresta perdidos na última década, mas falta financiamento público que ajude a diminuir o risco do investimento privado. Os apoios públicos, assegura, são “diminutos” e “desadequados”, com os critérios de avaliação dos projetos em sede de PDR 2020 a dificultarem a elegibilidade das zonas florestais do Norte, Centro e Algarve. Dos 42 milhões de euros já aprovados em sede de PDR, metade foi para o Alentejo.

Cortiça: a caminho dos mil milhões de exportações

É a estrela do cluster: com 736 mil hectares de sobro e uma produção anual de 90 mil toneladas, correspondentes a 50% da produção mundial, Portugal é líder do setor. As exportações de cortiça atingiram, em 2016, os 937,5 milhões de euros, valor recorde que “reafirma a confiança de empresários e investidores”, diz a Associação da Cortiça, a APCOR. As rolhas representam 70% das exportações, mas há uma infinidade de novos usos da cortiça, desde os materiais de construção, aos transportes, ao calçado ou o têxtil. Para continuar a crescer, esta indústria, que conta com 670 empresas e dá emprego a nove mil pessoas, precisa de encontrar novos modelos de produção e novas estratégias que lhe permitam aumentar a matéria prima.

Até porque a indústria importa já, todos os anos, mais de 160 milhões de euros de cortiça. Uma das soluções, diz João Rui Ferreira, presidente da APCOR, está na plantação de sobreiros com regas de instalação melhorada. O que permite mais do que duplicar a densidade de árvores por hectare, mas também diminuir os índices de mortalidade e reduzir, em mais de 15 anos, o primeiro ciclo de produção. A indústria está disponível para partilhar este investimento que, sendo maior à cabeça, permite aumentar a produtividade, tornando o retorno “muito mais rápido e com margens muito maiores”. O objetivo final é “trazer mais valor à floresta, distribuindo-o ao longo da cadeia”.

Madeira: exportações podem crescer 100 milhões ao ano

As exportações das indústrias de madeira e de mobiliário portuguesas cresceram mil milhões de euros entre 2009 e 2015 e valem já mais 2.331 mil milhões. No entanto, o presidente da Associação das Indústrias de Madeira e Mobiliário de Portugal garante que este valor pode facilmente crescer para 3,5 milhões de euros, ou mais, no espaço de uma década: “É fácil aumentarmos as nossas exportações 100 milhões de euros ao ano, nos próximos dez anos, se forem criadas condições de investimento nas empresas e de acesso às matérias primas. É uma questão de o país querer, ou não, fazê-lo”, defende Vítor Poças.

A falta de matéria prima em quantidade e a preço competitivo é a principal limitação da indústria, que importa mais de 20% da madeira que usa. “Não podemos continuar a queimar mais de 100 mil hectares de floresta todos os anos, a maioria dela de pinho, e destruir toda uma indústria recordista na manutenção de emprego nas indústrias de base florestal”, diz.

Pasta e papel: Portugal no pódio europeu

Com 2,2 milhões de toneladas de papel e 2,5 milhões de toneladas de pasta produzidas em 2015, Portugal é o maior produtor europeu de papel fino de impressão e escrita não revestido e o terceiro maior de pastas químicas. E exporta praticamente tudo o que fabrica para mais de 140 países. Em 2016, e segundo o INE, o setor exportou quase 2,4 mil milhões de euros.

Um desempenho económico positivo acompanhado, garante a Associação da Indústria Papeleira Portuguesa, de uma preocupação crescente com o ambiente: “As empresas iniciaram, logo nos anos 80, fortes investimentos do foro ambiental”, sublinha Carlos Vieira, diretor-geral da Celpa, destacando a substituição de combustíveis fósseis por biomassa (casca de madeira, resíduos florestais e licor negro). As empresas têm ainda apostado em sistemas de gestão sustentável das áreas florestais por si geridas: eram 202 mil hectares, em 2015, correspondentes a 2,3% do território nacional.

Ambiente: desligar matas nacionais da indústria

Para João Branco, presidente da Quercus, “a floresta tem que ser obrigatoriamente melhor aproveitada”, com uma parte dela a ter de sair do sistema de produção para a indústria e a ficar mais dedicada a outras valências, desde logo ao serviço dos ecossistemas. João Branco apela ao Estado que dê o exemplo e aplique essa mudança nas matas nacionais, como o pinhal de Leiria. Só assim se pode garantir água de qualidade nas nascentes e nas bacias hidrográficas e a fixação do carbono.

A produção de uso múltiplo, como turismo, produção de resina, cogumelos, caça, apicultura ou piscicultura, serão outras das componentes a explorar, bem como o a conservação da biodiversidade. A proteção dos solos é outro ponto relevante, porque a produtividade está diretamente proporcional à sua quantidade. João Branco ilustra: “Se uma floresta tem um solo com 20 centímetros, pode produzir 20 toneladas de eucalipto. Com incêndios, parte da terra é arrastada e se ficar só com 10 centímetros, a produção de eucaliptos cai para 10 toneladas, o que desvaloriza um imóvel”.

Turismo: potenciador de outras atividades

O turismo de natureza e no espaço rural “pode potenciar atividades laterais ao setor, mas é muito sensível a qualquer foco de instabilidade que tenha a ver com a insegurança das pessoas”, admite Cândido Mendes, presidente da Federação Portuguesa de Turismo Rural. Há 1713 registos de empreendimentos de turismo em espaço rural e 18 reconhecidos como de turismo da natureza. No ano passado, os centros de interpretação das áreas protegidas geridas pelo ICNF mereceram a visita de 23 mil pessoas, um pouco abaixo das 18 mil do ano anterior.

Caça: 10 milhões de euros para o Estado por ano

“A importância da caça é indissociável da floresta e do desenvolvimento rural”, salvaguarda Jacinto Amaro, presidente da Federação Nacional da Caça, para explicar que atividade combate a sazonalidade do turismo nas regiões do interior e o próprio abandono, sublinhando que “há zonas do país onde é o principal produto”.

Em 2016, havia 250 mil caçadores registados e aprovadas 116 mil licenças de caça. Estas últimas, juntamente com as taxas aplicadas às zonas de caça, geraram receitas de 10 milhões de euros para o Estado, estima Jacinto Amaro. O INE acrescenta que havia 124 empresas de caça, em 2014, com 193 pessoas ao serviço e um volume de negócios de 6,5 milhões de euros. O líder federativo acredita que a caça movimente anualmente 600 milhões de euros em Portugal.

Castanha: exportação dispara e faltam terrenos

O INE aponta para uma produção de 26 mil toneladas de castanha em 2016, mas José Carlos Laranjo, presidente da Associação Portuguesa da Castanha e professor na UTAD, fala no dobro: 45 toneladas, estimando um rendimento médio líquido de 4 a 5 mil euros por hectare. E dá mais argumentos para que se olhe para o castanheiro como uma boa alternativa para replantar as áreas ardidas: 1 hectare de castanheiros produz 6 toneladas de folhas que, ao caírem, enriquecem o solo e evitam a propagação do fogo. Essas folhas devolvem à atmosfera cerca de 38 toneladas de água por hectare e são um excelente regulador do clima. Por último, a fileira procura mais terrenos para responder à forte procura. As exportações cresceram 12 vezes de 2015 para 2016 e estão em 50,9 milhões de euros.

Pinhão: consumidor paga a 90 euros por quilograma

O pinheiro manso é a quinta espécie silvícola mais importante em Portugal e pode não ficar por aqui. Concentra-se no Alentejo e Ribatejo, mas está a expandir-se para Oeste e Centro, num crescimento assinalável nos últimos 20 anos, refere Nuno Calado, secretário-geral da União da Floresta Mediterrânica. Em 2016, havia 3400 operadores autorizados para a apanha da pinha, com uma colheita de 86 mil toneladas. Há unidades de transformação da pinha em Alcácer do Sal, Grândola e Coruche, mas a esmagadora maioria é exportada e transformada em Espanha e Itália. No ano passado, o país exportou 8 milhões de euros em pinhão, mas em 2014 tinham sido 15 milhões, uma diferença atribuída à queda do preço no mercado internacional. Nas compras, o consumidor não beneficia dessa baixa, continuando a pagá-lo a 90 euros por quilograma, quando no produtor está nos 35 euros.

Cogumelos: reclamada mais disciplina na atividade

Eurico de Sousa pede “regras claras” para a apanha dos cogumelos selvagens e nos montados ou soutos privados, porque o resultado tem sido, diz, a apropriação indevida do produto, que depois é vendido para a exportação. Dono da empresa Micellium, em Vila Flor, apela para que se siga o exemplo de outros países onde há datas e quantidades definidas para a apanha do cogumelo selvagem, ou onde só pode apanhar quem tem licença. Indigna-se igualmente com a proteção que o Estado tem dado ao eucalipto e ao pinheiro, em detrimento das espécies que fazem de barreira ao fogo, como castanheiro e carvalho, de crescimento lento, mas adequadas à produção de cogumelos, que poderiam ajudar a colmatar o rendimento: no ano passado, o país exportou 2,6 toneladas de cogumelos, por 7,9 milhões de euros.

Mel: 70% da apicultura nacional está nas florestas

Portugal distingue-se de outros países europeus por ser na floresta que se desenvolve a maior parte da apicultura. É lá que estão 70% do apiários e onde é produzido algum do mel mais reputado, como o de rosmaninho, urze ou alecrim, assinala Manuel Gonçalves, presidente da Federação Nacional dos Apicultores de Portugal.

O VAB do setor apícola subiu 53% de 2013 para 2015, atingindo 76,2 milhões de euros, um incremento atribuído ao aumento do preço do mel no produtor, devido a uma “forte quebra” da produção, que Manuel Gonçalves explica com as alterações climáticas. Há 10 mil apicultores registados, 10% dos quais profissionais.

Resina: mais de metade no distrito de Leiria

á 500 pessoas dedicadas à resinagem e seis empresas a fazer a sua transformação. Mais de metade da extração efetua-se no distrito de Leiria, mas a área de pinhal bravo relevante para a atividade vai de Chaves até ao litoral do Alto Alentejo. Os incêndios têm sido “um grande problema”, assume Miguel Santos, técnico florestal da associação ResiPinus. O inventário florestal de 2013 contava 700 mil hectares de pinheiro bravo. Os últimos incêndios fazem temor o pior, quando há uma nova procura do produto a nível internacional. Portugal produz 8 a 9 mil toneladas de resina por ano (cerca de 9 milhões de euros), paga ao produtor a 1€/Kg. Mas os pinheiros demoram 20 a 30 anos a atingir os 20 centímetros de diâmetro necessários para obter a resina. No anos 70-80, o país chegou a ser o segundo maior produtor mundial.

FILEIRA INDUSTRIAL:

21,9 mil milhões de euros 
Foi o volume de negócios das indústrias da fileira florestal (cortiça, papel, madeiras e mobiliário) em 2015

141 mil 
São os trabalhadores que estavam empregados, há dois anos, nas 21.164 empresas da fileira florestal em Portugal

Fonte: Dinheiro Vivo

Comentários
Paulo Coimbra · 

Deixem-se de filmes e façam o que tem que ser feito. Eucaliptos nos Parques Naturais não. Sei de um sítio onde foram plantados, as autoridades foram informadas e nada lhes aconteceu. Continuam lá no sítio. Sic, tvi, CMSeia, Icnf, Gnr... Foram todos avisados e nada. Os Eucaliptos Continuam no mesmo sítio. Estamos fartos de Lágrimas de crocodilo.
Antonio Marques
Você e eu somos os únicos que cumprimos a Lei em Portugal!
GostoResponder25 de Junho de 2017 13:50
Jorge Tavares
Soube ontem que o contrato entre a SIRESP SA e o MAI prevê que o sistema possa entrar em incumprimento durante cataclismos, raios, ciclones, etc.
Que justificação pode haver para isto?!
Carlos Cunha · 

vaaaale...muito mais

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