Plinio Maria Solimeo
A Revolução da Sorbonne, Maio de 1968 [foto acima], na França teve efeitos catastróficos sentidos até hoje em todo o mundo. Com efeito, desde então “foi-se tornando cada vez mais frequente aceitar como normais as excentricidades, loucuras e depravações difundidas por aquela revolução cultural, rejeitando o raciocínio e o bom senso”[i]. Isso ocorreu em praticamente todos os campos da atividade humana, sobretudo no comportamento.
Naqueles tenebrosos dias, estudantes esquerdistas, comunistas e anarquistas, inspirando-se no Livro Vermelho de Mao Tsé-Tung e em sua Revolução Cultural — quando o governo comunista chinês utilizava massas de jovens enraivecidos como tropa de choque para perseguir, humilhar, torturar e matar milhares de adversários do regime —, sob a égide do slogan “é proibido proibir”, se entregaram aos maiores desatinos, sobretudo a uma desbragada liberdade sexual, com a consequente aceitação das uniões ilícitas, inclusive entre pessoas do mesmo sexo.
Nos slogans pichados por esses revolucionários nos muros de Paris mostravam a íntima relação entre essa depravação moral e a Revolução que faziam, quanto mais libertinagem promoviam, mais atos revolucionários praticavam.
Com o tempo, muitos dos líderes de Maio de 1968 foram se metamorfoseando, tornando-se políticos ou burgueses bem instalados na vida, como o ex-líder soborniano Daniel Cohn-Bendit [na foto ao lado, no cento], atualmente deputado europeu e líder do Partido Verde.
Outros, como Pierre-Alban Delannoy [foto abaixo], ativista e terrorista da extrema-esquerda mais violenta durante a Revolução da Sorbonne, reconheceram seus erros e voltaram à prática da Fé. É sobre ele que escrevemos aqui.
O malefício da “esquerda católica”
Pierre-Alban [foto] nasceu em 1948, no seio de uma família católica. Quem poderia supor que participando das fileiras de instituições da Santa Igreja Católica esse então adolescente se tornaria um maoísta radical? Pois assim foi.
Infelizmente, a infiltração comunista nas hostes católicas já ia mar alto naquela época, produzindo seus frutos péssimos em organizações com essa inspiração, entre elas a JOC (Juventude Operária Católica), à qual Pierre-Alban se alistou. Em vez do Evangelho, a JOC se dedicava mais à ação política de esquerda. Pervertendo-se gradualmente com as ideias vigente nesse ambiente esquerdizante, o jovem foi se radicalizando cada vez mais, até incorporar-se aos 20 anos de idade — em 1968 — ao grupo maoísta Gauche Proletarienne (Esquerda proletária) derivando assim para o terrorismo e a luta armada.
Como na ocasião uma grossa maioria de operários esquerdistas aderiu à revolução dos estudantes, Pierre-Alban se infiltrou nas fábricas para provocar greves e luta de classes entre os trabalhadores e empresários, gerando violentos confrontos. Isso fez com que o jovem agitador acabasse preso.
Na prisão, ele começou a dar-se conta de que “os trabalhadores não necessitavam de nós para suas lutas, porque nós tínhamos nos convertido em um grupo terrorista”.
O longo “caminho de Damasco”
Por isso, quando saiu da prisão em 1973, Pierre-Alban abandonou a Gauche Proletarienne, retomou seus estudos e se tornou professor. Mas continuou a se dedicar à militância esquerdista, na ação sindical.
Passado o fervor da juventude, na maturidade, tocado por um movimento da graça divina, começou a meditar sobre sua vida passada e os seus atos radicais para mudar a sociedade segundo os padrões maoístas. Como consequência, ele confessou: “Entristeciam-me esses atos, essas ações que causaram feridas em meu coração. E com o tempo [essas feridas] foram ficando maiores”, levando ao arrependimento. Era um primeiro movimento de alma que mais tarde o levaria à conversão.
Entretanto, seu “caminho de Damasco” foi longo, e da maneira mais inesperada. Devido aos seus estudos, interessou-se pelo Holocausto dos judeus. Isso teve como consequência acercá-lo da espiritualidade do judaísmo, o desejo de estudar hebreu e de ler a Sagrada Escritura.
Ele diz que entre os vários fatores que o fizeram aproximar-se mais de Deus, esteve uma grave doença: “Um estado de saúde deplorável é uma escola de humildade. O conhecimento do Holocausto através do meu trabalho, e o contato regular com presos americanos condenados à morte aos quais escrevi”, levaram-no a falar de Deus, aproximando-o da religião católica.
Outro fator positivo nesse processo era uma boa inclinação de coração, pois “de certo modo, eu sempre procurei servir as pessoas”. Tudo isso somado levou-o a uma autocrítica, na qual “passei da luta política a uma luta contra mim mesmo” para corresponder à graça de Deus.
Conversão radical
Pierre-Alban estava ainda nesse estado de indefinição religiosa quando, num domingo de 2005, foi acompanhar sua mãe à Missa na abadia beneditina de Fontgombault [foto do interior da abadia]. Ora, essa abadia teve a indizível graça de nunca adotar as reformas litúrgicas de 1969, e de celebrar todos os seus atos de acordo com a liturgia tradicional. Assistir a uma celebração assim, dentro do doce rigor de uma liturgia repleta de ponderáveis e imponderáveis da Santa Missa de dois mil anos, provocou no ex-maoísta um impacto instantâneo. Tanto mais que toda ela foi acompanhada pelo insuperável canto gregoriano.
Eis como ele o narra: “Havia ido acompanhar minha mãe à missa e fui visitado por Cristo. Isso eu o senti fisicamente. De repente, senti-me atado à assembleia, aos monges no coro, às suas canções, e à própria abadia” — uma joia da arquitetura romana que teve seus inícios no século XI. Ele viu a si mesmo, e todos os presentes, como um só corpo. “Embora eu não gostasse de muitas coisas na Igreja, disse: ‘Quero isto!’”.
Entusiasmado com o que vira, Pierre começou a ler e a investigar sobre a vida de São Bento e de São Bernardo de Claraval, responsáveis por aquela obra tão maravilhosa. E seu amor à vida beneditina foi crescendo.
Até que em 2007 ele soube da existência de leigos não religiosos que viviam em comunidade seguindo a regra beneditina e decidiu ser um deles: “Falei de imediato com esta comunidade, onde podia rezar e viver como um cisterciense”.
Assim Pierre-Alban mudou-se para uma “fraternidade” próxima da antiga abadia de Claraval, onde vive, como leigo, seguindo o ora et labora beneditino, o que o “ajuda a manter-se em contato com Cristo”. Ele assiste aos serviços religiosos com a comunidade monástica, ao que acrescenta um tempo de oração pessoal. Continua escrevendo, investigando, divulgando vidas de santos, cuidando — para espairecer — das áreas verdes da fraternidade e fazendo visitas aos presos num cárcere próximo. Quem poderia imaginar que este maoísta radical acabaria trocando O livro vermelho de Mao Tsé-Tung pela Regra beneditina? Para a graça de Deus, não há limites…
É preciso dizer que a abadia de Fontgombault, como parte da congregação beneditina de Solesmes, é a mais povoada de suas fundações, contando atualmente com uma centena de monges e três filiais: duas na França e uma nos Estados Unidos. O canto gregoriano é a essência da prática litúrgica da comunidade, e a gravação de seus ofícios é ouvida em todo o mundo.
ABIM
[i]Fontes:
– Alfredo MacHale, A três décadas da Revolução da Sorbonne, Catolicismo, maio de 1998.
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