quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Adolescência, Identidade e Crise de Valores

sol.pt
A adolescência corresponde ao período em que o ser humano sofre mudanças orgânicas, cognitivas, sociais e afectivas. As mudanças sofridas pelo adolescente têm consequências ao nível do seu relacionamento interpessoal, familiar, escolar e social. A este propósito, Fátima Maria Simas relembramo-nos na sua obra Educação, Cognição e Desenvolvimento (2001) a concepção de adolescência apresentada por Seligman (1994):

- A adolescência surge como um período de grandes mudanças físicas que alteram a sua imagem corporal e intelectual começando a possibilitar a formação do conhecimento de si próprio e a prepará-lo para tomar decisões. Porém, este período de desenvolvimento é bastante complexo porque passa por um confronto de forças interiores e exteriores que afectam o auto conhecimento, tais como o contexto sócio-económico e cultural e a importância da família e dos seus pares que influenciam as expectativas dos jovens em relação ao futuro.   

 É, também, durante este período que o adolescente realiza um percurso, muitas vezes difícil, em que procura a sua identidade. Durante esse percurso o jovem encontra-se em busca de uma uniformidade capaz de lhe proporcionar segurança e auto-estima. Razão pela qual a companhia dos pais é, nesta fase, preterida relativamente à companhia dos amigos assim como é, igualmente, durante este período que parece ocorrer a identificação com o espírito de grupo. A confirmá-lo, apresentamos as citações que se seguem:
Termos como transformação, conflito e separação são centrais à compreensão dos processos desenvolvimentais da adolescência. As transformações referem-se a um conjunto de processos que vão da maturação biológica à adoção de novos papéis sociais, no curso dos quais o adolescente ressignifica a si, ao outro e à realidade. A separação envolve um processo de paulatino distanciamento entre os adolescentes e as antigas figuras de referência, como a família e a escola, quando eles tendem a privilegiar o compartilhamento de experiências com os grupos de companheiros. Cole e Cole, 2003; Dias e Tróccoli, 1999; Santrock, 2003).

Especialmente quando o adolescente busca uma maior autonomia em relação aos pais na adolescência, os grupos de pares emergem como fontes importantes de identificação e referência comportamental dos adolescentes. Porém, uma particularidade das tribos é o carácter volátil de seus vínculos internos, o que tanto torna sua dinâmica social muito rica, como enfraquece as ligações entre os membros, comprometendo o engajamento em projectos cooperativos de maior duração (Maffesoli, 1992/2000).  

Etimologicamente a palavra adolescente vem do latim ad, que significa, segundo Becker (1994) para e olescere que significa "crescer para". A adolescência implica que o jovem adequira autonomia e consequentemente uma visão própria do mundo. 

Ao nos debruçarmos sobre a questão da adolescência há uma questão que não podemos contornar, será que o período da adolescência é vivido de igual forma pelos jovens qualquer que seja a sua nacionalidade? Ou será que este período ganha contornos diferentes consoante o contexto social em que o jovem se encontra inserido?
O conceito de adolescência não é pacífico e, por isso, tem vindo a ser objecto de estudo de várias correntes da psicologia. As duas grandes tendências identificadas na investigação oscilam entre aqueles que defendem que a adolescência é um processo de natureza individual (baseiam a sua teoria colocando em evidência os aspectos biológicos e psicológicos) e os que defendem que se trata de um período identificado e reconhecido culturalmente (colocam a ênfase nos aspectos sociológicos, antropológicos e ideológicos). Nunes de Souza (1997) considera que o período da adolescência se caracteriza por ser um período difícil para os adolescentes não apenas pelas transformações físicas a que estão sujeitos nesta fase da vida, como também considera que este período constitui um período de crise para toda a família. Durante este processo o adolescente sente necessidade de contestar os valores que lhe foram incutidos pela família numa tentativa de se afirmar enquanto indivíduo com existência e características próprias. Esta fase caracteriza-se, igualmente, por o autoritarismo dos pais ter muitas vezes de ser substituído por uma atitude de negociação com os filhos relativamente às tomadas de decisão. Quanto maior for o grau de afectividade existente entre a criança e a figura de autoridade maior será o nível de aceitação das regras impostas, no entanto, no período da adolescência o jovem tende a rejeitar o que lhe foi anteriormente incutido. O jovem que teve a oportunidade de ter uma referência de autoridade positiva na infância tem mais facilidade em integrar-se socialmente, ou seja, em acatar as regras necessárias para viver em sociedade. Esta é a concepção de adolescência que corroboramos uma vez que consideramos ser um processo que extrapola o indivíduo e que envolve a família, a escola, as instituições e os grupos de pares. No que respeita à educação há, assim, uma estreita ligação entre o individual e o colectivo e a este respeito diz-nos Morin (1991) que sempre há um imprinting cultural a determinar as nossas percepções do mundo. 

Um outro processo que tende a desenvolver-se na adolescência é o desenvolvimento moral acompanhado pela aquisição de valores e ideais de justiça, liberdade ou equidade. Kolhberg (1981) diz-nos que o período da adolescência corresponde a uma etapa de construção de valores sociais e de manifestações de interesse, por parte do adolescente, por problemas de cariz ético e ideológico. O jovem adolescente aspira à existência de um mundo perfeito relativamente aos valores morais é altruísta, o que não raras vezes origina revoltas por descobrir que a sociedade não se pauta pelos valores que defende.

 Elsa Martins


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