sexta-feira, 4 de agosto de 2017

Macroscópio – Uma história que não é ficção científica. E um futuro incerto

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Macroscópio

Por José Manuel Fernandes, Publisher
Boa noite!
@lerlisboa, Instagram
 
No momento em que escrevo este Macroscópio a contestada Assembleia Constituinte da Venezuela está (finalmente) reunida, mesmo sendo certo que da Europa à América Latina sejam enviados recados a garantir que a sua eleição e legitimidade não serão reconhecidas. Em Portugal poucos são os que a defendem, mas não foi sempre assim no passado. Mas não, não vou voltar a escrever um Macroscópio dedicado àquele país da América Latina, deixo-vos apenas algumas referências, sendo que as três têm um comum ponto de partida, um texto de Boaventura Sousa Santos no Público a defender o regime venezuelano (Em defesa da Venezuela): A lista dos cúmplices da tragédia da Venezuela também inclui o Bloco, Sócrates e Portas, que eu próprio escrevi no Observador, Crónicas de amor assolapado pela Venezuela, de Maria João Marques também no Observador, e Boaventura rima com ditadura, de João Miguel Tavares no Público.
 
Esta semana que termina também voltei a pensar muito na nossa floresta e nos incêndios que a devastam, até porque amanhã estarei em Alvares, no concelho de Góis (é de lá a fotografia que publico abaixo, mostrando como tudo ardeu em redor dessa pequena povoação), onde na presença do Presidente da República, ocorrerá uma pequena cerimónia para assinalar a doação de 60 mil euros por accionistas do Observador destinados não só a financiar a reflorestação e reconstrução daquela freguesia com o apoio científico do Instituto Superior de Agronomia, como a procurar criar bons exemplos que possam ser replicados noutras zonas do martirizado Pinhal Interior. Por estes dias já fui duas vezes a Alvares e só vos digo que aquilo que por ali se testemunha é de cortara respiração – algo que também fica bem evidente neste pequeno vídeo onde se vê como os fogos passaram e repassaram por aquelas terras nas últimas décadas.

 
Mas este Macroscópio também não regressará ao debate sobre a floresta e os incêndios – será antes uma newsletter de fim de semana, com um apanhado de textos variados que ajudam a pensar ou a relaxar. Vamos a eles.
 
Começamos por aquele que foi um dos avanços científicos mais importantes dos últimos tempos, um salto num futuro que deixou de pertencer apenas à ficção científica: refiro-me ao facto de, pela primeira vez na História, uma equipa internacional de cientistas ter conseguido editar a informação genética de embriões humanos e eliminar doenças hereditárias. Esta informação que demos no Observador na passada quarta-feira pode ser aprofundada lendo os artigos do New York Times, In Breakthrough, Scientists Edit a Dangerous Mutation From Genes in Human Embryos, e da Science Magazine, First U.S.-based group to edit human embryos brings practice closer to clinic. Mas do que encontrei publicado há. No New York Times, uma abordagem bem interessante em Can Gene Editing Actually Do That? Trata de doze questões com três respostas possíveis (Already happened; Hypothetically possible e Pure fiction) que desafiam o grau de conhecimento dos leitores. Eis uma delas: será que esta técnica poderá ... enable parents to ensure that their baby will grow up to be a genius with supermodel looks and a creative streak, as soon as boutique fertility labs are legal? A resposta certa é “pura ficção” e a explicação a seguinte: “When people talk about the Crispr, they often talk about “designer babies.” Researchers who specialize in gene editing are quick to point out that some of the attributes that people seem most fearful will be marketed -- intelligence, beauty, creativity -- are not determined by a single gene or known group of genes.  Even much less complicated traits like hair color or height, Dr. Bondy-Denomy points out, “are not perfectly predictable.” An offer to edit out genetic mutations is a promise that some doctors may be able to keep in the not-so-distant-future if additional research and the law enables it. Anyone who tries to sell smarts and beauty in the next decade or two, however, will be misrepresenting the way that genes work, he said.”
 

Continuando a falar de ciência encontrei na The Economist uma recensão de dois livros que estão para sair nas próximas semanas – Inheritors of the Earth: How Nature Is Thriving in an Age of Extinction, de Chris Thomas, e The Ends of the World: Volcanic Apocalypses, Lethal Oceans, and Our Quest to Understand Earth’s Past Mass Extinctions, de Peter Brannen – e que defende a ideia, surpreendente, de que se nós humanos estamos a provocar a extinção de espécies a uma taxa alarmante, ao mesmo tempo estão a ocorrer fenómenos de hibridação e especiação a um ritmo também muito rápido. Em Why extinctions aren’t what they used to be dão-se exemplos: “Sparrows, which have spread from their Central Asian point of origin by adapting to life among people, are turning into different sorts of bird in different sorts of places; flies which until recently dined on the fruit of the American hawthorn have, since the arrival of European apples, split into spinophilic and pomophilic populations—forcing the parasitic wasps that prey upon them to do the same; a pretty ragwort brought to Oxford from the slopes of Mt Etna has, through a liking for the gravel beds of railways, spread from city to city in England, creating new varieties as it did so. All around the world there is similar evidence of hybridisation and incipient speciation as separated populations go their different ways and get it on with different far-flung relatives. “I find it difficult”, Mr Thomas writes, “to imagine a period in the entire history of terrestrial life on Earth when the speed of origination of new evolutionary lineages could have been faster.”
 
Se da leitura deste texto podemos sair com uma visão optimista do que a dominante, já a leitura de The age of disorder: why technology is the greatest threat to humankind, de Yuval Harari na revista da esquerda britânica The New Statesman faz uma leitura sombria do futuro, defendendo que “Disruptive technologies might change the very nature of humanity – and no nation can fight on its own”. Eis como ilustra esta tese: “If and when artificial intelligence (AI) surpasses human intelligence, it may be given control of weapon systems and crucial decisions, with potentially calamitous consequences. In addition, as AI outperforms human beings in ever more tasks, it might push billions of us out of the job market, creating a new “useless class” of people, devoid of both economic value and political power. Meanwhile, given enough biometric data and enough computing power, external algorithms could know us better than we know ourselves, and then governments and corporations could predict our decisions, mani­pulate our emotions and gain absolute control over our lives.”
 
Escrevendo a partir de uma perspectiva quase diametralmente oposta, Alejandro Chafuen defendei na Forbes que alguns dos desenvolvimentos políticos e sociais mais preocupantes dos dias que correm podem ser enfrentados se conseguirmos aprender com alguns autores clássicos por vezes insuficientemente lidos. Em The Forgotten Hayek: An Antidote For The New Populism? defende a ideia de que um racionalismo dogmático, que recuse qualquer outra fonte de inspiração, é desaconselhável. Pequeno extracto: “Although there have been other moments of growth, the greatest leap in civilization took place during the late eighteenth and nineteenth century. During that period, the intellectual elites of many countries began to promote institutions based on a view of the human person that was consistent with individualism and also recognized the religious, social and spiritualaspects of the human being. I believe that human beings should try to find most answers to their more serious questions through science and reason. But there are other sources of knowledge. Understanding this and respecting those who use these other sources as guide for their civil and political life might take out some steam from the worst populist movements: “those truly reactionary camps” that were a great concern for F.A. Hayek.”
 
Sem olhar agora para o futuro, e sem por em confronto abordagens políticas e filosóficas rivais, retomo um tema que já referi num anterior Macroscópio, o das motivações e folclore dos activistas anti-globalização. Desta vez trata-se de uma deliciosa crónica satírica de Cosmo Landesman na conservadora Spectator, Riot chic: how violent protest became fashionable, sobre “Rage is all the rage – and the middle classes love it”. Reparem na ironia desta passagem: “The riot chic crowd seek the euphoric rush that comes from combining violence with the feeling that you’re being virtuous. After all, you’re barbecuing someone’s car or throwing a bottle in the name of social justice! If you get clobbered by a police truncheon, well, nothing says you care about inequality like a fat lip from the old bill. Even if you don’t want to be involved in the violence, you can have the pleasure of being near the action, and of filming it on your phone to share on social media.

 
A terminar por hoje, e por esta semana, um texto mais longo, da americana The Atlantic, sobre um tema de enorme actualidade: como é que os smartphones e as redes sociais podem estar a transformar a vida dos adolescentes e a condicionar o seu futuro. Em Have Smartphones Destroyed a Generation? Jean M. Twenge defende que “More comfortable online than out partying, post-Millennials are safer, physically, than adolescents have ever been. But they’re on the brink of a mental-health crisis.” O gráfico que reproduzo abaixo mostra como paradoxalmente o número de amigos que os adolescentes fazem tem vindo a diminuir, o que tem consequências: “What’s the connection between smartphones and the apparent psychological distress this generation is experiencing? For all their power to link kids day and night, social media also exacerbate the age-old teen concern about being left out. Today’s teens may go to fewer parties and spend less time together in person, but when they do congregate, they document their hangouts relentlessly—on Snapchat, Instagram, Facebook. Those not invited to come along are keenly aware of it. Accordingly, the number of teens who feel left out has reached all-time highs across age groups. Like the increase in loneliness, the upswing in feeling left out has been swift and significant.”

 
E por esta semana é tudo. Tenham um bom fim-de-semana ou, sendo caso disso, uma boa continuação de férias. 

 
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