A posição
teórica de Rogers evoluiu através dos anos. Ele é o primeiro a indicar em que
mudou seu pensamento, transferiu sua ênfase ou modificou sua abordagem. Ele
estimula os outros a testarem suas afirmações, ao mesmo tempo que desencoraja a
formação de uma “escola de pensamento” que se inspire em suas conclusões
pessoais. Seu trabalho não se limitou a influenciar a psicologia; antes, “foi
um dos factores responsáveis pelas mudanças conceituais que ocorreram na área
da liderança na indústria (e também na área militar), na prática do serviço
social, da enfermagem e da assistência religiosa. Exerceu influência até mesmo
sobre os estudiosos de teologia e da filosofia”.
A
natureza básica do ser humano, quando actua livremente, é construtiva e
fidedigna.
Antecedentes
Intelectuais
A teoria
de Rogers desenvolveu-se essencialmente a partir de sua própria experiência
clínica. Ele sente que conservou a objectividade evitando a estreita
identificação com qualquer escola ou tradição específica. “ Na verdade, nunca
pertenci a qualquer grupo profissional. Fui educado por, ou tive íntimas
relações de trabalho com psicólogos, psicanalistas, psiquiatras, psiquiatras
sociais, assistentes sociais, educadores e religiosos, mas nunca senti que
pertencia, num sentido total ou comprometido a qualquer um desses grupos”.
Seus
alunos da Universidade de Chicago sugeriram que Rogers encontraria nas ideias
de Martin Buber e Soren Kierkegaard um eco de sua própria posição emergente. Na
verdade, estes escritores são uma fonte de fundamentação para as marcas que
Rogers traz da sua filosofia existencial. Recentemente, ele descobriu paralelos
ao seu trabalho em fontes orientais, notavelmente no Zen Budismo e nos
trabalhos de Lao-Tsé.
Conceitos
Principais
Uma
premissa fundamental da teoria de Rogers é o pressuposto de que as pessoas usam
sua experiência para se definir. Em seu principal trabalho teórico, Rogers
define uma série de conceitos a partir dos quais delineia teorias da
personalidade e modelos de terapia, mudanças de personalidade e relações
interpessoais. Os construtos básicos aqui apresentados estabelecem uma
estrutura através da qual as pessoas podem construir e modificar suas opiniões
a respeito de si mesmas.
O Campo
da Experiência
Há um
campo de experiência único para cada indivíduo; este campo de experiência ou
“campo fenomenal” contém “tudo o que se passa no organismo em qualquer momento,
e que está potencialmente disponível à consciência”. Inclui eventos,
percepções, sensações e impactos dos quais a pessoa não toma consciência, mas
poderia tomar se focalizasse a atenção nesses estímulos. É um mundo privativo e
pessoal ou não corresponder à realidade objectiva.
De início
a atenção é colocada naquilo que a pessoa experimenta como seu mundo, não na
realidade comum. O campo de experiência é limitado por restrições psicológicas
e limitações biológicas. Temos tendência a dirigir nossa atenção para perigos
imediatos, assim como para experiências seguras ou agradáveis, ao invés de
aceitar todos os estímulos que nos rodeiam.
As
palavras e os símbolos estão para a realidade na mesma relação com um mapa para
o território que o represente… Vivemos num “mapa” de percepções que nunca é a
própria realidade.
Self
Dentro do
campo da experiência está o self. O self não é uma entidade estável, imutável;
entretanto, observado num dado momento, parece estável. Isto se dá porque
congelamos uma secção da experiência a fim de observa-la. Essencialmente é uma
gestalt cuja significação vivida é susceptível de mudar sensivelmente (e até
mesmo sofrer uma reviravolta) em consequência da mudança de qualquer destes
elementos. Self é uma gestalt organizada e consistente num processo constante
de formar-se e reformar-se à medida que as situações mudam.
Rogers
usa o termo para se referir ao contínuo processo de reconhecimento. É esta
diferença, esta ênfase na mudança e na flexibilidade, que fundamenta sua teoria
e sua crença de que as pessoas são capazes de crescimento, mudança e
desenvolvimento pessoal. O self ou auto-conceito é a visão que uma pessoa tem
de si própria, baseada em experiências passadas, estimulações presentes e
expectativas futuras.
Self
ideal
O self
ideal é “o conjunto das características que o indivíduo mais gostaria de poder
reclamar como descritivas de si mesmo”. Assim como o self, ele é uma estrutura
móvel e variável, que passa por redefinição constante. A extensão da diferença
entre o self e o self ideal é um indicador de desconforto, insatisfação e
dificuldades neuróticas. Aceitar-se como se é na realidade, e não como se quer
ser, é um sinal de saúde mental. A imagem do self ideal, na medida que se
diferencia de modo claro do comportamento e dos valores reais de uma pessoa é
um obstáculo ao crescimento pessoal.
Congruência
e Incongruência
Congruência
é definida como o grau de exactidão entre a experiência da comunicação e a
tomada de consciência. Ela se relaciona às discrepâncias entre experienciar e
tomar consciência. Um alto grau de congruência significa que a comunicação (o
que você está expressando), a experiência (o que está ocorrendo em seu campo) e
a tomada de consciência (o que você está percebendo) são todas semelhantes.
Suas observações e as de um observador são consistentes.
Crianças
pequenas exibem alta congruência. Expressam seus sentimentos logo que seja
possível com o seu ser total. Quando uma criança sente amor ou raiva, ela
expressa plenamente suas emoções. Isso pode justificar a rapidez com que a
criança substitui um estado emocional por outro. A expressão total de seus
sentimentos permite que elas liquidem a bagagem emocional que não foi expressa
em experiências anteriores.
A
congruência é bem descrita por um Zen-budista ao dizer: “Quando tenho fome,
como; quando estou cansado, sento-me; quando estou com sono, durmo”.
A
incongruência ocorre quando há diferenças entre a tomada de consciência, a
experiência e a comunicação desta. As pessoas que parecem estar com raiva
(punhos cerrados, tom de voz elevado, praguejando) e que (se interpeladas)
replicam que de forma alguma estão com raiva, ou as pessoas que dizem estar
passando por um período maravilhoso mas que se mostram entediadas, isoladas ou
facilmente doentes, estão revelando incongruência.
Quando a
incongruência está entre a tomada de consciência e a experiência, é chamada
repressão. A pessoa simplesmente não tem consciência do que está fazendo. A
maioria das psicoterapias trabalha sobre este sintoma de incongruência,
ajudando as pessoas a se tornarem mais conscientes de suas acções, pensamentos
e atitudes na medida em que estes as afectam e aos outros.
Quando a
incongruência é uma discrepância entre a tomada de consciência e a comunicação
a pessoa não expressa o que está realmente sentindo, pensando ou
experienciando. A pessoa não é capaz de expressar suas emoções e percepções
reais em virtude do medo e de velhos hábitos de encobrimento que são difíceis
de superar. Por outro lado, é possível que a pessoa tenha dificuldade em
compreender o que os outros esperam dela.
A
incongruência pode ser sentida como tensão, ansiedade ou, em circunstâncias
mais extremas, como confusão interna.
Tendência
à Auto-Realização
Há um
aspecto básico da natureza humana que leva uma pessoa em direcção a uma maior
congruência e a um funcionamento realista. Além disso, este impulso não limitado
aos seres humanos; é parte do processo de todas as coisas vivas. “É este
impulso que é evidente em toda vida humana e orgânica expandir-se, torna-se autónomo,
desenvolver-se, amadurecer a tendência a expressar e activar todas as
capacidades do organismo ou self”.
O impulso
em direcção à saúde não é uma força esmagadora que supera obstáculos ao longo
da vida; pelo contrário, é facilmente embotado, distorcido e reprimido. Rogers
o vê como a força motivadora dominante numa pessoa que está “funcionando de
modo livre”, não paralisada por eventos passados ou por crenças correntes que
mantêm a incongruência. Maslow chegou a conclusões semelhantes; chamava esta
tendência de uma voz interna e fraca que é facilmente abafada. A suposição de
que o crescimento é possível e central para o projeto do organismo é crucial
para o restante do pensamento de Rogers.
Dinâmica
Crescimento
Psicológico
As forças
positivas em direcção à saúde e ao crescimento são naturais e inerentes ao
organismo. Baseado em sua própria experiência clínica, Rogers concluiu que os
indivíduos têm a capacidade de experienciar e de se tornarem conscientes de
seus desajustamentos.
Rogers
está convencido de que estas tendências em direcção à saúde são facilitadas por
qualquer relação interpessoal na qual um dos membros esteja livre o bastante da
incongruência para estar em contacto com o seu próprio centro de auto-correção.
A maior tarefa da terapia é estabelecer tal relacionamento genuíno.
Aceitar-se
a si mesmo é um pré-requisito para uma aceitação mais fácil e genuína dos
outros. Em compensação, ser aceito por outro conduz a uma vontade cada vez
maior de aceitar-se a si próprio. Este ciclo de auto-correção e auto-incentivo
é a forma principal pela qual se minimiza os obstáculos ao crescimento
psicológico.
Obstáculos
ao Crescimento
Rogers
sugere que os obstáculos aparecem na infância e são aspectos normais do
desenvolvimento. O que a criança aprende em um estágio com benéfico deve ser
reavaliado nos estágios posteriores. Motivos que predominam na primeira
infância mais tarde podem inibir o desenvolvimento da personalidade.
Quando a
criança começa a tomar consciência do self, desenvolve uma necessidade de amor
e de consideração positiva. Uma vez que as crianças não separam suas acções de
seu ser total, reagem à aprovação de uma acção como se fosse aprovação de si
mesmas. Da mesma forma, reagem à punição de um ato como se estivessem sendo
desaprovadas em geral.
O amor é
tão importante para a criança que ela “acaba por ser guiada, não pelo carácter
agradável ou desagradável de suas experiências e comportamentos, mas pela
promessa de afeição que elas encerram”. A criança começa a agir de forma que
lhe garante amor ou aprovação, sejam os comportamentos saudáveis ou não para
ela. As crianças podem agir contra seu próprio interesse, chegando a se
perceber em termos destinados a princípio a agradar ou apaziguar os outros.
Teoricamente esta situação poderia não se desenvolver se acriança sempre se
sentisse aceita e houvesse aceitação dos sentimentos mesmo que alguns
comportamentos fossem inibidos. Em tal situação ideal a criança nunca seria
pressionada a se despojar ou repudiar partes não atraentes mas autênticas de
sua personalidade.
Comportamentos
ou atitudes que negam algum aspecto do self são chamados de condições de valor.
“Quando uma experiência relativa ao eu é procurada (ou evitada) unicamente
porque é percebida como mais (ou menos) digna de consideração de si, dizemos
que o indivíduo adquiriu um modo de avaliação condicional”.
Condições
de valor são os obstáculos básicos à exactidão da percepção e à tomada de
consciência realista. De forma extrema, as condições de valor são caracterizadas
pela crença de que “preciso ser respeitado ou amado por todos aqueles que
estabeleço contacto”. As condições de valor criam uma discrepância entre o self
e o auto-conceito. Para mantermos uma condição de valor temos que negar
determinados aspectos de nós mesmos.
Por
exemplo, se lhe falaram “Você deve amar seu irmãozinho recém-nascido senão
mamãe não gosta mais de você”, a mensagem é d que você deve negar ou reprimir
seus sentimentos negativos genuínos em relação a ele. Se você conseguir
esconder sua vontade maldosa, seu desejo de machucá-lo e seu ciúme normal sua
mãe continuará a amá-lo. Se você admitir que tem tais sentimentos, você arrisca
a perder este amor. Uma solução que cria uma condição de valor é rejeitar tais
sentimentos sempre que ocorram, bloqueando-os de sua consciência. Agora você
pode agir de formas tais como: “Eu realmente amo meu irmãozinho, apesar das
vazes em que o abraço tanto até ele gritar” ou “Meu pé escorregou sobre o seu,
eis porque ele tropeçou”.
Quando a
criança amadurece, o problema persiste. O crescimento é impedido na medida em
que a pessoa nega impulsos diferentes do auto-conceito artificialmente “bom”.
Para sustentar a falsa auto-imagem a pessoa continua a distorcer experiências
(quanto maior a distorção maior a probabilidade de erros e da criação de novos
problemas). Os comportamentos, os erros e a confusão que resultam dão
manifestações de distorções iniciais mais fundamentais.
A
situação realimenta-se a si mesma. Cada experiência de incongruência entre o
self e a realidade aumenta a vulnerabilidade, a qual, por sua vez, ocasiona o
aumento de defesas, interceptando experiências e criando novas ocasiões de
incongruência.
Por vezes
as manobras defensivas não funcionam. A pessoa toma consciência das
discrepâncias óbvias entre os comportamentos e as crenças. Os resultados podem
ser pânico, ansiedade crónica, retraimento ou mesmo uma psicose. Rogers
observou que o comportamento psicótico parece ser muitas vezes a representação
externa de um aspecto anteriormente negado da experiência.
Perry o
corrobora, apresentando a evidência de que o episódio psicótico é uma tentativa
desesperada de se reequilibrar e de permitir a realização de necessidades e
experiências internas frustradas. A Terapia Centrada no Cliente esforça-se por
estabelecer uma atmosfera na qual condições de valor prejudiciais possam ser
postas de lado, permitindo, portanto, que as forças saudáveis de uma pessoa
retomem sua dominância original. Uma pessoa recupera a saúde reivindicando suas
partes reprimidas ou negadas.
Estrutura
Corpo
Embora
Rogers defina a personalidade e a identidade como uma gestalt contínua, não dá
ao papel do corpo uma atenção especial. Sua teoria é baseada na tomada de
consciência da experiência; não selecciona a experiência física como diferente
em espécie ou valor das experiências emocionais, cognitivas ou intuitivas.
Relacionamento
Social
O valor
dos relacionamentos é de interesse central nas obras de Rogers. Os
relacionamentos mais precoces podem ser congruentes ou podem servir como foco
de condições de valor. Relações posteriores são capazes de restaurar a
congruência ou retarda-la.
Rogers
acredita que a interacção com o outro capacita um indivíduo a descobrir,
encobrir, experienciar ou encontrar seu self real de forma directa. Nossa
personalidade torna-se visível a nós através do relacionamento com os outros.
Na terapia, em situações de encontro e em interacções cotidianas, o feedback
dos outros oferece às pessoas oportunidade de experienciarem a si mesmas.
Através
dos relacionamentos, as necessidades organísmicas básicas do indivíduo podem
ser satisfeitas. A esperança dessa satisfação faz com que as pessoas invistam
uma quantidade de energia incrível em relacionamentos, até mesmo naqueles que
não parecem ser saudáveis ou satisfatórios.
Casamento
O
casamento é um relacionamento não usual; é potencialmente de longo prazo,
intensivo, e carrega dentro de si a possibilidade de manutenção do crescimento
e do desenvolvimento. Os melhores casamentos ocorrem com parceiros que são
congruentes consigo mesmos, que têm poucas condições de valor como empecilho e
que são capazes de genuína aceitação dos outros. Quando o casamento é usado
para manter uma incongruência ou para reforçar tendências defensivas
existentes, é menos satisfatório e é menos provável que se mantenha.
As
conclusões de Rogers sobre qualquer relação íntima a longo prazo, tal como o
casamento, são focalizadas sobre quatro elementos básicos: compromisso
contínuo, expressão de sentimentos, não-aceitação de papeis específicos e
capacidade de compartilhar a vida íntima.
1)
Dedicação e Compromisso
Cada
membro de um casamento deveria ver “a união como um processo contínuo e não um
contrato. O trabalho feito visa tanto a satisfação pessoal como a satisfação
mútua”. Uma relação é trabalho; é um trabalho tendo em vista objectivos
separados ou comuns. Rogers sugere que este compromisso seja expresso da
seguinte maneira: “Nós dois nos comprometemos a cultivar juntos o processo
mutável de nosso actual relacionamento está enriquecendo nosso amor e a nossa
vida e nós queremos que ele cresça”.
2)
Comunicação – Expressão de Sentimentos
Rogers
insiste na comunicação total e aberta. “Arriscar-me-ei tentando comunicar
qualquer sentimento persistente, positivo ou negativo, ao meu companheiro (com
a mesma profundidade com que o percebo em mim) como uma parte presente e viva
em mim”. A comunicação tem duas fases igualmente importantes: a primeira é
expressar a emoção. A segunda é permanecer aberto e experienciar a resposta do
outro.
Rogers
sugere que devemos nos comprometer tanto com os efeitos que nossos sentimentos
causam em nosso parceiro quanto com a expressão original dos sentimentos em si
mesmo Isto é mais difícil do que simplesmente “desabafar” ou “ser aberto e
honesto”. É a disposição de aceitar os riscos reais envolvidos: rejeição,
desentendimento, sentimentos feridos e retribuição.
3)
Não-Aceitação de Papéis
Numerosos
problemas desenvolvem-se na medida em que tentamos satisfazer as expectativas
dos outros, ao invés de determinarmos as nossas próprias.
Ethienny Corrêa
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