domingo, 10 de abril de 2016

Ética no Contexto Hospitalar

O psicólogo, particularmente aquele que está inserido na instituição hospitalar, defronta-se constantemente com problemas que envolvem, solicitam e exigem posicionamentos éticos, seja no trato com seus pacientes, em alguns casos vivendo no limite suportável de sofrimento, seja com seus colegas e outros profissionais com os quais divide, com maior ou menos poder e importância social, o espaço hospitalar. (OLIVEIRA, 1995)

Embora existam relatos da presença de psicólogos no contexto hospitalar mesmo antes da regulamentação profissional, segundo Campos (1988), parece razoável, a partir dos inúmeros estudos acerca da realidade da profissão no Brasil, a suposição de que somente nos últimos anos, com a mudança mais ampla da configuração do campo profissional do psicólogo, este logrou inserir-se de forma estável e significativa no ambiente hospitalar.

Na tentativa de dimensionar o campo de actuação, Campos (1988) afirma que, enquanto profissional de saúde, o psicólogo teria “papel clínico, social, organizacional e educacional”, na forma de assistência psicológica que incluiria, enquanto clientela, além do paciente e seus familiares, a equipe multiprofissional e demais funcionários do hospital; e enquanto actividades, assessorias, consultorias e interconsultas psicológicas. Lamosa (1987) vai além, sugerindo que o psicólogo que trabalha em hospitais necessitaria “desenvolver uma imagem mais ampla como profissional de saúde, assumindo seu potencial de avaliação e manejo de problemas de saúde, além daqueles usualmente tidos como da alçada do psicólogo, ou seja, o emocional e o psicopatológico”. Se suposta a irreversibilidade de sua inserção no contexto hospitalar, admite a autora que os referenciais (teóricos, académicos, práticos e éticos) da Psicologia necessitam ser revistos.

O atraso da psicologia em ocupar deu espaço, talvez tenha sido o maior responsável pela banalização do nosso campo de trabalho. Segundo Oliveira (1995), todos os outros profissionais parecem entender de psicologia e arriscam-se a fazer diagnósticos psicológicos, sejam eles médicos, enfermeiros, padres, etc. Na verdade, o que se apresenta como básico e urgente é que o psicólogo consiga afirmar o seu papel profissional, definindo suas atribuições e delimitando a ocupação do seu espaço nas instituições hospitalares. Uma vez que, de acordo com o mesmo autor, muitas vezes este profissional é colocado frente a situações em que esquece o seu papel e acaba exercendo funções que não são as suas, muitas vezes movido por motivos de pura solidariedade humana.

Atitudes como essas podem causar grandes danos à imagem da profissão. Pois pode acabar invadindo o campo de actuação de outros profissionais. “O psicólogo não é médico, não é enfermeiro, nem é assistente social. Tais profissionais não são psicólogos e estarão cometendo imprudência ética ou fazendo exercício ilegal da profissão e, portanto violando a lei, quando assim procedem”. Faz-se necessário respeitar os limites éticos da actuação profissional.

É possível interpretar as exigências postas para o profissional inserido no contexto hospitalar, na literatura referida, como sendo constituída por dois níveis. Num primeiro, situar-se-ia o exercício das actividades “usualmente tidos como da alçada do psicólogo” (Lamosa, 1987), traduzidas por Campos (1988) como os papéis “clínico, social, organizacional e educacional”. Num segundo nível, ultrapassando os papéis convencionais, o desenvolvimento de “uma imagem mais ampla como profissional de saúde, assumindo seu potencial de avaliação e manejo de problemas de saúde”. Essas exigências pressuporiam, adicionalmente, uma revisão dos referenciais da Psicologia, a formação académica aí incluída.

As actividades desenvolvidas pelos profissionais são, no essencial, de natureza clínica: psicoterapia breve com pacientes, trabalhos de suporte com familiares. Mas, ambas conteriam uma dimensão educacional. A isso, pode-se agregar uma marca da actuação do psicólogo nos hospitais: “a busca (ainda) pela definição do seu espaço e actividades no interior da instituição hospitalar parece ser uma constante. De uma certa forma, as descrições sobre as acções do psicólogo no âmbito hospitalar lembram aquelas iniciais sobre o psicólogo na escola (malgrado o fato de que esta realidade ainda persista em muitos locais): uma espécie de profissional polivalente, de prontidão para actuar quando e onde se fizer necessário”. (Witter et al., 1992).

Existe ainda a necessidade de uma melhor instrumentalização técnica, fundamentada em desenvolvimentos teóricos mais consistentes, para subsidiar as acções que ampliam os limites tradicionais, utilizando, não raro, recursos que não se coadunam com as novas exigências desse alargamento de fronteiras profissionais dos psicólogos.

Para a própria preservação do espaço destinado à psicologia na instituição hospitalar, cabe ao psicólogo demarcar com a clareza da sua prática, com os recursos de sua técnica e com as suas formulações o campo pelo qual é responsável, para ir construindo e fazendo sua história.

Ethienny Corrêa
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CAMPOS, T. C. P. O psicólogo em hospitais: Aspectos de sua actuação em hospital geral. Tese de Doutorado Não publicada, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 1988.

LAMOSA, B. W. R. O psicólogo clínico no hospital: Contribuição para o desenvolvimento da profissão no Brasil. Tese de Doutorado Não-publicada. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 1987.

OLIVEIRA, M. F; ISMAEL, S. M. – Rumos da Psicologia Hospitalar em Cardiologia – Campinas/SP: Papirus, 1995.


WITTER, G. P., WITTER, C., YUKIMITSU, M. T. C. P., & GONÇALVES, C. L. C. Actuação do psicólogo escolar e educacional no Brasil: Perspectivas através de textos. Em CFP, Psicólogo brasileiro: Construção de novos espaços (pp. 23-53). Campinas: Átomo, 1992

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