Algazarra no Parlamento
O Parlamento reúne numa sessão. Há
importantes questões a tratar. Um deputado expõe os seus pontos de vista.
Depois, fala outro do partido contrário e deita por terra o que o orador
precedente tinha dito. Nenhuma prova objectiva. Não fez o menor esforço por
compreender bem. Corta por onde lhe parece, arranca proposições do contexto,
exagera nos seus juízos e pontos de vista, põe a ridículo e torna suspeita a
opinião do seu adversário.
Mal o orador acaba o seu discurso, o
atacado pede a palavra e responde precisamente no mesmo tom, com a única
diferença de ser um pouco mais contundente. A seguir, falam outros e outros;
talvez não se tenham preocupado nada pelo assunto que o primeiro orador propôs
nem pela sua exposição; derivam a pouco a pouco para temas totalmente
diferentes. De maneira que, depois de alguns discursos, já ninguém consegue
determinar propriamente a linha da discussão. Ou então formam-se dois bandos,
que talvez venham a acabar por assumir atitudes indignas e a transformar num
alvoroço selvagem aquele diálogo para onde o POVO tinha enviado os homens da sua confiança.
Uma
pessoa até se enche de vergonha quando ouve ou lê tais coisas nos relatos das
sessões parlamentares. E ainda se lêem coisas piores! Chega-se a sentir nojo
daquela algazarra. Quem enviou os deputados para o Parlamento? Nós eleitores!
Deviam representar a nossa causa! Por conseguinte, semelhante conduta
desonra-nos a nós todos.

O Parlamento converte-se numa entidade
ergotista de mentecaptos e indisciplinados, que não fazem o mínimo esforço para
compreenderem os outros. Onde as coisas caminham assim, não se edifica a
unidade; tudo são ruínas. Em lado algum aparece a vontade comum do POVO; não vêm ao de cimo os diferentes
interesses e orientações para se poder comparar e pesar a importância que têm,
até se conseguir uma vontade comum por meio de atinadas e prudentes
observações. Não se concentram as
diferentes orientações e energias, de maneira a constituírem uma cunha poderosa
e claramente orientada, que possa abrir caminho e permitir a actuação do POVO.
Tudo se vai em lamentáveis discussões vazias de clareza, conteúdo e de rigor.

Aqueles deputados à maneira de homens
sem Estado e sem povo. Um grego diria: «como bárbaros». Cada um deles começou por considerar o outro néscio, ignorante,
perverso… de contrário não poderiam falar como falaram. Era esse o clima
dos seus olhares, dos seus pensamentos e das suas palavras, dos seus gestos.
Resultado: foram-se afundando cada vez mais e afundam todos os outros nessa
ausência de Estado e de POVO, isto
é, nessa barbárie parlamentar. Chamam a isto liberdade e democracia.

Se
um deputado eleito pelo POVO vê no homem de frente um inimigo, que é preciso
derrubar, desautorizar e meter a ridículo, não respeita a diferença, não pode
ser democrata.
Aquele que assim actua não é político, não edifica o Estado, está por
interesses pessoais. Só conhece a lei dos punhos; não passa de um bárbaro, por
mais que leve na cabeça todos os códigos e conheça tintim por tintim todos os
artifícios da politiquice. Ao passo que quem actua da outra maneira é um
verdadeiro estadista, representante do POVO
que o elegeu. Entre ele e os da oposição já existe «Estado». É preciso
civilizar os políticos para que o Povo acredite
neles.
Por J. Carlos
(Jornalista)
*Por ser português, o autor do artigo
não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.
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