domingo, 22 de janeiro de 2017

A Função pública e a burocracia


Ler o Livro «Discursos e as Notas Políticas», da autoria de Oliveira Salazar, que foram publicados entre 1938 a 1943, um capítulo que despertou a minha atenção, relacionado com o título em supra.
Assim, num dado parágrafo do seu discurso que decorreu durante um almoço oferecido na residência oficial do Presidente do Conselho, aos altos funcionários do Ministério da Finanças, por ocasião do seu abandono daquela pasta, afirmou a dada altura:
- É assim de justiça, pura justiça a palavra que ponha em relevo a colaboração do funcionário do Ministério da Finanças (ia dizer, mas tive receio, da burocracia das finanças; esta tem sido tão desacreditada, tão aviltada, que sem distinções necessárias nem eu mesmo me atreveria a fazer-lhe o elogio).
Haverá uma espécie de injustiça social, involuntária e inconsciente, neste clamor da opinião pública contra o burocrata?
O burocrata é, no simplismo e também por vezes na justeza dos juízos populares, o homem inútil que se compraz em multiplicar as formalidades, encarecer as pretensões, a amortalhar em papéis os interesses, embaraçar os problemas com dúvidas (de toda a espécie), atrasar as soluções com os despachos, obscurecer a claridade da justiça em nuvens de textos legais (?), ouvir mal atento ou desabrido as queixas e as razões do público que são o pão, ou o tempo, ou a fazenda, ou a honra, ou a vida da Nação perante o estado e a sua Justiça; trabalhando pouco, ganhar muito e certo, sem proveito nem utilidade social, parasitariamente, sorver como esponja o produto do suor e do trabalho do povo.

Estes traços têm caricatura e infelizmente aqui e acolá também retracto. De quem são as responsabilidades?
Quando nos países em desordem os políticos defendem as usas posições com a criação e distribuição de lugares às clientelas partidárias, praticam ao mesmo tempo acto imoral e ruinoso para a economia da Nação; mas quando, no aperto das crises, os mesmos responsáveis pela delapidação dos dinheiros públicos ou simplesmente pela inconsiderada extensão de serviços apregoam, como medida salvadora, o despedimento de funcionários em excesso, certo é fazer-se confusão entre problemas de moralidade administrativa e a necessidade de reforma do Estado. Quando por espírito de favoritismo pessoal ou partidário, por fraqueza ou mal entendida bondade, corrupção ou ignorância das consequências, se preferem os maus aos melhores, degrada-se a moral do Estado e comete-se acto grave contra a justiça; mas no campo do interesse colectivo isso não é o mais grave. O pior de tido é não se poder dispor de instrumentos de trabalho úteis, é funcionarem com rendimento baixíssimo e de má qualidade o serviços públicos.” (Página 277).
Até aqui é do conhecimento de todos, que o funcionário público, vive do seu lugar de trabalho, é respeitado porque se respeita, sente-se digno porque se sabe útil a quem o procura, e mesmo no mais baixo da escala, nos mestres mais humildes ele pode tocar a perfeição, segundo o pensamento de Junqueiro, pode ser-se sublime a varrer as ruas.

Todos não somos de mais, para dizer basta de tanta burocracia a reinar nas instituições públicas a que nos dirigimos, sustentadas com pelos impostos dos cidadãos. Perante esta avalanche de burocracia que há anos nos tem vindo a esmagar, não devemos dar lugar ao temor, ainda que o sentimento do medo se faça cada vez mais presente no nosso quotidiano.
Contudo, a verdade que todos sentem e ninguém se atreve a confessar é que o mundo vive em profunda crise de medo: saber como e em que condições se deve apresentar reclamações contra a burocracia, que nos vai votando descaradamente a uma indiferença contínua, no deixa andar, caso contrário fica-se na eminência de vir a perder os seus postos de trabalho e a sofrer na vida vicissitudes só pelo facto de querer contribuir de forma frontal, para o bem deste País, que desde há muito anda à deriva, esbanjando descaradamente os poucos subsídios que restam da Comunidade Europeia. Creio que não somos assim tão pacóvios como nos fazem crer.
Quem se deslocar às instituições públicas existentes em Aveiro, certificar-se-á de que a realidade é bem flagrante do que procurei descrever. Vê-se funcionários a ler revistas de entretimento e jornais, outros sentados às secretárias na cavaqueira, indiferentes ao tempo que passa, enquanto os utentes que para ali descontam, aguardam horas com a senha na mão à espera de serem atendidos.
Nem todos devem ser tidos por iguais é certo, mas, a diferença é mínima. Para esses poucos exprimo o meu profundo respeito. O vírus da burocracia e da desmotivação veio para ficar como a Toyota.

O país assim não passa da cepa torta, quando se ouve tanto em inovação, cooperação e aproximação dos cidadãos. A palavra, as promessas, os discursos nos actos de tomada de posse raramente são consequentes. 

J. Carlos
Director do Litoral Centro

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