Ler
o Livro «Discursos e
as Notas Políticas», da autoria de Oliveira Salazar, que foram
publicados entre 1938 a 1943, um capítulo que despertou a minha
atenção, relacionado com o título em supra.
Assim,
num dado parágrafo do seu discurso que decorreu durante um almoço
oferecido na residência oficial do Presidente do Conselho, aos altos
funcionários do Ministério da Finanças, por ocasião do seu
abandono daquela pasta, afirmou a dada altura:
-
É assim de justiça, pura justiça a palavra que ponha em relevo a
colaboração do funcionário do Ministério da Finanças (ia dizer,
mas tive receio, da burocracia das finanças; esta tem sido tão
desacreditada, tão aviltada, que sem distinções necessárias nem
eu mesmo me atreveria a fazer-lhe o elogio).
Haverá
uma espécie de injustiça social, involuntária e inconsciente,
neste clamor da opinião pública contra o burocrata?
O
burocrata é, no simplismo e também por vezes na justeza dos juízos
populares, o homem inútil que se compraz em multiplicar as
formalidades, encarecer as pretensões, a amortalhar em papéis os
interesses, embaraçar os problemas com dúvidas (de toda a espécie),
atrasar as soluções com os despachos, obscurecer a claridade da
justiça em nuvens de textos legais (?), ouvir mal atento ou
desabrido as queixas e as razões do público que são o pão, ou o
tempo, ou a fazenda, ou a honra, ou a vida da Nação perante o
estado e a sua Justiça; trabalhando pouco, ganhar muito e certo, sem
proveito nem utilidade social, parasitariamente, sorver como esponja
o produto do suor e do trabalho do povo.
Estes
traços têm caricatura e infelizmente aqui e acolá também
retracto. De quem são as responsabilidades?
Quando
nos países em desordem os políticos defendem as usas posições com
a criação e distribuição de lugares às clientelas partidárias,
praticam ao mesmo tempo acto imoral e ruinoso para a economia da
Nação; mas quando, no aperto das crises, os mesmos responsáveis
pela delapidação dos dinheiros públicos ou simplesmente pela
inconsiderada extensão de serviços apregoam, como medida salvadora,
o despedimento de funcionários em excesso, certo é fazer-se
confusão entre problemas de moralidade administrativa e a
necessidade de reforma do Estado. Quando por espírito de favoritismo
pessoal ou partidário, por fraqueza ou mal entendida bondade,
corrupção ou ignorância das consequências, se preferem os maus
aos melhores, degrada-se a moral do Estado e comete-se acto grave
contra a justiça; mas no campo do interesse colectivo isso não é o
mais grave. O pior de tido é não se poder dispor de instrumentos de
trabalho úteis, é funcionarem com rendimento baixíssimo e de má
qualidade o serviços públicos.” (Página
277).
Até
aqui é do conhecimento de todos, que o funcionário público, vive
do seu lugar de trabalho, é respeitado porque se respeita, sente-se
digno porque se sabe útil a quem o procura, e mesmo no mais baixo da
escala, nos mestres mais humildes ele pode tocar a perfeição,
segundo o pensamento de Junqueiro, pode ser-se sublime a varrer as
ruas.
Todos
não somos de mais, para dizer basta de tanta burocracia a reinar nas
instituições públicas a que nos dirigimos, sustentadas
com pelos impostos dos cidadãos.
Perante esta avalanche de burocracia que há anos nos tem vindo a
esmagar, não devemos dar lugar ao temor, ainda
que o sentimento do medo se faça cada vez mais presente no nosso
quotidiano.
Contudo,
a verdade que todos sentem e ninguém se atreve a confessar é que o
mundo vive em profunda crise de medo: saber como e em que condições
se deve apresentar reclamações contra a burocracia, que nos vai
votando descaradamente a uma indiferença contínua, no deixa andar,
caso contrário fica-se na eminência de vir a perder os seus postos
de trabalho e a sofrer na vida vicissitudes só pelo facto de querer
contribuir de forma frontal, para o bem deste País, que desde há
muito anda à deriva, esbanjando descaradamente os poucos subsídios
que restam da Comunidade Europeia. Creio
que não somos assim tão pacóvios como nos fazem crer.
Quem
se deslocar
às
instituições públicas existentes em Aveiro, certificar-se-á de
que a realidade é bem flagrante do que procurei descrever. Vê-se
funcionários a ler revistas de entretimento e jornais, outros
sentados às secretárias na cavaqueira, indiferentes ao
tempo que passa,
enquanto os utentes que para ali descontam, aguardam horas com a
senha na mão à espera de serem atendidos.
Nem
todos devem ser tidos por iguais é certo, mas, a diferença é
mínima. Para esses poucos exprimo o meu profundo respeito. O vírus
da burocracia e da desmotivação veio para ficar como a Toyota.
O
país assim não passa da cepa torta, quando
se ouve tanto em inovação, cooperação e aproximação dos
cidadãos. A palavra, as promessas, os discursos nos actos de tomada
de posse raramente são consequentes.
J. Carlos
Director do Litoral Centro
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