Menos areal nas praias, perda de território e uma crescente vulnerabilidade para as comunidades costeiras.
Com uma das costas mais energéticas do mundo, Portugal é um dos países mais afetados por processos de erosão no seu litoral. Segundo a Agência Portuguesa do Ambiente, no âmbito do Programa COSMO, o país perdeu mais 1313ha de território costeiro, entre 1958 e 2020. O problema não é recente. Porém, tem vindo a intensificar-se como consequência das alterações climáticas e da subida do nível médio do mar; a par da dinâmica natural dos ecossistemas costeiros e de fatores antrópicos, como a intervenção humana nos processos fluviais nos rios e albufeira ou a implementação de obras pesadas de engenharia costeira.
Estima-se que mais de 1/4 da zona costeira continental portuguesa é afetada por intensos processos de erosão nas arribas e nos sistemas praias/dunas, bem como por alterações na dinâmica de balanço sedimentar ao longo da costa e que resultam no recuo da linha de costa e na perda de areal das praias e desmantelamento dos sistemas dunares.
Contudo, a perda de território não é consequência exclusiva dos processos de erosão no litoral português. O mar, aliado a episódios erosivos, ameaça afetar uma importante parte do património natural e paisagístico do país, bem como valiosos ecossistemas naturais e, com eles, uma importante biodiversidade marinha e costeira. Por outro lado, cabe mencionar o impacto da erosão costeira e na relação com alguns dos setores estratégicos da economia portuguesa, particularmente no setor do Turismo e recreio costeiro, no setor das Pescas e Aquicultura, no Transporte a atividades portuárias. Finalmente, e considerando que as áreas mais afetadas por processos de erosão costeira coincidem com zonas de ocupação humana com uso residencial ou com atividades comerciais e industriais, com emergentes grupos de utilizadores, de lazer e desportivos, o problema torna-se particularmente crítico para as comunidades costeiras, muitas delas já consideradas em situação de risco e de crescente vulnerabilidade social e económica. Dados preliminares do Roteiro Nacional para a Adaptação 2100 demonstram que até ao final do século, mais de 60 mil portugueses serão diretamente afetados pelos problemas causados pela erosão costeira.
Por isto, e não obstante a implementação de estratégias de adaptação à erosão, compatíveis com os ecossistemas costeiros e com a conservação da natureza, como a recuperação das dunas, importa debater o futuro e a adaptação dos milhares de portugueses afetados diretamente pelos riscos costeiros, mas também pelas expectativas de fruição e utilização de muitos mais portugueses e não nacionais.
Considerando que Portugal concentra cerca de 60% da população na faixa costeira (0-25km), parece adequado que a gestão do litoral português terá de integrar, na sua estratégia, as comunidades vulneráveis aos efeitos da erosão costeira, considerando as suas pessoas, seus modos de vida, interesses, conhecimento, valores e expectativas.
De facto, um estudo recente liderado pela Universidade James Cook (Australia) demonstrou o papel essencial das pessoas e do seu envolvimento ativo na Gestão Integrada das Zonas Costeiras. O estudo supracitado, demonstrou que a participação pública no planeamento costeiro e nos processos de tomada de decisão é um fator determinante para o sucesso e sustentabilidades das medidas implementadas para a adaptação das zonas costeiras aos seus riscos, tal como o da erosão. Verificou-se que o reconciliar do interesse local com o interesse público, a articulação do conhecimento local, técnico e científico e o desenvolvimento colaborativo de soluções inovadoras para a adaptação dos sistemas costeiros aos riscos que se lhe impõem, traduzem-se em estratégias fundamentais para o sucesso de qualquer plano de gestão costeira.
No entanto, a magnitude do problema em Portugal parece ser desproporcional ao conhecimento e envolvimento do público português com os processos relacionados com os riscos e gestão costeira. Resultados preliminares de um estudo em desenvolvimento por uma equipa de investigadores do Centro de Estudos Sociais (CES) e do Departamento de Ciências da Terra (DCT) da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC) demonstram que menos de metade dos portugueses consideram os riscos costeiros, como os processos erosivos e galgamentos costeiros, muito graves. Por outro lado, a maioria dos portugueses admite desconhecer a Estratégia Nacional para a Gestão Integrada das Zonas Costeiras, os Programas da Orla Costeira e os Planos de Gestão dos Riscos de Inundações; e considera que a informação sobre os processos relacionados com os riscos costeiros é insuficiente.
Os resultados preliminares demonstram a urgência de sensibilizar e capacitar os portugueses para o seu envolvimento ativo nos processos de tomada de decisão relacionados com a gestão do litoral e fomentar o envolvimento das comunidades locais no desenvolvimento e implementação de novas soluções para a resolução dos problemas relacionados com a orla costeira portuguesa, tal como o é a erosão costeira.
O estudo encontra-se ainda em desenvolvimento e qualquer cidadão poderá participar, através do link:
https://forms.gle/qbLrqpHgrRKCVdedA
Neide P. Areia, Pedro Costa, Alexandre O. Tavares
Neide P. Areia - Investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra
Pedro Costa - Investigador no Instituto Dom Luiz, Professor Auxiliar do Departamento de Ciências da Terra (DCT) da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC)
Alexandre O. Tavares - Investigador no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. Professor Associado com Agregação no Departamento de Ciências da Terra (DCT) da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC), Presidente do Conselho de Administração das Águas do Centro Litoral.
Imagem: Público
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