domingo, 10 de fevereiro de 2019

Heroísmo católico

♦  Plinio Maria Solimeo
Revolução Francesa
Aprendemos nos livros escolares que a Revolução Francesa (1789) foi um levante contra a oligarquia da nobreza, que oprimia impiedosamente o povo francês, negando-lhe seus direitos mais fundamentais e até mesmo pão. E que a trilogia “liberdade, igualdade e fraternidade” foi um dos melhores frutos dela, pois fez nascer no mundo a consciência pelos “direitos humanos”. No entanto, esses livros praticamente nada nos diziam dos crimes e crueldades dessa sangrenta Revolução. Tal unilateralidade nos privou de uma visão objetiva dela e de seus lados satânicos, que muitos historiadores contemporâneos idôneos nos dão a conhecer, baseados em farta documentação.

Não nos estenderemos aqui sobre essa Revolução, pois nos levaria longe. Cingimo-nos a um aspecto pouco conhecido dela, que foi a Guerra da Vandeia, uma das páginas mais gloriosas da história da Igreja, quando camponeses católicos se levantaram em defesa do altar e do trono.
Serve-nos de guia o sermão pronunciado na igreja de Puy Du Fou pelo Cardeal Robert Sarah [abaixo, foto do Prelado com as carmelitas de Luçon], Prefeito da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, por ocasião do 700º aniversário da fundação das dioceses de Luçon e Maillezais, pertencentes à histórica região da Vandeia.
Revolução Francesa
Mas antes seguem alguns dados que servirão para nos situar naquele momento histórico. No dia 14 de julho de 1789 ocorreu a “Queda da Bastilha”, considerada o estopim da Revolução. No ano seguinte foi constituída uma igreja constitucional, separada de Roma, e os sacerdotes foram intimados a jurar uma “Constituição Civil do Clero”, cismática. Os que fraquejaram e juraram, foram chamados de “juramentados”, e os que resistiram, de “refratários”.
Em 1791 foi proclamada uma Monarquia Constitucional, durante a qual houve o confisco dos bens da Igreja, que também ficou proibida de receber dízimos. Nesse ano, devido ao recrudescimento da Revolução, Luís XVI tentou fugir, mas foi preso na Torre do Templo e guilhotinado em 1793.
Entre os anos de 1793 e 1794 estabeleceu-se o reino do “Terror”, durante o qual foram exterminadas entre 16 mil a 40 mil pessoas — entre elas muitos bispos, sacerdotes, religiosos e gente do povo —, consideradas “inimigas da Revolução”.
Nesse mesmo ano de 1793 iniciou-se a insurreição no sul do vale do Loire, no oeste da França, com os camponeses católicos se levantando em armas em defesa da religião e do rei. Essa insurreição durou até 1796, causando tantos danos à Revolução e exasperando de tal modo os revolucionários, que eles decidiram aniquilá-la impiedosamente a ferro e fogo, numa guerra sem quartel.
Um escritor assim descreve a sanha de alguns desses energúmenos, e a sanguinária e implacável perseguição que eles deslancharam contra os insurgentes : “Destruam a Vandeia!” (Barrère, julho de 1793); “A Vandeia deverá ser um cemitério nacional” (Turreau); “Serão todos exterminados” (Carrier); “Essa é uma gente maldita” (Lequinio). De fato, a população vandeana foi objeto de um inaudito empenho de extermínio. Prisões, campos de prisioneiros a céu aberto e barcos-prisões afundados tornaram-se leitos mortuários. No afã de acelerar os processos, recorria-se à guilhotina, aos fuzilamentos em massa e aos afogamentos. Mulheres e meninos não escaparam à carnificina. Os próprios revolucionários relataram as piores atrocidades. Do total de uma população calculada em 815.000 pessoas, a incursão republicana na Vandeia matou 117.000 habitantes — decorrência de uma “chacina populacional” cujos métodos inspirariam, no século XX, figuras como Lenine e Pol Pot. (Jean Marc Bastière, “A face oculta da Revolução Francesa”, Le Figaro Magazine, 9-2-08).
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Revolução Francesa
Falando aos responsáveis pelo parque temático de Puy Du Fou [foto ao lado], que revivem a epopeia vandeana utilizando o sistema “son et lumière”, diz o cardeal Sarah: “Vossa obra se eleva nesta terra como um cântico que evoca a lembrança dos mártires da Vandeia. Fazeis reviver a esses 300 mil homens, mulheres e crianças, vítimas do Terror! Dais a voz àqueles a quem se quis silenciar, porque rechaçaram a mentira da ideologia ateia! Rendeis homenagem àqueles a quem se pretende afogar no esquecimento, porque rechaçavam a que se lhes tirassem a liberdade de crer e de celebrar a missa!”

De modo muito apropriado, o Purpurado faz a aplicação ao nosso tempo: “Vosso trabalho é necessário especialmente em nosso tempo, que parece abobado! Frente à ditadura do relativismo, frente ao terrorismo do pensamento que, de novo, quer arrancar a Deus do coração das crianças, necessitamos reencontrar o frescor de espírito, a simplicidade alegre e ardente destes santos mártires”.
O Cardeal Sarah, em Saint-Laurent-Sur-Sèvres, rezando junto à sepultura de São Luis María Grignion de Montfort
O Cardeal Sarah, em Saint-Laurent-Sur-Sèvres,
rezando junto à sepultura de
São Luis María Grignion de Montfort
O cardeal Sarah enaltece o heroísmo dos vandeanos que, com poucos recursos, causaram tanto mal à Revolução: “Quando a Revolução quis privar os vandeanos de seus sacerdotes, todo um povo se sublevou. Diante dos canhões, estes pobres só tinham seus bastões! Frente aos fuzis, só possuíam foices! Frente ao ódio das colunas infernais, só apresentavam seu rosário, sua oração e o Sagrado Coração bordado em seu peito! [] Com seu sacrifício, [os vandeanos] impediram que a ideologia se erigisse em mestra. Graças a eles, a Revolução teve que tirar a máscara e revelar seu rosto de ódio à Deus e à fé”.
Para o antístite africano, hoje enfrentamos uma luta de algum modo tão satânica quanto aquela contra a Revolução Francesa: “Quem se levantará hoje por Deus? Quem enfrentará os modernos perseguidores da Igreja? Quem terá coragem de se levantar sem outras armas que o rosário e o Sagrado Coração para enfrentar as colunas da morte do nosso tempo que são o relativismo, o indiferentismo e o desprezo de Deus? Quem dirá a este mundo que a única liberdade pela qual se merece a pena morrer é a liberdade de crer?
Na roupa do vandeano, a esposa costuma a insígnia do Sagrado Coração de Jesus
Na roupa do vandeano, a esposa costuma
a insígnia do Sagrado Coração de Jesus
O cardeal enumera então os perigos que enfrentam os católicos de hoje: “A ideologia de gênero, o desprezo da fecundidade e da fidelidade conjugal são os novos slogans desta revolução. As famílias são hoje como outras Vandeias que é preciso exterminar. Planifica-se metodicamente o seu desaparecimento, como se fez outrora na Vandeia. Estes novos revolucionários se inquietam diante da generosidade das famílias numerosas. Burlam-se das famílias cristãs porque elas encaram tudo o que eles odeiam. Estão dispostos a lançar novas ‘colunas infernais’ sobre a África para pressionar as famílias e impor-lhes e esterilização, o aborto, a contracepção”.
O purpurado termina com este grito de vitória: “A África resistirá como o fez a Vandeia! Por todas as partes as famílias devem ser como a ponta de lança desta revolta contra esta nova ditadura do egoísmo”.
ABIM

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