quarta-feira, 7 de agosto de 2019

Religião | A catedral-fortaleza da Cristandade não pode ser destruída nem desfigurada


A catedral de Notre-Dame de Paris é sumamente emblemática, obra-prima e joia da Cristandade, lugar sagrado que pertence à História. Por isso sua perfeita restauração significa respeito à civilização, enquanto restaurá-la com traços modernos desfigura a própria civilização

Jean Goyard sendo entrevista em Pari
Jean Goyard sendo entrevistado em Paris
O atual governo francês tem colaborado para apagar a herança cultural e religiosa em toda a Europa, inclusive pelo favorecimento de maciça imigração islâmica. Dentro desse contexto o presidente Macron, após o incêndio de Notre-Dame, tem atuado para que a restauração não corresponda exatamente ao que ela sempre foi em seus 850 anos de existência, mas adquira conotações da arte contemporânea.

Em sentido oposto atua a TFP francesa, numa campanha para que a magnífica catedral seja restaurada exatamente como era, sem qualquer concessão à modernidade progressista, pois isso equivaleria à destruição de sua beleza sacral, como concebida na Idade Média, e portanto dos aspectos mais elevados de Notre-Dame que, à maneira de sua flecha destruída pelo incêndio, apontava para o Céu.

Sobre estas e outras questões, Catolicismo obteve uma entrevista exclusiva com Jean Goyard, da TFP francesa. Formado em Direito pela conceituada Université Panthéon Assas (Paris II), ele é encarregado de relações públicas da Société Française pour la Défense de la Tradition, Famille et Propriété (TFP) e da GEIE Européenne de Médias. Membro de Avenir de la Culture — entidade que age contra a “revolução cultural” na França e atua para disponibilizar aos jovens uma educação sadia — é também sócio de Droit de Naître, associação que promove campanhas em defesa da vida inocente e contra a prática do aborto. Como representante da TFP Francesa, nosso entrevistado tem atuado muito especialmente na campanha pela restauração “à l’identique” (como era antes) de Notre-Dame.

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Catolicismo — A respeito do incêndio na bela catedral de Notre-Dame de Paris, agora com o fogo debelado e as cinzas abaixadas, como o senhor avalia o impacto dessa tragédia na opinião pública francesa?

Jean Goyard — É uma comoção profunda, cuja intensidade o noticiário da mídia não permitiu medir, pois não se pode compreendê-la sem conhecer bem as relações dos franceses com Notre-Dame de Paris. Com suas torres e arcobotantes ancorados no chão de Paris, convidando por sua flecha a olhar sempre mais alto, Notre-Dame frustrava a tendência do homem à vulgaridade, a uma visão puramente intelectual, atraindo as mentes para o Céu. Por sua beleza, harmonia, equilíbrio, força e elegância, irradiava uma atmosfera de calma e esperança, que exercia no espírito dos franceses o papel de um farol. Era tal sua ação de presença, que contemplá-la já significava receber sua influência benéfica. A primeira impressão foi de estupor e desolação, e na psicologia dos franceses foi uma catástrofe, um terremoto. Mais do que uma emoção, foi um traumatismo. A chaga permanece hoje tão viva como no primeiro dia.

Catolicismo — Algo disso se estende também ao público de outros países?

Jean Goyard — Perfeitamente. Os elementos disponíveis mostram que essa reação é compartilhada mais ou menos em toda parte. Para efeito de comparação, durante os ataques às torres gêmeas em Nova York, 900 canais de TV, dentre 1.200 em todo o mundo, interromperam seus programas para relatar notícias. Sobre Notre-Dame, mais de 2.500 canais de TV, dentre 3.000, deram notícias contínuas por três dias. Nos jornais, o destino de Notre-Dame eclipsou os outros assuntos durante os dias que se seguiram. Isso é suficiente para mostrar o impacto global do evento. Recebi mensagens emocionantes do Líbano, Madagascar, Polônia, de pessoas querendo compartilhar sua dor com um francês. Incontáveis ​​foram as pessoas que choraram. Durante as campanhas da TFP francesa em contato direto com o público, na Ópera ou na estação Saint-Lazare, muitos argentinos, brasileiros, espanhóis, italianos, africanos, asiáticos nos expressaram sua solidariedade e seu amor a Notre-Dame. Da República dos Camarões, da Costa do Marfim, trabalhadores empregados em Paris me afirmaram que o incêndio lhes causou efeito análogo ao de uma punhalada no peito. A tristeza é global.

Catolicismo — Notre-Dame tem para a França significado sobretudo religioso?

Jean Goyard — Notre-Dame tem por certo um significado religioso, pois é um lugar dedicado ao culto católico. Mas não haveria comoção semelhante se um incêndio tivesse atingido a catedral da diocese de Évry, ou mesmo outras catedrais francesas, embora muito bonitas. Não faço a comparação para menosprezá-las, mas para dizer que Notre-Dame significa muito mais do que o aspecto religioso. Intimamente relacionada com a nossa história, pode-se afirmar que se identifica com ela. Durante mais de 850 anos, ela foi sempre fiel ao seu papel. Alguns até a chamavam de Velha Senhora, pois fazia parte da vida parisiense. Muitas das grandes cerimônias que pontuaram nossa história aconteceram ali — para celebrar a eleição de um Papa, as grandes vitórias militares da monarquia, os “mistérios” medievais, essas representações da vida de Cristo. Sem esquecer, ao longo do Ancien Régime, os desfiles das corporações de ofício para celebrar seu santo padroeiro. Mas Notre-Dame era ainda mais, difundia em toda a cidade um estilo, um espírito — o espírito de sacralidade e bondade. Ela sacralizou a vida temporal. O Dr. Plinio Corrêa de Oliveira lhe aplicava com adequação estas palavras das Escrituras: Monumento de beleza perfeita, a alegria do mundo inteiro. Obra-prima da arte gótica, ela nos falava da civilização cristã e da luz da Idade Média que chegou até nós.

Catolicismo — Teria havido uma permissão de Deus para aquele incêndio?

Jean Goyard — É muito natural que nos perguntemos: Por que aconteceu aquela catástrofe? Se Notre-Dame fez tanto bem, e se doravante esse bem não se fará, por que Deus permitiu tal destruição? Mas a questão também se põe de outra maneira: Ocorreria tal incêndio se a sociedade estivesse cônscia de seus valores, de sua civilização, ansiosa por preservar suas obras-primas, especialmente a mais excelente, a mais sublime, aquela que melhor representa a sua alma? Pode-se aventar, como hipótese de explicação aplicável ao caso, que quando se desvanece o espírito de uma instituição, de um país, de um império, os vermes roedores estão no seu interior, na sua “madeira”. Ainda que as formas se conservem por algum tempo, mais cedo ou mais tarde a coluna carcomida por eles se desmorona. O Império Romano sofreu esse tipo de colapso, e Notre-Dame sofreu esse fogo. Não será esse fogo um símbolo, e também uma advertência para o que está acontecendo na nossa sociedade?

Catolicismo — É possível então supor que tenha sido um castigo, um sinal da Providência Divina para a França ou para todo o mundo católico?

Jean Goyard — É difícil interpretar um evento, quando não há uma perspectiva muito clara. Mas alguma pessoa de bom senso se arriscaria a descrever nosso tempo como um apogeu da verdadeira civilização? Quando a ideologia de gênero é ensinada às crianças nas escolas? Quando diariamente se faz um aborto por minuto na França? Quando a lei ratifica o casamento entre pessoas do mesmo sexo? Quando os médicos se envolvem impunemente com manipulação genética, com procriação artificial para lésbicas, com “úteros de aluguel” para homossexuais? Quando as autoridades permitem as igrejas serem profanadas, e nelas se cometerem sacrilégios? Quando acontecem concentrações de rock com muitas blasfêmias? Quando… quando… a lista é longa demais. O fato indiscutível é que nossa sociedade está carcomida pelos vermes. Nossa Senhora advertiu sobre castigos em La Salette, em 1846; e em 1917 repetiu as advertências em Fátima. Foi ouvida? Os homens se converteram, fizeram penitência? Não é proibido comparar o fogo da catedral com o estado de nossas sociedades, em seguida aproximar ambos com as aparições da Santíssima Virgem Maria. Não há imprudência nessa aproximação.

Catolicismo — Foi pungente ver a flecha da catedral ser consumida pelo fogo, até o momento da queda. Como o senhor nota essa sinistra particularidade do incêndio?

Jean Goyard — Aquele foi o momento mais trágico. Nos vídeos da internet, ouve-se erguer naquele momento um clamor de desolação dos parisienses que se encontravam em oração, ou como observadores nas margens do Sena e na Praça da Prefeitura. Essa obra de arte, incandescente por algum tempo, travava uma luta desigual contra as chamas, fazendo pensar nessas vitórias que o mal às vezes obtém contra o bem, o demônio contra a cristandade. Ou como a morte dos mártires, quando seu corpo era derrotado pelo império da espada ou das feras, mas sua alma indomável subia para Deus. Um de meus amigos comparou a flecha de Notre-Dame a uma magnífica expressão de verticalidade pontiaguda e de impulso para o alto, bem o contrário do espírito igualitário que a França, através Revolução Francesa, disseminou pelo mundo inteiro. Outra série de imagens chamou minha atenção. No extremo oposto às duas torres havia uma cruz alta, ornamentada como um ostensório. Quando a estrutura de madeira desmoronou, essa cruz alta e fina caiu com tanta elegância, que parecia ter sido tomada pelo Anjo da Nobreza, dizendo que Deus teria a última palavra.
Jovens rezam diante de Notre-Dame em chamas

Catolicismo — Esse divino aviso poderia ser também considerado como uma misericórdia, despertando o povo francês do letargo atual?

Jean Goyard — Somente a doutrina católica introduz a noção de misericórdia. A punição às vezes se apresenta ao homem, mas sempre com o objetivo de arrependimento, de conversão, da confissão bem feita que purifica totalmente a alma de seus pecados. Nisso a concepção católica de castigo não tem nada a ver com o protestantismo. Uma reação surpreendente dos franceses, no dia seguinte ao incêndio, foi o começo de um espírito de luta renovada, que notamos precisamente na controvérsia entre os partidários de uma restauração de Notre-Dame idêntica ao que era e os partidários de sua desfiguração pela introdução da arte contemporânea no telhado da catedral. Assim os franceses, ainda sob a influência da letargia, são chamados a abandonar o estado de espírito acomodatício e suicida que os impede de reagir. Notei uma reação sintomática na revista “Le Point”: “Não amamos essa flecha como devíamos. Passávamos diante dela, erguíamos os olhos para ela e prosseguíamos no caminho, porque estávamos com pressa. Eu não amava suficientemente Notre-Dame quando ela estava lá. Como eu gostaria de poder dizer a essa flecha que a amo… mas ela não está mais lá”. É a sensação de que o irreparável chegou. Uma imensa saudade, certamente benéfica, porque com ela vem uma contrição, e no fundo a saudade do Paraíso. No dia seguinte ao incêndio, os franceses e todos os católicos do mundo acordaram, em diferentes graus, mais católicos do que no dia anterior. Sofreram, mas Deus talvez queira tirar disso um bem maior.
Pe. Jean-Marc Fournier, salvou a Sagrada Coroa de Espinhos

Catolicismo — A mídia brasileira não deu destaque a um episódio que nos pareceu muito significativo: o resgate da coroa de espinhos de Jesus Cristo, que se guardava na catedral. Poderia nos contar como isso se passou?

Jean Goyard — Foi um belo ato. O padre Jean-Marc Fournier [foto ao lado], capelão-chefe da Brigada de Incêndio de Paris, estava em serviço naquele dia. Chamado, ele pediu autorização de seu comandante para ir salvar esse inestimável ​​tesouro que é a Sagrada Coroa de Espinhos, que Cristo suportou durante a Sua Paixão, e para a qual São Luís mandara construir a Sainte Chapelle (tornada relicário da Sagrada Coroa até a Revolução Francesa). Entre muitos voluntários, o comandante dos bombeiros escolheu dez homens, que penetraram na catedral ainda não invadida pela fumaça, mas onde caíam do alto cascatas de brasas e chumbo incandescente. A segunda dificuldade era obter os códigos da arca e as chaves do relicário onde a Coroa Sagrada era guardada. Quando o capelão e alguns bombeiros afinal chegaram com as chaves, os outros já tinham conseguido extrair a Coroa, quebrando o relicário. O padre Fournier não queria também deixar as hóstias consagradas no tabernáculo em chamas, como declarou depois à TV: “Jesus Cristo está realmente presente no Santíssimo Sacramento, e qualquer um estremeceria com o pensamento de que um Ser que ele ama pudesse perecer nas chamas”. Único sacerdote dentro da catedral, naquele momento, ele procedeu a uma bênção do Santíssimo Sacramento, para que Deus poupasse seu santuário. O que se sabe, concretamente, é que as ordens perspicazes do comandante do corpo de bombeiros, a tenacidade de 400 bombeiros, e com toda certeza a ajuda de Deus, salvaram Notre-Dame da destruição.

Catolicismo — Já se tem alguma apuração sobre o incêndio ter sido provocado ou acidental?

Jean Goyard — Os meios de comunicação sentiram imediatamente que a suspeita de incêndio criminoso seria levantada. Logo no início do incêndio, e com uma segurança no mínimo desprovida de fundamento, tentaram influir na mente dos franceses no sentido de excluir essa possibilidade, repetindo exaustivamente que a hipótese criminosa estava excluída pela “investigação”. Mas a investigação nem sequer havia começado! Como então essa hipótese poderia ser a priori excluída? Diante de tudo o que se sabe ou se divulga atualmente, mudou desde o início de junho o “discurso oficial” da imprensa, e agora insiste na falta de segurança. Aponta que havia uma “falência do sistema de segurança da catedral”, e a análise dos dados mostra enorme lacuna na manutenção e na segurança contra possíveis intrusões e contra incêndios. Tal descura poderia configurar um incêndio criminoso. Mas qual seria o criminoso? Os serviços administrativos? Todos os que deveriam ter soado o alarme e não o fizeram? Membros do clero responsáveis pela catedral? Muita gente… ou seja, ninguém. Hoje se divulga que Notre-Dame sofreu uma tentativa de atentado com botijões de gás há dois anos e meio, e que a madeira da estrutura da catedral, após 850 anos, estaria como que petrificada, tornando-se dificilmente inflamável.

Catolicismo — Que atitude toma o governo francês em relação a essa catástrofe?

Jean Goyard — Aparentemente não faz nada, mas está se preparando para agir com base em um projeto de lei com caráter “ditatorial”, já aprovado pelos deputados, que permitirá ao presidente decidir sobre assuntos como o da restauração sem consultar os órgãos administrativos competentes. Lembremos, a propósito, que o presidente Macron, nos discursos da noite do incêndio e do dia seguinte, não manifestou a menor solidariedade com a dor dos católicos, nem sequer mencionou a palavra “católico”, numa atitude em sintonia com sua história pessoal e de acordo com o filão ateu existente na França. Disso se queixou oportunamente o Arcebispo de Paris, Mons. Aupetit. Além disso, Macron se referiu a Notre-Dame como edifício cultural de grande importância para a França e sua história, sem sequer mencionar a expressão “civilização cristã”! Um exercício de equilibrismo, que suscitou legítima indignação, pois Notre-Dame de Paris é antes de tudo um fruto da civilização cristã, da arte católica. Sempre pertenceu à Igreja católica, mas foi roubada pelo Estado por ocasião da Revolução francesa e não foi devolvida. O que foi furtado nunca pertence aos ladrões nem a seus descendentes. Destinada ao culto católico, Notre-Dame pertence à Igreja por direito de nascimento e direito de conquista.
Membros da TFP, no final da campanha, diante de Notre-Dame

Catolicismo — Como está transcorrendo a campanha da TFP francesa para Notre-Dame ser restaurada exatamente como era?
Jean Goyard — A campanha da TFP francesa desenrolou-se inicialmente com uma petição na internet (www.flechenotredame.org), que atinge hoje quase 100.000 signatários. Será ampliada, para que a TFP a entregue ao governo dentro do melhor cenário possível. Também enviamos aos parlamentares uma carta bem argumentada, baseada em pareceres de vários arquitetos dos monumentos históricos (um corpo profissional de muita autoridade) sobre a necessidade de preservar a missão, o acabamento estético e sacral da catedral. O terceiro vetor é a campanha de rua, que nos permite tomar contato direto com o público, conversar com ele e alertá-lo sobre as más intenções dos fanáticos da arte contemporânea, cuja iniciativa pretende desfigurar Notre-Dame.

Catolicismo — Em que pontos de Paris a campanha foi feita? Qual foi o grau de consonância do público com o objetivo da campanha?

Jean Goyard — Além das proximidades de Notre-Dame, os pontos de campanha escolhidos foram a praça da Ópera Garnier; dois pontos diante da estação Saint Lazare; a praça do Palais Royal entre a sede do Conselho de Estado e o Palácio do Louvre; o Bon Marché; a praça Victor Hugo; e o cruzamento da rua de Vaugirard com o Boulevard Pasteur. A escolha dos lugares correspondeu à necessidade de alcançar diferentes camadas da população. Na estação de Saint Lazare e no Boulevard Pasteur pudemos abordar mais ou menos todos os tipos de franceses, e me parecem estes os locais onde a campanha teve maior reatividade.

Catolicismo — Houve manifestações de oposição à campanha? Como a TFP refutava os argumentos opostos?

Jean Goyard — Sempre há quem se oponha. Aliás, se não houvesse reação contrária, indicaria que os adversários julgaram sem importância a campanha, e ela não os incomodava. Como pessoas em número considerável se sentiram incomodadas, nossos argumentos claros e apresentados com cortesia provocavam, de modo geral, uma mudança de posição, a pessoa dando-se conta do erro em acreditar nas palavras ambíguas das autoridades públicas. Houve alguns que, enquanto se afastavam, repetiam slogans correntes: “não se deve recusar a modernidade” ou “é preciso saber evoluir”. Alguns otimistas ingênuos declararam acreditar que o governo não ousaria tocar em Notre-Dame. É por causa de gente assim que até o “casamento homossexual” foi legalizado.

Catolicismo — O senhor pode nos contar algum caso concreto de mudança de posição?

Jean Goyard — Quando uma pessoa foi abordada, estava convicta de se introduzir modernidade na arquitetura de Notre-Dame. O membro da TFP mostrou-lhe então, no seu smartphone, fotos de quatro projetos. Essa pessoa ficou tão horrorizada, que assinou a petição depois de exclamar em alto e bom som: “à l’identique!”.

Catolicismo — Foi possível perceber nas ruas de Paris algo na linha do sentimento de orfandade dos católicos, e mesmo não católicos?

Jean Goyard — Sim. Os membros da TFP desceram no cais ao lado jusante de Notre-Dame, para rezar e tirar a foto de encerramento do primeiro dia de campanha. Várias pessoas olhavam atentamente, sem falar, mais ou menos contemplando e rezando. Um homem com boina de marinheiro, barba, cachimbo na boca, parecia especialmente tocado. Tinha os olhos vermelhos de quem havia chorado, e falou pouco para não exteriorizar mais a sua emoção. Disse simplesmente que já possuía o folheto da TFP, e nos observou enquanto rezávamos. Em torno de Notre-Dame, evidentemente, bem como em diversos pontos de Paris, vimos pessoas realmente emocionadas. Presenciamos também algumas que se diziam agnósticas, mas estavam furiosas contra o governo devido aos planos de introduzir arte contemporânea na estrutura de Notre-Dame. Um desses insistia: “Notre-Dame é Notre-Dame, e na Notre-Dame não se deve tocar!”

Catolicismo — Para encerrar a entrevista, pergunto se o senhor tem alguma mensagem para os brasileiros, muitos dos quais consideram a França uma segunda Pátria.

Jean Goyard — Os franceses que tivemos convivência com brasileiros sabemos quanto estes amam a França. A França das catedrais e dos castelos, não aquela da sanha contra os homens que os edificaram; a França da literatura, das artes, das paisagens doces e pacíficas; a França dos santos e heróis; a França da generosidade, da gentileza e da “douceur de vivre”. Muitos aspectos de mentalidade unem brasileiros e franceses. É notável como parece imbuído do espírito medieval tudo quanto o Aleijadinho legou para a posteridade; como se parece com a guerra dos vendeanos a epopéia dos católicos brasileiros que resistiram contra os invasores protestantes; ou ainda quando se contempla na corte imperial brasileira, no Rio de Janeiro, quanto ela teve de parecido com a belle époque francesa. Não podemos nos esquecer de que o Brasil e a França se unem na mesma família, na Casa de Orleans e Bragança, em que confluíram os sangues de São Luís (da dinastia capetíngea) e de São Nuno Álvares Pereira, fundador da Casa de Bragança. Os príncipes do Brasil, Dom Luiz e Dom Bertrand, foram muito afetados pelo incêndio da catedral de Notre-Dame, exigiram notícias sempre atualizadas, sentiram-se profundamente feridos pela catástrofe. De um lado e outro do Atlântico, muitos querem que a França retome seu lugar de Filha Primogênita da Igreja, posição da qual em grande parte ela se distanciou. Minha entrevista se encerra com um apelo a que todos rezem pela França, para que ela seja perdoada por Nossa Senhora e volte a combater ao serviço da Santa Igreja. E que a reconstrução de Notre-Dame “à l’identique” se torne para ela um primeiro passo nesse longo caminho. Peço a cada leitor, a cada brasileiro, que assine a nossa petição, acessando o link www.flechenotredame.org. Todos podem assinar, pois se trata de uma petição internacional. Assim, todos terão ajudado a França a se recuperar desta provação terrível. Muito obrigado!

ABIM


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