Manuel Santos, que liderou a investigação, tem esperança de ver o novo teste aprovado até ao final do mês, numa altura em que o Governo aposta em alargar a testagem para combater a pandemia.
Um novo teste PCR para detetar a infeção por Sars-CoV-2, desenvolvido pela Universidade de Aveiro (UA), está pronto a entrar no mercado nacional, assim que receber luz verde das autoridades de saúde. Ao contrário da zaragatoa nasofaríngea, que causa desconforto e induz as lágrimas em muitas pessoas, a nova solução nada tem de invasiva, uma vez que basta recolher uma amostra de saliva: cospe-se para um tubo de plástico (como os das colheitas de sangue), com a ajuda de um pequeno funil, e nem sequer é necessária a intervenção de um enfermeiro. “Podemos fazer isto sozinhos, seja em casa ou no local de trabalho”, sublinha o diretor do Instituto de Biomedicina (iBiMED) da UA, Manuel Santos, que liderou a investigação.
Nos últimos três meses, a sua equipa dedicou-se a criar um teste PCR alternativo, sem os constrangimentos provocados pela introdução de uma cotonete grande no nariz, quase até à zona da garganta. Para concretizar o objetivo de simplificar o processo de colheita, era imperioso ajustar a tecnologia PCR, de modo a que os laboratórios conseguissem identificar (ou descartar) a presença do novo coronavírus nas amostras de saliva. Depois de “péssimos resultados no início”, a investigação não podia ter evoluído de melhor forma. “Conseguimos chegar a um ponto em que temos um teste com uma sensibilidade tão boa ou melhor do que o da zaragatoa e com uma fiabilidade superior”, adianta Manuel Santos, referindo-se à capacidade para detetar casos positivos a partir de cargas virais mais reduzidas e também à precisão no diagnóstico, quando comparados com os testes PCR utilizados neste momento. “Em alguns casos, poucos, tivemos testes que deram negativo com a zaragatoa e positivo com a saliva”, acrescenta, para reforçar a ideia de que “há menos falsos negativos com amostras de saliva”. Uma possível explicação para esta melhor fiabilidade, nota Manuel Santos, pode estar no facto de nem sempre ser possível realizar uma boa colheita com a zaragatoa: “Como é muito desconfortável, sobretudo as crianças e os idosos retraem-se muito, e por vezes não chega à nasofaringe.”
Kit de testagem a um euro
Os PCR são testes que apresentam um grau de fiabilidade maior do que os antigénios (os chamados testes rápidos), além de permitirem a deteção do vírus quando a sua presença no corpo não é tão intensa, por exemplo em pessoas assintomáticas. Numa altura em que o Governo anunciou a intenção de aumentar a testagem para melhor controlar a pandemia da covid-19, o diretor do iBiMED considera que os testes de saliva poderão “ter um impacto muito significativo” nesse plano. Além de mais práticos e fiáveis, serão também mais baratos do que os atuais PCR, garante Manuel Santos. Não só porque os custos do kit de colheita de saliva (tubo e funil), desenvolvido através de uma parceria com a empresa portuguesa Muroplás, andarão à volta de um euro e dispensam o recurso a cuidados de enfermagem, mas também porque o novo método vai permitir uma “maior automação em laboratório”. Em vez de uma amostra de cada vez, explica o investigador, vai ser possível analisar 10 ou 20 ao mesmo tempo, o que será especialmente útil em casos de probabilidade reduzida de infeção, como as pessoas com contactos de baixo risco que vão passar a ser testadas. Se a probabilidade for alta, pelo contrário, já não se justificará a opção, uma vez que, depois, seria necessário repetir o processo em laboratório para identificar qual ou quais das amostras continham o vírus.
Manuel Santos sublinha que a deteção do Sars-CoV-2, através de colheitas de saliva, está autorizada nos Estados Unidos da América, desde abril, em testes PCR, tendo recebido entretanto o aval em países europeus como Espanha, França ou Itália. Portugal também já viabilizou este método alternativo mas apenas para testes antigénio. Agora que a Universidade de Aveiro apresenta uma solução ao nível dos testes PCR, o diretor do iBiMED tem esperança de que o Infarmed dê luz verde ao kit e ao novo teste “até ao final de fevereiro”.
A Muroplás, enfatiza, é “uma empresa de engenharia de plásticos certificada para a área médica” e não terá problemas em produzir kits em massa, assim como os laboratórios já podem trabalhar a partir das colheitas de saliva para detetarem casos positivos. “Do nosso lado está tudo pronto para o teste ser aprovado”, remata.
RUI ANTUNES / Jornalista
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