“Em política, o que parece, é”, acertou António Salazar, antigo primeiro-ministro português. No mesmo rumo, Gustavo Capanema afirmava que em política a versão vale mais do que o fato. Michel Temer deveria ouvi-los.
Vamos ao caso. O ministro Eliseu Padilha anunciou de passagem que em setembro o governo recriará o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). O motivo fundamental, segundo noticiaram órgãos de divulgação, é a tentativa de arvorar bandeiras sociais. Daria ao governo maior apoio popular (balela), acenaria para setores sociais que costumam se identificar com partidos de esquerda (verdade, mas dali não viria apoio). A reforma agrária seria acelerada (continuando a torrar rios de dinheiro público num programa demolidor).
Em visita ao gabinete presidencial, foi o que, semanas antes, patrocinados pelo deputado Paulinho da Força, exigiram de Temer dirigentes da Frente Nacional de Luta Campo e Cidade (FNL) e, ali também mimado, o ex-líder do MST José Rainha. Carlos Lopes, dirigente da FNL, declarou na saída: “Na reunião, falamos sobre a extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário. O campo não aceitará isso. Esta foi a forma como a FNL se projetou. E ele assumiu o compromisso de construir as condições para que o MDA volte”.
José Rainha foi dirigente do MST. Em 2007 abandonou o movimento porque era (e continua) linha auxiliar do PT. Então no governo, o PT dificultava a generalização das invasões. Queria as mãos livres. O mesmo Rainha, agora inexplicavelmente paparicado como eventual apoio precioso, foi condenado a 31 anos e 5 meses de prisão por estelionato, formação de quadrilha e extorsão. Recorre em liberdade. Outro fato que precisa ser gritado dos telhados: em abril passado o TCU mandou parar o processo de reforma agrária, detectou 578 mil benefícios irregulares. Ladroagem, favoritismos, desvios de dinheiro público no meio do constante caos administrativo.
Existe no ar cheiro forte de que o disparate anterior não foi eliminado, permanecendo a coisa igual nas linhas gerais. Pois na contramão de severíssimo e indispensável ajuste nas contas públicas, o governo Temer anuncia que, na prática, vai continuar torrando dinheiro público com uma política que em nada aumenta a produção no campo, não melhora a situação dos agricultores mais necessitados, além de consolidar estruturas de agitação, do tipo MST e FNL. Estes se locupletam política e financeiramente com o assistencialismo estatal. Decorrência forçosa, afugentará do campo investidores temerosos das consequências do inesperado e escandaloso apoio de cima para agitadores profissionais. Tudo acontece no momento em que representantes do empresariado e operadores do mercado se dizem temerosos de que o governo não disponha de força política para tomar as necessárias medidas de recuperação econômica. Não adiantam a respeito desmentidos ad hoc, nem enunciados de boas intenções, que os fatos desmentirão. O público mantém a péssima impressão anterior.
É lógico, expressaram sua estranheza filiados da Frente Parlamentar da Agropecuária, entidade que congrega cerca de 200 deputados federais e senadores. Entre eles, o senador Caiado, que afirmou ser contra o discurso de austeridade do governo. Ele acrescentou que o Ministério do Desenvolvimento Agrário foi criado por Lula por questões ideológicas para contemplar setores do PT (lembro, entregue a correntes radicalizadas do PT, adversárias históricas do agro). Concluiu o senador goiano: “Talvez porque o PT e o PMDB estiveram juntos por muito tempo, essa ideia contaminou o PMDB. O Temer poderia se livrar desse tipo de contaminação ideológica”. Na mesma direção manifestaram seu desacordo os deputados Onyx Lorenzoni e Nilson Leitão, para os quais é prejudicial “ceder a este tipo de pressão”.
Aqui aparece um ponto indispensável das agendas da Frente Parlamentar da Agropecuária e da CNA. Tem relação não apenas com a saúde do campo, mas pode influir fortemente no futuro do Brasil. A História não as perdoará se, por comodismo, o deixarem de lado. Não custa recordar, toda a política da reforma agrária é um dos vários “tumores de estimação” que intoxicam o Brasil. É politicamente incorreto apontar a bagunça larápia com que a reforma agrária foi executada e a desgraça escancarada para todos que ela trouxe ao campo.
Michel Temer garantiu há pouco: “As pessoas se acostumam a [achar,] quem está no governo não pode voltar atrás. Quem está no governo, se errou, não tem de ter compromisso com o erro. Somos como o JK, nós não temos compromisso com o equívoco. Portanto, quando houver equívoco, nós reveremos”.
Michel Temer precisa ouvir Michel Temer. Precisa ouvir JK. Esquecer esta bobagem (queria dizer providência demolidora) de recriar o MDA. E, finalmente, executar o programa de reconstrução nacional. É o que dele esperam os brasileiros patriotas, ansiosos de não ver desperdiçada essa ocasião, talvez única nos últimos tempos, de colocar bases para um futuro pátrio de prosperidade e grandeza cristã.
Fonte: abim
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