sexta-feira, 19 de maio de 2017

Macroscópio - O que pensam os republicanos do seu homem na Casa Branca?

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Macroscópio

Por José Manuel Fernandes, Publisher
Boa noite!
 
Passaram pouco mais de 100 dias de Presidência Trump e uma sucessão de casos – as suspeitas de ligações da sua campanha com a Rússia, a demissão inopinada do director do FBI, a alegada passagem de informação confidencial aos russos, as atabalhoadas explicações para isto tudo e o nomeação de um procurador especial para investigar as possíveis interferências de Moscovo no processo eleitoral fizeram descer os níveis de aprovação do Presidente para níveis históricos num início de mandato, criaram dificuldades inesperadas à agenda legislativa dos republicanos e levaram a que se começasse a falar de “impeachment”. Ler a imprensa norte-americana é encontrar um coro de críticas até porque – e nesse ponto Trump terá razão – a quase totalidade dos jornais é abertamente hostil à Casa Branca. Contudo não são os jornais que mandam – é a maioria republicana que domina as duas câmaras do Congresso. Pelo que, neste Macroscópio, procurei ver o que pensam os republicanos, ou pelo menos os seus colunistas mais conhecidos. O retrato não é lisonjeiro para Trump, mas a hipótese de destituição parece longínqua.
 
Mas comecemos pelo que pode acontecer. Primeiro, o ponto da situação do Observador – Pode haver ‘impeachment’ de Trump? 11 perguntas e respostas –, pelas minhas próprias dúvidas, num pequeno vídeo – Posso ter-me enganado e Trump afinal não fica quatro anos – e pela interrogação da The Atlantic: How Does This End? Four alternatives for the scandal-plagued presidency of Donald Trump. Essas quatro alternativas são: a) Trump Is Impeached; b) Trump Resigns; Trump Rebounds e c) Trump Trudges On. Conclusão? Nenhuma, por enquanto: “Trump takes great pride in the world-stunning story of his political rise. But whether it ends with a bang or a whimper now depends largely on forces beyond his control”.
 
Interessante é também ler o editorial da Spectator, desta semana, no qual a venerável revista inglesa se pergunta se Is the Trump presidency in its last days? A resposta continua a ser um ponto de interrogação, mesmo que se considere que Trump pode sobreviver aos casos dos últimos dias: “All the brouhaha about his shady links to Russia and his corruption can still be passed off as tittle-tattle. The Trump presidency is not finished, but it is in deep crisis. Unless he can quickly correct the image of himself as a reckless charlatan who is unworthy to lead the free world, he will not see out his first term.”
 
Mas como há muitas aspectos que Trump de facto já não controla, é bom começar a olhar para o que dizem alguns dos muitos republicanos que nunca aceitaram bem a sua candidatura, como o senador John McCain. Para o respeitado veterano de guerra, e de acordo com a Weekly Standard, Controversies Surrounding Trump Reaching 'Watergate Size and Scale'. Em concreto: “Asked what Trump should do, McCain again referred to the Nixon presidency and said, "get it all out" before the public, "no matter what it is." "Same thing that you and others advised Richard Nixon," he said. "It's not going to be over until every aspect of it is thoroughly examined and the American people have made a judgment, and the longer you delay, the longer it's going to last."
 
McCain, recorde-se, foi o candidato dos republicanos nas eleições presidenciais de 2008, as primeiras ganhas por Obama. Na altura um dos grupos que mais veementemente o apoiou foi o dos chamados neoconservadores, um grupo que agora esteve quase todo contra Trump, e que continua ainda mais ferozmente anti-trumpista depois destes seus primeiros meses na Casa Branca. Vejamos alguns exemplos:
  • After Trump, uma crónica de William Kristol, o fundador da Weekly Standard e uma das principais figuras do movimento neoconservador, já pensa no dia seguinte: “One senses that Americans are already experiencing a healthy revulsion against the embarrassing political scene in which we find ourselves. What comes next is taking control of our fate and turning that revulsion into the construction, after Trump, of a new politics of liberty, a new ethic of responsibility, and a new vision of national greatness.”
  • Republicans Need to Abandon the Trump Ship ASAP, um texto de Max Boot, um historiador que também costumava escrever na Weekly Standard e que agora, na Foreign Policy, faz uma extraordinária confissão e um veemente apelo: “Given the unwillingness of Republicans to act as a check on Trump’s abuse of power, the only remedy that I can see lies in the 2018 midterm elections. It pains me to say this as someone who spent 30 years as a loyal Republican — I re-registered as an independent on Nov. 9 — but I agree with Mark Salter, Sen. John McCain’s former chief of staff, who tweeted: “Words I thought I’d never say: the security of the United States might now depend on electing a Democratic Congress in 2018.”
  • Those who serve Trump should ask themselves: Why am I still here?, do ensaísta Robert Kagan, que no Washinton Post se dirige directamente aos “adultos” de quem se esperava que, aceitando servir na Casa Branca de Trump, lá conseguissem impor alguma ordem: “It’s hard for anyone on the outside to judge exactly when the time is right for decent, honorable people to call it quits. Only they can assess when the good they do no longer outweighs the bad they cannot prevent and in which they inevitably become complicit. But they do need to face the question.”
 
Mas se esta linha de argumentação dos neoconservadores não surpreende, pois eles encontravam-se entre os republicanos que mais se opuseram à candidatura de Trump, vejamos o que escrevem alguns dos mais conhecidos colunistas conservadores:
  • No New York Times a mais conhecida das vozes republicanas é Ross Douthat, que entende que existe uma saída constitucional, mas radical: The 25th Amendment Solution for Removing Trump. Esta 25ª emenda foi aprovada depois da morte de John Kennedy e permite que os membros do Governo declarem que o Presidente é incapaz de governar, desencadeando dessa forma um processo de destituição. Este colunista defende que esse é o caminho a seguir: “There will be time to return again to world-weariness and cynicism as this agony drags on. Right now, though, I will be boring in my sincerity: I respectfully ask Mike Pence and Paul Ryan and Mitch McConnell to reconsider their support for a man who never should have had his party’s nomination, never should have been elevated to this office, never should have been endorsed and propped up and defended by people who understood his unfitness all along. Now is a day for redemption. Now is an acceptable time.”
  • Charles Krauthammer, provavelmente o colunista conservador mais influente do país, também não podia estar mais contra Trump, mas pensa que recorrer à 25ª emenda seria um erro terrível. Em The guardrails can’t contain Trump defende no Washington Post: “Trump’s behavior is deeply disturbing but hardly surprising. His mercurial nature is not the product of a post-inaugural adder sting at Mar-a-Lago. It’s been there all along. And the American electorate chose him nonetheless. A decent respect for constitutional governance requires banishing even the thought of invoking the 25th Amendment. What to do? Strengthen the guardrails. Redouble oversight of this errant president. Follow the facts, especially the Comey memos. And let the chips fall where they may. But no tricks, constitutional or otherwise.”
  • Já Jennifer Rubin, que anima o blog conservador Right Turn no mesmo Washington Post explica Why impeaching Trump is no longer out of the question: “Finally, Trump went to war with the media and the intelligence community, trying to destroy sources of objective truth. This was a grave error insofar as both those institutions are incentivized to demonstrate their professionalism, courage and devotion to the Constitution. The speed with which new, damning facts surface will likely increase. Trump chose to demonize the wrong people.
 
Mas então já estão todos contra Trump mesmo entre os colunistas conservadores? Calma. Apesar de o tom geral ser bastante crítico, há vozes que recomendam prudência e que se dê ao Presidente o tempo necessário para que uma sua eventual destituição não apareça junto do eleitorado como fruto de mais uma “conspiração das elites de Washington”. É o que defende, por exemplo, Robert W. Merry na The American Conservative, em Removing Trump Won’t Solve America’s Crisis. Na opinião deste colunista, “The elites are the problema”. Ou seja: Yes, Trump is a disaster as president. He lacks nearly all the qualities and attributes a president should have, and three and a half more years of him raises the specter of more and more unnecessary tumult and deepening civic rancor. It could even prove to be untenable governmentally. But trying to get rid of him before his term expires, absent a clear constitutional justification and a clear assent from the collective electorate, will simply deepen the crisis, driving the wedge further into the raw American heartland and generating growing feelings that the American system has lost its legitimacy.”
 
Também o historiador Niall Ferguson coloca alguma água na fervura numa coluna no Rhe Boston Globe, This isn’t tyranny — it’s Trumpery:  “At this point, the prophets of tyranny loudly bewail the depravity of the Republican Party. How can they give the tyrant Donald this cover when the Constitution cries out for his impeachment? Give me a break. There have been multiple presidential scandals in the 227 years since the Constitution was finally ratified. Rarely has a party abandoned its man in the White House. That’s not tyranny. It’s democracy. It will be a different story if Trump’s approval numbers slump and the Republicans get destroyed 18 months from now.”
 
Algo de semelhante também defende Nick Gillespie no site Reason, a partir de uma perspectiva libertária. Para ele All This Impeachment Talk Is Pure Trump Derangement Syndrome: “That man in the White House is vulgar, disrespectful, self-involved, maybe even dangerous. So?” Mais: “One thing is clear: Cleaving to right/left, conservative/liberal, Republican/Democrat tribes in a world in which more and more people define themselves as libertarian isn't going to work. Neither will falling for fake-news narratives about Trump's historical badness. We need a new politics that is ultimately based on policy, not personalities; policy, not politics; and policy, not partisanship. We need to demand more of our elected representatives and we need to start yesterday.”
 
E que dizer da nomeação de Mueller, um antigo director do FBI, para dirigir as investigações às interferências russas na campanha? Também neste ponto os editorialistas mais próximos dos republicanos estão divididos:
  • O Wall Street Journal, em editorial, considerou essa nomeação um erro: The Special Counsel Mistake, considerando que o adjundo do Procurador-Geral cedeu às pressões da oposição democrata e da comunicação social quando lhes devia ter feito frente: “Rosenstein bends to political pressure, and here we go again”. Para a bíblia da imprensa financeira de Nova Iorque, “These expeditions rarely end well for anyone, and Democrats are hoping this one will bedevil the Trump Administration for the next four years.
  • Já Erick Erickson, da Fox News, tem uma posição radicalmente oposta, defendendo que Mueller returns and Republicans should rejoice. Em concreto, “Instead of fretting, Republicans should be reassured by the Mueller appointment.  The Department of Justice has just blown up a Democrat talking point that Jeff Sessions and those beneath him on the DOJ organizational chart were too partisan to ever do anything like this.  And once Mueller gives the president a pass, the rest of the Democrat arguments will collapse, too.”
 
Algo deverá contudo acabar por ser determinante na posição dos republicanos: perceberem até que ponto manterem-se no barco de Trump pode comprometer as suas expectativas eleitorais nas eleições de 2018. O receio de que possam perder  maioria no Congresso, como sucedeu com Obama e os democratas em 2010, poderá determinar o grau de envolvimento dos eleitos com o seu homem na Casa Branca. Tanto mais que, como notou o cientista político William A. Galston no Wall Street Journl numa coluna onde analisa as sondagens mais recentes – Trump’s Tanking Approval Numbers – a verdade dos números parece apontar para que “Supporting the president in 2017 could prove costly for Republicans in 2018”.
 
Por outro lado, a sucessão de casos envolvendo a Casa Branca pode também prejudicar a agenda legislativa republicana, algo que Noah Rothman analisa Trump May Have Already Lost the GOP Moment, um texto importante publicado pela Commentary: “We are in the grip of some magical thinking. The cascade of controversies, unforced errors, and erratic behaviors gumming up the works in Washington D.C. is a feature of the Trump presidency, not a bug.Now, with the GOP agenda in Congress stalled amid a suffocating barrage of scandals.”
 
Estes dois últimos pontos de vista são tão ou mais relevantes quanto Donald Trump dificilmente cairá se a maioria dos congressistas republicanos se mantiver do seu lado, como a maioria dos congressistas democratas se mantiveram do lado de Bill Clinton aquando da tentativa de impeachment suscitada pelo caso Monica Lewinsky. Mas isso é tema para seguirmos com atenção nas próximas semanas ou mesmo meses. Para já Trump está de partida para a sua primeira grande viagem internacional, e nós de saída para um fim-de-semana que se anuncia, pelo menos em Portugal, glorioso. Tenham bom descanso e boas leituras. 

 
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