PIRRONICE DE (ANO) VELHO
Já foi comprar o jornal? Se não o fez já ou estava a pensar fazê-lo, fique a saber que faz parte de uma espécie em vias de extinção.
Quando encerra um jornal morre um fragmento da nossa vida. Aquele que está ligado ao odor das páginas e da tinta que nos mancha os dedos. Aos acontecimentos desvendados através dos seus redatores, fotógrafos, de quem o imprimiu, de quem o levou ao quiosque e de quem o vendeu. A morte de um jornal é o primeiro passo para o falecimento do jornalismo. Do mais clássico ao mais moderno. Do que criava a burguesia emergente que se opunha ao antigo regime aos que promoviam a imprensa proletária que agitavam consciências nas fábricas, nas ruas e nas barricadas. O que misturava o cheiro a rapé dos salões de época com o suor do medo emanado dos jornais clandestinos. Quando pára uma rotativa a liberdade de expressão é derrotada.
Jornalismo de proximidade, de rua, colado à realidade, lutando contra os elementos. Como centenas de profissionais continuam a tentar fazer diariamente, em cada canto do mundo, face às adversidades. Adversidades caracterizadas por intimações, umas mais veladas que outras, ou pelo politicamente correto tão em voga. Os apoios estatais ou não existem ou estão perpetuamente atrasados. Triste fado daqueles que dão couro e cabelo para fazer jornalismo local e regional. Mas não iludamos responsabilidades. Não esqueçamos a cota de culpa que nos toca como consumidores de cultura. Os jornais são produto de uma modernidade que deu lugar a uma nova época. A da imediatez do audiovisual, das redes e da cultura do efêmero.
A erosão acelerou drasticamente. Os jornais só eram essenciais para os anunciantes quando eram essenciais para os leitores. Aparentemente ninguém gosta de fazer anúncios em jornais. Acontecia, simplesmente, porque funcionava. Para um jovem (de hoje), comprar um pedaço de árvore morto (que por sinal, está mais caro) sobre o qual se estampam as notícias de ontem, onde não se pode clicar, nem interagir, é coisa sem sentido.
Por tudo isto, quando morre um jornal morre parte do nosso ser. Mas, não ia comprar o jornal? Vá, por favor. E guarde-o, não vá o diabo tecê-las. Pode ser que acabe por ter um valor arqueológico interessante.
In BRADOS DO ALENTEJO 29/12/2022
Editorial
NUNO MOURINHA
NB: Artigo enviado pelo Amigo José Rui M. Rabaça
Nenhum comentário:
Postar um comentário