sexta-feira, 6 de novembro de 2015

A MULHER NO FASCISMO - TOTAL AUSÊNCIA DE DIREITOS

A MULHER NO FASCISMO - TOTAL AUSÊNCIA DE DIREITOS


Trinta anos volvidos sobre a Revolução de Abril, é importante recordar a situação anterior da mulher na sociedade portuguesa, caracterizada pela ausência total de direitos. E porque há quem queira branquear a história do fascismo, evocando direitos e respeito pela mulher, recordemos, porque a memória pode ser curta, alguns aspectos em várias áreas da sua vida.

No trabalho

– Em 1974, apenas 25% dos trabalhadores eram mulheres; apenas 19% trabalhavam fora de casa (86% eram solteiras; 50% tinham menos de 24 anos).

– Ganhavam menos cerca de 40% que os homens.

– A lei do contrato individual do trabalho permitia que o marido pudesse proibir a mulher de trabalhar fora de casa.

A mulher no fascismo - Total ausência de direitos

– Se a mulher exercesse actividades lucrativas sem o consentimento do marido, este podia rescindir o contrato.

– A mulher não podia exercer o comércio sem autorização do marido.

– As mulheres não tinham acesso às seguintes carreiras: magistratura, diplomática, militar e polícia.

– Certas profissões (por ex., enfermeira, hospedeira do ar) implicavam a limitação de direitos, como o direito de casar.


Na família

– O único modelo de família aceite era o resultante do contrato de casamento.

– A idade do casamento era 16 anos para o homem e 14 anos para a mulher;

– A mulher, face ao Código Civil, podia ser repudiada pelo marido no caso de não ser virgem na altura do casamento.

– O casamento católico era indissolúvel (os casais não se podiam divorciar).

– A família é dominada pela figura do chefe, que detém o poder marital e paternal. Salvo casos excepcionais, o chefe de família é o administrador dos bens comuns do casal, dos bens próprios da mulher e bens dos filhos menores.

– O Código Civil determinava que “pertence à mulher durante a vida em comum, o governo doméstico”.

– Distinção entre filhos legítimos e ilegítimos (nascidos dentro e fora do casamento): os direitos de uns e outros eram diferentes.

– Mães solteiras não tinham qualquer protecção legal.

– A mulher tinha legalmente o domicílio do marido e era obrigada a residir com ele.

– O marido tinha o direito de abrir a correspondência da mulher.

– O Código Penal permitia ao marido matar a mulher em flagrante adultério (e a filha em flagrante corrupção), sofrendo apenas um desterro de seis meses;

– Até 1969, a mulher não podia viajar para o estrangeiro sem autorização do marido.

Saúde Sexual e Reprodutiva

– Os médicos da Previdência não estavam autorizados a receitar contraceptivos orais, a não ser a título terapêutico.

– A publicidade dos contraceptivos era proibida.

– O aborto era punido em qualquer circunstância, com pena de prisão de 2 a 8 anos. Estimavam-se os abortos clandestinos em 100 mil/ano, sendo a terceira causa de morte materna.

– Cerca de 43% dos partos ocorriam em casa, 17% dos quais sem assistência médica; muitos distritos não tinham maternidade.

– A mulher não tinha o direito de tomar contraceptivos contra a vontade do marido, pois este podia invocar o facto para fundamentar o pedido de divórcio ou separação judicial.


Segurança Social

– O regime de previdência e de assistência social caracterizava-se por insuficiente expansão, fraca cobertura de riscos e prestações sociais com baixo nível de protecção social.

– O número de trabalhadores(as) abrangidos com o direito a pensão de velhice era muito reduzido. Pouco antes do 25 de Abril, o número de portugueses a receber pensão era cerca de 525 mil.

– Não existia pensão social, nem subsídio de desemprego.

– A pensão paga aos trabalhadores rurais era muito baixa e com diferenciação para mulheres e homens.

– Não existia pensão mínima no Regime Geral e a pensão média, o abono de família e de aleitação atingiam valores irrisórios.

– As mulheres, particularmente as idosas, tinham uma situação bastante desfavorável. A proporção de mulheres com 65 anos e mais que recebia pensões era muito baixa, assim como os respectivos valores.

Infraestruturas e equipamentos sociais

– Em 1973 havia 16 creches oficiais e a totalidade, incluindo as particulares, que cobravam elevadas mensalidades, abrangia apenas 0,8% das crianças até aos 3 anos de idade.

– Não existiam escolas pré-primárias públicas e as privadas cobriam apenas 35% das crianças dos 3 aos 6 anos de idade.

– Quase 50% das casas não tinha água canalizada e mais de metade não dispunha de electricidade.

Direitos cívicos e políticos

– Até final da década de 60, as mulheres só podiam votar quando fossem chefes de família e possuíssem curso médio ou superior.

– Em 1968 a lei estabeleceu a igualdade de voto para a Assembleia Nacional de todos os cidadãos que soubessem ler e escrever. O facto de existir uma elevada percentagem de analfabetismo em Portugal, que atingia sobretudo as mulheres, determinava que, em 1973, apenas houvesse 24% dos eleitores recenseados.

– As mulheres apenas podiam votar para as Juntas de Freguesia no caso de serem chefes de família (se fossem viúvas, por exemplo), tendo de apresentar atestado de idoneidade moral.

Dados estatísticos

• Esperança de vida das mulheres:
70,8 anos (1970)
80,6 anos (2002)

• Taxa de mortalidade infantil:
(permilagem)
37,9% (1974)
5,0% (2002)

• Taxa de mortalidade materna:
(por 100 mil nados vivos)
73,4% (1970)
2,5% (2000)

• Partos em estabelecimentos de saúde:
37,5% (1970)
99,5% (2000)

• Analfabetismo:
33,6% (1970)
9,0% (2001), dos quais 11,5% mulheres, 6,3% homens.

• Taxa de actividade feminina:
19% (1974)
46% (2003)

• Feminização do ensino superior:
44,4% (1970-71)
56,0% (2001)

• Taxa de cobertura:
– Água canalizada:
47,0% das casas (1970)
97,4% das casas (2001)

– Esgotos:
58,0% (1970)
96,7% (2001)

– Electricidade:
63,0% (1970)
99,6% (2001).


Aberrações no tempo do fascismo...

– Em 1932, em todos os manuais de leitura estava incluída a seguinte frase: “Na família, o chefe é o pai; na escola, o chefe é o mestre; na igreja, o chefe é o padre; na Nação, o chefe é o governo.”

– Em 1936, o Ministério da Educação proibiu as professoras de usar maquilhagem e indumentária que não se adequasse à “majestade do ministério exercido”; as professoras só podiam casar com a autorização do Ministro, concedida apenas desde que o noivo demonstrasse ter “bom comportamento moral e civil” e meios de subsistência adequados ao vencimento de uma professora.

– Salazar declarava: “Nos países ou nos lugares onde a mulher casada concorre com o trabalho do homem (...) a instituição da família, pela qual nos batemos, como pedra fundamental de uma sociedade bem organizada, ameaça ruína.” E “Portugal é um país conservador, paternalista e – Deus seja louvado – ‘atrasado’, termo que eu considero mais lisonjeiro do que pejorativo.”

– Em muitas localidades, quando uma mulher morria os sinos dobravam menos vezes do que quando era um homem.


25 de Abril de 1974
Uma Revolução democrática e nacional
Uma Revolução para as mulheres

O 25 de Abril de 1974 representou para as mulheres portuguesas uma autêntica revolução. Abriram-se as portas para a conquista de um lugar digno na sociedade, em igualdade de direitos com o homem, e não numa mera posição subalterna. As medidas revolucionárias na área do trabalho, da segurança social, do direito da família, a criação de equipamentos sociais (creches, jardins de infância, lavadouros públicos,...) e de infraestruturas básicas (rede de água, esgotos, electricidade), o alargamento e o reforço dos serviços públicos, tiveram repercussões imediatas nas suas vidas.


A título de exemplo:
– Fixação do salário mínimo nacional (DL 212/74, de 27.05);

– Aumento generalizado de salários, garantia de emprego, férias, subsídio de férias e de Natal; diminuição das diferenças salariais, supressão do tratamento legal ou convencional claramente discriminatório;

– Abertura às mulheres das carreiras da magistratura judicial e do ministério público e dos quadros de funcionários da justiça (DL 251/74,12.06), carreira diplomática (DL 308/74, de 6.07), a todos os cargos da carreira administrativa local (DL 251/74, de 22.06);

– Abolidas todas as restrições baseadas no sexo quanto à capacidade eleitoral dos cidadãos (DL 621-A/74, de 15.11);

– Alteração do artigo XXIV da Concordata, passando os casamentos católicos a poder obter o divórcio civil (DL 187/75, de 4.04);

– Abolido o direito do marido abrir a correspondência da mulher (DL 474/76, de 16.06);

– Revogadas disposições penais que reduziam penas ou isentavam de crimes os homens, em virtude das vítimas desses delitos serem as suas mulheres ou filhas (DL 262/75, de 27.05);

– Aprovação da Constituição em 1976, que consagrava a igualdade entre mulheres e homens em todos os domínios da vida, e cuja entrada em vigor determinou a revogação de todo o direito discriminatório ainda existente;

– Ampliação do período de licença de maternidade para 90 dias (DL 112/76, de 7.02), 60 dos quais teriam de ser gozados após o parto, estando abrangidas todas as trabalhadoras;

– Entrada em vigor, em 1978, da revisão do Código Civil (DL 496/77, de 25.11); na família a mulher deixa de ter estatuto de dependência para ter estatuto de igualdade com o homem;

– Criação das consultas de planeamento familiar nos centros de saúde materno-infantil (Despacho do Secretário de Estado de Saúde, 16.03.76).


Marcos importantes - A Constituição de 1976

O artº 13º estabeleceu que todos são iguais perante a lei. O artº 36º que os cônjuges tinham direitos e deveres iguais no casamento e que os filhos nascidos fora do casamento não podiam ser objecto de discriminação.

Foram estabelecidos direitos e deveres sociais, tais como: segurança social (artº 63º), saúde (artº 64º), habitação (artº 65º).

É atribuída ao Estado a incumbência do desenvolvimento de uma rede nacional de assistência materno-infantil e a divulgação dos métodos de planeamento familiar [artº 67º, al. b) e d)].

Reconhecimento da maternidade como valor social eminente, e o direito a uma licença de parto sem perda de retribuição e quaisquer regalias (artº 68º).

Garantido o direito ao trabalho para todos, incumbindo ao Estado garantir a igualdade de oportunidades na escolha de profissão e na progressão da carreira (artºs 51º e 52º) e o princípio do salário igual para trabalho igual [artº 53º, al. a)].

Revisão do Código Civil

A Reforma do Código Civil, aprovada pelo DL 496/77, de 25.11, aboliu as disposições discriminatórias do Direito da Família quer quanto à mulher, quer quanto aos filhos.

A mulher deixa de ter estatuto de dependência para ter estatuto de igualdade no seio da família.

Desaparece a figura do “chefe de família”.

O governo doméstico deixa de pertencer, por direito próprio à mulher. O casal decide em comum qual a sua residência.

A mulher deixa de precisar de autorização do marido para ser comerciante. Cada um dos cônjuges pode exercer qualquer profissão ou actividade sem o consentimento do outro.

Na constância do matrimónio, o exercício do poder paternal pertence a ambos os cônjuges.

Os direitos dos filhos não dependem da existência do casamento entre os pais; não há qualquer discriminação legal contra os filhos nascidos fora do casamento.

Lei da Maternidade – Lei 4/84, de 4 de Abril

A aprovação desta lei, que teve posteriormente diversas alterações, foi muito relevante para as mulheres trabalhadoras.

Reconhecido o direito a uma licença de maternidade de 98 dias, bem como o direito à dispensa de trabalho para consultas pré-natais e amamentação.

Previsto o direito a condições especiais de segurança e saúde nos locais de trabalho para trabalhadoras grávidas, puérperas e lactantes.

Estabelecimento de presunção de que o despedimento dessas trabalhadoras é feito sem justa causa.

Previstas diversas licenças para acompanhamento de filhos menores, e filhos deficientes e com doenças crónicas.

30 Anos após o 25 de Abril Governo PSD/CDS-PP desencadeia grave ofensiva contra os direitos das mulheres



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