Um estudo do Instituto Salk para Pesquisas Biológicas sugere que a capacidade de memória do cérebro é muito maior do que as estimativas indicavam. As conclusões podem ajudar os cientistas a compreender como o cérebro é tão eficiente em energia.
“Esta é uma verdadeira bomba no campo da neurociência”, disse Terry Sejnowski, um dos principais autores do estudo. “Descobrimos a chave para desvendar o princípio do design de como os neurónios funcionam com baixo consumo de energia, mas alto poder de computação”.
As nossas memórias e pensamentos são o resultado de padrões de atividade elétrica e química no cérebro. Uma parte fundamental dessa atividade acontece quando as ramificações dos neurónios interagem em determinados cruzamentos. Nestas interações - as sinapses – uma ramificação de saída (axónio) de um neurónio liga-se a uma ramificação de entrada (dendrito) de um segundo neurónio.
Os sinais viajam através das sinapses de acordo com as “ordens” de substâncias químicas chamadas neurotransmissores. Cada neurónio pode ter milhares de sinapses com milhares de outros neurónios. Contudo, pouco sabemos ainda sobre estas.
Medindo tamanhos sinápticos
No novo estudo, enquanto a equipa reconstruía em 3D o tecido do hipocampo de ratos (o centro de memória do cérebro), os cientistas notaram algo incomum: em alguns casos, um único axónio de um neurónio formava duas sinapses, que chegavam a um único dendrito de um segundo neurónio.
Ao início, os investigadores não pensaram muito sobre essa duplicidade, que ocorre no hipocampo em cerca de 10% das vezes.
Eis que Tom Bartol, um dos investigadores da equipa, teve uma ideia: se pudessem medir a diferença entre duas sinapses muito semelhantes como estas, poderiam ser capazes de medir melhor os tamanhos sinápticos, que até agora só tinham sido classificados como pequenos, médios e grandes.
Para fazer isso, os investigadores usaram microscopia avançada e algoritmos computacionais desenvolvidos para fazer imagens dos cérebros de ratos e reconstruir ligações, formas, volumes e área de superfície do tecido cerebral a um nível nanomolecular.
Novidade
Os cientistas esperavam que as sinapses fossem mais ou menos semelhantes em tamanho, mas foram surpreendidos ao descobrir que eram quase idênticas.
“Ficamos espantados ao descobrir que a diferença entre os tamanhos dos pares de sinapses eram, em média, de apenas cerca de 8%. Ninguém pensou que seria uma diferença tão pequena”, explicou Bartol.
Porque a capacidade de memória dos neurónios é dependente do tamanho da sinapse, esse acabou por ser um número-chave para que a equipa pudesse, a partir daí, usar os modelos algorítmicos do cérebro para medir a quantidade de informações que poderiam ser armazenadas nas conexões sinápticas.
26 tamanhos
Os cientistas já sabiam que o intervalo de tamanho entre a menor e a maior sinapse podia variar por um fator de 60. Além disso, a maioria das sinapses são pequenas.
Armados com o conhecimento de que sinapses de todos os tamanhos podem aumentar em cerca de apenas 8% entre os tamanhos dentro de um fator de 60, a equipa determinou que poderia haver cerca de 26 categorias de tamanhos de sinapses, em vez de apenas três.
“Os dados sugerem que existem 10 vezes mais tamanhos de sinapses do que se pensava“, descreve Tom Bartol. Em termos informáticos, 26 tamanhos de sinapses correspondem a cerca de 4,7 bits de informação – anteriormente, pensava-se que o cérebro era capaz de apenas um ou dois bits de armazenamento.
Sinapses adaptativas
As sinapses do hipocampo são pouco confiáveis: quando um sinal viaja de um neurónio para outro, só ativa um segundo neurónio de 10 a 20% das vezes.
Como é que, com sinapses tão pouco confiáveis, o cérebro possui tanta precisão? Uma possível resposta, ao que parece, está na constante adaptação das sinapses.
A equipa usou os novos dados e um modelo estatístico para descobrir quantos sinais eram necessários para cada par de sinapses chegar a essa diferença de 8%.
Os investigadores calcularam que, para as menores, cerca de 1.500 eventos causam uma mudança no seu tamanho/capacidade (20 minutos). As maiores precisam de apenas algumas centenas de eventos (um a dois minutos).
“Isto significa que, a cada 2 ou 20 minutos, as sinapses estão a adaptar-se para o próximo tamanho. As sinapses ajustam-se de acordo com os sinais que recebem”, explica Bartol.
O resultado deste estudo abre um novo capítulo na investigação de mecanismos de aprendizagem e memória.
As descobertas sugerem mais perguntas para explorar, por exemplo, se regras semelhantes podem ser aplicadas a sinapses em outras regiões do cérebro.
Além disso, os dados oferecem uma explicação para a surpreendente eficiência do cérebro. O cérebro adulto acordado gera apenas cerca de 20 watts de potência contínua – o mesmo que uma lâmpada fraca.
A descoberta poderia ajudar a área da computação a construir maquinas ultraprecisas que sejam ao mesmo tempo mais eficientes em termos de energia.
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