terça-feira, 6 de junho de 2017

Macroscópio – Vão as empresas de sondagem enganar-se outra vez no Reino Unido?

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Macroscópio

Por José Manuel Fernandes, Publisher
Boa noite!
Ilustração do The Telegraph
 
Quando Theresa May decidiu convocar eleições antecipadas no Reino Unido a generalidade das sondagens apontava para uma vitória esmagadora dos conservadores. Agora que estamos a poucos dias do escrutínio a vantagem sobre os trabalhistas de Jeremy Corbyn quase desapareceu. Num país onde as últimas sondagens se enganaram redondamente – enganaram-se em 2015 quanto não previram a vitória folgada dos conservadores, enganaram-se no referendo do Brexit, quando deram a vitória ao “remain” e foi o “leave” que ganhou. Desta vez à desconfiança quase geral acrescenta-se a divergência entre os vários estudos. Hoje havia quem prognosticasse uma vitória dos conservadores por 11 pontos e quem falasse de uma margem de apenas um ponto. O que se passa? É isso que tentaremos ajudar a perceber neste Macroscópio.
 
Primeiro que tudo, como estão as coisas? Um bom sítio para conhecer todos os estudos de opinião é uma página da Wikipédia, Opinion polling for the United Kingdom general election, 2017. Tem todos os resultados e gráficos com a média das sondagens. Um desses gráficos é o que reproduzo abaixo e que ilustra bem a aproximação dos trabalhistas aos conservadores:
 
 

Para uma análise mais jornalística recomendo a análise do Telegraph, que também vai sendo actualizada com os números mais recentes – General election polls 2017: Latest odds tracker and maps – e que acrescenta alguns elementos interessantes sobre as ciscunscrições que cada partido quer “roubar” aos seus adversários e nos conta também como já não é a origem social dos eleitores aquilo que divide os Tory do Labour. É a idade: “If you want to find the new dividing line in British politics, age is the new predictor. Generally, YouGov's polling has found that the older you get, the more likely you are to vote Conservative. Labour is 19 points ahead among 18-24 year-olds while the Conservatives are ahead by a huge 49 points among the over 65s.”
 
Passando agora à dúvida que todos têm, julgo que ela está bem sintetizada numa peça da The Economist, Are British pollsters headed towards another miss? Nela sublinha-se uma constante das sondagens nas últimas quatro décadas, período em que quase todas elas subestimaram quase sempre o voto conservador: “Since 1979 they have mismeasured the difference between the Conservatives and Labour, the all-important general-election statistic, by an average of 4 percentage points. In the most recent general election, held in 2015, the final polls missed the result by a shocking 6.6 points—provoking an existential crisis among pollsters”. O gráfico abaixo ilustra bem a diferença entre as previsões das sondagens e o resultado final nas eleições gerais das últimas décadas:

 
A consciência desse erro levou desta vez os diferentes institutos a adoptarem novas metodologias para tentarem estimar melhor o resultado das eleições. Alguns artigos explicam bem como isso é feito e as diferenças que explicam tão grandes divergências no que se refere à estimativa final. Eis alguns desses artigos:
  • Polls more divided on Conservative lead, uma análise de fundo do Financial Times, publicada já há alguns dias mas que explica bem as diferenças de método dos vários institutos: “Polls, including YouGov, that show narrower Conservative leads are those that assign probabilities of voting based wholly or primarily on a respondent’s self-reported likelihood of casting a ballot, meaning that young people make up a far bigger proportion of the likely vote than they have historically. Those showing wider Conservative leads, such as ComRes and ICM, model turnout based on historical figures for demographic groups. This would have improved accuracy in most previous elections, but risks coming unstuck if behaviour changes markedly. Accordingly, which of the two approaches provides the more accurate picture depends on whether historical patterns hold, or whether Labour leader Jeremy Corbyn has succeeded in persuading younger voters and previous non-voters to participate. Some have pointed to the surge in applications to register to vote among young people as evidence of increased enthusiasm. This is possible, but the data have only been available for one previous general election, so it is difficult to draw solid conclusions. As things stand, pollsters are as nervous as politicians.”
  • A landslide or a hung parliament - why are the polls so far apart in predicting the General Election?, um trabalho muito completo do Telegraph, onde estes mesmos pontos são explicados com maior detalhe. Por exemplo: “So even though there is no doubt that last year's EU referendum and the election of Jeremy Corbyn as Labour leader galvanised many young voters, it's still a gamble to say that the 2017 General Election will buck the trend and have historic levels of youth turnout. ICM makes adjustments to its polls based on the turnout at previous elections for age and class. Its most recent poll suggested that 18-24 turnout would be around 40 per cent - part of the reason why they have Labour at a much lower level than YouGov.”
  • Turnout of younger voters holds key to election outcome, a análise do Guardian que insiste sobretudo neste ponto, o de os mais novos aparecerem ou não para votar na próxima quinta-feira, uma mobilização cuja intensidade pode decidir a eleição tal a diferença de apoio aos dois partidos quando se comparam os mais novos (que apoiam mais o Labour mas costumam abster-se mais) com os mais velhos (que estão com os conservadores e habitualmente se abstêm menos). Os números são impressionantes: “Put simply the polls such as Survation and YouGov are doing a brilliant job in reaching more 18-to-24-year-olds than other polling companies. But in doing so they are in danger of repeating the mistake the polling companies made in the 2015 general election when they overstated the Labour vote and understated the Conservative vote. This is because while younger voters may tell pollsters in large numbers they intend to vote Labour, they are far less likely to actually make it to the polling station. The difference is quite big. Only 44% of 18-24s in the ICM poll say they are 10/10 certain to vote next Thursday, compared with 66% of 35-64s and 80% of over-65s.”
 
Que pensar quando nem as empresas de sondagens se entendem? Talvez recorrer à ajuda de Nate Silver, que tão presente esteve no Macroscópio nas últimas semanas da corrida eleitoral nos Estados Unidos, e que tão precioso nos foi, e ver o que ele escreve em Are The U.K. Polls Skewed?, publicado no seu FiveThirtyEight. O texto é longo e muito informativo, apresenta-nos vários modelos interpretativos que podem levar a previsões diferentes e tem também a vantagem de nos alertar para algumas peculiaridades do sistema eleitoral inglês e da forma como este atribui os lugares no Parlamento. Por exemplo: “While FiveThirtyEight isn’t attempting to translate votes to seats — that’s a tricky problem and one that we haven’t had much luck with in the past — other people’s models show that if Conservatives were to win by much less than their 2015 margin, their majority would be under threat. A series of YouGov models released this week have shown Conservatives winning 308 to 317 seats — short of a 326-seat majority — with a 3- to 4-point win. Uniform swing calculations also suggest that Conservatives would be underdogs to retain their majority with a 4-point win, and about even money to do so with a 5-point win.”
 
Ou seja, tudo pode ser ainda mais complicado, pois pode haver uma maioria de quem não tiver mais votos (já aconteceu no passado). O que leva Nate Silver a uma conclusão muito cautelosa: “To sum things up, I’d give the same advice that I pretty much always do on the eve of an election. Focus on the polling average — Conservatives ahead by 7 points — rather than only the polls you like. But assume there’s a wide range of outcomes and that the errors are equally likely to come in either direction. Given the poor historical accuracy of U.K. polls, in fact, the true margin of error7 on the Labour-Conservative margin is plus or minus 10 points. That would imply that anything from a 17-point Conservative win to a 3-point Labour win is possible. And even an average polling error would make the difference between May expanding her majority and losing it.”
 
 

Antes de terminar, e uma vez que esta campanha tem sido tragicamente marcada por atentados terroristas, o Macroscópio não podia terminar sem vos referir um trabalho de Edgar Caetano no Observador – É tempo de dizer chega? O plano para vencer o terrorismo islâmico – e vos deixar o link para o texto integral da declaração de Theresa May na sequência dos ataques deste fim de semana: “Things need to change”: Theresa May’s full statement on the London attack. Dessa declaração destaco a seguinte passagem:
First, while the recent attacks are not connected by common networks, they are connected in one important sense: they are bound together by the single, evil ideology of Islamist extremism that preaches hatred and promotes sectarianism. It is an ideology that claims our Western values of freedom, democracy and human rights are incompatible with the religion of Islam. It is an ideology that is a perversion of Islam and a perversion of truth. It cannot be defeated through military intervention alone. It will not be defeated through the maintenance of a permanent defensive counter-terrorism operation, however skilful its leader and practitioners. It will only be defeated when we turn people’s minds away from this violence and make them understand that our values, pluralistic British values, are superior to anything offered by the preachers and supporters of hate.
 
E por hoje é tudo. Espero que tenha ajudado a entenderem um pouco melhor o que se passa com as sondagens no Reino Unido, sem vos dar certezas mas ajudando a compreender melhor as dúvidas. Tenham bom descanso e boas leituras. 
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