sábado, 23 de dezembro de 2017

Eu, Psicóloga | As pessoas boas nos dão felicidade, as pessoas más nos ensinam lições



Para muitas crianças, o Natal é uma das épocas mais esperadas do ano. Mas, para aquelas com autismo e suas famílias, pode ser um período repleto de desafios.

Alguns dos simples prazeres dessa festa, como abrir presentes ou se reunir com a família em torno da mesa da ceia, podem ser momentos atribulados, já que crianças autistas valorizam suas rotinas e têm dificuldades para lidar com mudanças no dia a dia.

Então, o que pode ajudar essas famílias a ter um Natal em harmonia?

Kevin Harrison, pai de Daniel, de 11 anos, conta que ele e sua mulher aprenderam que não devem encher de presentes o menino, de 11 anos, ao celebrar o dia de Natal em sua casa em Arnold, no norte da Inglaterra.

"Tentamos uma vez sentar com ele e abrir vários presentes de uma vez, mas ele entrou em crise. Ficou muito mal. Hoje, ele leva até uma semana para abrir todos", diz Harrison.

Ele conta que Daniel têm dificuldade para entender o que está acontecendo. "A sala de casa fica diferente, a cozinha fica diferente, recebemos cartões de boas festas, as pessoas começam a fazer visitas, há propagandas por toda parte, e ele não vê sentido algum nisso tudo", diz.

"Ele começa a ser comportar de forma diferente. Ele gosta de se trancar no quarto, e faz isso ainda mais durante a época de Natal. Seu quarto é seu santuário."

Medo de Papai Noel

Daniel também fica com medo quando vê um Papai Noel. Seu pai acha que ele não entende direito o que significa o Natal. "Ele estuda em uma escola católica, onde ensinam sobre isso, mas não sabemos ao certo se ele entende o que é Jesus... Dan pensa que tudo se resume aos presentes."

Também é difícil para o menino explicar o que ele quer ganhar de presente, o que faz o casal se sentir culpado, porque sua filha adolescente, Hannah, sempre ganha o que deseja. A ceia é um momento delicado, porque Daniel desenvolveu um receio de se alimentar, após sofrer de refluxo quando era bebê, e nunca fez uma refeição natalina.

"Por anos, ele sequer queria sentar perto de comida. Era horrível, nós em volta da mesa e nosso filho em seu quarto. Nós nos acostumamos com isso, mas, neste ano, esperamos que algo possa mudar um pouco, e ele consiga comer um pouco de peru. Vamos tentar oferecer amassadinho ou cortado bem fininho. Mesmo assim, ele leva bastante tempo para comer e precisa ser supervisionado para que não engasgue."

O pai de Daniel diz que esses contratempos fizeram com que o menino só tenha sido convidado para três festas até hoje. "Pode imaginar como nos sentimos? Não acho que ele se importa, mas é bem difícil para a gente. Mas as crianças [da sua turma] gostam e cuidam dele."
Desafio duplo

Para Simona Zetu, uma intérprete de romeno de Birmingham, na região central da Inglaterra, o desafio é duplo, já que seu filho de 4 anos e sua filha de 15 têm autismo. A maior dificuldade de Patrick é com a comida. Ele parou de comer há quatro meses e, hoje, só bebe leite.

O menino não se sentará com a família para a ceia de Natal. Ficará brincando em outra sala. "O problema é mais com a textura e a cor da comida. Não podemos forçá-lo a comer, senão ele engasga."

Sua filha, Crina, tem uma dificuldade parecida. Por quatro anos, ela comeu apenas batata frita e molho de tomate e só passou a fazer as refeições com a família a partir dos 10 anos. Agora, mais velha, ela passou a ter interesse por comida – a culinária japonesa é sua preferida no momento – e vai ceiar com os pais no dia de Natal.

"Os dois comiam normalmente até os 18 meses de idade. Pararam de um dia para o outro", diz Zetu. "Parece que estou criando a mesma criança de novo."

Ela conta que Patrick gosta de abrir seus presentes, mas não entende o que é o Natal. "Ele não parece entender o que está acontecendo."

Luzes e barulhos

Zetu, que se mudou da Romênia com sua família há três anos, diz que era assim também com Crina. "Ela não tinha noção de que o Papai Noel iria visitá-la. Vivia em um mundo próprio. Depois dos 6 anos, passou a estar mais presente e começou a entender o significado das coisas e a ficar muito animada", diz.

Ela acrescenta que sair às compras na época de Natal com os filhos, com todas as luzes e barulhos, pode ser algo bem difícil.

"Depois de meia hora, o Patrick senta-se no chão e se recusa a sair do lugar. Ele não chora nem grita, apenas fica sentado. Temos que pegá-lo no colo para ir embora. Já a minha filha prefere ficar na maior parte do tempo na livraria."

Zetu evita fazer visitas a amigos e parentes no Natal sempre que possível. "Se sou eu que tenho visitas, sempre me certifico que os quartos das crianças estão preparados para elas, porque, depois de 15 minutos, Crina prefere ir para o seu."

A menina não gosta muito de bater papo, porque não vê sentido nisso. Acha melhor ir para seu quarto desenhar, pintar ou ler. "Não mudaria como eles são por nada desse mundo. Tenho muita sorte de ter filhos tão adoráveis e amorosos. Eles gostam muito de abraços e beijos. São incríveis", diz Zetu.

"Fico com o coração partido quando conto que eles têm autismo e as pessoas respondem que sentem muito. Não fiquem mal por isso, eles apenas pensam de forma diferente. São felizes. Normalmente, quando falamos de autismo, só enxergamos a parte ruim. Mas o austismo não se resume às crises."

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