quarta-feira, 23 de setembro de 2020

A ressurreição da sátira: Poemas em Tempo de Peste

Merda para esta vida de paz,
diria, se fosse escritor naturalista:
porque, já agora, tanto me faz
comer um bife ou simplesmente alpista.

 

Com esta desembaraçada franqueza, o poeta Eugénio Lisboa enfrenta, desabafa, ri-se e faz-nos rir deste perigoso mundo em que um vírus nos pôs a viver. Poemas em Tempo de Peste não é só um livro de poemas, é uma aventura em que se fundem literatura e vida. Ah, mas fundem-se com um grande sentido lúdico e um melancólico langor, que tanto toca em Camões, Eliot ou Almada, como no sabor a paraíso de uma África que já foi, porque «o passado sempre conta / quando o vírus já desponta!»

 

À mesa destes Poemas em Tempo de Peste, são chamados a sentar-se os grandes do mundo. De um Trump «fodido», diz Eugénio Lisboa, «Que chatice se ele ficasse / no governo e nos lixasse», para logo se espantar com a nossa presidente do Banco Central Europeu:

 

A Senhora Christine Lagarde

acha que os velhos vivem demais;

pra que a economia se resguarde

há que apressar os ritos finais.

 

A política nacional merece outros mimos a Eugénio Lisboa. Como este aceno a um deputado:

 

O Nuno Melo tem medo

de tudo que não conhece

e tornou-se, muito cedo,

activo no Cê Dê Esse.

 

Ou este mimo escatológico a um partido exuberante:

 

Fala o CHEGA como bufa,

não conhece outro falar:

quando tenta uma chufa,

fá-lo como a evacuar!

 

Os Poemas em Tempo de Peste de Eugénio Lisboa tanto cantam o admirável Pinto da Costa em decassílabos (não murchos) «com umas rimas do caraças», como exaltam em redondilha maior o génio singular de Gonçalo M. Tavares:

 

Ele diz coisas geniais

e diz coisas pessoais,

mas as coisas pessoais

não são nunca geniais

e as coisas geniais

mais parecem de jograis!

 

Poemas em Tempo de Peste não é só um livro, é a ressurreição da sátira, e é um reencontro da poesia com o riso libérrimo. Poesia clara que nos sacode da letargia destes dias e nos convida à plenitude da vida:

 

Lixe-se a melancolia,

refúgio de quem não luta,

e combata-se, de dia,

o vírus filho da puta!

 

Lê-se com sofreguidão e gosto: em confinamento ou na rua, em silêncio ou em voz alta. Há quanto tempo já não lhe falavam de um livro assim? Chama-se Poemas em Tempo de Peste. Eugénio Lisboa é o seu autor. Uma edição da Guerra e Paz, para ler já a partir do dia 29 de Setembro, numa livraria perto de si ou no site da editora.

 

 

 

Poemas em Tempo de Peste

Eugénio Lisboa

Ficção / Poesia

96 páginas · 15x20 · 11,00 €

Nas livrarias a 29 de Setembro

Guerra e Paz, Editores

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário