segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Voltámos ao inferno. Entre as lágrimas e a raiva

P
 
 
Enquanto Dormia
 
David Dinis, Director
 
Estamos a 16 de Outubro de 2017 e voltamos ao mesmo: 
Voltou o inferno. Ontem foi o dia do ano com mais incêndios florestais de 2017. RTP, SIC e Expresso já apontam para dez ou 11 mortes, mas a Protecção Civil ainda só confirmou seis, seis histórias trágicas, à hora que lhe escrevo esta carta. Uma das situações mais incompreensíveis aconteceu na A25, onde muita gente teve que fazer inversão de marcha na mesma faixa, tentando fugir ao fogo. Infelizmente, não é possível garantir que as vítimas não sejam mais: há muitas dezenas de fogos activos, muitas casas ardidas em sítios diferentes, dezenas de feridos (alguns graves) e poucos meios para chegar a todo o lado. A equipa do PÚBLICO acompanhou a noite ao minuto, deixando a síntese, os mapas, as ocorrências, todos os detalhes que preferíamos não ter que lhe contar outra vez.
Mas é o nosso dever fazê-lo: do terreno, deixo-lhe o testemunho dos jornalistas do PÚBLICOo olhar perplexo do Carlos Cipriano, que nunca pensou ver o que viu nas Caldas da Rainha; e o susto do Tiago em Braga, onde o fogo chegou a tocar a fronteira da cidade - e chegou mesmo ao Bom Jesus. As fotos do pior dia, as fotos desta noite triste, são do Paulo Pimenta, que cedo percebeu que íamos precisar dele. Ao Paulo, que sabemos que sofreu como todos os que combatem esta tragédia, fica mais um abraço, o nosso abraço de obrigado.
Marcelo, desta vez, não foi para o terreno - mas deixou o recado: “Há o dever moral e cívico de fazer uma análise sobre o que se está a passar”, disse o Presidente, primeiro numa nota, depois numa declaração à SIC-Notícias, feitas para o Governo ler muito devagarinho.
Mas Costa respondeu rápido: na Protecção Civil, ao lado da ministra, voltou a segurá-la no cargo: "É um bocado infantil a ideia de que consequência política é a demissão de um ministro". E depois disse que tudo isto "vai acontecer outra vez" e que os portugueses são "adultos" e querem "uma atitude madura" do Governo, "com respostas ponderadas". Pelo meio, ainda ouvimos o secretário de Estado do MAI dizer isto: "Não podemos ficar à espera dos bombeiros para nos resolverem os problemas".
Atitudes "maduras", respostas "ponderadas". Pedrógão já foi há mais de três meses. Este foi o nosso pior Verão de sempre, com mais de 70 mortos. Mete dó, já mete raiva. Dizem que hoje volta a chuva. Oxalá, porque é a única coisa que nos pode tirar este inferno. No JN, a minha amiga Inês Cardoso escreve o que eu sinto também: "Vamos continuar a repetir o que se escreve e analisa há anos. Que este modelo de socorro está esgotado e precisa de ser fortalecido. Que tem de haver dinheiro para salvar a floresta e o mundo rural antes de arderem, não depois. Repetiremos até que alguma coisa mude. Até que quem nos governa sinta, pelo menos, vergonha de que este ano tenha acontecido". Vamos mesmo, Inês, as vezes que forem precisas.

Outras notícias da noite

Puigdemnont respondeu a Rajoy, mas sem dizer se declarou a independência. Na carta enviada esta noite, o presidente do Governo da Catalunha pede que acabe a "repressão" e também uma reunião para chegar a acordos.
Na Venezuela, Maduro reclamou vitória nas eleições regionais, garantindo que venceu uma "vasta maioria" dos 23 governos que foram ontem a votos. A oposição recusou imediatamente os resultados - horas antes, era ela que garantia ter conseguido uma "vitória histórica", com base nos dados provisórios. A Associated Press conclui, bem, que o país se vai dividir ainda mais.
Na Áustria, a vitória dos conservadores abriu caminho à extrema-direitaO endurecimento da política de acolhimento de refugiados foi premiado. E estas são as mensagens para a Europa registar.
Atenção também ao que acontece no Iraque: as forças militares começaram um ataque em Kirkuk, tentando recuperar posição numa zona tomada pelas forças curdas em 2014. A situação tem tudo para ser um barril de pólvora, anota o New York Times

O Orçamento 

Nos grandes números, é istoo Orçamento é de 2018, mas inclui já facturas para 2019 e 2020. Sendo que a folga, essa, foi para a esquerda e não para reduzir mais o défice - mas até a descida que está prevista tem um mistério pelo meio. O Sérgio Aníbal olhou para o documento e chegou aqui: das poupanças incertas às mudanças no BCE, estes são os riscos do OE.
Nos impostos, o mais importante é o simulador, claro. Mas para perceber o quadro geral convém saber mais alguma coisa. Há algumas novidades no IRS, das rendas ao fim dos vales-educação. Há também uma surpresa: nem toda a descida do IRS vai ser sentida no próximo ano. E uma outra, sobre como se aplica o mínimo de existência. E sobretudo há uma incógnita: os recibos verdes vão pagar mais ou não?O Governo garante que não, mas a esquerda está a fazer contas. Se for o caso, vai haver luta na especialidade (e há mais batalhas em vista). De resto, registe o regresso dos "impostos do pecado" - que são mais e voltam a subir. E um aviso: o Fisco vai controlar mais as transferências para offshore.
Na função pública é onde mais se nota o alargar do cinto. As restrições nas entradas serão menores, os professores vão entrar nos quadros ao fim de três contratosna saúde haverá mais reposições, os reformados vão ter incentivos a voltar ao activo, para além do que já sabíamos sobre as carreiras (desbloqueadas em dois anos). Aperto, só mesmo este aviso: Centeno quer combater o absentismo no Estado e poupar 60 milhões.
Nos apoios sociais, há também um ponto em abertoo Governo vai rever a condição de recursos, mas não explica até onde quer ir (numa matéria sensível à esquerda). Mas também há decisões fechadas, como um novo aumento das pensões extraordinário.
Para as empresas, prometem-se benefícios no reinvestimento de lucros, mas sobretudo muitos milhões de fundos comunitáriosA derrama estadual em IRC é que ainda não sabemos se sobe ou não.
Tudo isto é uma síntese (que pode ver aqui em três minutos e aqui notícia a notícia). Quanto à análise, aqui tem as primeiras linhas de Francisco LouçãRicardo CabralLuís Teles Morais, mas também do Vítor Costa e as minhas. Nos próximos dias, claro, voltaremos ao tema.

Outras notícias

Rui Rio abriu fogo sobre Santana e criticou Marcelo. Numa entrevista à TVI, o candidato à liderança do PSD recusou que o seu objectivo seja um Bloco Central e deixou claro que não gosta deste orçamento. A Sónia Sapage fez um resumo.
O pão que compramos vai ter cada vez menos sal. Há um acordo entre Governo e panificadores que nos vai mudar o paladar - e melhorar a saúde.
Metade dos 1500 refugiados que chegaram já deixou Portugal: 1511 pessoas foram acolhidas através da recolocação da União Europeia. Mais de 720 interromperam o programa e saíram do país.
Ia dar-lhe conta da agenda do dia, mas dei por mim a pensar que já se faz tarde e que pouco mais importa do que seguir com muita atenção o que se passa com os incêndios. Conte connosco. Que o dia melhore.
Até já.

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