A cidade pode dormir em paz, quando o sentinela está acordado
- Hélio Brambilla
Àmedida que vão se dissipando as nuvens plúmbeas da pandemia (a maior operação de engenharia social de que se tem registro na História), o mundo vai despertando do lockdown imposto por ditadorzinhos locais e mundiais, e começa a entender o real sentido dessa operação: implantar o igualitarismo social escravizante, embora a “eficiência” desse nivelamento social já se tenha patenteado na catástrofe econômica dos países onde o comunismo foi implantado.
A previsão pandêmica era que alguns países terão recuo de até 17% no PIB, perdendo-se assim grande parte do que é produzido em um ano. Era este o cálculo vaticinado por certa mídia sensacionalista para muitos países, inclusive o Brasil. Nisso havia até uma “torcida” para que a previsão de fato se materializasse. Embora lamentando a perda dos brasileiros cujas vidas foram ceifadas pela covid-19, caminhamos para o final de 2020 com os indicadores econômicos apontando para uma queda de 5% no PIB.
A população ordeira, pacífica e cheia de fé esforçou-se para minimizar as consequências da tragédia. Um esforço que seria em vão, se o produtor rural também tivesse parado de produzir. E sem o esforço dos nossos intrépidos caminhoneiros, como teria podido chegar à mesa da população essa alimentação farta, sadia e barata? Esses nossos heróis não são nacionalistas e regionalistas no mau sentido. Têm os olhos abertos para muito além das nossas fronteiras, pois nossa produção de excedentes alimentares ajuda a alimentar mais de um bilhão de pessoas em todo o mundo.
Agitação agrária produzida nas cidades
É reconfortante ressaltar sempre a situação excelente da agropecuária nacional, como temos feito. Mas o quadro atual seria muito diferente, caso tivessem prevalecido as propostas de caráter comunista que, 60 anos atrás, muitos tentavam impor ao nosso País. Fatores prejudiciais ou impeditivos da produção, se fossem assim implantados, teriam transformado o Brasil em outra Cuba ou Venezuela.
Naqueles conturbados anos 60, alastrava-se pelo País uma agitação subversiva do setor rural, paradoxalmente dirigida quase toda nas cidades. Imprensa, rádio e TV ocupavam-se dela com largueza. Era assunto corrente nas tribunas, nos meios políticos, nas universidades. E também nas sacristias, lamentavelmente. Jornais da corrente comuno-progressista divulgavam textos incendiários da luta de classes. Exemplo característico são os versos de Vinicius de Morais, publicados no semanário “Brasil, Urgente”, dirigido por Frei Carlos Josaphat, O.P.:
Senhores barões da terra
Preparai vossa mortalha
Porque desfrutais da terra
E a terra é de quem trabalha
Bem como os frutos que encerra. […]
Chegado é o tempo da guerra
Não há santo que vos valha. […]
Queremos que a terra possa
Ser tão nossa quanto vossa
Porque a terra não tem dono
Senhores donos da terra. […]
Não a foice contra a espada
Não o fogo contra a pedra
Não o fuzil contra a enxada:
– Granada contra granada!
– Metralha contra metralha!
E a nossa guerra é sagrada!
A nossa guerra não falha!
Paralelamente à fermentação dos ânimos, tramitavam no Legislativo federal projetos e mais projetos de Reforma Agrária, de cunho nitidamente confiscatório e socialista.
Alvos doutrinários para uma contra-revolução
Alguns problemas doutrinários e práticos afloravam em todo esse debate, ou nele estavam subjacentes.
· Seria legítimo e conforme à justiça haver fazendeiros, donos da terra, e de outro lado trabalhadores rurais que não fossem donos do solo, vivendo de salário? Os comunistas afirmavam que não. Que diziam a esse respeito os proprietários? Que diziam os trabalhadores rurais?
· Os comunistas afirmavam que a supressão da propriedade rural não prejudicaria a produção agrícola. Que diziam a esse respeito os proprietários? Que diziam os trabalhadores rurais?
· Alguns socialistas sustentavam que, segundo os ditames da justiça e as conveniências da produção agrícola, não deveria haver propriedades grandes, mas tão-somente médias e pequenas. Outros socialistas, mais radicais e mais próximos do comunismo, afirmavam que só deveria haver propriedades pequenas. Que diziam disso proprietários e trabalhadores rurais?
· Convicções filosóficas e religiosas, direitos e interesses múltiplos se mesclavam ante problemas desse vulto. As opiniões se dividiam, e consequentemente a subversão encontrava fácil terreno para vicejar. Sob as vistas condescendentes do presidente João Goulart, agitadores de toda ordem proliferavam e ganhavam terreno.
· O que diziam de todas essas importantes questões os brasileiros de todas as profissões e classes sociais?
O ponto mais importante: uma questão de consciência
Nesse panorama assim conturbado, o autêntico sentinela não podia calar-se. O Prof. Plinio Corrêa de Oliveira compreendeu que só uma obra de envergadura, elucidando os aspectos doutrinários, morais e técnicos do problema agrário, poderia convencer os meios católicos e os ambientes rurais sobre a injustiça do que se propunha. Só assim se cortaria o passo à crescente agitação ameaçadora. Daí surgiram os pontos básicos para a elaboração do livro Reforma Agrária – Questão de Consciência.
A fim de realizar o projeto, o Prof. Plinio pediu a valiosa cooperação de dois Bispos – D. Antonio de Castro Mayer e D. Geraldo de Proença Sigaud – companheiros de luta desde os tempos do jornal “Legionário”. O economista Luiz Mendonça de Freitas foi também convidado a redigir a parte econômica da obra.
No dia 10 de novembro de 1960 – exatamente 60 anos atrás – um grande anúncio da Editora Vera Cruz, na primeira página de um dos mais importantes jornais do País, comunicava o lançamento de Reforma Agrária – Questão de Consciência. Outro anúncio foi difundido em um canal de TV de São Paulo. Precedera essa propaganda um artigo de lançamento, de autoria do Prof. Plinio, publicado em Catolicismo no mês de outubro daquele ano.
A candência do tema atraiu a atenção de muitos, e a primeira edição de cinco mil exemplares esgotou-se em 20 dias. Seguiram-se três outras edições, escoando-se 30 mil exemplares. Um levantamento de “O Globo” constatou, em 30 de junho de 1961, que Reforma Agrária – Questão de Consciência está entre os livros mais vendidos do Brasil. Tornara-se um best-seller nacional. O fato surpreendeu, pois não era habitual a tiragem maior que dois mil exemplares para um livro doutrinário e técnico.
Reformas de base e a queda de um presidente
Entrementes o País foi sacudido por uma convulsão política, que o abalou de alto a baixo. A crise se deflagrara com a inopinada renúncia do Presidente Jânio Quadros em agosto de 1961, enquanto o vice-presidente João Goulart se encontrava em visita à China comunista. Sucessivas manobras político-ideológicas acabaram conduzindo-o à Presidência da República.
A partir daí os setores esquerdistas viram-se com as mãos livres para convulsionar ainda mais o País, por meio de greves e agitações tanto políticas quanto sindicais. Eram elas apoiadas e insufladas por elementos da esquerda católica, tendo à frente importantes membros da hierarquia católica.
Nosso espaço é insuficiente para narrar a batalha feroz que se seguiu, num debate de ideias jamais visto no Brasil. Chegava assim ao auge a dramática controvérsia referente às “reformas de base”. E do próprio cerne da controvérsia emergia a questão de consciência, três anos antes apontada por Reforma Agrária – Questão de Consciência como o nervo mais sensível da matéria em debate.
Aos poucos, todos esses lances de caráter doutrinário, somados a outras iniciativas de diversos setores da sociedade empenhados na luta anticomunista, foram gerando em largas faixas da opinião nacional uma crescente rejeição ao esquerdismo. Tal rejeição se consubstanciou numa imensa onda de indignação dos elementos mais sadios da opinião pública contra a política cripto-comunista do Governo João Goulart.
Criara-se assim o clima ideológico e psicológico que constituiu o fator determinante da Revolução de 1964. Quando, a partir de 19 de março daquele ano, as grandes e memoráveis Marchas da Família com Deus pela Liberdade começaram a atrair para as ruas imensas multidões, delas participaram com entusiasmo os membros da TFP, alegres por oferecerem seu peculiar contributo para a criação desse clima ideológico e psicológico, que se traduzira em tais manifestações de patriótico inconformismo. Com o suceder das Marchas, ficava claro o sentir do povo brasileiro, e ninguém mais deteria o curso dos acontecimentos.
No derradeiro discurso televisionado (que antecedeu de um dia à sua queda), um exasperado presidente Goulart vituperou acerbamente aqueles que lutavam contra seus aliados, os “católicos esquerdistas”, e contra as “reformas de base”: “O veto desta minoria reacionária ao meu governo […] fortaleceu-se quando afirmei que as reformas de base são um imperativo da hora em que vivemos”.
Era tarde. Um dia depois o Brasil o removia da Presidência.
Com a TFP, inviabilizando a Reforma Agrária
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