quarta-feira, 9 de agosto de 2017

A dimensão religiosa no jornalismo (I)

OPINIÃO DE MANUEL PINTO
O jornalismo a sério requer atenção, conhecimento e cultura. De tudo isto se faz um profissional competente. Hoje mais ainda do que ontem.

Se o jornalismo fosse a arte de compilar, dar forma e amplificar aquilo que se ouve, lê ou vê, seria muito fácil de pôr em prática. Mas para isso não eram precisos jornalistas: já teríamos as redes sociais.

Produzir e publicar notícias de interesse público exige bastante mais: é preciso escolher, porque nem tudo cabe ou é relevante; é preciso destacar, porque nem tudo se reveste de igual importância e tem de ser organizado e alinhado no tempo e no espaço disponíveis. Além disso e com frequência, o que de mais importância acontece não está visível, nem é fácil de encontrar e deslindar, requerendo investigação, tempo para verificar, cruzamento de dados, capacidade de compreender e relacionar elementos e fenómenos, consultar fontes e peritos…

Enfim, jornalismo a sério requer atenção, conhecimento e cultura. De tudo isto se faz um profissional competente. Hoje mais ainda do que ontem, devido à quantidade de dados e de informações e também ao muito ruído ambiente.

Porém, mesmo que tudo o que acabo de observar fosse tido em conta, ainda assim poderia haver realidades relevantes para a sociedade, que o jornalismo não vê ou faz de conta que não vê e, por conseguinte, não cobre.

Ponhamos as coisas ao contrário: consideremos os vários sectores da nossa vida social que são importantes para a vida de muitas pessoas – e falo do nosso caso porque nem todas as sociedades seguem o mesmo caminho – e comparemos o grau de cobertura que os media lhes dão. Poder-se-ia dizer, sem exagerar, que há áreas hipervalorizadas, como o futebol ou a economia, e áreas silenciadas como o trabalho, a diversidade cultural ou a religião.

Tomemos o último caso: muitas centenas de milhares de portugueses são praticantes de uma confissão religiosa. Permanece a centralidade da Igreja Católica, mas são já meia centena as confissões radicadas em Portugal e mais de 600 as registadas oficialmente, sobretudo cristãs, mas não só. São incontáveis as iniciativas, as instituições, os pronunciamentos, as notícias, as actividades nos domínios da cultura, do ensino e da acção social. Por outro lado, o fenómeno religioso e o seu lugar na sociedade constituem motivo de debate e de polémica, percorrendo uma escala que vai do ultrapassado e deletério ao necessário e imprescindível.

Enfim, pareceria haver base bastante para despertar a atenção do jornalismo. E no entanto é razoável perguntar: um cidadão que queira acompanhar de forma minimamente esclarecida e aprofundada a dimensão religiosa em Portugal (e no mundo) encontra-se bem servido?

Fonte: RR

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