segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

Macroscópio – O dia seguinte de Rui Rio. Sinais e alertas.

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Macroscópio

Por José Manuel Fernandes, Publisher
Boa noite!
 
Pronto. Rui Rio ganhou as directas, vai ser o senhor que se segue no PSD. E ganhou porque ganhou a norte (o Público tem um mapa elucidativo em Rio varreu o Norte, mas Sul ficou quase todo para Santana) e porque também não teve pudor em usar os sindicatos de voto internos, sendo que desta vez o Observador filmou e descreve a operação no terreno em Ovar, a terra do seu director de campanha (a investigação e reportagem está aqui e... só lendo e vendo), um trabalho que vai de encontro aos esquemas reveladosno Expresso do passado sábado, que descobriu oito militantes inscritos numa morada onde já não há nenhuma casa. Enfim, os partidos são assim (e trocar directas pro primárias, como o PS fez na disputa entre António José Seguro e António Costa também não melhora muito as coisas), pelo que talvez valha a pena olhar para o homem da organização de Rio, alguém que no blogue Blasfémias apresentam assim, augurando-lhe muito futuro: Salvador Malheiro, o Marco António Costa de Rio
 
Relativamente à análise do significado da vitória de Rui Rio e à explanação dos desafios que o esperam, há um conjunto de textos mais jornalísticos que vale a pena referir:
  • No Observador Vítor Matos faz a previsão atrevida de que, Se perder as legislativas, Rio não ajudará governação PS. É uma ideia que fundamenta não na vontade de Rio, mas na ideia de que Costa não precisará dele: “O novo líder do PSD acha que ao disponibilizar-se para viabilizar um Governo socialista — no caso muito provável de os sociais-democratas perderem as eleições — retira António Costa da influência negocial da esquerda. Rio pensa que o país ganha com isso. Mas para que essa ideia acontecesse era preciso o PS querer negociar. O mais provável é o PSD ficar pendurado à espera que a dama lhe conceda a dança”. Ou seja, “António Costa passa a ter o jogo aberto”.
  • Também no Observador, Miguel Pinheiro escreveu sobre Os vencedores, os vencidos e os espectadores, um texto que não segue a ortodoxia da maioria dos comentadores ao separar Passos Coelho do “passismo” e ao colocar o antigo primeiro-ministro entre os vencedores: Comportou-se exemplarmente durante toda a campanha. Ou seja: calou-se e desapareceu. Talvez não tenha ficado eufórico com o resultado, uma vez que Rio contava com a queda dele para a sua ascensão, mas a verdade é que a preocupação de Passos com o rigor das finanças está segura com o novo líder e estaria tremida com Santana Lopes.”
  • No Expresso, no que respeita a textos mais analíticos, destaque para O caminho de Rio é o buraco da agulha, de Martim Silva – “A campanha de Rio não foi boa. Mas um candidato poucochinho não significa um líder a prazo. O caminho para o sucesso é estreito, mas existe. E o que vai decidir tudo é o estado da economia em 2019” – e Até quando aguenta Rui Rio? Uma discussão sem sentido, de Bernardo Ferrão – “Rio era o que tinha maior capacidade de provocar danos no Governo. Não por ser um político hábil, popular ou cheio de retórica, mas por ser tão somente novidade. Um velho novo. A mudança que tardava em chegar”.
  • No Público David Dinis escreveu sobre as 11 decisões difíceis para o novo líder, a primeira das quais tem a ver com a necessidade de “unir” o PSD, prevendo-se que “Não é de esperar que Rui Rio siga o exemplo máximo de unidade dado na história recente do PSD: o de Passos Coelho que, depois de vencer em 2010, convidou Paulo Rangel (o seu principal adversário) para n.º 1 da sua lista ao Conselho Nacional.”
  • Por fim, no Diário de Notícias, Paulo Baldaia fala-nos de A afirmação de um líder, notando que “Para um líder da oposição que diz que a justiça funciona mal, que a comunicação social vive muitas vezes como se fosse um poder instituído sem assumir as suas responsabilidades, que o sistema político tem defeitos que esperam há muito para ser corrigidos, Rio tem de provar que é o político capaz de fazer essas reformas. (...) Ao mesmo tempo, o PSD vai ter de conseguiu demonstrar que tem um programa económico que é melhor do que o do atual governo.” 
 
Num registo mais opinativo, e fugindo à ideia de que este será um novo tempo em tudo diferente do anterior, Alexandre Homem Cristo fala-nos no Observador de A (só) aparente ruptura no PSD. A sua tese é que “A ideologia tem um peso menor nas reformas estruturais do que, acreditando no discurso político, se poderia julgar. Como tal, nesse plano, o PSD de Rui Rio não será realmente divergente do de Passos. Aliás, recorde-se que, quando o tema da campanha interna foi o ajustamento financeiro, Rui Rio até alertou que teria ido mais longe – afinal, aos olhos de Pacheco Pereira e de outros críticos da austeridade, qual dos dois seria o perigoso neoliberal?
 
Num texto menos claro sobre aquilo que defende o seu autor, Pedro Santos Guerreiro, escreve no Expresso, em Rui Riu-se, algo de semelhante, pois sublinha as convergências entre o líder que sai e o líder que entra: “Rio acredita no diabo de Passos, ainda que não o nomeie: que as contas públicas do país continuam débeis, que a economia está a crescer sem qualquer transformação perene, que qualquer crise externa fará ruir a nossa recuperação e que o atual governo esbanja no Estado, centrando-se em quem vota (pensionistas, funcionários públicos, trabalhadores privados) em detrimento de quem investe (as empresas).”
 
Há contudo um tema que, tendo entrada na campanha para a liderança já na sua recta final teve já um peso importante no debate e não deverá desaparecer, como tema de controvérsia, tão depressa: o tal possível apoio do PSD de Rui Rio a um governo minoritário do PS. António Costa, director do jornal online Eco, refere-se-lhe num texto cujo título se inspira no de uma canção de Fausto, Por este Rio acima?, onde sublinha que “Rio até se deixou enrolar por Santana Lopes em torno da discussão sobre uma viabilização de um governo minoritário de Costa. Como vai sair desta? Tem de reformar o país, retomar o que ficou parado nestes anos de frente de esquerda. E, definitivamente, tem de deixar de se dirigir ao poder em Lisboa como ‘a corte’. Esse é um discurso para um presidente de câmara, não é para um líder nacional. Que quer ser primeiro-ministro.”

 
Estas palavras foram publicadas no domingo, isto é, antes de Manuela Ferreira Leite ter vindo defender a posição de Rui Rio numa entrevista à TSF cujos termos relançaram a controvérsia. O que a antiga presidente do PSD disse foi o seguinte: “Da mesma forma que o Bloco de Esquerda e o PCP têm vendido a alma ao diabo, exclusivamente com o objetivo de pôr a direita na rua, eu acho que ao PSD lhe fica muito bem se vender a alma ao diabo para pôr a esquerda na rua“.
 
Esta formulação serviu de pretexto para a crónica que eu mesmo escrevi hoje, Um PSD para vender a alma ao diabo? Não obrigado., onde defendi a ideia de que o PSD não só não pode colocar-se numa posição subalterna relativamente ao PS, mas sobretudo que o país político da geringonça é um outro país político onde as águas devem estar mais claramente separadas. Por isso, escrevi, “a democracia portuguesa necessita de propostas políticas alternativas, claramente distintas, e não apenas de nuances que permitam às clientelas ajeitar-se a qualquer tipo de governo, desde que estejam lá. Mais: a existência dessa alternativa ficou bem clara à esquerda com a actual solução governativa, pelo que à direita não se pode pecar por omissão”, ou seja, “o PSD de que o país precisa é um PSD que defenda as reformas que o PS nunca quis ou quererá fazer”.
 
O cenário de subalternização do PSD é o cenário da sua transformação numa versão portuguesa de um partido subalterno como hoje parece ser o SPD alemão, algo para que João Marques de Almeida – um colunista do Observador que colaborou com a candidatura de Santana Lopes – chamou a atenção em Obrigado Santana Lopes e parabéns Rui Rio. Escreveu ele: “Aparentemente, Rui Rio aderiu à JSD por causa do seu entusiasmo com o SPD, adquirido no colégio alemão no Porto. Esperemos que o seu destino não seja agora transformar o PPD no SPD português, fazendo pelo caminho de Costa ‘a Merkel portuguesa’”. Mais: “Dado o entusiasmo com grandes coligações e com blocos centrais, sugiro uma análise um pouco mais cuidada às duas grandes coligações entre Merkel e o SPD. Serviram sobretudo para as lideranças do SPD salvarem os seus lugares apesar de terem perdido as eleições”. 
 
Na mesma linha também se colocou Diogo Prates em num texto significativamente intitulado PSD e SPD e publicado igualmente no Observador, e que vale mais pelo seu didatismo, assim introduzido:  “Se as eleições fossem hoje o resultado mais provável seria uma vitória do PS sem maioria absoluta e muito provavelmente Costa dispensaria de bom-grado a companhia de Catarina e Jerónimo para fazer de Rio seu vice no governo. Neste exercício de futurologia qual seria o futuro do PSD? Talvez seja útil olhar para a Alemanha”. 
 
Finalmente uma nota para o total desencanto do colunista do Expresso Henrique Raposo, que tem mesmo um título brutal na sua crónica: O futuro do PSD é votar CDS, Iniciativa Liberal ou... Rui Moreira. Começa por ser claro – “não votaria num PSD liderado por Santana, não voto num PSD liderado por Rui Rio” – e depois regressa ao passado e ao falhanço da direita inspirada por Lucas Pires nos seus encontros de Ofir: “O esmagamento das ideias de Lucas Pires pela tecnocracia de Cavaco é um momento negro para a direita portuguesa, representa uma automutilação que dura até hoje, e representa a destruição de um efectivo pluralismo político. Santana e Rio querem um PSD igual ao PS. E assim pergunta-se: então para que serve a política se todos são iguais?” Que fazer então? Ele defende que se recupere essa experiência e orientação: “É em Ofir que está a chave para um centro direita contra as esquerdas mas também contra os crescentes nacionalismos, marialvismos, trumpismos e anti europeísmos”.
 
Ora aqui está uma pista seguramente controversa, mas nem por isso menos interessante. Talvez falemos mais dela no futuro. Para já despeço-me com votos de bom descanso e melhores leituras.
 
 
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