segunda-feira, 14 de junho de 2021

REPORTAGEM TSF: "Escassez." Desconfinamento reduz dádivas de sangue ao IPO


Apesar das dificuldades sentidas em alguns dias, os responsáveis garantem que não houve cirurgias, nem tratamentos adiados. No Dia Mundial do Dador de Sangue, a TSF visita o Serviço de Sangue do IPO de Lisboa.
Susana tem 36 anos e desde os 20 e poucos que é dadora de sangue. Nesta tarde quente de junho, é a primeira a dirigir-se ao balcão, para doar sangue. A manhã foi mais agitada. Mas, de tarde, o serviço está praticamente deserto.

Feita a inscrição, preenchido um questionário sobre saúde geral, Susana é vista por um médico, que avalia se tem condições para a doação. Diz-lhe que também está interessada em doar plaquetas.

No IPO, além do sangue "total", os dadores podem também doar, separadamente, cada um dos componentes do sangue. Plaquetas ou glóbulos vermelhos, por exemplo. Isabel Branco, médica imuno-hemoterapeuta, explica que o processo é ligeiramente mais demorado mas, fisicamente, o dador não sente grandes diferenças.

"Pode ter um bocadinho de formigueiros, o que tem a ver com o anticoagulante que se junta, mas que se pode compensar rapidamente, com cálcio ou bebendo um copo de leite, isso passa."

Isabel Branco explica ainda que doar componentes do sangue em separado, é uma forma de rentabilizar melhor a dádiva, para tratar várias pessoas.

Menos dádivas

De manhã, Ana Paula, a rececionista, contou mais de 20 dadores. João Barata foi um deles. Começou a doar sangue ainda estudante, por mero acaso, quando houve uma colheita na universidade. E nunca mais deixou de o fazer. Confessa que se sente "especial", ao contribuir para uma vida melhor, dos doentes do IPO.

É comum haver menos dádivas depois do almoço mas, quem faz as colheitas, notou uma quebra generalizada nos últimos tempos "É do desconfinamento", acredita a enfermeira Liliana Simãozinho.

"Por terem voltado ao trabalho ou por terem outros afazeres, acabaram por desvalorizar um bocadinho a dádiva e por vir menos ao nosso serviço. Até tínhamos algumas sessões agendadas, e as pessoas acabaram por faltar, o que foi muito mau."

A médica imuno-hemoterapeuta Isabel Branco põe água na fervura, ao sublinhar que, apesar da quebra generalizada após o desconfinamento, antes, entre janeiro e maio deste ano, num dos picos da pandemia, o IPO registou um aumento global de 28% do número de dadores e um crescimento de 54% dos dadores de primeira vez, nomeadamente, entre os jovens.

A poucos metros dali, da sala onde são feitas as colheitas de sangue, Isabel Branco abre a porta da câmara frigorífica. Está frio: não mais de 4 graus. É aqui que são guardadas as dádivas de sangue, mas a médica não escondAdmite mesmo que não é "excessivo" falar de "escassez" nalguns tipos, como o "A negativo": "É suposto termos 30 unidades; como vê, há duas! Ontem tivemos de ir várias vezes ao Instituto Português de Sangue buscar vários tipos de sangue, nomeadamente o A negativo e o B, que também havia dificuldade."

Apesar disso, Isabel Branco faz questão de sublinhar que não há consequências para os doentes. "Não foi adiado nenhum tratamento, nem nenhuma cirurgia, mas, às vezes, é preciso aqui alguma ginástica".

A médica acredita que as falhas são temporárias e que um apelo generalizado não é solução. "Hoje, já houve bastante afluência de manhã. Não fizemos nenhum apelo nacional porque, se vier muita gente, num momento só, neste momento de pandemia, não é benéfico, porque não queremos que haja ajuntamento de dadores. Por outro lado, se vierem muitos dadores regulares agora, vão faltar depois."

Mais sangue do que outros hospitais

O sangue, por inteiro, ou os diversos componentes, são tratados e conservados no laboratório, prontos a dar resposta a um hospital que precisa de muito mais sangue do que qualquer outro.

Nuno Miranda, diretor da Unidade de Transplantes de Medula do IPO, nota que, aqui, não se fazem só cirurgias. Há também que contar, por exemplo, com os tratamentos oncológicos, que afetam a capacidade da medula, de produzir sangue. e que também há prateleiras praticamente vazias.

"Durante um período de tempo, que pode ser longo, os nossos doentes não vão ter capacidade de produzir, nem glóbulos vermelhos, nem plaquetas em quantidade suficiente. E até recuperarem essa capacidade, que depende do funcionamento da nova medula, vamos ter de lhos dar, para eles terem capacidade de viver, rigorosamente. Isto é uma coisa essencial para a vida."

As dádivas de sangue feitas ao IPO destinam-se aos doentes aqui acompanhados, em internamento, ou no hospital de dia. Trata-se de uma pequena sala, com apenas 6 camas, onde são seguidas mais de 20 pessoas todos os dias.

"São doentes oncológicos, que precisam de transfusões e que estão em ambulatório (...) vêm em períodos em que estão a recuperar da quimioterapia; ou, em períodos pré-operatórios, vêm repor as reservas, para otimizar os níveis de hemoglobina, para suportarem bem a cirurgia."

Ao fundo do corredor, mesmo ao virar da esquina, Ana Paula não larga o computador e o telefone. É preciso confirmar as marcações, garantir que os dadores vêm mesmo.

Uma tarefa facilitada a partir deste Dia Mundial do Dador de Sangue, se quiser doar ao IPO, basta preencher um formulário digital, a partir de agora disponível no site.
Fonte: https://www.tsf.pt/portugal/sociedade/-escassez-desconfinamento-reduz-dadivas-de-sangue-ao-ipo-13834652.html



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