José Manuel Silva* - Jornal de Notícias, opinião
Um título errado da TSF, entretanto corrigido, deu origem a mais uma notícia "negra" para os médicos, com base afinal numa clara "não notícia".
Esclareço. No que se refere aos apoios concedidos na área da Saúde, os destaques das notícias levam as pessoas a crer que apenas a indústria farmacêutica concede patrocínios, embora esta naturalmente prevaleça, e que só os médicos são os beneficiados. Não é verdade. Conforme o mais recente comunicado do Infarmed, há oito grupos de entidades a conceder patrocínios e há catorze grupos de entidades a recebê-los, predominando as "sociedades médicas/associações de investigação/de estudos clínicos", não os médicos individuais, e incluindo associações de doentes, que o Estado, vergonhosamente, não apoia.
Nestes "apoios" estão incluídas aquilo que são normalíssimas relações comerciais, como a inserção de anúncios em revistas científicas, a compra de espaços de stand e a distribuição de pastas, blocos e esferográficas em congressos, etc.
Será que alguém acharia normal que uma lei impusesse uma listagem num portal em que todas as empresas tivessem de declarar os anúncios que publicam nos órgãos da Comunicação Social, festivais de música e eventos desportivos, etc.? Provavelmente, não. Pois bem, na Saúde isso acontece e é considerado como "patrocínio" de "caráter duvidoso"!
Há congressos com custos superiores ao salário mensal líquido de um médico especialista (1500 euros) e os apoios que os médicos recebem para a sua formação, que o Estado não concede, refletem-se em benefício para os doentes.
É curiosa a ênfase que é colocada na diferença entre o montante declarado pelas entidades patrocinadoras e o valor declarado pelas entidades recetoras, quando essa diferença não tem significado absolutamente nenhum, resultando apenas da burocrática estupidez da lei que obriga a uma dupla declaração dos mesmos atos! Os patrocinadores declaram sempre, os recetores esquecem-se com frequência, pois não faz parte da sua rotina quando recebem um apoio esporádico. Está tudo declarado e não há nada a esconder, nem quaisquer consequências fiscais ou legais. Porquê tanto ruído?
Quando teremos um legislador que simplifique a legislação, evitando a obrigação da dupla declaração e todas estas desnecessárias e estéreis confusões?
Simultaneamente, porque cultivo a transparência e pela coincidência de alguns secretários de Estado receberem apoios para irem a jogos de futebol, lançamos um desafio a este Governo para que, com as devidas adaptações, generalize o espírito e a letra do art.º 159 dos decretos-lei 176/2006 e 123/2013 a todos as pessoas que ocupam cargos públicos, de eleição ou nomeação, para que população e jornalistas possam, de forma transparente, consultar igualmente as respetivas listagens de apoios e patrocínios. Fica o desafio.
*Bastonário da Ordem dos Médicos
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