segunda-feira, 4 de setembro de 2017

O poderoso Marcelo

Pela primeira vez, desde que o Negócios lançou a iniciativa dos Mais Poderosos em 2010, o Presidente da República ocupa o primeiro lugar desta lista. Este facto é um claro sinal dos tempos e um reflexo da forma como Marcelo Rebelo de Sousa exerce o seu poder.
Celso  Filipe
Celso Filipe 03 de setembro de 2017 às 23:00
Um sinal dos tempos, porque Portugal tem vindo progressivamente a ganhar autonomia, saindo de um período de ajuda externa em que os mais poderosos eram personalidades tutelares de Portugal, como Angela Merkel, Wolfgang Schäuble e Mario Draghi. E depois porque Marcelo Rebelo de Sousa usou a fragilidade de um Governo inesperado, baseado numa geringonça, para se afirmar como fiel da balança e assumir protagonismo.

O poder de Marcelo nasce desta dupla circunstância, a que soma um terceiro elemento decisivo, a personalidade do Presidente e o prazer que genuinamente lhe dá a actividade política.

Marcelo dessacralizou a Presidência da República e tornou-a terrena. O seu antecessor, Cavaco Silva, afirmava o seu poder através do silêncio, do distanciamento no trato com os cidadãos e da vetustez de carácter. Marcelo Rebelo de Sousa faz precisamente o contrário. Fala, intromete-se, aproxima-se das pessoas e tem comportamentos mundanos, como pagar as contas no multibanco. Os portugueses que respeitavam Cavaco identificam-se com Marcelo. As suas falhas e defeitos humanizam-no e acabam por reforçar a sua popularidade. E esta é uma diferença substantiva que o Presidente sabe usar em seu proveito.


O poder de Marcelo Rebelo de Sousa extravasa em muito a forma como muitos olham para a função presidencial. O jornalista Vítor Matos, que em 2012 publicou o livro "Marcelo Rebelo de Sousa", uma biografia consentida mas não autorizada do agora Chefe do Estado, escreveu já este ano no Observador, a propósito de Pedrógão e Tancos, que o Presidente exerce uma "magistratura de interferência", sendo este "um estilo com um tremendo potencial de conflito".

A realidade é que a atitude interventiva de Marcelo tem sido uma mais-valia para o país, proporcionando estabilidade num cenário político que muitos consideravam (e consideram) de extrema fragilidade.

O poder de Marcelo nasce aqui, mas só se torna efectivo porque ele o tem usado sabiamente, tornando-se relevante e incontornável, com a vantagem de ninguém o poder acusar, à esquerda ou à direita, de que tem deixado a defesa dos interesses do país para segundo plano. Antes pelo contrário. Marcelo chegou ao poder por sua conta e conquistou-o por mérito próprio. É verdade que se trata de um jogo arriscado e que a política é o reino do efémero. Mas, até agora, o Presidente da República tem-se saído muito bem. 

Fonte: Jornal de Negócios

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