Preço pago pela indústria não para de cair. Autarcas pedem ao governo a definição de preços mínimos. Parlamento já aprovou lei nesse sentido que espera o fim das férias dos deputados.
Domingos Luís é um pequeno proprietário florestal. Aos 65 anos tinha pinheiros que valiam uns 20 a 25 mil euros. Em vez de ter o dinheiro no banco, era uma espécie de reserva que podia vender a qualquer altura quando fosse preciso.
A 17 de junho o fogo chegou a Pedrógão Grande e Domingos Luís ficou sem o seu pé-de-meia em forma de árvores. Hoje recorda que não quis vender logo depois a madeira queimada porque o preço estava demasiado baixo... mas com novos incêndios em julho e agosto o preço caiu ainda mais.
Domingos Luís está agora num impasse. Ou vende rapidamente por valores muito baixos. Ou espera e vê a madeira degradar-se com o tempo e a chegada das chuvas.
São casos como este pequeno produtor florestal que estão a preocupar as câmaras municipais afetadas por aquele que ficou conhecido como o incêndio de Pedrógão Grande, mas também as associações de madeireiros e quase todos os partidos.
Aliás, há um projeto de lei no parlamento, aprovado na generalidade a 19 de julho, que prevê que o Ministério da Agricultura e Florestas crie parques para receber madeira queimada do fogo de Pedrógão e defina um preço baseado naquilo que se verificava antes do fogo.
O problema é que o projeto, aprovado pelo PSD, BE, CDS-PP, PCP e PEV, não passou de imediato, devido ao PS, a votação final global e está à espera que os deputados regressem de férias para começar a ser discutido na especialidade.
Autarcas querem fim da especulação
Até que os deputados avancem com o diploma proposto, em conjunto, pelo PSD, CDS e PCP e o transformem de facto em lei (há claramente maioria parlamentar para isso), a madeira vai-se deteriorando e os proprietários não sabem o que fazer à vida.
A presidente da Câmara de Góis, um dos municípios mais afetados pelo incêndio de Pedrógão, explica à TSF que muitos donos da madeira queimada dizem que o que lhes estão a oferecer não chega para recuperar o investimento e com frequência nem para pagar o trabalho de limpar a mata.
Lurdes Castanheira, eleita pelo PS, acrescenta que muitos estão a deixar a madeira nos terrenos o que é um problema para o futuro: matéria altamente combustível para novos incêndios.
Razões que já levaram os vários autarcas da zona a proporem ao governo, incluindo diretamente ao primeiro-ministro, que para acabar com a especulação o Estado defina preços mínimos com urgência e crie incentivos a uma reflorestação ordenada.
Lei à espera do regresso de férias
Entretanto, o PCP, um dos partidos que suporta o executivo e um dos três que propôs a lei que está a 'marinar' no parlamento, escreveu em agosto ao Ministério da Agricultura e Florestas.
O deputado João Ramos conta que também foram informados que o preço da madeira queimada no incêndio de Pedrógão não tem parado de cair, com graves perdas para os proprietários, pelo que se impõe ao governo que avance com as medidas já aprovadas na generalidade na Assembleia da República.
O comunista defende que é preciso garantir preços justos para os produtores evitando que "alguém se aproveite da tragédia dos fogos".
João Ramos recorda que a proposta de criar preços mínimos para a madeira queimada no incêndio de Pedrógão Grande já conseguiu juntar partidos da esquerda e da direita no parlamento.
Madeireiros dizem que fábricas impõem descida de preços
A Associação Nacional de Empresas Florestais, Agrícolas e do Ambiente (ANEFA), que representa sobretudo os madeireiros que compram aos produtores e vendem à indústria, confirma que desde Pedrógão os preços da madeira queimada desceram muito e há muita madeira a ficar no terreno aumentando o risco de novos incêndios daqui a alguns anos, repetindo-se algo que aconteceu depois dos grandes fogos de 2005.
O presidente, Pedro Serra Ramos, adianta contudo que são esses os preços impostos pelas fábricas que recebem a madeira comprada aos produtores.
Os números da ANEFA revelam que o preço pago pela indústria pelo pinho queimado tem vindo a baixar mensalmente: neste momento cada tonelada é paga a 27 euros, "madeira que normalmente mesmo queimada anda nos 36 euros" (menos 25%).
Domingos Luís, o pequeno proprietário florestal que apresentámos no início desta reportagem, sublinha que apesar do prejuízo e de existir quem ande a lucrar com os fogos, não culpa quem compra a madeira queimada. Sem regulação, "é normal que um madeireiro chegue aqui para ganhar a vida e compre pelo melhor preço possível".
Fonte: TSF
Foto: Artur Machado/Global Imagens
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