O antigo presidente do CDS Adriano Moreira morreu hoje aos 100 anos, confirmou hoje à Lusa fonte do partido.
A notícia foi avançada pelo
DN e confirmada à agência Lusa por fonte do CDS.
O ministro dos Negócios Estrangeiros enviou condolências aos familiares e amigos de Adriano Moreira, destacando a reflexão permanente do ex-ministro e deputado sobre o papel de Portugal no mundo.
"As minhas condolências aos familiares e amigos de Adriano Moreira, que ao longo de muitas décadas teve sempre disponibilidade e abertura de espírito para pensar sobre o lugar de Portugal no mundo", escreveu João Gomes Cravinho na rede social Twitter.
O antigo presidente do CDS morreu hoje aos 100 anos, confirmou à Lusa fonte do partido.
Com 100 anos completados em 06 de setembro passado, foi condecorado pelo Presidente da República em junho com .
Nomeado pelo então Chefe de Estado António de Oliveira Salazar, Adriano Moreira foi ministro do Ultramar no período da ditadura (1961-1963) e, já em democracia, depois de ter estado exilado no Brasil, foi presidente do CDS (1986-1988), deputado até 1995 e chegou a ser também vice-presidente da Assembleia da República e manteve sempre a ligação à universidade e à reflexão em matéria de Relações Internacionais.
Em 2015 foi nomeado para o conselho de Estado, onde permaneceu até 2019, já com Marcelo Rebelo de Sousa em Belém e de quem recebeu as últimas condecorações, incluindo a Grã-Cruz da Ordem de Camões.
Tinha acabado de celebrar 100 anos de vida em setembro.
Outras reações
A mensagem do Presidente da República no centenário de Adriano Moreira
(06 de setembro de 2002)"O verdadeiramente fascinante em Adriano Moreira é que, há muito, entrou na História apesar de toda a sua vida ter sido feita de desencontros históricos. Chegou sempre cedo demais ou tarde demais a esses encontros.
"Cedo demais. Quando, vindo de Trás-os-Montes profundos, ostensivamente orgulhoso das suas raízes, subiu os degraus da vida, se fez estudioso, e académico, e a Academia que primeiro o acolhera o desperdiçava, e à sua criatividade escrita e oral e à sua ilimitada doação ao trabalho. Por razões que, ela própria, viria a abandonar tempos volvidos.
"Cedo demais. Quando sonhou converter uma escola de quadros coloniais, depois ultramarinos, em Academia tão nobre quanto outras de outros tempos. E teve de encontrar atalhos e esperar pacientemente para que o óbvio acontecesse.
"Cedo demais, quando se lançou, pioneiro, em domínios da Ciência Política, das Relações Internacionais, da Geoestratégia prospetiva. E foram precisas décadas até se entender como antecipara o futuro.
"Cedo demais, quando intuiu, na sua militância rebelde de juventude, que os regimes ou se adiantam na mudança ou morrem; e morrem comatosamente sem glória nem esperança. E assistiu, impotente, à consumação do que marcou a sua e a nossa vida coletiva.
"Cedo demais, quando viu, e viu com clareza, como os Impérios depressa passam da nostalgia de eras transcorridas para destinos não vislumbrados nem assumidos como inevitáveis. E, debalde, sonhou abrir avenidas para o pós-Império, antes de ele chegar à margem dessas avenidas.
"Cedo e, ironicamente, também tarde demais, quando jovem governante, quis reformar Política e Direito Coloniais e Ultramarinos, e, para muitos, o que trazia era rutura em excesso, e, para muitos outros, aportava com, pelo menos, uma década de atraso.
"Cedo e tarde demais, quando irrompeu, nos seus quarenta anos de idade – contrastantes com a anciania do poder instalado. Cedo demais, porque não tinha os pergaminhos do cursus honorum do regime, nem a rede de lealdades no seu seio, nem a aquiescência de um líder, que encontrara na guerra o argumento moral e vocal para continuar, como se o tempo fosse eterno e tudo à sua volta acompanhasse esse seu tempo fora do tempo.
"Tarde demais, porque outros – ideias, projetos, factos, pessoas, existiam ou se faziam para o dia seguinte, não esperando por uma charneira já improvável, por uma transição já inviável.
"Chegara cedo demais para um Status quo parado na sua solidão. E tarde demais para a mudança que decifrava, mas cada vez mais intuía já não contar com o seu papel determinante.
"Ainda assim, refez-se na Academia, no Brasil e em Portugal. Ainda assim, viu reparadas miopias, injustiças, esquecimentos. Ainda assim, pôde – caso único – liderar formação política em regime bem diverso daquele a que se opusera jovem e no qual fora, em posição cimeira, do mais inteligente, do mais brilhante, do mais sedutor, em lances essenciais. Mas, já era tarde. Tinham passado vinte e cinco anos. Mundo, Mundo de fala portuguesa, Europa, Portugal eram, irreversivelmente outros.
"E foi assim que alguém, como poucos, fadado para a Chefia do Estado ou do Governo, ou missões internacionais de tomo, se desencontrou com esses destinos.
"E foi assim que, mesmo desencontrado com a História, nela entrou há meio século, ou talvez mais. Nela entrou, nela ficou, nela ficará para sempre. A própria História se faz desses sortilégios.
"Há quem se encontre com ela e nela não entre, não deixe traço, a não ser o de uma cronologia, de um apontamento sumário, de um aceno breve, ainda quando reconhecido.
"Com Adriano Moreira, a História acolheu-o bem antes de a Providência ou o Fado lhe terem proporcionado o mais raro do raro – viver e tão intensamente que se pôde permitir o por todos invejável – ser o último a contar o que viu e viveu, sem a possível contradita dos contemporâneos.
"Mas Adriano Moreira, além desse privilégio comparativo, foi sempre impar no pensamento, na oratória, na conquista das almas, na natural adesão dos alunos, discípulos, seguidores, na intuição do essencial, na conjugação de valores com realidade, no equilíbrio entre o enigma que reforça o mito e a empatia que suscita a emoção, na confirmação da certeza que tinha e tem do seu ascendente com uma sábia humildade, misto de uma sincera modéstia do seu ser com uma subtil e fina capacidade de enlear pessoas e chamá-las à identificação afetiva.
"Em suma, traços de génio, tantas vezes recoberto pela antiga presciência acerca da inveja portuguesa, de que falava o Embaixador Rodrigo Sousa Coutinho na sua carta ao Rei Luís XV.
"Não é, porém, apenas por ter, há muito entrado na História, na nossa História Portuguesa, que hoje aqui estamos. Aqui estamos para lhe dizermos, de viva-voz, como lhe agradecemos tudo o que fez, tudo o que faz, pelas nossas Forças Armadas, pela nossa Língua, pela nossa Cultura, pela nossa Portugalidade.
"Neste momento não há nem direita, nem esquerda, nem civis, nem militares, nem apóstolos das suas lutas, nem críticos de algumas das suas atitudes, nem antigos, nem novos, nem novíssimos, nem conhecedores de há tempos sem fim – nos quais me conto, colega de carteira que foi de meu Pai, há quase um século –, nem recém-vindos ao seu convívio.
"Há, tão somente, Portugueses!
"E são esses Portugueses que lhe agradecem em nome de Portugal!"
Fonte oficial
Perfil redigido pela Agência Lusa
Adriano Moreira, que morreu hoje com 100 anos, foi ministro do Ultramar no período da ditadura e presidente do CDS já em democracia, tornando-se uma das figuras mais prestigiadas dos séculos XX e XXI.
Condecorado pelo Presidente da República em junho com a Grã-Cruz da Ordem de Camões, antes de completar 100 anos em 06 de setembro, destacou-se não só como político e estadista, mas também como professor universitário e pensador em matéria de Relações Internacionais.
Ex-membro do Conselho de Estado indicado pelo CDS-PP, Adriano Moreira teve um percurso académico e político dividido entre dois regimes, tendo sido ministro do Ultramar no Estado Novo, de 1961 a 1963, e presidente do Centro Democrático e Social (CDS) em democracia, de 1986 a 1988.
Professor universitário com dezenas de obras publicadas, fortemente ligado ao atual Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP), que dirigiu e ajudou a reformar antes do 25 de Abril, foi também deputado, entre 1980 e 1995, e vice-presidente da Assembleia da República no seu último mandato parlamentar.
"A minha vida foi a escola, sobretudo. A intervenção política foi mais por obrigação cívica", afirmou Adriano Moreira, numa entrevista à agência Lusa, em 2012.
Adriano José Alves Moreira nasceu em Grijó, Macedo de Cavaleiros, no distrito de Bragança, em 06 de setembro de 1922, filho de António José Moreira, que foi subchefe da Polícia de Segurança Pública (PSP) no porto de Lisboa, e de Leopoldina do Céu Alves.
Em Lisboa, morou em Campolide, estudou no Liceu Passos Manuel e licenciou-se em Ciências Histórico-Jurídicas pela Faculdade de Direito de Lisboa, em 1944. Recém-formado, começou a exercer a advocacia e o seu envolvimento num processo contra o então ministro da Guerra, Fernando dos Santos Costa, valeu-lhe uma detenção.
No Aljube, de onde foi libertado passados cerca de dois meses, conheceu Mário Soares: "Até então, só o conhecia de nome. Era um jovem que muita gente apreciava, porque tinha uma certa alegria e também porque era muito determinado e consistente para a idade. Mas defendíamos posições inteiramente contrárias", relatou, citado pela Visão, em 1995.
Entretanto, ingressou no corpo docente da antiga Escola Superior Colonial, que passaria a Instituto Superior de Estudos Ultramarinos - o atual ISCSP, pelo qual se doutorou, assim como pela Universidade Complutense de Madrid - e que, com a sua intervenção, seria integrado na Universidade Técnica de Lisboa.
A sua tese "O Problema Prisional do Ultramar", editada em 1954, foi premiada pela Academia das Ciências de Lisboa. Entre 1957 e 1959, Adriano Moreira fez parte da delegação portuguesa às Nações Unidas: "Aí pude ouvir pela primeira vez em liberdade as vozes dos povos que eram tratados como mudos ou como dispensáveis. E isso mais avivou a minha ideia de que tínhamos de transformar completamente o ensino".
António de Oliveira Salazar chamou-o então para o Governo, primeiro para subsecretário de Estado da Administração Ultramarina, em 1960, e depois para ministro do Ultramar, em 1961. Estalavam as primeiras revoltas em Angola contra a colonização portuguesa.
Segundo o próprio Adriano Moreira, Salazar convidou-o para que pusesse em prática um conjunto de reformas de que falava nas suas aulas, mas posteriormente pediu-lhe para mudar de política e a sua resposta foi: "Vossa excelência acaba de mudar de ministro".
"Fui ministro de Salazar, mas fui o ministro que fui: revoguei o Estatuto do Indigenato e aboli as culturas obrigatórias nas colónias", disse ao Expresso, em 1983.
Quando deixou o Governo, em 1963, voltou ao ensino e casou-se em 1968 com Mónica Isabel Lima Mayer, com quem teve seis filhos, António, Mónica, Nuno, Isabel, João e Teresa. Foi presidente da Sociedade de Geografia.
Após o 25 de Abril de 1974, foi saneado das funções oficiais e esteve exilado no Brasil, onde foi professor na Universidade Católica do Rio de Janeiro.
Em 1980, regressou à política ativa, como candidato a deputado nas listas da Aliança Democrática (AD). Filiou-se no CDS, que acabaria por liderar, entre 1986 e 1988, e continuou deputado até 1995.
Em 2014, Adriano Moreira foi uma das 70 personalidades que defenderam a reestruturação da dívida pública como única saída para a crise.
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