O que há a fazer para travar as alterações climáticas? A resposta é simples, embora a sua concretização seja muito difícil
Um dos maiores desafios que a Humanidade enfrenta é o das alterações climáticas globais, isto é, o sobreaquecimento da superfície da Terra provocado pelas emissões dos gases de efeito estufa, o mais importante dos quais é o dióxido de carbono CO2).
Qualquer combustão leva a emissões deste gás, cujas moléculas têm a propriedade de absorverem e emitirem a radiação infravermelha que o nosso planeta envia. Este vaivém de energia entre a superfície da Terra e a atmosfera causou um incremento da temperatura média à superfície do nosso planeta 1,2 ºC acima dos níveis pré-industriais.
Com o Acordo de Paris, de 2015, ficou estabelecido que a temperatura do globo não deveria nunca ultrapassar os 2 ºC ao longo das próximas décadas e que, preferencialmente, não deveria ultrapassam os 1,5 ºC.
Este último objetivo é hoje praticamente impossível a avaliar pelo teor do último relatório, o sexto, do IPCC – Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas, das Nações Unidas (os documentos dos grupos de trabalho do IPCC estão já disponíveis na Internet desde o ano passado).
O que há a fazer para travar as alterações climáticas? A resposta é simples, embora a sua concretização seja muito difícil.
As emissões de CO2 têm vindo a subir. É necessário que diminuam. Temos que emitir menos CO2, desejavelmente nenhum, ou melhor, equilibrar quaisquer emissões com absorções de modo a obter um resultado líquido nulo (net zero). Os vários países estão a fazer voluntariamente promessas de redução: Portugal prometeu net zero para o ano de 2050.
O setor da energia é um dos maiores emissores de CO2. Precisamos de energia para os transportes, para a indústria, comércio e agricultura, etc. e, para obtermos essa energia, estamos ainda muito dependentes dos combustíveis fósseis (petróleo, gás natural e carvão).
O desafio climático é, em larga medida, o da mudança dessas fontes energéticas, que causam emissões, por fontes alternativas (energias hidroelétrica, eólica, biomassa, solar, geotérmica e nuclear), que não causam ou causam muito menos.
Urge, para além de poupar energia, abandonar as energias fósseis. Existe uma variedade de tecnologias disponíveis, mas não é fácil fazer a «transição energética», até porque as energias eólica e solar estão dependentes de condições meteorológicas que nem sempre estão reunidas, não sendo fácil armazenar as energias produzidas.
Vejamos o caso português. Na Pordata, que compila dados de fontes oficiais, está indicado o consumo de energia primária. A boa notícia é que desde o ano 2000, temos vindo a gastar menos energia: em 2000 consumimos 25.254 milhares de toneladas equivalentes de petróleo (tep) e em 2021 apenas 20.817.
Mas a má notícia é que a maior parte das energias que usamos ainda está ligada aos combustíveis fósseis: no ano de 2021, o petróleo dá conta de 8456 milhares de teps (41% do total) e o gás natural de 4974 milhares de teps (24%). O carvão é hoje praticamente residual entre nós e ainda bem porque este é o combustível com mais emissões.
As energias renováveis perfazem 6585 milhares de toneladas (32%).
Vemos que ainda há um longo caminho a percorrer para o país diminuir o consumo de combustíveis fosseis, que continuam a ser necessários nos transportes e na indústria. A situação atual pesa na economia do país, uma vez que o petróleo e o gás natural são comprados ao estrangeiro.
A situação é melhor, se olharmos apenas para a produção de eletricidade. Não somos autossuficientes nessa produção: nos últimos anos temos importado eletricidade.
Em 2021, foram produzidos entre nós 50.968 gigawatts hora de energia elétrica (o gigawatt hora, GW h, é uma unidade de energia; 1 tep = 11,63 MW h). Houve 33,093 GW h de energias renováveis, o que perfaz 65% da produção total de energia elétrica, uma fracção muito boa.
À frente das energias renováveis, está a energia hidroelétrica (13.455 GW h), seguida de muito perto pela eólica (13.216 GW h): cada uma delas representa cerca de 26% do total da energia elétrica.
Há ainda a acrescentar a biomassa (4007 GW h), a fotovoltaica (2237 GW h) e a geotérmica (179 GW h), esta última só com expressão nos Açores.
A evolução temporal da energia usada é um bom indicador da nossa transição energética: no ano 2000, as energias renováveis eram só 30% da energia elétrica, mas a proporção subiu desde 2018 consistentemente acima de 50%.
Prevê-se que continua a subir, de modo a cumprir a meta de net zero. A energia eólica tem potencial para crescer se forem colocadas unidades geradoras em áreas offshore (há um projeto para a zona ao largo da costa da Figueira da Foz) e o mesmo acontece com a energia fotovoltaica, dada a solaridade do país.
No panorama internacional, Portugal está bem colocado. Segundo um ranking de 2021 da Enerdata (uma consultora francesa do setor da energia), a Noruega lidera com 99% de energia renovável da produção elétrica, seguida pela Nova Zelândia (81%) e pelo Brasil (78%). Portugal ocupa um honroso 7.º lugar, logo atrás da Suécia. O país está no bom caminho…
Carlos Fiolhais é Físico e comunicador de Ciência
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